As Correntes Invisíveis

O silêncio dentro do carro era sufocante.

Helena mantinha os olhos fixos na estrada à frente, mas sua mente estava longe. Seu corpo ainda lembrava o calor de Miguel, os lábios dele explorando sua pele, o desejo que a consumiu de uma forma que nunca sentiu com Gustavo. Mas agora, sentada ao lado do marido, a realidade era um peso insuportável sobre seus ombros.

Gustavo estava tranquilo demais.

Ele dirigia com uma calma calculada, as mãos firmes no volante, os olhos fixos na rua escura. Mas Helena o conhecia bem. Aquele silêncio não era indiferença. Era análise.

Ele estava observando cada detalhe, cada resquício de culpa no rosto dela.

— A festa foi divertida? — ele perguntou de repente, sem tirar os olhos da estrada.

O estômago de Helena revirou.

— Foi cansativa.

— É mesmo? — Um pequeno sorriso surgiu no canto dos lábios dele. — Sumiu por um tempo.

Seu coração deu um salto.

— Precisava de um pouco de ar.

O sorriso dele aumentou, mas não chegou aos olhos.

— Claro.

Aquela palavra carregava algo oculto. Uma insinuação.

Helena cruzou as pernas, as mãos apertadas no colo, como se pudesse esconder a verdade dentro de si.

Ele sabia?

Não… Não podia saber.

Mas Gustavo não precisava de provas para agir. Ele gostava de jogar. Gostava de observar a presa antes de atacar.

O caminho de volta para casa foi torturante. Cada minuto parecia uma eternidade, e Helena mal conseguia respirar direito. Quando o carro finalmente parou na entrada da mansão, ela quase correu para fora.

Mas antes que pudesse sair, a mão de Gustavo segurou seu pulso.

Seu toque era firme, possessivo.

— Durma bem, Helena.

O estômago dela se revirou.

Ela olhou para ele, tentando decifrar o que havia por trás daquele sorriso calmo. Gustavo não era do tipo que fazia cenas. Ele preferia atacar no momento certo.

Lentamente, ele soltou seu pulso, deixando um rastro de gelo na pele dela.

Helena entrou na casa sentindo-se zonza. Subiu as escadas, o coração acelerado, a respiração curta. Quando chegou ao quarto, trancou a porta atrás de si e desabou.

O peso da traição caiu sobre ela como um avalanche.

Ela havia traído Gustavo. De verdade. Não apenas nos pensamentos, mas com o corpo, com os lábios, com os gemidos abafados contra a pele de outro homem.

As lágrimas vieram antes que ela pudesse contê-las.

Ela se odiava por desejar Miguel. Mas, ao mesmo tempo, odiava-se ainda mais por temer Gustavo.

Então, o celular vibrou.

Helena prendeu a respiração.

Seu coração disparou quando viu o nome na tela.

Miguel.

Suas mãos tremiam enquanto pegava o aparelho. Seu dedo pairou sobre a tela por um momento antes de atender.

— Helena… — A voz rouca dele soou como um choque elétrico percorrendo sua espinha.

Ela fechou os olhos, sentindo a culpa e o desejo se misturando em um nó apertado dentro de si.

— Miguel… — sua voz saiu trêmula, quase um sussurro.

— Você está bem?

Ela abriu a boca, mas nenhuma palavra saiu. Como poderia dizer que não? Como poderia confessar que sentia como se estivesse se afogando?

— Eu não devia ter ido embora… — ele continuou, a voz carregada de algo que parecia arrependimento. — Você não precisa enfrentar isso sozinha.

Helena sentiu uma onda de calor tomar conta dela. Queria acreditar que Miguel poderia protegê-la. Que ele poderia ser sua salvação.

Mas ela sabia que não era tão simples.

Ela se afastou da porta, caminhando até a janela. Lá fora, as luzes do jardim projetavam sombras na grama perfeitamente aparada. Tudo parecia calmo, mas Helena sabia que sua vida estava longe da tranquilidade.

— Gustavo sabe — ela sussurrou, finalmente deixando escapar o medo que a consumia.

Do outro lado da linha, Miguel ficou em silêncio por alguns segundos.

— Você tem certeza?

Ela engoliu em seco.

— Não… Mas eu sinto. Ele não perguntou nada diretamente, mas… estava me testando. Ele nunca diz o que está pensando. Ele só… espera o momento certo para agir.

Miguel soltou um suspiro pesado.

— Você tem que sair daí, Helena.

Ela riu, sem humor.

— E ir para onde? Você acha que Gustavo não me encontraria?

— Você não pode continuar vivendo com medo.

Ela passou as mãos pelo rosto, sentindo a cabeça latejar.

— E se ele já souber? E se estiver apenas esperando para me destruir?

O silêncio de Miguel foi suficiente para confirmar o que ela já sabia.

Se Gustavo descobrisse, ele não a perdoaria.

Mas a questão não era apenas o que Gustavo faria com ela.

Era o que ele faria com Miguel.

Helena sentiu o peito apertar.

Ela o colocou em perigo.

— Eu preciso pensar — murmurou, mordendo o lábio.

— Helena… — A voz de Miguel era firme. — Você sabe que eu faria qualquer coisa por você, não sabe?

As lágrimas voltaram a brotar em seus olhos.

— Eu sei.

— Então me deixa te ajudar.

Ela apertou os olhos, lutando contra a dor que queimava por dentro.

— Eu te ligo depois.

E então, antes que pudesse hesitar, desligou o telefone.

Helena se deixou cair na cama, encarando o teto.

Se Gustavo já sabia… o que aconteceria agora?

Lá fora, um trovão ressoou no céu.

E, pela primeira vez, ela teve certeza de que a tempestade estava prestes a cair sobre ela.

Continue lendo no Buenovela
Digitalize o código para baixar o App

Capítulos relacionados

Último capítulo

Digitalize o código para ler no App