Capítulo 3

Mavi

Eu saio da cadeia me tremendo tanto, que pareço uma idosa com mal de Parkinson. Sinceramente, nem sei o que deu na minha cabeça de que isso seria uma boa ideia. E ainda ter que ouvir na minha cara, que sou uma criança.

Na minha cabeça Badá já era um velho, careca e sem dente. E não aquela muralha de homem todo posturado, tatuagem dos pés a cabeça e com uma marra que só cabe nele.

Me aproximo do carro onde Rangel me esperava e respiro aliviada por esta já distante daquele ambiente horrível.

Rangel: Deu tudo certo lá? - Estendo o papel de volta pra ele que não fiz nem questão de saber o que estava escrito.

Mavi: Ele pediu uma visita íntima. Tem certeza que aquele homem não vai tentar transar comigo?

Rangel: Tá doidona, Maria? Cara é sujeito homem po, tá lidando com vacilão não. Se tu tiver com medo, passa a bola que outra vem no teu lugar, da o papo.

Eu já queria ter desistido quando passei pela revista, com várias paranoias na cabeça do tipo "E se eu tiver com uma arma?" "Drogas?" Mesmo sabendo que não estava com nada, eu fiquei tão tensa que parecia que a qualquer momento os agentes iriam retirar um quilo de maconha do meu bolso.

O tanto que minha irmã iria falar na minha cabeça se soubesse disso, não quero nem imaginar.

Mavi: Eu vou, será a última. Ele mesmo quem disse!

Rangel: tranquilo então, marco pra amanhã!

Mavi: mas já? Tem que ver o horário, por que tenho que levar o samuca pra escola. Hoje eu pedi minha irmã, mas não posso ficar pedindo todo dia.

Rangel: A visita é de manhã, se pá nem demora e dá tempo de tu ir levar o moleque.

Mavi: Me adianta o que é que vou levar, se for droga não entro.

Rangel: Tá peidando na farofa já? É um celular.

Mavi: E onde eu vou esconder esse celular, Rangel? Meu Deus. - passo a mão no rosto sabendo que isso podia dar uma merda tão grande pro meu lado.

Rangel: Já tá tudo no esquema, os guardas não vão te revista, relaxa.

Ele liga o carro sem nem esperar por uma resposta minha vai em direção aí salgueiro.

Já estávamos próximo ao Carnaval, por tanto o morro era aquela euforia toda, ensaio de escola de samba, bailes temáticos, Helen tentava me arrastar para todos, mesmo sabendo que eu não gostava tanto.

Rangel para bem em frente ao salão da Erica, eu desço agradecendo e atravesso a rua chegando na porta onde Samuel estava sentado sem uniforme.

Mavi: Vai estudar hoje não, neguinho? - Pergunto depositando um beijo em sua testa e me sento ao seu lado.

Samuel: Hoje não tem aula, Maria. Tá doida?

Erica: Fala direito menino, onde estão seus modos? - Erica se vira pra falar pra ele que sorri todo sem graça.

Mavi: Ele é um cocudo mesmo, Erica. Um dia me ama e no outro me odeia.

Erica: Tu pode ficar com ele agora na parte da tarde? Preciso sair pra comprar produtos pra repor aqui no salão, e Samuel se for comigo, eu não compro nada e ainda faz eu gastar todo meu dinheiro com ele.

Mavi: Fico sim, sem problemas.

Erica: Pode subir com ele se quiser, só vou terminar esse cabelo e vou. Não demoro!

Afirmo com a cabeça e Samuel logo se levanta subindo as escadas, Erica morava em cima do salão bem no meio do morro, e as vezes Samuel me fazia subir empurrando a bicicleta com ele garupa, um Folgado.

Me sento na sala onde ele já havia ligado a TV e fico ali atoa com ele que está vidrado num desses vídeos bobos do YouTube.

Meu celular toca com um número desconhecido e eu fico cabulada em atender, sempre era trote e dessa vez não seria diferente. Resolvo não atender e jogo o celular de lado.

A ligação insiste e eu atendo sem falar nada...

Badá: Maria?

Mavi: ah... oi, é você!

Badá: Sou eu, se liga... a grana já tá com Rangel, ele vai te entregar mais ou tarde ou amanhã bem cedo, e não precisa aparecer aqui amanhã.

Mavi: Por que? O que houve?

Badá: Nada. Isso aqui não é lugar pra tu não, se ligou? Tu é novinha e tem uma vida pela frente aí, po. Fica envolvendo nesses bagulho sem fundamento não que é furada.

Mavi: Mas eu vou... - crio coragem pra confrontar. - Eu quero que tu saia da cadeia daqui uns dias e ache que eu te devo alguma coisa por ter me polpado. Tu disse que seria a última vez e amanhã estarei aí.

Badá: Tá lidando com moleque não, tenho 37 anos, se eu tô te dando o papo é de sujeito homem. Tô ajudando por que sei quem é tua mãe, já cuidou de mim quando eu era criança. Ela nem sabe que tu tá nessa né?

Mavi: Só Helen sabe, é Rangel. Eu faço o que for preciso pra tirar ela daquele hospital, já te disse.

Badá: Eu não te quero aqui, tá entendendo? Já dei meu papo é ele é um só, vê se não teima por que eu não costumo ter muita paciência. - a voz rouca dele ecoando do outro lado da linha fazia meu corpo se arrepiar por completo.

Mavi: São 40 mil reais Ba... - já ia pronunciar seu vulgo quando me dei conta de que Samuel estava ao lado. - 40 mil reais, tu vai me dar essa grana toda de mão beijada? Nem fudendo.

Badá: Tu tá com a boquinha muito suja, acha não? Malcriada. Meu papo é reto mina, ele não faz curva. Não te quero aqui e tu não me deve nada. Paga pela cirurgia da sua coroa aí e fica suave. Apaga essa ligação aí pra não te complicar. Tô indo nessa, boa sorte pra tua mãe aí.

Ele desliga na minha cara sem nem esperar eu responder alguma coisa. O medo me domina de tal forma, só em pensar se ela seria capaz de me cobrar algo aqui fora, não da, sou medrosa demais.

Respiro aliviada sabendo que logo minha mãezinha estará em casa, eu disse que lutaria pra compensar todas as coisas que ela já fez por mim, e isso não é nem o começo.

Entro em casa já anoitecendo e sinto o cheiro de comida, Laura cozinha muito bem, já eu, sabia mal fritar um ovo sem me queimar toda.

Laura: Rangel deixou uma bolsa aí pra tu. - Me sento na mesa próximo a ela que está de costas mexendo algo na panela, ela se vira me fuzilando com os olhos. - De onde tu tirou aquela grana toda, Maria?

Mavi: Eu visitei o Badá... - Ela me olha arregalando os olhos e apoia as duas mãos na mesa se abaixando. - Não foi nada demais, Laura. Era só pra entregar uma carta pra ele, ele disse que a mãe cuidou dele quando era criança e quis ajudar.

Laura: Assim? Sem mais nem menos?

Mavi: Foi. Ele só pediu pra que eu fizesse outra visita, mas me ligou dizendo que não precisava mais e que Rangel entregaria a grana pra cirurgia da mãe.

Laura: Maria Vitória, acabei de crê que tu perdeu a sanidade mental.

Mavi: Não conta nada pra mãe que eu fui lá, eu me resolvo com ela.

Laura: Eu não me meto. E ele é como em? Fico curiosa pra saber. Nunca vi uma foto dele, deve ser um velho babão.

Mavi: Não é, pode acreditar. - Começo a contar suas características físicas e Laura sorri toda animada, éramos o oposto uma da outra, ela dá bagaceira e eu na minha como sempre. - E tu não sabe a maior, sabe o Samuel da Erica? - Ela afirma com a cabeça esperando eu terminar de falar. - É filho dele!

Laura: Meu Deus. Então ele é casado com a Erica?

Mavi: Não... ouvi ela falar que engravidou dentro da cadeia quando fez uma visita pra ele.

Laura: Que babado fortíssimo. - Ela gargalha desligando a panela e tampando. - Eu vou para o hospital dormir com a mãe. A janta tá pronta!

Confirmo e vou para meu quarto, tomo um banho colocando uma roupa confortável e me sento na cama olhando aquela bolsa cheia de dinheiro, nunca vi tantas notas de cem em minha vida. Sorrio novamente, minha mãe está salva.

Arrumo minha comida e me certifico que a casa está toda trancada, eu morria de medo de alguém entrar aqui, mesmo sabendo que a gestão do morro não aceitava isso, nunca se sabe.

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