A manhã na mansão Avelar começava cedo. Como parte de suas tarefas diárias, Eveline caminhou silenciosamente pelo corredor do andar superior e entrou nos quartos de Lucas e Beatriz para acordá-los. Com delicadeza, chamou-os carinhosamente, ajudando-os a se arrumarem para a escola. Lucas vestia uma camisa azul clara e bermuda bege, enquanto Beatriz usava um vestido xadrez azul com laço no cabelo.Acompanhando-os até a cozinha, Eveline sorriu ao ver a mesa decorada com frutas frescas, pães quentinhos e leite com chocolate, cuidadosamente preparada por Marta, a governanta.— Podem comer sem pressa meus amores, temos tempo, eu acordei vocês um pouco mais cedo para não se atrasarem! Estão prontos para mais um dia de aventuras? — perguntou Eveline, ajeitando os cabelos de Beatriz com carinho.— Sim! Hoje é dia de aula de artes! — disse Beatriz, animada.— E eu vou jogar futebol! — completou Lucas, com o brilho travesso nos olhos.Depois do café, o motorista da família os levou para a escola
Marcus encarava o próprio reflexo no espelho da academia privativa da mansão Castelão. O suor escorria pela testa, misturando-se à expressão determinada — e melancólica. Estava ali todos os dias, religiosamente, desde que assinara os papéis de divórcio. Precisava fazer algo com a dor que consumia seu peito, e transformar seu corpo parecia, ao menos, uma pequena vitória sobre o caos interior.Reeducou também sua alimentação. Nada de uísque à noite, nada de comida processada. Tudo natural, balanceado. Helena, sua mãe, cuidava para que as refeições fossem pensadas não apenas para o corpo, mas também para a alma do filho destruído.Além disso, Marcus seguia firme nas consultas semanais com o psicólogo. Ali, pela primeira vez, aprendia a lidar com sentimentos que sempre abafara com arrogância, trabalho e controle. Enfrentar sua vulnerabilidade era mais difícil que qualquer reunião de negócios.Nas reuniões da empresa Castelão, Marcus mantinha a postura impecável. Terno sob medida, voz firm
Após despertar confuso e enojado na casa da festa, Marcus não perdeu tempo. Saiu discretamente, evitando qualquer contato com Sabrina ou qualquer outra pessoa.Chegou em casa ainda com a cabeça latejando, o cheiro de álcool impregnado na pele. Foi direto para o chuveiro, onde permaneceu por longos minutos sob a água gelada, tentando lavar a culpa, a vergonha e o vazio que o consumiam.Vestiu uma roupa sóbria e seguiu para a empresa Castelão, tentando ocupar a mente com trabalho.O dia passou em meio a reuniões exaustivas e decisões impessoais. No fim da tarde, Marcus retornou para casa apenas desejando se refugiar no silêncio.Ao entrar na mansão, encontrou sua mãe, Helena, na sala, servindo café para uma visita inesperada.Era Sabrina.Helena manteve a educação, mas o desconforto era visível.— Marcus, sua prima Sabrina veio falar com você. Pedi para que ela aguardasse no escritório — disse Helena, com um sorriso polido e olhar duro.— Veio falar comigo? — Marcus murmurou, trincando
Marcus ainda se recuperava da visita devastadora de Sabrina.Assim que ela saiu do escritório, com os saltos ecoando pelo corredor, Helena, aflita, surgiu à porta.Seus olhos ansiosos e a expressão fechada denunciavam o turbilhão de pensamentos que lhe corria pela cabeça.— Marcus — ela entrou, fechando a porta atrás de si —, pelo amor de Deus, o que aconteceu? O que aquela víbora veio fazer aqui? — perguntou, baixando a voz, mas carregada de indignação. — Você costumava dispensá-la em dois minutos! Agora recebe ela assim, dentro da nossa casa?Marcus soltou um suspiro cansado, passando a mão pela nuca como se buscasse forças para falar.Sentou-se na poltrona diante da lareira apagada e encarou a mãe com olhos opacos.— Ela veio... — começou, a voz rouca. — Ela veio dizer que talvez esteja grávida.Helena arregalou os olhos, levando as duas mãos à boca, em choque.— Pelo amor de Deus, Marcus! — exclamou, abafando o grito. — Como você pôde deixar isso acontecer?Marcus fechou os olhos,
A caneta escorregava entre os dedos finos de Eveline Rocha. O papel à sua frente tremia como se denunciasse o que ela não podia dizer em voz alta. Aquela não era uma assinatura de amor. Era um contrato de resgate. Resgate financeiro — não emocional.Sentada à mesa da sala de jantar, Eveline parecia pequena demais para a gravidade daquela decisão. A jovem de pele alva e cabelos negros como a noite encarava o documento com os olhos cor de mel marejados. Seu coração batia tão alto que podia jurar que os outros escutavam.Mas ninguém escutava nada naquela casa.Seu pai, Júlio Rocha, estava de pé ao lado da lareira, com os braços cruzados e a expressão fria como mármore. Desde que a fábrica da família — uma tradicional tecelagem herdada do avô de Eveline — começara a falir, ele já não a olhava como filha. Era uma moeda de troca, e nada mais.— Assine de uma vez, Eveline. Não temos o dia todo — disse ele com voz áspera, sem tirar os olhos do relógio de bolso que herdara como um troféu de te
Eveline observava, pela janela do carro, as vastas paisagens da fazenda, a estrada de terra, ainda um pouco empoeirada pela recente chuva, parecia não ter fim. O coração dela batia acelerado, mas ela tentava controlar as emoções. Era a primeira vez que estava indo para lá, e apesar de tudo, uma sensação de ansiedade misturada com curiosidade dominava seu corpo.Ela não sabia bem o que esperar. As palavras de seu pai, Júlio, ecoavam em sua mente: "Este casamento é sua salvação, Eveline. A nossa única chance." Ele e a madrasta, Claudia, tinham apostado tudo naquele matrimônio. Marcus Castelão não era apenas rico — ele era a última tábua de salvação para os negócios em ruínas da família Rocha. Eveline nunca pensou que um casamento, tão frio e imposto, pudesse ter algo de bom.Ela chegou à fazenda por volta do final da tarde, o céu tingido de laranja, como um aviso de que a noite estava prestes a cair. Quando o carro parou, não havia ninguém à porta esperando por ela, nada que lembrasse u
O jantar foi silencioso.Eveline sentou-se à mesa longa, comendo sob o olhar atento de Maria e os poucos funcionários que transitavam discretamente pela casa. Marcus não apareceu para comer com ela. A mesa, embora farta, parecia um palco vazio. Nada ali era acolhedor, e cada mordida parecia feita por obrigação.Depois do jantar, Maria levou-a de volta ao quarto. As malas já estavam no lugar, as roupas cuidadosamente organizadas no armário. A noite estava quente, e uma brisa morna entrava pela janela, balançando levemente as cortinas.Eveline trocou-se por uma camisola leve de seda vermelha, que Claudia fizera questão de colocar no fundo da mala. O tecido macio grudava em seu corpo como uma segunda pele, destacando sua silhueta. Ela hesitou em se olhar no espelho, mas o fez. Pela primeira vez, se viu com os olhos de um homem. Um homem como Marcus.Será que ele me deseja? Ou só me escolheu pelo ventre?Bateu à porta. Um toque firme. Ela se sobressaltou.Maria entrou.— O senhor Marcus e
O corpo de Eveline ainda tremia. A primeira vez deixara marcas que ela jamais esqueceria. Marcus, mesmo com seu jeito contido e palavras frias, havia sido intenso, dominador... e surpreendentemente carinhoso durante o ato. Mas, assim que seus corpos se separaram, a distância entre eles voltou a se instalar.Ela observava de lado, deitada nua entre os lençóis, o homem que agora se levantava da cama, recolocava a camisa e virava de costas.— Você pode ficar aqui. Amanhã, Maria irá te mostrar o resto da casa. — A voz dele voltou ao tom seco, formal. Quase impessoal.Eveline sentou-se lentamente, os cabelos caindo sobre os ombros nus, os seios ainda sensíveis. A frieza dele depois de tanta entrega era como um tapa.— É só isso? — a pergunta escapou de seus lábios sem que ela planejasse.Marcus virou-se devagar, os olhos verdes a examinando como se ponderasse cada palavra.— O que você esperava?Ela baixou os olhos, engolindo o gosto amargo do silêncio que se seguiu. Ele não disse mais nad