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Do Medo ao Amor
Do Medo ao Amor
Por: Viviane Cruz
Capítulo 1 - O Contrato

A caneta escorregava entre os dedos finos de Eveline Rocha. O papel à sua frente tremia como se denunciasse o que ela não podia dizer em voz alta. Aquela não era uma assinatura de amor. Era um contrato de resgate. Resgate financeiro — não emocional.

Sentada à mesa da sala de jantar, Eveline parecia pequena demais para a gravidade daquela decisão. A jovem de pele alva e cabelos negros como a noite encarava o documento com os olhos cor de mel marejados. Seu coração batia tão alto que podia jurar que os outros escutavam.

Mas ninguém escutava nada naquela casa.

Seu pai, Júlio Rocha, estava de pé ao lado da lareira, com os braços cruzados e a expressão fria como mármore. Desde que a fábrica da família — uma tradicional tecelagem herdada do avô de Eveline — começara a falir, ele já não a olhava como filha. Era uma moeda de troca, e nada mais.

— Assine de uma vez, Eveline. Não temos o dia todo — disse ele com voz áspera, sem tirar os olhos do relógio de bolso que herdara como um troféu de tempos melhores.

A madrasta, Claudia, estava recostada no sofá com uma taça de vinho, a elegância superficial estampada em um sorriso satisfeito. Usava um vestido de seda vermelha, provocativo e dissonante com o momento. Ela não escondia a indiferença — e nem a crueldade.

— Vai ser a coisa mais útil que você já fez por essa família — disse Claudia, entornando o vinho com prazer. — Um pouco de gratidão cairia bem.

Luiza, a meia-irmã, estava escorada na parede, mascando chiclete e revirando os olhos. Tinha a mesma idade de Eveline, mas o contraste entre elas era gritante. Luiza era preguiçosa, mimada e acostumada a ter tudo sem esforço. Sempre invejou a beleza, a inteligência e até o silêncio resiliente de Eveline.

— Até que enfim a santa vai servir pra alguma coisa — provocou, rindo com escárnio. — Casar com o monstro escondido na fazenda. Mal posso esperar pelas cartas de amor... ou os gritos de pavor.

— Cale a boca, Luiza — sussurrou Eveline, com um fio de voz.

Mas ninguém a defenderia. Ninguém jamais a defendera.

Desde pequena, Eveline fora a estranha dentro da própria casa. Após a morte de sua mãe biológica, Júlio havia se casado rapidamente com Claudia, uma mulher fria e ambiciosa. Ela nunca fez questão de esconder o desprezo por Eveline. Sempre preferiu Luiza, sua filha do primeiro casamento. Enquanto Luiza ganhava festas, roupas caras e elogios, Eveline ganhava tarefas, cobranças e silêncio.

Mesmo assim, ela nunca reclamou. Sonhava em estudar medicina, em sair daquele ambiente sufocante, em cuidar de vidas — talvez porque ninguém nunca tivesse cuidado da dela. Tirava as melhores notas da escola, passava horas estudando escondida, recortava imagens de jalecos brancos e guardava sob o travesseiro.

Mas quando terminou o colegial e falou sobre vestibular, Claudia riu.

— Faculdade? Pra quê? Vai cuidar de doentes como sua mãe fracassada? Sua única chance de fazer algo certo nessa vida é casar-se com um homem rico. E agora você vai ter essa sorte.

Era isso: Sorte. A palavra soava como uma ofensa.

A fábrica de tecidos estava à beira da falência. Os bancos já haviam cortado as linhas de crédito. Júlio, orgulhoso demais para declarar falência, aceitou a proposta que viera por meios estranhos — uma união entre sua filha mais velha e o recluso Marcus Castelão, milionário do setor agropecuário. Eveline nunca o vira. Sabia apenas que ele havia sofrido um acidente grave, que vivia isolado em sua fazenda e que queria uma esposa e um herdeiro. O casamento seria discreto. Sem cerimônia. Sem festa.

Sem escolha.

Com a mão trêmula, Eveline assinou.

Seu coração afundou.

Não houve aplausos. Nenhum parabéns. Só o som do papel sendo retirado da mesa e entregue ao oficial do cartório, que saiu tão indiferente quanto chegou. Júlio pegou a taça de Claudia e bebeu como quem brinda à própria salvação.

— Prepare-se. O carro de Marcus chega em uma hora. E trate de ser agradável, Eveline. Sua obrigação agora é obedecer.

Ela levantou-se em silêncio, tentando manter a postura apesar do nó na garganta. Enquanto subia as escadas para arrumar suas coisas, ouviu a voz de Luiza, rindo no andar de baixo:

— Aposto que ela nem vai saber o que fazer na cama.

Eveline parou por um segundo no topo da escada. Não chorou. Não respondeu. Mas ali, em silêncio, jurou a si mesma que sobreviveria — nem que tivesse que transformar aquela prisão dourada na chave para sua liberdade.

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