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D E P O I S | 1| AFIADO COMO LÂMINA

                                          Miriad, Academia Elementar.

                                                       Dias atuais.

  NÃO O SINTO EM MINHA MENTE.

Era de propósito. Eu não queria que ninguém soubesse que eu havia corrido para a Academia Elementar assim que tive uma oportunidade.Eu a fechei quão logo abri os olhos e tracei o plano mentalmente.ão o sinto em minha mente.

As aulas haviam encerradas até as devidas medidas que precisavam ser tomadas entrarem em ação, com todas as consequências de um novo Punho liderando o mundo dos Caminhantes da Luz. O que requeria a presença de todas as Falanges do mundo. Da Luz, pelo menos. E não que não me perturbasse o fato de eu estar ali por ser uma deles, mas eu podia muito bem usar esse fato ao meu favor. Estavam todos o suficientemente ocupados com isso agora, e provavelmente meu pequeno sumiço seria rapidamente desconsiderado.

Pelo menos, eu contava com isso.

Eu não sabia bem onde estava indo. Mas de acordo com as últimas informações que havia colhido, Zórem teria uma cópia da biografia de Evangeline Hatthwey escondida nas pilhas de arquivo morto da biblioteca da Academia. E esse livro havia virado meu objeto de desejo desde o dia em que eu descobri que Evangeline era minha Antecessora. Ou melhor, que eu era Predecessora da coisa que habitara seu corpo. Uma coisa sobre a qual eu ainda não tinha muitas informações.

O que era o suficiente para me deixar em estado de pânico, a ponto de sair correndo na primeira oportunidade para colher mais informações que me auxiliassem no processo de adaptação. E dicas. Quem sabe eu encontrasse, sei lá, um livro de auto-ajuda intitulado “Como lidar com coisas que você não conhece, mas que habitam seu corpo e querem terrivelmente te dominar, parte 1”, ou qualquer coisa assim.

   Eu já não sentia mais a presença cheia de energia da Esfera dentro de mim, mas podia saber que ela estava ali, recolhida em algum lugar, esperando pelo momento em que nossas almas se tornariam uma só. E prova disso, era a Marca das Balança carimbando meu pulso. A Marca do Equilíbrio.

Era assustador.

Como o resto das coisas que eu vinha enfrentando desde que Eron Stellar aparecera nas escadarias da Academia George Lemaitre.

Concentre-se.

As coisas meio que rodavam ao meu redor, perdendo o foco e a importância toda vez que ele dominava meus pensamentos, o que devo admitir, acontecia com bastante frequência. Talvez na maior parte do tempo.

Mas eu precisava de foco enquanto vencia os corredores e mais corredores de uma das maiores construções de Miriad, o lar natal de todas as Falanges do mundo, com poderes elementais ou não. Era meu único momento livre, já que no mais tardar, quando a Luz beijasse as Sombras (o famoso “pôr do sol” no mundo humano), a Cerimônia da Coroação do Novo Punho exigiria a presença de todos os presentes em Miriad.

E pensar que toda a repercussão era consequência de minha mais recente loucura ainda era desorientador.

Não é todo dia que garotas como eu acabam com mulheres poderosas e tiranas em dimensões de seres poderosos.

Concentre-se, Eveline!!!

Chacoalhei a cabeça pela décima vez, tentando me concentrar no caminho à frente.

Eu deveria encontrar o que mais se parecesse com alguma biblioteca Falange no interior da Academia Elementar, e agradecia mentalmente por não haver nenhum aprendiz testando suas habilidades com lâminas pelo caminho. Os corredores bem iluminados e largos lembravam muito aos corredores da GL, mas tinham muitos lembretes pelas paredes de que aquilo passava longe de ser uma escola comum: símbolos em evidência adornavam cada centímetro de cimento, se sobrepondo brilhantes por cima da tintura creme, com efeitos holográficos difíceis de serem ignorados. Era quase como eles saltassem em direção á meus olhos toda vez que eu tentava não olhar. O silêncio reinava, prova viva de que eu estava sozinha e de que não deveria ficar nervosa.

Mas eu estava.

Era a primeira vez que eu me aventurava sozinha por Miriad, sem a constante vigília de Arbo, Eron ou Dublemore, e pensar em tudo que poderia acontecer considerando tudo que já acontecera, ainda me rendia muitos tremores pelo corpo, me obrigando a andar da forma mais silenciosa possível.

O plano era simples.

Achar a biblioteca. Achar o livro. Pegar o livro. Voltar para a mansão Pinnbolrg. E ninguém ficaria sabendo, não até eu descobrir a extensão verdadeira do problema que me envolvia junto com Evangeline em uma grande massa de problemas e mistérios. E se a coisa fosse muito ruim, ninguém ia precisar ficar sabendo até que eu não arranjasse uma solução.

Simples e eficaz.

Pelo menos, era assim que o plano me parecera quando o bolei mentalmente naquela manhã, embolada nas cobertas quentes da casa de Ilínea.

Mas me parecia bobo e sem sentido agora. Até por que eu percebia que nunca conseguiria me achar naquela construção imensa e cheia de corredores, que mais pareciam labirintos.

Eu estava tentada a dar meia volta quando detectei um movimento rápido em uma das portas abertas no extremo do corredor ao meu lado num relance de olhar. O desconforto que se instalou na sola de meus pés me obrigou á parar, voltando alguns passos atrás no mais resoluto silêncio, observando melhor o interior da sala.

E meu queixo caiu, como se uma força gravitacional inexplicável o puxasse de encontro ao chão.

Isso, por que havia uma pessoa ali.

Com a respiração presa dentro dos pulmões, observei a distribuição do grande salão em forma retangular, com alguns colchonetes azuis espalhados pelo chão. Haviam algumas barras de aço presas ás paredes, fazendo circunferências familiares pelo teto. Haviam também bancadas com armas de pequeno porte espalhadas por toda a extensão das paredes, oferecendo várias opções de lâminas e objetos mortais das mais diversas espécies. Os alvos dispostos no fim da sala pintados em círculos de vermelho vivo continham várias adagas afiadas perfurando seu centro, demonstrando a habilidade de que as havia atirado, e em meio á tudo isso, Eron.

Sem camisa.

Ainda em silêncio, meus dedos se agarraram ao batente da porta.

Ele estava de costas, segurando um conjunto de facas adornadas em uma mão enquanto girava uma adaga prateada entre os dedos da outra. Os cabelos negros como a noite caíam sobre o pouco que eu conseguia ver de seus olhos verdes, e os músculos dourados brilhavam á baixo da iluminação amarelada das lamparinas em forma de bolhas grudadas no teto.

Mas não foi em nada disso que minha atenção se fixou.

Um Eron sem camisa era um tabu que nunca fui capaz de resolver. Tentar imaginar isso e recriar as todas as consequências da imagem sempre me deixaram ruborizada, pensando que eu nunca seria capaz de imaginar tudo com eficiência. E a cena diante de mim agora só provava que eu estava infinitamente certa.

Com o cós da calça escura perigosamente baixa nos quadris estreitos, os músculos quase morenos se ondulavam de forma atraente ao longo de seu lombar, braços e ombros, e um enorme dragão escuro envolvia grande parte das costas, as asas delimitando-se pelos ombros, as pernas e o rabo enrodilhando as costelas, e as garras acabando nos dois lados do pescoço. A boca aberta e escura, na clavícula direita, expelia fogo negro, criando o tribal que eu sempre achara sexy descendo pelo braço direito.

Aquilo era de matar.

Eu sabia que ele era forte, e que tudo por baixo da camisa devia ser tão bom quanto era por fora, mas nunca havia imaginado o quanto.

Apesar de saber que uma das Marcas dos Detentores do Fogo era o Dragão, nunca imaginei que pudesse ser a Marca dele. Ou melhor, como a Marca ficaria nele.

Os efeitos eram simplesmente devastadores. Nucleares. Bombásticos.

Espere ai... como é que se puxa o ar mesmo?                                           

Eu só podia estar sonhando. Aquilo tudo não poderia ser meu, poderia? Espere... era meu?

Eron tinha o poder de sugar toda a minha atenção para si, como se meu mundo gravitasse ao seu redor e meu Sol se pusesse a sua sombra. Aquele garoto era simplesmente uma bomba nuclear explodindo em meio ao meu espaço sideral. Ele havia conseguido se infiltrar de tal modo em meu escudo protetor, que eu ainda encontrava dificuldades ás vezes em entender como, exatamente, as coisas haviam acontecido em sua forma íntegra.

Minha vontade própria se tornava maleável com ele por perto, o que me fazia temer sua presença mais do que qualquer outra coisa.

Haviam motivos para tia Peg nos querer o mais afastados possível, o que a levara á monitorar com certa insistência suas visitas a mansão Pinnbolrg, onde nunca podíamos ficar sozinhos. Ás vezes, em silêncio, eu me pegava observando minha tia de soslaio, me perguntando que tipo de mistérios rondavam seu passado obsoleto, ou o porquê de ela insistir com tanta pertinência que eu ficasse o mais longe possível do garoto á minha frente, o mesmo que tinha o poder de me fazer parar e reconsiderar.

Era inevitável.

Tia Peg jamais entenderia aquilo.

E exatamente por isso, me desvencilhei silenciosamente do batente da porta, tensionado deixar o lugar do mesmo jeito que chegara.

Eu havia desistido de tentar afastar Eron, mas no momento, eu tinha outros assuntos em que me focar.

Meus pés deslizaram pelo chão de pedra polida sem emitir nenhum ruído, e me preparei para me afastar quando mais uma adaga se enterrou em meio ao alvo depois de uma investida ágil de braço.

— Vê algo que goste?

Paralisei onde estava ao som da sua voz musical e melodiosa.

Raios. Por acaso ele tinha olhos na nuca e eu ainda não havia reparado?

Ainda em estado de choque, não ousei emitir nenhum ruído, como se esperasse para ter certeza de que ele havia realmente falado comigo.

E então, ele se virou.

Engoli em seco, tentando não dar na cara que meus olhos passavam por seu peito nu da mesma forma minuciosa que o raio laser de um scanner. Se as coisas eram interessantes na parte traseira, eram espetaculares na dianteira.

As depressões profundas do abdômen enrijeceram quando ele firmou as pernas de frente para mim, e os músculos em evidência saltando por todas as partes visíveis de seu corpo denotavam a grande quantidade de veias tencionadas. A Marca escura de um enorme sol se estampava na parte central de seu peito, predominando mais da parte esquerda, exatamente em cima do coração. Os raios negros ondulando em circunferências pelo tórax e descendo em direção ao umbigo.

Seus lábios redondos se esticaram em um sorriso torto e matreiro enquanto seus olhos verde-dourados avaliavam minha reação, seu polegar desenhando um caminho tentador pelo queixo anguloso.

— E então? Vê algo que goste?

Não tenho certeza se gaguejei ou pisquei, mas no próximo segundo, me lembrei de fechar a boca escancarada.

Enfiei as mãos nos bolsos traseiros do jeans surrado enquanto pensava em algo inteligente para dizer, o que raramente acontecia nessas situações.

— Ahn... como você sabia que eu estava aqui?

Como eu ia dizendo...

Ele ergueu uma das sobrancelhas escuras, seus olhos deslizando sobre mim enquanto piscava maliciosamente, brincando com as adagas de forma distraída.

— Por que eu sempre sinto você. — ele deu de ombros — Da mesma forma que sinto meus dedos ou qualquer outra parte do meu corpo.

A comparação me fez piscar por alguns momentos, ainda tonta pela forma constante com a qual sua mente se embolava na minha, como duas serpentes se enrodilhando e lutando por território. Eu não lembrava do momento em que havia retirado bloqueio dela, mas a sentia se abrir para o garoto cataclista da mesma forma que uma flor se abria para o orvalho, na promessa de um pouco de vida e essência. Estava além de meu poder o domínio detê-la naquele momento. Da mesma que estava além de meu domínio deter á mim mesma.

Quando foi mesmo que me perdi?

Mais o menos no momento em que me achei.

Não houve exatamente um intervalo de tempo válido em que me decidir.

— Como isso acontece?

Ele se limitou a um dar de ombros.

— E quem é que se importa? Eu gosto. Ponto final. Dane-se o resto, se existe algum. — ele sorriu, dando um passo á frente e estendendo uma das mãos ­— Venha. Vamos ver o quanto você é boa com arremessos.

Ensaiei uma careta, analisando as lâminas enterradas na madeira branca e vermelha.

— Se quer mesmo saber, posso te adiantar sem a necessidade de um teste: sou muito melhor cantando o hino nacional em árabe e fazendo equilibrismos em cima de uma corda bamba.

Ele estreitou os olhos em minha direção.

 — Você não está com medo de ficar sozinha comigo, está?

— Eu já fiquei sozinha com você antes.

— Antes, eu ainda não podia te tocar.

Estremeci diante de sua piscadela, sentindo toda a minha estrutura tremer diante de sua afirmação. Não era mentira. Estar sozinha com Eron quando ele podia me incinerar com apenas um toque era uma coisa, mas estar sozinha com ele depois que desenvolvi uma barreira contra fogo era outra completamente diferente.

Por que eu continuava correndo riscos de ser incinerada com apenas um toque, só que de um modo mais não-literal.

Mordi o lábio.

— Ahm, eu...

Ele suspirou, recolhendo o braço e me enviando um olhar cortante, como se estivesse ultrapassando cada fina camada de minha mente até chegar ´minha alma.

— Venha aqui, Ev.

E minhas pernas começaram a se mover por conta própria.

Era como se eu fosse ferro puro sendo puxado em direção á um grande imã. Não havia uma forma melhor de descrever aquela força interdimensional me puxando em sua direção. Ele era o buraco negro. Eu era matéria pura.

 E ele voltou á sorrir de canto. O sorriso sumindo quando me aproximei.

Seus braços fortes estavam ao redor de minha cintura antes que eu pudesse me dar conta do que estava acontecendo. As coisas eram simples entre nós dois. Havia uma dificuldade insuperável de ambas as partes de querer manter as mãos longe um do outro. E essa era toda a explicação que eu tinha sobre o que acontecia quando ele estava por perto.

— Pensei que você quisesse testar minhas habilidades com arremesso. — cobrei num fio de voz.

Seus polegares desenhavam círculos em minhas costas, por cima da camiseta folgada de yoga, e ainda assim, eu podia sentir o poder de sua pele sobre a minha, emitindo ondas sonoras de calor por minhas veias.

— Você ficaria assombrada com a quantidade de habilidades suas que desejo explorar nesse exato momento.

A bolota se formou em minha garganta, e por um momento, um zum esquisito tomou posse de minha audição.

— Seja... acadêmico. — pigarreei, ainda tentando me concentrar na forma correta de fazer os pulmões e os pensamentos funcionarem ao mesmo tempo.

— Estou tentando ser o mais acadêmico possível, acredite. Acontece que... — ele deslizou as mãos sobre as laterais de minhas costas, percorrendo depois o caminho de minha espinha com o dedo indicador — É difícil pensar com delicadeza quando você está tão perto. Não é como se você pudesse me culpar.

— Você me trouxe para perto... — cobrei, tentando me afastar um passo, o que ele rapidamente impediu.

— E não pretendo deixa-la se afastar tão cedo... — ele me apertou contra ele, me arrancando outro suspiro. Eu adorava a forma como nos encaixávamos. A forma como ele tinha que se inclinar e baixar os ombros para poder me aninhar entre o peito, ou a forma como eu tinha que ficar na ponta dos pés para ter acesso á sua boca. — Sua tia não está aqui, então me deixe desfrutar um pouco dessa amostra de sorte.

— A Cerimônia vai começar em instantes...

Ignorando meu comentário, seu rosto desceu para a curva de meu pescoço, a ponta de seu nariz desenhando um caminho sobre a pele enquanto minha resistência ruía aos poucos.

— O que você estava fazendo aqui, Ev?

Meus olhos se abriram alertas. Eu devia ter desconfiado.

Ele sabia que eu estava escondendo alguma coisa. É claro que ele sabia.

Haviam muitas coisas á cerca daquele assunto que me deixavam em estado crítico de alerta. As últimas palavras de Zórem não saíam de minha cabeça, se repetindo como um CD riscado, e eu tinha quase toda a certeza necessária que o significado delas não poderia ser nada bom. Eu já havia aprendido o suficiente, e só planejava descobrir qual era o mistério em segredo.

Qual era o mal naquilo?

O problema, era que Eron também estava a par do problema denominado “Evangeline”, e jamais me deixaria esconder qualquer coisa dele. O que rapidamente me obrigou a abrir o jogo.

Depois de meu relato rápido sobre ter saído à procura da biografia de Evangeline, Eron voltou a levantar o rosto, me enviando um olhar curioso.

— Eu poderia ter pegado o livro para você, se você tivesse me pedido.

Desviei os olhos. Eu não queria falar sobre aquilo agora. Algo me dizia que as coisas já se complicariam bastante futuramente, e aquilo não era algo com que eu quisesse lidar agora.

— Eu sei. Vou me lembrar disso na próxima vez.

Mas ao invés de concordar e dar o assunto por encerrado, ele tocou meu queixo com a ponta do polegar, me fazendo inclinar o pescoço para ele, de forma a olhar dentro de seus olhos verdes e dopantes. Há algum tempo atrás, olhar dentro de seus olhos me horrorizava, porque eu me sentia sempre sendo sugada para dentro de tudo que Eron representava ao realizar o ato. Mas agora, eu entendia, que o que me aterrorizava, era o fato de conseguir achar á mim mesma ali dentro, como agora.

— Não, você não sabe.. Tão pouco concorda comigo. — ele discordou, —O que você planeja, é enfrentar todo o problema sozinha e carregar sobre os ombros todas as consequências. Achou mesmo que eu não saberia?

Por alguns momentos, minha voz foi aniquilada de meu pacote de funções corporais.

Eron tinha o poder supremo de me decifrar por completo, e aquilo só me deixava ainda mais assustada. Saber que ele entendia partes de mim que nem eu mesma sabia existir me deixava em estado platônico de desespero. Por que era bom demais. E eu temia que algum dia, isso pudesse acabar.

— Eu... eu só... —gaguejei por alguns instantes, mas simplesmente não havia o que ser dito além do óbvio: que ele estava certo.

Seus dedos roçaram meu rosto, e ele colocou uma mecha de cabelo cor café caída à frente de meu rosto para trás da orelha.

— Eu não menti quando disso que posso sentir você, Eve. — ele disse. — Então porque não me conta o que te perturba tanto?

Desisti de tentar manter qualquer escudo contra ele. Ele já havia provado ser á prova deles.

— Evangeline. Não canso de pensar que estou atada á ela de uma maneira que não consigo evitar. Quase como se... eu pertencesse á ela e a tragédia que marcou a geração de minha família.

Os olhos de Eron se deteram um tempo nos meus, em silêncio, para então, ele me trazer para mais junto de si, curvando p pescoço e sussurrando próximo á meu ouvido.

— Você pertence a mim, Eveline Gringer. A ninguém mais... sinto como se pertencesse antes mesmo de eu te conhecer.

A onda elétrica de calor que percorreu minhas veias se fundiu com minha necessidade dele, vazando por meus lábios de forma sôfrega quando ele voltou seus olhos novamente para os meus, selando sua afirmação enquanto encarava meus lábios entreabertos.

— ... sua...

Não sei dizer exatamente como aconteceu, mas quando dei por mim, meu corpo já estava preso numa das paredes mais próximas, tendo o corpo de Eron como barragem.

— É incrível como você tem uma habilidade nata de sempre me prender contra as coisas... sobre tudo, contra as paredes... — minha voz saiu ofegante, descompassada pelo brilho faminto pairando nos olhos de Eron e pela palma quente de sua mão deslizando provocadoramente por meus quadris tensos.

— Gosto de tê-la contra a parede. Gosto da ideia de saber que você não tem nenhum lugar para correr. Que sua única alternativa é sucumbir a mim.

Minha pulsação se acelerou num ritmo exorbitante quando ele me apertou contra a matéria fria.

— O que inevitavelmente sempre acontece. É culpa da adrenalina, sabe... — engoli em seco, tentando desviar o assunto e atribuir nosso descontrole á sua recente atividade física.

Mordi o lábio quando seus dedos apertaram a pele de minha coxa por cima da calça jeans. Eron arfou.

— Não faz ideia do que minha adrenalina está me impelindo á fazer agora...

Seus dedos voltaram á subir, se insinuando pelas bordas de minha camiseta folgada.

— Ahn.. então deve ser algo mais que apenas pura e simples... adrenalina...

Ele inclinou a cabeça em minha direção, e um formigamento familiar subiu por minhas pernas.

— Algo me diz que você está diabolicamente correta.

Dias e mais dias de tensão estavam prestes a serem liberados. Já fazia muito tempo desde que ficáramos sozinhos, e a presença constante de tia Peg sempre nos impedia de nos esquecermos do resto do mundo e sucumbir um ao outro, como agora.

Minhas mãos deslizaram por seu peito nu, o fazendo sibilar, e fechei meus olhos, esperando ansiosa pelo turbilhão de sensação que eu sabia que viriam a seguir.

Pouco antes de alguém irromper nas portas.

— Ah, vocês estão aí.. é claro que estão. E juntos. E terrivelmente próximos, devo dizer.

Surpresa, afastei Eron rapidamente, que rosnou em direção a entrada, onde Arbo nos encarava com os braços cruzados e uma expressão divertida no semblante. Os cabelos ruivos no tom familiar e selvagem de sempre, e os enormes olhos azuis que recriavam as facetas de uma tempestade escura semicerrados com escárnio enquanto os cantos de sua boca se erguiam num meio sorriso de deboche.

— Você já ouviu falar numa coisinha chamada “privacidade”? — Eron murmurou de forma ácida, girando uma adaga afiada entre dedos.

Arbo se limitou a dar de ombros.

— E você já ouviu falar numa coisinha chamada “uma-garota-levando-horas-para-se-preparar-para-uma-festa”? Pois é. Esta é Eve.

Arfei surpresa.

— Céus... já está na hora?

— Sim. — Arbo se desvencilhou do batente da porta, levando ás mãos a cintura num gesto gracioso — E você precisa vir comigo. Tenho ordens claras para prepará-la para a Grande Cerimônia. O que quer dizer que você deve se desgrudar do Sr. Fogueira Humana e vir comigo. — ela sorriu. — Agora.

Eron rolou os olhos.

— Você tem muita sorte de estar na mesma Elite que eu, Srta. Irritação Ambulante Cheia de Nós Nos Cabelos.

— Eu tenho que ir... — avisei, rumando em direção á porta e a Arbo antes que os dois começassem a se cutucar de verdade.

— Nos vemos lá.... — ele piscou em minha direção, enviando arrepios ao longo de minha espinha ao terminar a frase em meus pensamentos.

... Emunah.

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