sol da tarde ainda estava a pino, projetando sombras longas pela rua enquanto uma brisa fresca soprava, aliviando o calor urbano. As vitrines das poucas lojas que restavam ali refletiam a luz dourada, dando um ar quase tranquilo à vizinhança — uma tranquilidade que eu sabia que não duraria muito com Ethan por perto.
Ele parou o carro bem em frente à minha floricultura, e eu agradeci mentalmente pelo fato de ter comprado a maior parte das casas e lojas dali nos últimos anos, justamente para expandir o negócio e construir um shopping. Graças a isso, a vizinhança estava praticamente vazia, e ninguém veria uma ruiva de jeans e camiseta saindo de um carro de luxo ao lado de um bilionário arrogante. A última coisa que eu precisava era gente inventando fofocas sobre mim. Saí do carro, apertando o grimório contra o peito, enquanto Ethan dava a volta e se esticava, como se quisesse aproveitar cada segundo daquele sol ameno. — Você pode me explicar por que estamEthan me observou por um momento, seu olhar avaliando minha expressão como se tentasse decifrar algo.Mas eu não lhe dei tempo para isso.Ethan não respondeu imediatamente à minha provocação. Em vez disso, inclinou a cabeça levemente, como se tentasse enxergar algo além do que eu estava demonstrando. Seu olhar atento me deixou inquieta, e eu sabia que, se ele decidisse perguntar algo, talvez eu acabasse dizendo mais do que deveria.Antes que ele tivesse chance de abrir a boca, me apressei em dizer:— Eu preciso checar minha avó antes.Ele apenas assentiu, desviando o olhar para uma das prateleiras, onde algumas hortênsias azuladas estavam em plena floração. Seus dedos tocaram uma pétala com leveza, como se testasse a textura delicada da flor.Sem esperar por mais nada, subi o vão de escada que levava ao pequeno apartamento acima da loja.Assim que abri a porta, senti um alívio imediato. Tudo estava calmo. Minha vizinha, uma senhora gentil e de sorriso sem
Ele hesitou, e por um momento achei que não fosse responder. Mas então suspirou.— Um ataque. Meu pai tinha muitos inimigos, e alguém achou que ela seria um alvo fácil. E foi. — Sua mandíbula se contraiu. — Eu nunca vi meu pai tão… desesperado. E foi ali que tudo mudou. Foi ali que eu soube que, gostasse ou não, eu teria que crescer rápido.Minhas mãos se apertaram ao redor do grimório contra meu peito. Eu sabia o que era perder alguém assim.— Eu perdi minha mãe também — sussurrei.Ele virou o rosto na minha direção, observando-me atentamente.— Como?Engoli em seco.— Câncer. Eu tinha quinze anos.Um silêncio se instalou entre nós. Não era desconfortável, nem pesado. Era apenas um momento onde duas pessoas que haviam perdido suas mães muito cedo se reconheciam na dor uma da outra.Eu nunca falava sobre isso. Mesmo anos depois, a ferida nunca fechava completamente. Mas ali, na presença de Ethan, parecia menos impossível falar sobre isso.— Eu
Meus olhos se arregalaram no mesmo instante. Dessa vez, eu sabia que tinha pronunciado certo. E então a hortênsia ao lado de Ethan começou a crescer. As folhas se expandiram, ganhando um verde mais vivo, mais vibrante. Os galhos se alongaram suavemente, e as pétalas, antes tímidas, agora estavam mais cheias, volumosas, como se tivessem absorvido a energia da própria terra em questão de segundos. Soltei o ar, surpresa. — Você achou que iriam sair faíscas? — perguntei, me virando para ele com uma sobrancelha arqueada. — Isso parece uma magia de crescimento. Ethan me encarou por um momento, depois soltou uma risada sem graça, coçando a nuca. — Talvez eu tenha confundido duas palavras parecidas em lupino. Minha expressão se fechou. — Como assim? Ele deu de ombros, desviando o olhar como se estivesse envergonhado. — Faz muito tempo que não falo no meu idioma nativo, ruiva. Alguma
DUAS SEMANAS DEPOIS Lustres de cristal pendiam do teto alto, derramando uma luz dourada e cálida sobre as mesas impecavelmente arrumadas. O tilintar das taças de cristal misturava-se ao murmúrio refinado das conversas, enquanto garçons vestindo ternos impecáveis deslizavam entre os convidados, servindo pratos delicadamente preparados e vinhos envelhecidos.O aroma de especiarias finas e carne grelhada pairava no ar, um convite à indulgência que, para mim, não passava de mais um detalhe entediante naquela noite interminável.Ao meu lado, minha noiva caminhava com passos calculados, tão graciosos quanto o deslizar de um cisne sobre um lago plácido. Scarlett Kingsley sabia como se portar nesses eventos—sabia como ser admirada, desejada e respeitada. Seu vestido vermelho longo moldava seu corpo com perfeição, o tecido fino acariciando sua pele em cada movimento. Os cabelos loiros estavam presos em um coque sofisticado, algumas mechas estrategicamente soltas para suaviz
— O quê? — perguntei, mantendo a expressão neutra, mesmo sentindo o gelo escorrer pela minha espinha. — A florista — repetiu, observando-me com interesse. — Eu descobri sobre as dificuldades que você está tendo para construir o novo shopping. Parece que uma dona de floricultura se recusa a vender o espaço, e isso está atrasando todo o projeto. Por um segundo, minha mente ficou completamente vazia. Então, como uma pancada, a lembrança veio. A floricultura. A papelada que eu havia recebido semanas atrás, sobre um espaço pequeno, mas bem localizado, cuja dona se recusava a vender. O projeto milionário, travado por uma única loja de flores. E a dona era Lila Prescott. De todas as formas em que eu poderia me lembrar dela, aquela havia sido a última que minha mente iria buscar. Eu nem tinha associado as duas coisas. O rosto dela surgiu na minha mente—os olhos vibrantes, a forma como mordia o lábio quando se co
Caleb não era estúpido.Ele percebia nuances, mudanças sutis. Se ele estava comentando sobre isso, significava que meu comportamento já não era tão imperceptível quanto eu achava.Meus olhos encontraram Scarlett do outro lado do salão.Ela caminhava graciosamente entre as mulheres da alta sociedade, o vestido vermelho abraçando suas curvas com elegância enquanto esvoaçava a cada passo calculado. Seu coque sofisticado mantinha cada fio dourado no lugar certo, destacando suas feições refinadas. Cada sorriso que ela dava era no momento exato, cada inclinação de cabeça, cada palavra dita no tom certo. Ela pertencia àquele mundo tanto quanto eu. Nascera para ele.E eu deveria estar satisfeito.Eu sabia disso.Scarlett era a esposa ideal para alguém como eu. Inteligente, bela, poderosa. Uma Kingsley. O que qualquer alfa gostaria de ter ao lado.Então por que, nos últimos dias, tudo parecia deslocado?Por que meu lobo se remexia inquieto sob minha pele, como
E minha união com Scarlett não era exceção.— Eu não posso simplesmente… — comecei, mas as palavras morreram na minha garganta.Terminar com ela.Não ainda.Não enquanto tudo ainda estivesse tão incerto.— E o que você vai fazer? — Caleb pressionou, seus olhos escuros me analisando com atenção.Eu não respondi imediatamente.Porque eu não sabia.Pela primeira vez em muito tempo, eu realmente não sabia o que fazer.— Ele vai fazer merda — Alec interrompeu, um sorriso afiado brincando em seus lábios, mas seus olhos não acompanhavam a expressão divertida. — É óbvio.— Foda-se, Alec — murmurei, esfregando a têmpora.Mas Alec apenas riu, tomando um gole de seu bourbon.— O que foi? Estou apenas curioso para saber se você vai dar o primeiro passo.Havia algo na forma como ele disse isso, um certo peso naquelas palavras, uma curiosidade que parecia ir além da mera provocação.Caleb notou.Eu também.Mas não era o momento para
O ar noturno era denso e fresco, carregado com o cheiro de terra úmida e madeira queimada. O silêncio da noite era interrompido apenas pelos gritos animados das crianças e as risadas de Alec, que brincava de pega-pega com os sobrinhos sob a luz prateada da lua cheia.Eu me encostei na grade do terraço, observando a noite se estender diante de nós. O peso daquela conversa ainda pressionava meus ombros, e, por mais que eu tentasse afastar os pensamentos, a verdade era inevitável.Scarlett estava certa. Eu precisava desse momento.— Você está com essa cara desde que saímos do restaurante — Colin comentou, acendendo um charuto e tragando lentamente. — Então vamos direto ao ponto.Ele me conhecia bem demais para que eu pudesse esconder qualquer coisa. Antes que eu dissesse qualquer coisa, ele já soltou, como se fosse óbvio:— A florista.Minha testa franziu na hora.— Como diabos você sabe disso?Colin soltou um suspiro cansado, soprando a fumaça para o la