Futilidade. Era uma coisa que não se encontrava nele. O que, para a época moderna, essa condição é digna apenas de aberrações. E o que mais havia de especial em sua personalidade, era a poesia que encontrava para cada momento. Não era escrita, de forma alguma. Era seu olhar, seu tom de voz, seus gestos. E até mesmo suas dores. Futilidade, realmente era uma coisa que passava longe de sua existência. Mas o que mais posso dizer, se infelizmente esse livro está aqui para contar o lado trágico dessa poesia? Se fosse diferente, não haveria história para contar. E como em todas as histórias, sempre existe um ponto de partida, um começo onde tudo que relatamos a seguir passa a existir. Pois bem, era uma madrugada fria de outono, aproximadamente três horas da manhã. Não é de estranhar que Byron Mansfield tenha ficado assustado ao acordar com uma voz feminina que fungava e dizia palavras indistintas no banheiro. Sua mulher, Elizabeth Mansfield estava chorando. Não era muito frequente que esses episódios aconteciam, na verdade bem raras eram as vezes que Byron via sua amada abatida. Por isso, levantando-se rapidamente de sua cama, correu até o banheiro, parou ao lado da porta fechada, por respeito à ela.
É difícil retratar esse momento e os sentimentos de Byron, pois quando tomou a decisão de perguntar o que estava acontecendo com ela e o que a deixava aflita, sua voz falhou. Falhou como se soubesse que depois dessa madrugada, sua vida mudaria para sempre. Mas ele não sabia, por que teria de temer alguma coisa em relação ao seu destino, se tudo caminhava como um belo esboço da felicidade para eles?
— Minha querida — perguntou ele, na segunda tentativa de fazer a sua voz não falhar mais — o que aflige esse teu coração?
Esperou por respostas. Porém a única resposta que chegou até Byron foi o choro de Elizabeth. Ele escutou um barulho vindo de lá de dentro e tão logo a porta foi aberta. O rosto dela estava banhado em lágrimas, seus olhos estavam com olheiras profundas, como se estivesse vivendo esses sofrimentos meses atrás. Estava parecendo frágil e inicialmente Byron ficou sem reação nenhuma. Não teve coragem de perguntar nada, pois sentia-se um homem mau. Mau por não ter percebido que ela estava neste tormento, pois pelo estado que sua esposa encontrava-se agora na frente dele, dava a resposta que ela estava sofrendo em silêncio há algum tempo. Quando finalmente tomou uma decisão, não foi dita, mas foi um gesto. Seus braços envolveram a esposa numa tentativa de abraçá-la. Mas apenas ficou como tentativa, pois logo Elizabeth desvencilhou-se, murmurando um "não". Agora, mais do que nunca, ele ficou sem reação. Olhou nos olhos da amada, procurando por respostas, mas não encontrou. A expressão em sua face estava irreconhecível e pela primeira vez Byron temeu pelo pior.
— Não posso continuar a viver nessa casa. — Disse por fim Elizabeth. — as paredes parecem zombar de mim, a atmosfera grita que sou pecadora. Byron, não quero o seu perdão, não quero uma palavra sua. Deus tomará a providência de castigar-me eternamente...
— O que está havendo? — Interrompeu ele, a angústia tomando conta do seu ser. Alguma coisa terrível havia acontecido, disso ele sabia. Mas o discurso que Elizabeth estava tentando completar não fazia sentido em sua mente.
— Eu poderia mentir, sim eu poderia ter tomado essa decisão. — Continuou ela, agora com a voz mais firme do que outrora — mas se assim o fizesse, minha consciência mais do que nunca me odiaria. Byron, eu estou grávida.
A vontade que ele teve após essa fala, foi de questionar. Mas não o fez pois a euforia foi maior e tão logo substituída pela angústia. Ela estava chorando porque estava grávida e havia associado essa situação com a palavra pecado. Ele pensou, respirou pausadamente, mas não chegou a quaisquer conclusões pois sua mente impunha a negação. Optou por olhar nos olhos da amada e se arrependeu amargamente: era o que o seu coração estava sentindo e a mente queria negar.
— Não há motivos de tristeza, meu bem... — A voz de Byron não era a mesma. Era um esboço de receio, de desespero.
— Byron... — Elizabeth enxugou as lágrimas mas não pôde olhá-lo. — O filho não é seu.
A prontidão que tudo, de repente, explodiu no mundo de Byron foi desumana. Naquele momento haviam destroços de sua alma e sentimentos, não obstante, a vergonha fazia-se presente. Uma forte corrente de adrenalina passou pelo corpo de Byron e foi até suas mãos que, sem ao menos lembrar que encontrava-se em frente à sua amada mulher, um soco certeiro atingiu o rosto de Elizabeth e fez seus lábios sangrarem. Depois desses milésimos segundos de total irracionalidade, ambos passaram à fazer acusações. Acusações estas que não cabe-me dizer aqui, pois foram sem nexo. A raiva deturpou os sentimentos e apagou memórias. Haviam dois estranhos, quebrados por dentro, cuspindo palavras de ódio contra o outro.
O que mais há de dizer?
Naquela madrugada, Byron ameaçou Elizabeth de morte. Não seria tão relevante pois o ódio dominava sua parte racional, mas sinto que estarei em dívida caso não deixe transparente esse detalhe. E após essa grotesca ameaça Elizabeth é deixada sozinha, chorando e lamentando-se pelos seus erros. Byron Mansfield caminhou durante longas horas em uma pérfida escuridão que tirou-lhe a alma. Sua mente parecia embriagada pois voltou a consciência quando já estava de volta à antiga casa de seus pais e não lembrava como havia parado ali. Continuava a mesma: sem presença nenhuma, mas convidativa. Faziam anos que a casa encontrava-se desabitada pois sua mãe mudara um tempo atrás. E como nunca fora de grande importância, Byron nunca visitara essa casa depois da mudança de seus progenitores.
Ela estava quase toda vazia, porém havia uma TV, um rádio velho e lindas decorações de vidro. Haviam alguns pratos e talheres na cozinha também. E em um piscar de olhos, todos os objetos estavam no chão, quebrados, estilhaçados. Byron encontrava-se em uma fúria imensurável e esquecera que era de madrugada e haviam vizinhos. Foi se dar conta quando uma voz aguda gritou com ele perto da sua porta e um dos seus maiores erros foi responder. Era Emily Gutterberg, uma antiga amiga de sua mãe. Sucedeu-se então uma guerra com a mulher que não esforçou-se para continuar ética e abriu prontamente a porta da casa antiga dos pais de Byron.
Caro leitor, é nessa cena que falho contigo. Dei ênfase na fúria de Byron, na sua devastação mental e em seu perigoso temperamento durante essas poucas palavras que vos escrevo. Falho agora pois nem mesmo Byron se lembra. Ele escondeu da memória que nem mesmo a suave brisa da madrugada acordou para presenciar o horrendo acontecimento.
Byron Mansfield matou Gutterberg à facadas. Ato este, tão cruel e irracional, que o número de facas excedeu quinze. O vermelho já manchava o chão e sua consciência voltou quando o corpo já estava enterrado no quintal dos fundos.
Novamente, vou salientar que vou pecar nos detalhes. Mas você leitor, já sabe: o plano amador de Byron não foi planejado, portanto, haveria, mais para frente, lacunas que o incriminaria.
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Depois dessa terrível tragédia, Byron Mansfield mudou-se de país. Passou a morar na Inglaterra, largou seu trabalho como pintor em Cleveland, Ohio e passou a contribuir para a arte em Londres. Ele não sentiu arrependimento, era orgulhoso e confiante demais. Aceitava e se perdoava, acreditava que havia cometido um erro, porém a culpa era de Elizabeth. Para Mansfield, Elizabeth havia feito com que ele matasse a senhora Gutterberg, portanto, sua consciência não causou-lhe insônia, apenas uma leve dor de cabeça que tão logo foi substituída com a maturidade de sua fama em Londres. Seu reconhecimento foi tanto, que fez fortuna lá durante quatro meses. Criou uma obra-metáfora para expressar a dor do amor. O quadro onde fora pintado à óleo uma rosa sangrando representava o sentimento puro que fora amaldiçoado e consequentemente condenado. Essa pintura levou Mansfield às grandes galerias. Viveu assim, até sentir-se profundamente vazio. Esse buraco em sua alma o dinheiro e o álcool jamais fora capaz de preencher. E foi esse mesmo sentimento que o fez voltar para Cleveland e tentar uma vida confortável lá.
Porém Byron era ingênuo. A vida já havia provado à ele que era cruel e ele esquecera disso. Quando finalmente se estabilizou em sua casa na Seventeen Six Street, uma rua com um conjunto de casas nobres, passou a viver tranquilamente durante três meses. Essa paz não durou muito. Descobriu mais tarde, por obra de alguma maldição ou mera coincidência, que Elizabeth havia ocupado a última casa da rua. E seu tormento voltou, pois ela estava sempre acompanhada e com a estrutura física diferente: carregava o pecado dentro de si.
Após ter conhecimento disso, sua vida virou uma tragédia. Ele passava o maior tempo que possuía na rua, observando o movimento do casal que arruinara sua vida. Logo, suas telas e pinturas foram esquecidas e consequentemente, o dinheiro que delas provinham.
Byron não conseguia acreditar que em menos de um ano ele havia provado tamanha balbúrdia e sofrimento. E como está relatado no início, toda história tem um marco inicial para o desenrolar. O marco inicial deste livro é este mostrado: a tragédia sem máscaras O sofrimento amargo arrancado das vísceras do mundo.
Cleveland Museum of Art é considerado um dos mais prestigiados museus dos Estados Unidos. Com um total de 45,000 mil peças de arte de todo o mundo, não é à toa que atraia mais de meio milhão de visitantes por ano. Fundado em 1913, junto com o Wade Park o preço de construção foi de 1,25 milhões de dólares. O nome do Park serve como uma homenagem a Joptha H. Wade cujo princípio era: "Para o benefício de toda a população sempre".Parte das galerias é exposta no próprio Wade Park, dentre ele pode-se destacar Chester Beach's Fountain of the waters (1927); Monumento de Tadeusz Kościuszko, American Revolutionary War.Vale destacar também que o departamento possui Arte Chinesa, Arte moderna da Europa, Arte africana, Medieval, contemporânea, fotografia, têxteis, gravuras, esculturas, desenhos e muito mais.✺✺✺Apesar da co
Para Byron, tudo foi muito rápido. E como muitas coisas nessa história não sabemos, deixo essa questão de lado pois sua importância não transparece grandiosidade. O que posso contar é que ele seguiu a ambulância e chegou no hospital um pouco atrasado. Byron apenas lembra-se de, de repente, estar na sala onde aconteceria o parto. Muito provável que ele tenha passado pela recepcionista e dito que era o pai da criança que estava prestes a nascer. Percebeu que estava nessa situação quando os olhos de Elizabeth encontraram os seus. A reação que Byron viu nos olhos dela foi de profunda decepção. Ou será que era surpresa? Ele jamais se encontraria em uma situação de avaliar os sentimentos dela novamente. Durante o momento onde ambos se olhavam, os médicos estavam agitados atrás, garantindo que tudo ocorresse bem.A parteira que estava no qu
Durante o dia seguinte, Byron viveu um crescente otimismo. Conseguira terminar sua mais nova obra de arte e havia tido um incentivo por parte dos organizadores do concurso. Lembraram os pormenores e desejarem-lhe sorte. E mesmo que nos dias anteriores, ou meses, ele estivesse destruído, não houve o que tirasse a sua certeza: iria ganhar o concurso.No dia que antecedeu o esperado evento, Byron manteve-se sóbrio. Foi difícil, mas não impossível. Talvez porque ele passou a maior parte do tempo pensando em discursos, fantasiando prêmios e escolhendo a roupa. Saiu de última hora e comprou peças que faziam jus ao seu conhecido estilo: terno preto com gravata borboleta de vermelho sangue e provavelmente faria uma maquiagem que contornava grande parte de seus olhos. Essa sua aparência era um dos motivos por ser tão falado e vítima de curiosos.Durante a noite ele dormiu rapidamente, apesar da an
ELIZABETH15/01/1985 - segunda -feira (1 ano depois) No tocante ao noticiário, eu simplesmente fiquei espantada. Nunca imaginei que um dia veria Byron sendo preso. O repórter mostrava fotos dele com algemas e uma roupa escandalosamente estúpida. Por tudo que ouvi, consegui ter uma breve noção da façanha que ele havia realizado. Assassinou uma mulher de idade, não por acasosua vizinha. Eu não a conhecia tão bem, mas o suficiente para tirar a conclusão de que ela não era uma má pessoa que deveria ser morta. Não soube como ele a matou, desliguei antes mesmo que a televisão me mostrasse o que eu não desejava ver. Respirei
Essa noite, posso dizer que foi uma das primeiras que acordei sem os choros de Sophie. Agradeci tanto, pois tinha que trabalhar e tive de acordar as seis horas da madrugada. Eu era gerente de uma loja de cosméticos, e isso significava que todas as responsabilidades caíamsobre mim. Fiquei muito tempo ausente e agora estava voltando a trabalhar. Quando acordei, mal tomei uma café da manhã decente e me arrumei com roupas confortáveis. Novamente tive que sair "voando", pois poderia chegar atrasada e não queria isso. A loja era em um shopping, nem tão perto de casa, porém era rápido de se chegar. O shopping era um dos melhores da cidade. Era simplesmente perfeito. As lojas eram todas arrumadas e até parecia que as pessoas eram mais bonitas. Haviam quatro andares, sendo que tinha duas pra&
- Claro que isso não tem nada a ver, idiota!- Se algo der errado eu te mato!As vozes iam ficando cada vez mais altas e eu não sabia onde estava, tudo ainda permanecia embaçado, entretanto eu conseguia ver algumas coisas. Um homem bem alto parou na minha frente e começou a me olhar. Eu não sabia o que fazer nem o que dizer. Ainda não conseguia ver direito, então não o reconheci.-
—Elizabeth, acorda!Uma voz parecia estar me chamando de um lugar bem distante, quando fui abrindo meus olhos consegui perceber que não era só um sonho. Era a voz de uma mulher, que tão logo reconheci ser daquela moça que havia falado comigo. Sua expressão não estava tão assustada, mas as suas mãos batiam fortemente na beira da minha cama. Tirei o lençol que estava em cima das minhas pernas e sentei na cama. Fiquei me perguntando quem me colocara confortavelmente naquela cama, com o lençol a cima de mim. Uma dor de cabeça me impedia de olhar diretamente para ela. Meu corpo inteiro doía igualmente.
BYRON 15/01/1999 - (14 anos depois)Quando Byron saiu da prisão, foi como se uma luz houvesse sido acessa. Pensar em passar o resto da vida preso num quarto com outros desconhecidos, com tempo para passeio com minutos contados era demais para ele. Sua imaginação, a arte que havia nele não havia morrido nesse tempo. Aliás, continuava vivíssima de certa forma, atrapalhando-o. Atrapalhando pois não podia pintar, então seus sentimentos se transformavam em uma angústia crescente, sem que ele pudesse fazer mais nada. Por mais que saiam dos quartos, não era a mesma coisa do que estar totalmente livre. Era uma prisão, literalmente. Vendo as mesmas coisas, as mesmas pessoas. Observando mais criminosos entrando e saindo. Ele já