— Me conta mais desse namoro? Já se conheciam? - Dario fazia Helena tagarelar. Gregory, o médico que ele havia conhecido na casa dela, era seu instrutor. Ela tinha uma queda por ele e, com aquele jeito adorável dela, conquistou sua amizade, mas foi como conhecer o homem de seus sonhos e a perfeita esposa. Depois disso, ela se casou e ficou viúva. Havia um ou outro namorinho antes, mas nada durava. Ele nunca a deixou desamparada, especialmente, depois da viuvez. Foi seu médico, seu amigo. Agora é seu chefe e namorado.Dario ouvia a história. De fato, pelo que se lembrava, dos vídeos dela, Gregory era mais recorrente que os outros amigos. — Me explica isso de "Encontro de viagem"? - Helena tinha o brilho curioso no olhar. Chegavam ao Mall, a pé. — Você marca com alguém para se conhecerem e compartilharem a viagem, não é nada demais. - Dario explicou, superficialmente. Parou na loja de chás. - Frutas vermelhas? - Ele ofereceu, fingindo adivinhar sua preferência.— Sim, senhor. - Ela co
A intuição de Helena exigia um estado de alerta exaustivo. Gregory havia saído sem lhe dizer nada. Ela sequer o viu pela manhã. As pequenas seguiam pesadas rotinas com Martha lhes tutoriando. Isso confortava Helena. — Tem um minuto, Helena? - A voz de Scarlet surgia atrás dela. — Todo o tempo que quiser, Scar. Fala comigo, bebê. - Ela respondeu. — Como faço para tirar? - A mulher via a moça comovida. — Tenho meus meios. Pegue uma bagagem, pequena. - A oportunidade se desenhava. - Somente o essencial. Vou providenciar um carro para a gente. Tenho um amigo que vai nos auxiliar. - A moça foi para seu quarto. Helena ligou para Dario. - Preciso de você. Sem questionamentos. Pode fazer isso por mim? — Quando? - Ele respondeu, de pronto. — Agora. Preciso chegar a Pueblo, no Colorado. Vamos em três motoristas. - Ela definiu, objetiva. — Chego em vinte minutos. - Dario disse, interrompendo a ligação. Helena pegou o essencial e ajudou Scarlet. — Celulares, tablets, qualquer meio d
Nem Scarlet e nem Dario se conformavam com a serenidade e, menos ainda, com os abusos a que Helena foi sujeita. — Você matou ele? - Scarlet perguntou, curiosa, melhorava de humor. — Aí é que está. Quando fiquei licenciada por causa do luto, ele foi promovido no meu lugar e acabou virando meu chefe, não sei porquê cargas d'água. - Helena seguia o relato. O sangue de Dario já fervia. - Quando seu pai passou a dividir comigo, logo que ele e sua mãe se divorciaram, seu pai virou meu chefe. - Helena deixou um riso escapar. - Preciso parar com esse negócio de me envolver com meus chefes. Hebert também foi meu superior. Enfim, esse cara se fingiu de policial e entrou em casa, me atacou e dizem que me estuprou, mas não sei, ele me estrangulou e se algo aconteceu, eu não estava consciente. Como meus ovários foram tirados, era cirurgia recente e, bom, seu pai quem me socorreu. - Dario lembrava das manchas de sangue e, agora, sabia que Helena era completamente estéril. - Assim que tive alta, v
— Greg, na boa, irmão? Vocês, da imigração, não têm departamento próprio de investigação interna? Não é caso para o FBI ainda. - Sullivan disse, tranquilamente. — É sua sobrinha, Sully! - Gregory se desesperava. - Minha filha! — E sua namorada é a bandida? - Sullivan o desafiava. — Helena é de Operações Avançadas, imprevisível por natureza. Ela me preocupa. Até que ponto isso é ou não sequestro? A mamãe e a Katrina a desafiaram e humilharam, usando a Scarlet. - Gregory elevava o tom. - Helena é o inferno da fronteira, sozinha, investiga, persegue e executa coiotes. Acha mesmo que ela não seria capaz de tomar uma vingança? Ainda mais com a Scar grávida? - Ele estava fora de si. - É alguém que sofreu muito, que amo, mas que também me causa medo. É para além de uma assassina treinada e rancorosa. — Ama ou está tentando "salvar" do caminho que você julga errado? Obrigado. - Gregory ouvia o irmão, atentamente, devolvendo documentos para alguém. O primogênito ouvia o som dos rabiscos
DESERTO DE CHIHUAHUA — Una migra! Una migra! Una migra! Mira! - O coiote apontou para um ponto, no alto da colina, sobre o rochedo, sozinho, com uma arma de grosso calibre no colo. Dario Garcia estreitou os olhos, a figura estava parada no alto da rocha, inerte. Não parecia fazer mira ou algo assim, aliás, sequer parecia viva. Ele tratou de instruir os coiotes que trabalhavam para ele e seguiu, perpendicular, em direção à figura agourenta sobre o rochedo. Aproximou-se, devagar, passo após passo, esquivando-se, entre a rala vegetação rasteira do deserto, em seu paramento militar da cor da areia. "Uma migra, sozinha, mulher?" Ele identificava a silhueta da policial. Dario julgava: ou ela tinha se perdido ou estavam em solo estadunidense. Qualquer hipótese era problemática. Conforme se aproximava, o contrabandista percebia as nuances. Filetes de sangue seco partiam do nariz; a boca rachada, a pele exposta. Se estivesse viva, aquela criatura miserável, em pesado paramento militar,
Dario passou horas observando sua paciente. Trocou a bolsa de soro e umedeceu seus lábios com o algodão molhado. Ela era bonita para uma militar, admirava-se do motivo de alguém, como ela, ter virado uma. Com o fim da segunda bolsa, ele a rolou e pôs sob o corpo um tapete descartável higiênico, para cães, para o caso de ainda estar inconsciente quando todo aquele líquido resolvesse sair. Adormeceu, com a pistola em punho, pronto para matá-la, se fosse necessário. Helena sentia a dor excruciante lhe roer a alma, forçando-a a perceber-se. Algo lhe tampava os olhos, estava viva e aquilo bastava naquele instante. A cabeça doía um inferno e os olhos, mesmo fechados, ardiam. A boca e a garganta secos, algo lhe feria o braço, dolorosamente. Ela gemeu, baixinho. Dario despertou. A mulher respirava, ofegante, inquieta. Se não estivesse desperta, logo acordaria. — Me ouve? Me entende? - Ele perguntou, em espanhol, percebia o gesto de cabeça dela, confirmando. Estava desperta. - Qual seu
Algo naquele lugar escuro, no Deserto de Chihuahua cheirava bem. Helena gostava do aroma. Dario a servia de um caldo de legumes, batido e leve. Guiou as mãos dela até a borda da tigela e da colher, mas ela não tinha firmeza nas mãos, tremia muito, ainda sem forças. — Me permita ajudá-la, senhora. - Dario tomava a frente, alimentando-a, colher por colher. Ela se fartou com pouco, o estômago cheio. - Amanhã, vamos partir e levar você até a fronteira. - Ele anunciou, precisava resolver aquela militar antes que ela identificasse o caminho. - Não se preocupe, você estará em casa, com sua criança, antes do anoitecer. — Não tenho uma criança, amigo. - Ela respondeu, curtamente.— Mas tem uma cicatriz no ventre. - Ele seguiu, aplicando o gel sobre a queimadura e o colírio nos bonitos olhos daquela mulher. — Oh! Isso. - Ela piscou os olhos, já não ardiam mais e nem sentia tanta dor. O ferimento no braço era o mais incômodo. Dario limpou o ferimento, cobrindo-o com gaze. — Não precisa falar
Um dia no trabalho e o relatório da ação indicava falha na ação. Em seu escritório recebia o comandante, com o braço que repousava, fora da tipóia, sobre a mesa.— Como está, Helena? - Renard perguntou, fechando a porta atrás de si. — Ah, Peter! Cara! Tive muita sorte. - Ela suspirou. - Fomos emboscados. Ou errei feio nos cálculos do planejamento ou vazou informação. De qualquer forma, a sindicância vai encontrar o problema e me cortar ou achar o boca aberta. Fiz o que pude para livrar a equipe. No time, só eu não tenho família. Sabe como é difícil dar notícia de "Morto em Ação" para quem sobrevive. — Helena, mesmo assim, deveria ser mais cautelosa com esses imprevistos. - Peter a repreendia, suave e amistosamente.— Vou tentar na próxima, Peter. - Ela respondeu, massageando os olhos sob as pálpebras. — Complicadas essas queimaduras nos olhos. Coçam um inferno. - Ele puxava conversa. — Começou aqui. No deserto, esse cara que me resgatou, tinha um colírio que foi excelente. - Ela r