O ar da noite parecia mais denso, carregado por algo que Helena não sabia nomear. Sua pele ainda ardia onde Miguel a tocara, como se o calor dele tivesse ficado impregnado nela. Sua mente gritava para fugir, mas seu corpo… seu corpo queria mais.

Ela precisava voltar ao salão. Precisava se afastar antes que fizesse algo que não pudesse desfazer. Mas quando tentou se mover, Miguel a impediu.

— Não fuja de mim, Helena.

A voz dele era um sussurro rouco, carregado de desejo e certeza. E isso a assustava. Miguel sempre soube o que queria e não tinha medo de ir atrás. Já ela… ela passara anos sendo moldada para ser a esposa perfeita, a senhora Montenegro, uma mulher que sabia seu lugar e jamais ousaria cruzar certos limites.

Mas agora ela estava ali. E o limite já fora cruzado.

— Isso não pode acontecer, Miguel. — Sua voz saiu hesitante, denunciando a mentira.

Os dedos dele deslizaram devagar pelo braço dela, um toque leve, mas devastador.

— Mas já está acontecendo.

Helena sentiu as pernas fraquejarem. Precisava parar aquilo. Antes que fosse tarde demais.

Ela deu um passo para trás, rompendo o contato. Virou-se para a mansão, tentando recompor sua respiração. Mas Miguel não a deixaria ir tão fácil.

— Você ainda ama seu marido? — A pergunta veio como uma lâmina.

Helena congelou. Sentiu o coração acelerar, não pelo desejo desta vez, mas pelo medo da resposta que deveria dar.

Ela deveria dizer sim. Deveria dizer que Gustavo era o amor de sua vida, que aquele casamento ainda fazia sentido, que Miguel era apenas um delírio passageiro. Mas não conseguia pronunciar essas palavras. Porque seriam uma mentira.

Ela virou-se lentamente, encarando Miguel. Ele não sorriu, não provocou. Apenas esperou.

E foi esse silêncio que a destruiu.

— Não sei se algum dia amei. — As palavras saíram em um sussurro.

Miguel não pareceu surpreso. Em vez disso, deu um passo à frente, diminuindo a distância entre eles mais uma vez.

— Então por que ainda está com ele?

Helena abriu a boca, mas não conseguiu responder. Por que ainda estava? Por conforto? Por medo? Pelo que as pessoas diriam? Ou porque, se saísse agora, estaria admitindo que desperdiçou anos da sua vida em algo que nunca foi real?

— Eu não posso fazer isso com ele.

Miguel bufou, cruzando os braços — E ele faz o quê com você? Ele te olha como eu te olho, Helena? Ele sequer percebe quando você está infeliz?

A raiva tomou conta dela — Você não entende! Minha vida não é tão simples assim!

Ele se aproximou mais, seus olhos queimando nos dela.

— Sua vida é exatamente o que você escolhe que ela seja.

A dor cresceu dentro de Helena, porque, no fundo, ela sabia que Miguel estava certo.

Ela não disse nada. Apenas se virou e caminhou de volta para a mansão, sentindo cada passo pesar como se estivesse deixando para trás algo que nunca mais poderia recuperar.

Quando entrou no salão, as risadas e a música pareciam surreais. Como se viessem de outro mundo, um mundo que já não pertencia a ela.

Gustavo estava perto do bar, rindo alto com os amigos, segurando um copo de uísque como se fosse um troféu. Ele parecia perfeitamente à vontade, como se nada pudesse perturbá-lo.

Ela parou por um momento, observando o marido. Era um homem imponente, de traços duros, sempre impecável. Gustavo era um estrategista nato, alguém que controlava tudo ao seu redor. Incluindo a esposa.

Mas ali, enquanto Helena o olhava, percebeu algo que nunca tinha notado antes.

Ele não a olhava de volta.

Nem uma única vez naquela noite ele a procurou no meio da multidão.

A verdade bateu forte: Gustavo não estava preocupado com ela. Nunca esteve. Seu casamento não era uma história de amor, era um contrato. Um arranjo conveniente.

Mas Miguel a olhava. Ele sempre olhou.

Helena sentiu o estômago revirar. Como tudo havia chegado a esse ponto? E então sua mente voltou ao início.

Voltou ao dia em que Miguel entrou em sua vida. Voltou ao momento exato em que tudo começou a desmoronar.