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Capítulo 3 A Vida Improvável da Sra. Amonhhat.

Ouviu o motorista conversar com alguém, uma vizinha curiosa com certeza. Ela afirmava que não havia ninguém na casa, que a dona do lugar estava trabalhando. Hórus tinha ciência de que ela possuía graduação em medicina e especialização na área, mas não imaginou que exercesse a profissão, nem mesmo mandou investigar as atividades dela. Pensando nisso, o fato de viver na completa miséria exercendo medicina e recebendo as quantias vultosas mensais que lhe enviava, era ainda mais irreal. Tinha que admitir, havia negligenciado Olívia Morrison por tempo demais. Enviou uma mensagem a Anúbis para que este o informasse onde ela trabalhava, depois de alguns minutos se lembrou que ele estava em um jantar de negócios. Não havia alternativa se não esperar. Resolveu ler novamente as informações de sua ‘esposa’, quando foi interrompido por vozes esganiçadas que se aproximavam cada vez mais do carro. Duas mulheres açoitavam a porta de seu lado, com as mãos em punhos pedindo ajuda desesperadas, ele apertou o botão da trava e permitiu que elas a abrissem, reconheceu um tom de emergência verdadeiro em suas vozes. Amparavam uma jovem mulher em estágio avançado de gravidez que urrava de dor, seu corpo se contorcia iluminado pela luz interna do veículo.

- Por favor senhor, nos ajude. Minha filha precisa chegar ao hospital, ela está dando à luz. Não temos dinheiro para a ambulância, ela não consegue chegar ao ponto de ônibus. – uma das velhas que amparava a mulher suplicava entre lágrimas.

Normalmente teria se afastado de qualquer mulher grávida que se aproximasse dele, traziam lembranças muito dolorosas que enterrou no mais fundo de sua mente. Entretanto se negar ajudar em uma emergência dessas seria no mínimo desumano, por isso ele praguejou para si mesmo, bloqueando as lembranças de sua mente e cedeu. Se afastou para o canto oposto no assento de couro para abrir espaço a elas, e ordenou.

- Dê o endereço do hospital ao motorista.

Depois de dizer essas breves palavras, encostou a cabeça no apoio do banco e tentou não se abalar pelos gemidos e gritos estridentes de dor da mulher que parecia um enorme balão a ponto de explodir. Já tinha muito com o que se preocupar e ocupar sua mente cansada, não deixaria essa situação o atingir só porque se tratava de uma grávida.

Seu motorista possuía talento para formula um, em cinco minutos estavam estacionando na emergência do hospital, Hórus desceu do carro e prontamente se aproximou apoiando a mulher agonizante. Os enfermeiros chegaram com uma maca, e enquanto a velha senhora fornecia informação a um deles com uma prancheta, ele se viu arrastado pelos outros dois que deduziram que era o parceiro da gestante.

- Ouçam, eu não...

A tentava se explicar e se afastar da maca foi ignorada com sucesso, a contragosto, era conduzido junto a gestante pelo corredor que cheirava a assepsia. Quando estavam vários corredores a dentro, uma voz firme e feminina os interrompeu.

- Ele não é o pai, muito menos acompanhante. – a voz vinha de um corredor lateral com um letreiro de UTI.

Todos pararam e olharam naquela direção, por alguns segundos só se ouvia os grunhidos de dor da pobre mulher e o barulho de maquinas hospitalares que vinha de trás da porta com o letreiro. Hórus se voltou para agradecer quem finalmente o salvara daquela situação bizarra. Para sua surpresa se deparou com um rosto que lhe parecia familiar.

- Tom, leve Violet para o centro cirúrgico quatro e chame a Dra. Novack, deixe a mãe dela acompanhar. Avise a recepção que já deixei tudo certo no setor financeiro e eles já estão de sobreaviso.

- Certo, vamos. – o enfermeiro mais velho respondeu, certamente era o tal de Tom.

- Muito obrigada Olívia, nós nunca poderemos pagar sua ajuda... – a velha chorava alternando seu olhar da filha, para a figura pequena na porta.

- Não se preocupe com isso Molly, vai ficar tudo bem. – ela deu um breve sorriso sob a máscara. – vou conhecer o bebê assim que terminar por aqui.

O enfermeiro assentiu e voltou a empurrar a mulher rapidamente corredor a fora. Hórus se deteve na figura pequena e feminina encostada ao batente da porta. Olívia. Não poderia ser coincidência. Seus olhos se revezavam em detalhar os traços do rosto delicado em forma de coração, o corpo pequeno encobertos pelo largo uniforme fazendo-a praticamente desaparecer dentro dele; não devia passar de um e sessenta e cinco de altura. Pele morena clara, com um viço jovial reverberante, cabelos negros como a noite, lisos, presos em um coque meio desmanchados no alto da cabeça, olhos castanhos intensamente amendoados e a boca rosada se assemelhava a uma joia delicada. Não havia dúvidas, essa mulher era a sua esposa.

- Se já terminou seu momento voyeur, pode se retirar. Essa é uma área restrita. – ela disse com impaciência, mantendo o tom de voz baixo, acenou para a placa ao lado de sua cabeça.

As palavras ásperas o surpreenderam, afinal esperava ao menos um pouco de cortesia de sua “esposa”. Deixou de lado a observação sutil para analisa-la abertamente, não tinha porque esconder sua vontade de irrita-la, afinal ela havia sido descortês inicialmente, era óbvio que detestava o que ele estava fazendo. Gostou muito do olhar desafiador e até mesmo hostil que estampava o rosto dela, era bem diferente da primeira e última vez que a viu. Algo se inquietou em seu âmago, nenhuma mulher o encarou dessa forma. A pequena mulher o mirou ainda mais irritada e cruzou os braços sob o peito, fazendo o tecido do pijama profissional marcar os seios perfeitamente redondos escondidos sob tanto tecido. Hórus sentiu sua boca salivar, seu corpo esquentou reagindo instantaneamente. Isso era inédito, geralmente sua libido era uma parte adormecida e não costumava dar o ar de sua graça. Sempre foi um homem controlado, mas sua sexualidade era um vasto deserto árido que a muito tempo não era despertada. Os atos sexuais eram vistos como uma maneira de extinguir sua tensão, acontecia raramente quando estava disposto a tolerar Vitória. Agora se via parado olhando diretamente para os seios dela como um pervertido incontrolável, tentando mensurar o se tamanho, textura, maciez, e os imaginando em uma lingerie provocante.

- Aqui Sr. Amonhhat. – ela apontou para a própria face. – Meu rosto é aqui!

A mulher era petulante e atrevida! Quem diria que aquela figura apática de olhos tristes e sem brilho se transformaria nessa bela rosa espinhenta. Estava fascinado, o fato dela saber quem ele era e não se intimidar, prosseguindo com seus comentários afiados foi como um afrodisíaco poderoso o levando a imaginar cenas quentes com ambos nus. Engoliu o no seco de sua garganta, decidiu não irrita-la ainda mais por enquanto, deu-lhe um breve sorriso charmoso e perguntou.

- Sabia que estava a sua procura? – arqueou a sobrancelha direita, sem perder uma reação dela. – Sra. Amonhhat.

- Estou sabendo agora. – Olívia enrijeceu ainda mais o corpo. – Mas, como pode ver, estou em horário de trabalho, se quiser falar comigo pode esperar frente à minha casa.

- Posso esperar aqui, e voltamos juntos. – sugeriu ele, o toque de malicia em sua voz não foi disfarçado, na verdade ele nem percebeu que soou assim.

- Prefiro ir para casa sozinha. Falamos mais tarde Sr. Amonhhat. – sem esperar pela resposta ela voltou para dentro do setor em que estivera a poucos minutos.

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