Eles acoitavam sua mente quando Jade resolvia lhe dar um dia de folga. Como aquele.
Estranhava esses dias, se perguntando o que a Falange demente poderia estar fazendo.
De alguma forma, era como se ele se sentisse mais seguro quando Jade lhe fazia suas visitas constantes, se empenhando em fazê-lo descobrir novos limites de dor ao aplicar-lhe uma seção diária de tortura criativa. Pelo menos, nesses momentos, a atenção e criatividade de Jade se concentravam nele, e não em Eve, Havana ou Eron. Era quando Jade estava mais empenhado em fazê-lo ceder e trabalhar para ele. Algo que Layan sempre recusava.
E as consequências se somavam de forma dolorosa ao longo de seu corpo, já maltratado pelo tempo. Seu dom de regeneração tornava tudo apenas algumas vezes pior, o forçando a viver cada dia como se tivesse morrido e tornado no último. Era angustiante. Pela primeira vez Layan se pegava pensando que ter um corpo inumano com um sistema imunitário tão elevado era decididamente uma droga. Ele te impedia de sucumbir, mas não te privava de sentir. Ele meio que te tornava mais forte para a dor, o que era especialmente ao considerar as circunstâncias.
Tinha plena consciência de que poderia acabar com tudo ao botar um fim definitivo á sua vida a qualquer momento. Seria tão mais simples se entregar ao negrume que estava se tornando cada vez mais familiar para si. Imaginava que o que quer que fosse que o esperasse do outro lado, devia ser decididamente melhor do que o inferno no qual estivera confinado nos últimos tempos.
Mas jamais se permitiria morrer enquanto não tirasse Havana dali.
Algo que parecia cada vez mais impossível a cada segundo que se passava. Estava fraco, terrivelmente magro, e seus pensamentos lhe traíam com alucinações variadas e conflagradas de momentos que ele não sabia se estavam realmente acontecendo ou não. Não sabia se ainda era capaz de pensar com coesão, pois as certezas o abandonavam de forma gradativa, o deixando terrivelmente distante da razão. Caminhar em direção a lucidez lhe parecia o mesmo que tentar alcançar as estrelas. Era como se precisasse tirar esse peso das costas. Layan odiava falhar. Havia falhado com sua família, havia falhado com Eron, e não podia suportar falhar com Eve também. Era angustiante a forma com a qual sentia-se ligado com a ela, como se precisasse desesperadamente tirá-la do fogo.
Esticou uma perna sobre o chão sujo. A extensão das calças rasgadas pelas navalhas afiadas que Jade fizera serpentear por sua pele, quebrando os ossos em milhares de pedaços microscópicos na mesma ocasião. Layan se lembrava de ter gritado nessa vez, tentando se defender ao socar o rosto de Jade em um momento de distração do mesmo. Como recompensa, tivera seus dedos quebrados a baixo de um cilindro de ferro.
Havia sido um de seus dias mais lúcidos.
Jade não o permitia ficar fraco a ponto de morrer por falta de nutrientes no organismo. Ele preferia que ele estivesse o suficientemente forte para sentir com mais intensidade o prazer da dor corroendo cada parte mínima de seu corpo.
A dor.
Estava se tornando sua única válvula de escape quanto às alucinações. Eram os momentos mais intensos, nos quais ele realmente voltava a si. Ás vezes almejava pela visita de Jade. Ser torturado era melhor que ser vítima de seus pensamentos a cada torturante segundo de prisão.
— Está com fome? — a voz lhe surpreendeu vinda de algum lugar perto dele.
O aguçamento de seus sentidos parecia ter sumido. Layan ás vezes se pegava pensando que naquelas condições, jamais teria chance de vencer uma briga nem mesmo contra um terreno bêbado ou doente.
Seus olhos encontraram o que parecia ser uma silhueta familiar lhe encarando por trás das grades.
Mas não era Jade.
Layan não demorou muito tempo para reconhecer os olhos escuros como carvão lhe fitando por entre as barras enferrujadas.
— Zoe... — ele arfou, piscando para ter certeza que a garota não se passava de uma miragem, uma peça pregada por seu subconsciente.
— Eu trouxe uma maçã... — ela disse de repente, mostrando algo vermelho entre os dedos que lhe parecia ter os mesmos relevos da fruta. A questão, é que seus olhos estavam inchados, e ele nunca podia confiar no que achava ver — Eu lembro que você costumava gostar delas...
As palavras lhe atingiram com intensidade.
Layan não costumava ouvir muitas palavras passivas nos últimos dias.
— Porque está aqui, Zoe?
A garota baixou seus olhos, deixando que a cascata de cabelos grossos e escuros caíssem á frente de seu rosto. Algo parecia se remexer de forma inquieta por trás de suas íris escuras.
— Porque você precisa ser tão... idiota? Imbecil, burro?
— Obrigado. Faz tanto tempo que não ouço um elogio...
Os olhos de Zoe se voltaram ferozes para ele.
— Você está se matando, Delayan! E a troco de quê!?
— Você jamais entenderia...
Zoe o encarou, a curiosidade salpicando seu olhar enquanto se misturava á ansiedade. Ela queria ouvir alguma coisa. Mas Layan era incapaz de saber o que ela poderia querer dele.
— Então me explique.
Layan lambeu os lábios secos.
— As trevas te fizeram esquecer quem você é, Zoe. Lute contra elas, e você terá todas as respostas das quais precisa.
Zoe pensou sobre suas palavras, jogando a maça de uma mão para outra.
— Não existe como lutar contra isso.
— Você nunca vai saber se não tentar.
— Isso não muda o fato sobre você ser um idiota. — ela diz, — Aceite as propostas de Jade, e se liberte deste inferno, Layan. Você pode fazer isso.
Layan negou com um gesto fraco de cabeça.
— Não posso. Não enquanto não tirar Havana daqui.
Zoe balançou a cabeça em discordância.
— Você é de fato mais maluco do que eu achei que fosse. Sabe Layan, quando essa loucura começou, achei que você estivesse sendo corajoso. Mas agora percebo, que você simplesmente enlouqueceu. Não se morre por alguém. Muito menos se sofre. Pelo contrário. Ás vezes, é necessário matar para sobreviver...
Layan cruzou o cenho em sua direção.
— Ah, Zoe... o que aconteceu com você? — ele lamentou num fio bambo de voz — Você entende, não entende? Entende por que jamais conseguiu o que queria de Eron? Você não seria capaz de trazê-lo de volta do poço obscuro no qual ele estava confinado. Você só seria capaz de socá-lo ainda mais fundo. Isso não fica claro para você? Eu gostaria de fazê-la entender...
Por um segundo, os olhos de Zoe ficaram maiores, e ela pareceu tremer interiormente. Era como se ela estivesse se recordando de uma outra vida, como se lembranças suas que ela não sabia existir estivessem vindo à tona. Layan quase podia vê-la se debatendo entre ondas furiosas, tentando emergir sem sucesso enquanto a profundidade a arrastava para baixo. O sentimento se intensificou quando seus olhos escuros deslizaram para os dele, um pedido silencioso de ajuda se confundindo com uma promessa silenciosa de vingança perante suas palavras.
— Eu... eu não sei... voltar. Eu não entendo... — ela parecia brigar consigo mesma, por um momento, considerando as palavras dele.
Zoe se deixou cair a frente, se agarrando ás barras enquanto tentava alcançar algo dentro dos olhos de Layan.
— Eu lembro dele Layan... é a única recordação mais viva em minha mente. Em algum momento, meu coração parou de funcionar. Mas ele ainda responde ao chamado quando me lembro dele. Ele foi a única coisa que alguma vez já quis. Mas eu nunca fui o suficiente para ele. Você acha que existiriam possibilidades... — ela parou, como se considerasse mentalmente o que estava falando — ... de ele ainda me querer se eu... mudar?
Um fiapo luminoso de esperança fluiu do peito de Layan, e ele se agarrou á ele de forma desesperada, se esquecendo de todo o resto por apenas um segundo.
— Sim, Zoe! É óbvio que sim! — ele blefou, seu coração se contorcendo ao pensar em Eve.
“Me perdoe por isso, Eve. Mas estou fazendo por sua mãe. Você vai me entender”.
Os olhos de Zoe aumentaram mais nas órbitas. Layan tinha a sensação de que estendia sua mão para Zoe, na esperança de puxá-la de dentro da água.
— Eu... como?
“Por favor, isso tem que funcionar. Por favor...”.
— Me ajude a tirar Havana daqui.
Por um momento, tudo que ele teve foi o silêncio pesado sendo devolvido para ele. Suas esperanças começaram a ruir quando os olhos de Zoe foram diminuindo, como se ela estivesse voltando a si, e Layan sentiu como se sua mão escapasse da dele, deslizando úmida enquanto ela voltava a se afogar no lago escuro, sendo puxada para baixo novamente.
Ela piscou, levantando-se rapidamente e jogando a fruta vermelha para dentro, que rolou até perto de onde ele estava com um leve ruído oco.
— Coma sua maça, Layan. Você nunca esteve tão magro.
O desespero voltou a se fundir em seu peito, se estendendo como cordas vibrantes de nervosismo.
— Espere! Isso é um não??
Os olhos de Zoe ainda eram confusos, e com um gesto estranho, ela jogou os cabelos de lado, desviando o rosto em outra direção.
— Eu... eu volto em uma outra hora.
E ela saiu.
Eu não podia realmente acreditar que Eron estava me arrastando para a pista de dança. Não até estar exatamente no meio dela, um círculo ondulante pintado no chão em forma de arabescos crisólitos, de onde símbolos disfarçadamente se interligavam a outros desenhos de forma artística. A pista não estava tão cheia, e a música não me parecia tão ruim. Era um estilo clássico, vindo do piano de cauda posto e um dos cantos do grande salão, junto a outros instrumentos musicais que eu não me lembrava de conhecer.
— Não acredito que em face de tudo, você realmente queira dançar... — meu tom era perplexo quando ele se virou para mim, me puxando pela cintura ao mesmo tempo em que esticava outro braço, tomando minha mão em sua palma, e quando ele me puxou contra seu corpo quente, eu logo percebi o quanto ele queria dançar. — Oh, céus... você realmente é inacreditável.
Ele piscou, um sorriso amortecedor e torto cortando seu rosto perfeito.
— Eu sei. Inacreditável. As pessoas costumam dizer isso.
— Não deixe que esse seu ego enorme estrague esse momento. Este salão é realmente incrível.
— De acordo. Mas eu ainda não estou certo sobre você e esse vestido.
Meus olhos se puxaram para baixo.
— Qual o problema com esse vestido?
— Fora o fato de que ele te faz parecer um petisco ambulante? Droga. Qualquer roupa te faz parecer um petisco...
Vacilei um passo quando seu braço se apertou ao meu redor.
— Eu possivelmente ainda não entendi o real problema.
— Eu sou incrivelmente doente sobre petiscos.
Segurei o riso na garganta, seguindo seus passos a tempo de descobrir que Eron era um ótimo dançarino. Aliás, ele era bom em tudo. Maldito perfeccionismo.
— Seu manto é dourado. — eu afirmei, um pouco tonta sobre o problema da sua proximidade. Pelos bebês de toda a terra, por que ele tinha de estar sempre tão perto?
— Ele realmente é.
— Porque ele é o único?
Seus olhos caíram sobre mim como os raios do sol aquecendo minha pele.
— É a minha cor preferida.
Maldição. Arbo provavelmente saberia disso. E isso provavelmente explicaria muito sobre a história toda do petisco.
— Eu não sabia sobre isso.
Seus olhos navegaram mais uma vez por todo a extensão de meu corpo, parecendo avaliar mais uma vez o encaixe da peça em curvas que eu nem sabia que existiam. Ele sorriu, o ar malicioso subindo a seu olhar.
— Voltando a questão do vestido...
Eu corei.
— O que tem ele?
— É realmente maravilhoso... — ele disse, baixando o rosto até que sua boca estivesse próxima ao meu ouvido e sua respiração quente fizesse cócegas na pele de meu rosto, sussurrando mais alto que a música — ...mas tenho certeza de que ele ficaria ainda mais maravilhoso no chão do meu quarto.
Eu totalmente me afoguei, e um segundo depois, seu braço já não estava mais em minha cintura quando ele me rodopiou, me atraindo novamente para si no momento seguinte. O ar havia escapado de meus pulmões quando caí contra seu peito, e minhas mãos encontraram seus ombros.
As mãos de Eron subiram por minhas costas, encontrando outro decote e lhe permitindo contato direto com minhas costas.
Oh, Santa Merda.
Era o efeito Eron. Eu sentia minhas bochechas ferverem enquanto perseguia o oxigênio para dentro novamente.
Seu peito poderoso estremeceu com o riso, que atraiu para trás algumas mechas de meu cabelo.
— Eu sei que você está com as pernas bambas, Ev, mas se você permanecer caída em cima de mim por muito mais tempo sua tia pode acabar dando uma de ninja no meu traseiro antes que a música acabe.
Ele tinha um ponto.
Me recompus, pigarreando de forma pitoresca enquanto esticava a coluna, e voltava á dança.
— Não que eu não goste do fato de você estar completamente caída por mim... — ele voltou a piscar, incitando as engrenagens de meus pulmões a não funcionarem da forma correta.
— Eu apreciaria se você calasse sua boca suja.
Seus olhos caíram sobre meus lábios.
— Você gosta dessa boca suja.
O calor subiu por minhas pernas.
— Sem essa, não vai acontecer. Você não vai conseguir me tirar de órbita hoje.
Ele voltou á sorrir.
— Você está apostando isso comigo?
O riso floresceu antes mesmo que eu conseguisse segurá-lo.
— Ás vezes eu meio que te odeio.
Ele me atraiu para perto.
— Eu sei que sim.
Logo, meus olhos detectaram tia Peg num outro canto do salão. Ele estava sentada ao redor de uma mesa redonda com outras Falanges de cabelos brancos. Estava muito concentrada na conversa, mas eu tinha uma noção maluca de que minha tia sempre teria um olho disponível para focá-lo em mim.
Arbo não estava a vista, mas logo detectei outras pessoas que não esperava ver. Pelo menos, não dividindo o mesmo espaço e o mesmo copo de bebida. Dublemore estava enfiada um inacreditável vestido branco gelo, com os cabelos geralmente lisos e soltos presos num coque cintilante no alto da cabeça. Eu não me lembrava que ela fosse tão bonita. Á sua frente, Edra, mais parecendo-se com uma criança enfiada nos vestidos da mãe, segurava o copo que ambas dividiam. Edra era bonita a seu modo infantil, mas a forma como as duas mantinham os braços entrelaçados meio que não se parecia com algo que eu estivesse acostumada a ver vindo da garota de gelo. Dublemore não era exatamente o tipo de garota que deixava as pessoas se aproximarem demais, e sua aproximação repentina á Edra estava começando a abrir meus olhos.
— O quanto você sabe sobre aquelas duas? — eu perguntei, apontando meu queixo na direção onde elas estavam.
Eron estreitou os olhos contornados pelos cílios hiper escuros enquanto dava de ombros.
— Tanto quanto você. Elas devem estar em algum encontro sexy ou algo assim.
Mirei seus olhos novamente.
— Você realmente não disse isso.
— Como assim? Não é nada demais. — ele nos atraiu para outro lado da pista — Afinal, o amor é lindo.
Estreitei meus olhos em sua direção.
— Sério? Você acha que elas estão se vendo dessa forma?
— Que outra forma você acha que a Abominável Garota das Neves consentiria que alguém se aproximasse?
Rolei os olhos.
— Você é terrível.
— E você está obcecada por mim. Quando você vai finalmente admitir?
— Isso não tem muito a ver com o assunto.
Ele me apertou mais contra si. Mais do que seria seguro á um nível Tia Peg.
— Você está fugindo do assunto.
Eu ri mais uma vez. Esse Eron era completamente diferente do Eron que conheci antes. Do Eron sombrio que havia chegado sem mais nem menos na Academia George Lemaître, explodindo todo o meu mundo de alguma forma irreparável. Ele ainda era obscuro de algumas formas, mas eu diria que aqueles eram dias melhores. Não havia muita coisa que eu sabia sobre ele, mas sabia que ele havia ficado adormecido por muitos anos de sua vida, e que eu havia sido a pessoa que ele permitira ver em sua forma verdadeira como ele era de verdade.
Foi pensando nisso, que meu coração se esmagou contra as costelas, e as próximas palavras saíram meio de supetão.
— Como foi... estar adormecido?
Por um momento, seus olhos se apertaram, e seu aperto também se tornou mais firme ao seu redor. Sua mandíbula travou, e por um momento, me perguntei se eu não havia feito a pergunta errada no momento errado. Eron era meio que como uma bomba ativada. Nunca havia como saber o momento no qual ele explodiria. Simplesmente acontecia e ... bum!
— Era como estar num sonho sem sonhos. — ele finalmente disse, como se analisasse bem as palavras pela primeira vez na noite. — Não haviam... sentimentos. Ou pensamentos. Ou a noção de tempo. Era meio como... não existir. É. Eu acho que se assemelha a isso. Eu não existi por um tempo. E quando acordei, tive completa consciência de tudo. De tudo que não vivi.
Por um momento, suas palavras me afetaram de maneira pessoal.
— Isso soa horrível.
Ele sorriu torto novamente, seus olhos verde-dourados piscando brilhantes. Eles haviam adquirido aquela cor ao longo do tempo. Eu lembro que quando o conheci, seus olhos eram apenas verdes. Agora, um anel dourado circundava suas íris, e machas da mesma cor se expandiam de suas pupilas, se misturando ao verde e criando uma cor única.
— Foi como eu disse. Você ainda não sabe o que são coisas horríveis. Nosso mundo não é exatamente um conto de fadas, e eu odeio que você tenha sido arrastada para ele.
— Não era como se eu tivesse muitas escolhas. Eu sei muito bem que contos de fadas nem sempre têm finais felizes também... — eu disse, me afastando e voltando para ele em meio a dança suave — Uma vez você me disse que não era nenhum Príncipe Encantado.
Seus olhos escureceram alguns graus.
— O que não foi uma mentira.
— O que eu quis dizer, é que ultimamente você tem sido melhor que um. — eu sorri, presa á ele vendo o sorriso voltar ao seu rosto, mesmo que uma sombra tensa contornasse o calor em seus olhos — Eu só... me sinto mal com isso. Eu estou sorrindo e minha mãe está... passando por sabe-se lá o quê.
Lembrar de Havana era como ter sal grosso sendo passado nas minhas mais sangrentas feridas. Eu ainda não tinha nenhuma notícia de minha mãe. Ou Layan. E isso me deixava um pouco mais louca a cada dia.
O sorriso de Eron sumiu.
— Eu sei. Mas é apenas uma questão de tempo até que Jade se mostre e queira negociar — o músculo em sua mandíbula se travou novamente — E nesse dia, estaremos prontos. Vamos trazer sua mãe de volta. Eu prometo.
— Mas... eu não posso esperar mais. Estou ficando maluca com isso. Se algo acontecer á Havana, eu nunca vou me perdoar.
Eron me puxou para fora da pista de dança, em um canto mais recluso do salão. Havia um corredor que eu não havia visto imerso pelas sombras e protegido da luz que não chegavam a ele, e ele me atraiu para lá. Então, ele pousou um dedo em meu queixo, me fazendo olhar para ele.
— Eu posso ver. Sinto muito. Talvez... possamos fazer alguma coisa sobre isso. Os poderes de Ílinea estão de volta. Ela pode tentar prever alguma coisa. Para termos uma base em que nos firmar.
— Você acha que isso pode realmente funcionar?
Ele tomou uma de minhas mãos, e a levou até os lábios, a beijando mansamente.
— Faremos o que for necessário, funcione ou não. Podemos fazer o que for preciso amanhã, o que você acha?
As lágrimas quase transbordaram por meus olhos nesse momento. Ele iria me ajudar.
— Amanhã minha tia planeja se mudar para a Mansão Hatthwey. É provável que hoje, eu já durma lá. Fiquei sabendo através de Ilínea que está tudo pronto.
O sorriso matreiro se abriu em seu rosto novamente.
— Quer dizer que agora não terá nenhum Pinnbolrg ao seu redor e que você vai ter um quarto só seu?
Soquei seu peito.
— Minha tia ainda vai estar lá.
O sorriso cresceu.
— Bem, suponhamos que ela não vá poder estar lá em todos os momentos. Sua tia é uma pessoa extremamente ocupada. Não é como se ela pudesse montar guarda na porta ou na janela do seu quarto o tempo todo.
O calor familiar subiu por minha espinha quando a imagem se implantou em meu cérebro.
— Sim, eu vou ter meu próprio quarto.
— Isso soa como algo agradável de se ouvir.
Sem aviso prévio, ele me puxou contra si, me apertando contra ele enquanto uma de suas mãos subia por meu pescoço, seus dedos se enrolando em meus cabelos.
— Eu apareço por lá amanhã, emunah... e nós podemos... — meus olhos devem ter entregue algo, por que ele soltou um leve riso tenso enquanto meus pés deixavam o chão, e eu completamente me grudava nele, o peso de minha respiração no mesmo nível que a respiração de Eron — Eu ia dizer nós podemos começar pelas investigações sobre qual o passo certo á dar, mas nós sempre podemos negociar o tempo livre.
Ainda arfando, a sensação familiar de minhas costas contra uma parede chegou rápida, e eu não pude fazer nenhum comentário sarcástico nesse momento, porque estava completamente imersa em seu olhar completamente dourado enquanto espalmava minhas mãos sobre seu peito nu.
Fechei os olhos, roçando meu rosto no dele, sentindo a textura áspera da barba e mordendo o lábio ao cravar meus dedos em seus ombros.
Eron rosnou, puxando meus quadris contra ele e direcionando meu rosto em direção á sua boca.
Mas então, como se estivesse sentindo dor, ele se inclinou um pouco, o ar escapando de seus pulmões e os olhos se abrindo de repente, ao mesmo tempo em que uma carreira quase translúcida de fogo pareceu evaporar por suas íris. Por um momento, foi meio assustador e bizarro, o que me fez afrouxar o aperto sobre ele enquanto Eron piscava com um leve meneio de cabeça, como se estivesse tentando se lembrar de algo.
— Eron? O que foi?
Ele se afastou um passo, me permitindo pousar no chão novamente enquanto firmava suas mãos na parede atrás de mim.
— Eu... me desculpe. — ele disse de repente, sugando o ar com força para dentro. — É que... ás vezes é como se Zórem ainda estivesse fritando meus miolos, me queimando vivo. Acho que ainda não consegui esquecer totalmente disso.
Lembranças de seu grito agoniado se estamparam em meu cérebro, e todo o momento se foi.
Fechei os olhos, forçando a tornar minha respiração ofegante saudável outra vez e tentando expulsar de minha mente as cenas da noite mais horrível de minha vida, onde fui obrigada á testemunhar Eron sendo torturado da forma como eu deveria ter sido.
— Eu sinto muito. Se não fosse por minha culpa, nada disso teria acontecido.
Ele pegou meu queixo rapidamente.
— Nunca mais diga isso. Nada disso foi culpa sua.
Assenti vagarosamente, e fiquemos ali, engolindo um ao outro na escuridão e respirando o ar um do outro enquanto algo se passava entre nós dois. Eron me bebendo com os olhos enquanto nossos corações batiam estranhamente no mesmo ritmo.
E os gritos, foram as primeiras coisas que se fizeram ouvir.
Arregalei meus olhos para Eron, e logo em seguida, ele me puxou para o salão novamente, a tempo de ouvimos os gritos que vinham de Falanges descendo rápido as escadarias que vinham da superfície.
— Estão atacando os portões do Sul!!!
Mais uma vez, o ar escapou de meus pulmões, mais o menos no instante em que Arbo chegava assustada até nós, segurando as barras do vestido enquanto se punha ao meu lado.
— Arbo! Leve-a para casa! — Eron disse á Arbo, claramente se referindo á mim, se movendo em minha direção no próximo instante — Nós nos vemos amanhã, emunah.
Mas eu peguei seu pulso antes que ele pudesse ir.
— Espere! Eu vou com você!
Ele se voltou novamente.
— Isso não é uma opção em um milhão de anos! — ele desceu seus olhos quentes por mim — Fora que você seria uma péssima distração.
Pela deusa de pijama e óculos de sol.
Ele não dava um tempo nem nesses momentos. Não era á toa que Eron era um cataclista. E totalmente a única pessoa capaz de me deixar toda quente em questão de nano segundos.
Ele se arqueou, pressionando seus lábios de forma rápida contra os meus, e voltando-se para cima novamente, me deixando tonta instantaneamente e deixando que minha imaginação se encarregasse de terminar o efeito final de seus lábios contra os meus.
— Amanhã eu vou exigir muito mais que isso. Tenha uma boa noite.
E ele já não estava mais ali. Tudo que eu fiz, foi ficar olhando abobalhada para a confusão que se gerou enquanto tentava entender a situação toda.
— Isso é... injusto! Porque ele tem de estar lá???
Arbo deu de ombros.
— Ele é a única Falange do Fogo. Ele simplesmente tem de estar lá... — ela cruzou seus braços quando me voltei estupefata para ela, erguendo uma sobrancelha vermelha enquanto detectava meu decote levemente torto, me fazendo corar — Emunah, é? Isso não soa como algo que um não-namorado fale, seja lá que diabos isso signifique.
OS RAIOS SOLARES PENETRARAM ATRAVÉS DE MINHAS pálpebras, pontuando a claridade para dentro de meus olhos.Os seixos oblíquos jaziam um calor sólido sobre meus braços descobertos, abraçados sobre um travesseiro da mesma forma que eu costumava abraçar um urso de pelúcia quando pequena. Piscando, me deparei com a cena reluzente pintada de laranja amarelado enquanto me espreguiçava na longa cama de mogno.Eu estava sozinha em casa.Era estranho e bizarro. Mas eu sabia.Depois que alguns de meus sentidos de Falange foram despertos, me deparei com esse sensor estranho que entregava a presença distinta de seres da mesma raça próximos a mim. Cada um tinha uma presença estranha de fazer sentir, as sensações jaziam como palavras através das mudanças de
JADE STELLAR ESTAVA EM MIRIAD.Yohanna Winchester estava em Miriad.E eu não sabia dizer qual dos dois era pior.Quem iria subitamente aparecer agora? A moça da propaganda de detergente do canal 9? O prefeito da Disneylândia? Um terrorista famoso? Não que Hanna Winchester não fosse meio terrorista quando ela queria. Ou quando não queria. Ou em todos os momentos em que respirasse.Depois de concluir que eu realmente ainda não havia tido nenhuma espécie de morte cerebral, meu primeiro impulso foi fechar a porta com força e torcer mentalmente que eu estivesse tendo alucinações. Até a possibilidade de estar ficando maluca era completamente mais aceitável do que a veracidade da imagem de Hanna Winchester parada em minha varanda. E de Herman servindo como seu guia.— Eveli
ESTAVA EM CIMA DA MESINHA DE CENTRO.A Biografia de Evangeline finalmente estava ali, em cima da mesinha de centro a minha frente, o objeto de meu desejo me observando inanimado de cima do vidro transparente da mesinha, exatamente abaixo de meu nariz, e tudo que eu conseguia fazer era olhar para ela com todo o corpo paralisado. Eu sentia como se estivesse tentando respirar em baixo da água, a tortura de imaginar o que eu poderia encontrar entre aquelas páginas era tão palpável que em me sentia escorregando por um enorme desfiladeiro, sem ter nada ao meu redor em que me firmar.Quando eu abrisse aquela biografia, as coisas iriam desandar, para mal ou para bem, e não havia muito que eu achasse que pudesse fazer sobre isso. Crescer tem essa coisa estranha de encarar o problema de frente, sejam quais forem as consequências. E eu descobrira tarde demais q
SENTADA SERENAMENTE NAQUELE ESTOFADO, tia Peg se parecia apenas com uma pessoa normal e amargurada enquanto encarava o chão, e não a anciã misteriosa que sabia muito mais do que o pouco que sempre ousava revelar. Sua postura me corroía, me sangrava, exatamente por ter plena consciência de que não havia muito que eu pudesse fazer para inverter a situação. Ver minha tia ruindo um pouco mais a cada dia era terrível, e exigir respostas parecia ser ainda pior, mas parecia não haver nada que fizesse mais sentido naquele momento.― A Grande Roda parece estar brincando com nosso mundo, nos aprisionando numa maré de repetições tortuosas que se repetem de erro após erro... e eu... eu não sei como parar isso! Eu não sei! ― ela enfiou o rosto entre as mãos, e meu senso primitivo de sanidade considerou as pr
O CAMINHO ERA TORTUOSO E CHEIO DE PEDREGULHOS soltos que me faziam tropeçar a cada passo dado, me fazendo perguntar interiormente se havia sido uma boa ideia sair sozinha àquelas horas enquanto tentava seguir o ponto branco a minha frente, que abria as asas de momento em momento e exclamava sons estranhos que eu achava impossíveis de serem reproduzidos.Herman às vezes voltava o longo pescoço para trás, como se quisesse ter certeza de que eu ainda o estava seguindo, e eu podia jurar que conseguia captar um leve vislumbre de satisfação nos olhos amarelados dele.― Não me olhe assim! ― eu tiritei irritada, tentando encontrar um ângulo aceitável com a sola das botas enquanto firmava os pés na trilha escolhida pelo mamífero cheio de características exoestranhas ― Eu ainda sinto vontade de estrangular voc
― Lizzie e Izzie! Parem! Parem agora mesmo! Isso é uma ordem! ― o grito de Arbo cortava o campo de uma ponta a outra enquanto fingia não estar tentando perseguir suas irmãs sem sucesso. ― Eu estou avisando. Eu realmente estou começando a me enfurecer! ― Arbo tirintou, um segundo antes de ser jogada por cima de uma mureta quando uma das gêmeas lançou as duas mãos em sua direção.Elizabeth e Isabelle riram histericamente, recomeçando a correr e continuando a carregar um sutiã de Arbo para longe.Um sutiã revelador estampado com ursinhos dançarinos.― Eveline e Yohanna! Prestem atenção! ― Arena ralhou, chamando novamente nossa atenção com a ajuda de um taco de madeira, entalhado nas pontas com o mesmo símbolo que eu ainda não havia conseguido
EU QUERIA FALAR COM ELE.Eu não queria falar com ele.Eu considerava seriamente essas duas opções enquanto rabiscava palavras aleatórias em meu caderno de anotações enquanto achava que Arena não estava percebendo. A sala não era branca, como uma sala de uma escola normal. Ao contrário, as paredes em tons de pastel e âmbar eram tatuadas com o que pareciam ser holografias de símbolos, imagens de guerras, estatuetas egípcias, frases familiares extraídas de tratados antigos e várias outras menções que eu nem sempre conseguia entender. E as holografias mudavam de minutos em minutos. A porta de madeira escura estava aberta, o silêncio significante afirmava que a Academia estava completamente vazia.Ao meu lado, Hanna parecia realmente atenta â explicação,
P A R T E II _ L Á G R I M A S D E S A N G U E“As suas palavras, trago-as escritas no coração com as lágrimas de sangue”._Almeida Garret, in MOISÉS, MassaudEU ERA A CURA.Raios! Como não havia visto isso antes? Uma maldita cura! O único real motivo de ter atraído Jade.E Eron.Por um momento, tudo fez sentido. Seria este o motivo sólido por Eron ainda não ser meu namorado? Ou por mais exatamente, ele nunca ter me pedido em namoro? Apenas porque queria se curar e estava experimentando pequenas seções diárias para seu mal das Trevas crônico? Provando pequenas doses que pusessem minha evidente utilidade em teste? Uma maldita experiê