Capítulo 3

Para Byron, tudo foi muito rápido. E como muitas coisas nessa história não sabemos, deixo essa questão de lado pois sua importância não transparece grandiosidade. O que posso contar é que ele seguiu a ambulância e chegou no hospital um pouco atrasado. Byron apenas lembra-se de, de repente, estar na sala onde aconteceria o parto. Muito provável que ele tenha passado pela recepcionista e dito que era o pai da criança que estava prestes a nascer. Percebeu que estava nessa situação quando os olhos de Elizabeth encontraram os seus. A reação que Byron viu nos olhos dela foi de profunda decepção. Ou será que era surpresa? Ele jamais se encontraria em uma situação de avaliar os sentimentos dela novamente. Durante o momento onde ambos se olhavam, os médicos estavam agitados atrás, garantindo que tudo ocorresse bem.

A parteira que estava no quarto conversou de maneira carinhosa com Byron e Elizabeth, tratando como se fossem um casal, o que não era espantoso. Byron Mansfield havia dito mesmo que era o pai da criança, senão não estaria ali. E nos momentos seguintes, Elizabeth não disse nada além de chamá-lo e apertar fortemente sua mão durante os longos minutos que se passaram. O toque dela despertou um sentimento de segurança que havia tempos, Byron não sentia. E de repente, ele se permitiu viver aquele momento como se fosse dedicado à ele: como se fosse a sua mulher e o seu filho. Ele tinha consciência de que isso era bem pior do que uma falsa esperança, mas não teve forças para lutar contra esse pensamento que distorceu sua realidade durante aquele tempo.

Aquilo pareceu apagar tudo à sua volta. Passara rápido demais para ele, o parto já havia sido realizado e tão logo Elizabeth segurava a linda menina em seus braços. Sim, era uma menina! E Byron sentiu uma alegria imensa: por um momento se viu pensando nas características da menina quando crescesse e percebeu que a imagem que tinha dela era com suas características. Afastou com pavor esse pensamento de sua mente e voltou à realidade cinzenta. Seu sorriso sumiu na hora e se alguém estivesse observando, diriam que esse momento marcou o mais triste dos pecados e o mais obscuro futuro. Seu coração amargurou-se novamente e ele odiou Elizabeth e sua filha. Logo, sua consciência alertou: seu lugar não era ali. Sentiu-se agitado e sua mente deu voltas para tentar decidir como sair daquela situação. Olhou para Elizabeth e ela ainda segurava a filha: chorava e sorria ao mesmo tempo, uma explosão de sentimentos bons. Quando a mesma notou o olhar de Byron, sorriu para ele.

Pareceu o fim.

Aquele sorriso era tudo o que ele precisava para sua vida. Seu mais hediondo tormento poderia sim, ser curado. E estava naqueles lábios a razão de tudo, do céu e do inferno. A ira crescente explodiu em seu peito e nesse instante foi como se nunca estivesse ali: ele a amava. Byron a observou anestesiado durante um tempo. E novamente foi trazido bruscamente à realidade: precisava sair dali o mais rápido possível.

Byron suspirou e virou as costas prontamente. Caminhou até a porta e ignorou os olhares confusos de quem estava no quarto.

"Não vá". Uma voz suave, calma e suplicante chegou aos ouvidos de Byron. A delicadeza pareceu enfiar uma adaga em seu peito e ele recusou-se à olhar para trás. Byron sabia que Elizabeth compreendera o quanto ele ficara abalado com todo este acontecimento. E ele odiou a compreensão dela.

Saiu do quarto ouvindo Elizabeth dar explicações às médicas que ali estavam. Quase que imediatamente após sair do quarto, Byron viu um homem na sala de espera. Soube logo que era aquele que havia roubado toda a sua felicidade. Lágrimas surgiram em seus olhos e ele observou com melancolia o quanto o companheiro de Elizabeth não parecia estar aflito. Na verdade, esbanjava a maior tranquilidade que ele já vira. Pensou em largar a racionalidade e ética, mas deteve-se. Olhou profundamente em seus olhos e viu o mais obscuro ódio.

Byron saiu do prédio pensando o quanto a sua mente o enganava: o companheiro de Elizabeth não estava com ódio porque Byron não representava uma rivalidade.

Por que ele estava se torturando tanto?

Não havia resposta digna à essa pergunta.

♧♧♧

Byron chegou em casa com os pensamentos aflitos, transbordando dor. E ele deixou transbordar. Tratou de pegar uma tela, conjunto de tintas à óleo e produziu. Produziu a dor e o sofrimento. Cada traço, cada pincelada estava doente de amor, trazia uma marca inconfundível da Tragédia.

A tela que anteriormente estava branca e vazia, preencheu com as mais variadas cores. Cada lágrima formava um ritmo na pintura e de início, Byron acreditou que logo desistiria, não acreditava que nada de belo poderia sair de todo aquele sofrimento. Mas ele não desistiu. Lágrimas escorriam em seu rosto e a tinta escorria em sua tela, ambas em uma surpreendente sintonia. A arte, nada mais representou que seu sofrimento.

Byron passou horas rabiscando um esboço de sua alma e não sentiu o tempo passar. A fúria estava sendo depositada naquela pintura e por um momento aliviou, como minutos depois de um desabafo. O tempo foi passando e ele se sentiu cansado. Uma espécie de abulia tomou conta de seu corpo e ele só pensava em desabar em sua cama e nunca mais ter que encarar a vida novamente. Largou o pincel e fez questão de não olhar o quadro. Queria que todo seu sofrimento fosse exorcizado na pintura, mas tão logo percebeu que não acontecera. A dor estava ali, latente e mortal.

Mansfield caminhou até seu quarto e supriu-se com uma dose generosa de whisky. Caiu na cama como se ela fosse a solução para tudo e ficou lá. Cansado, amargurado e sem esperanças. Questionou o motivo de ter pintado: não adiantaria de nada, no máximo renderia algum dinheiro para ele manter seu vício. Ao pensar nisso, lembrou do concurso que fora convocado. Sorriu sutilmente e pensou não estar tão perdido assim. Adormeceu sob efeito do álcool e do cansaço, mas dessa vez com um ponto de esperança, um mínimo motivo (mas um motivo), para levantar amanhã.

♤♤♤

Acordou seis horas em ponto, com a cabeça latejando de dor. Quase imediatamente lembrou do compromisso e pesquisou em sua agenda. O concurso era para daqui dois dias. Tratou de levantar, tomou um banho quente e relaxante. Logo em seguida tomou uma aspirina e encheu um copo de Martini. Esses seus hábitos estavam fazendo com que ele perdesse peso muito rápido e de forma preocupante. Mas ele não percebia isso. Talvez notasse um pouco dos seus ossos cada vez mais proeminentes, mas nunca associara à falta de cuidado na sua alimentação. Seguiu então, sua rotina normal.

Parou na frente do quadro que começara. Havia tons de azul, roxo e vermelho vinho. Parecia uma catacumba com dimensões estéticamente perfeitas. O cenário era muito escuro e o preto era a cor principal. Mas havia um detalhe que o fez aproximar-se ainda mais para observar. Havia um suave tom de amarelo na parte superior direita, como se representasse uma luz. Seria a esperança?

Juntou os pincéis e as tintas e retomou o trabalho. Queria finalizá-lo ainda hoje. E foi assim que passou seu dia, tentando exorcizar a dor e surpreendendo-se com sua alta concentração e vontade de realizar o quadro.

No meio da tarde notou o quanto estava bêbado e percebeu que excedera demais o tanto que planejara beber. Deitou-se em sua cama exausto e riu com amargura: será essa esperança fruto da embriaguez? Adormeceu com uma dor ardente em seu peito e clamou para que não estivesse tão perdido quanto acreditava.

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