Theo Lima O silêncio depois da pergunta de Lívia pesava sobre nós como uma nuvem carregada. Eu podia ver em seus olhos a esperança se dissolvendo pouco a pouco, como se ela já soubesse a resposta que eu relutava em dar. A pergunta ecoava na minha cabeça. A verdade? Eu não sabia. Ou talvez soubesse, mas não queria admitir nem para mim mesmo. Aurora tinha um jeito de entrar na minha vida como um furacão, bagunçando tudo, e mesmo quando eu achava que finalmente tinha seguido em frente, ela voltava, nem que fosse apenas nas minhas memórias. Mas eu não podia dizer isso a Lívia. — Não é nada, Lívi — respondi, forçando um sorriso que não alcançou meus olhos. — Só foi estranho… uma coincidência boba. Ela me observou por um longo momento, como se tentasse decifrar o que eu estava escondendo, mas acabou apenas assentindo. — Tudo bem — disse, com um tom que parecia mais conformado do que satisfeito. O jantar seguiu, mas a leveza de antes tinha desaparecido. Conversamos sobre amenid
Aurora Ricci A peça do jogo girava entre os pequenos dedos do meu filho, determinado a encaixá-la onde, claramente, não cabia. — Filho, não insiste, você pode acabar quebrando. A peça não vai encaixar. Ele olhou para a peça, teimoso, e me olhou com aquele brilho nos olhos que sempre me desarmava. — Mas, mamãe, não posso desistir. É o meu jogo favorito e eu gosto muito dele. Eu tenho que tentar, tentar e tentar. Ele precisa saber que um defeito não vai me fazer parar de brincar com ele. Meu peito apertou. Porque, naquele instante, eu vi muito mais do que um menino insistindo num jogo. Eu vi uma verdade que por tanto tempo ignorei. Por que eu desisti? Por que escondi a verdade de Theo? Eu sempre estive ao lado dele, fui a primeira a conhecê-lo, a primeira a segurar sua mão ensanguentada quando ele se machucou por minha causa. Mas agora, tudo o que restava para mim era vê-lo ao lado de outra pessoa, sem lembrar quem realmente esteve com ele desde o início. Fechei os olho
Aurora Duarte Ricci Cruzei os braços, esperando que ele fosse direto ao ponto. — Precisa de mais alguma assinatura minha antes de eu ir? Ele apertou os lábios e desviou o olhar por um instante, como se estivesse organizando os próprios pensamentos. — Preciso que você espere. — Para quê? — Me responde uma coisa, Aurora. Por que, anos atrás, você investiu na minha pequena empresa? Minha respiração falhou por um momento. Eu não esperava essa pergunta. — Por que passou horas e horas fazendo planilhas, orçamentos para que eu conseguisse um investimento e, depois, colocou seu próprio dinheiro no meu negócio? Mais do que qualquer dos acionistas que tenho na empresa, você se dedicou para que meu pequeno negócio, se tornasse algo grandioso, e eu fico me perguntado, o que te motivou? Engoli em seco. Theo me olhava com intensidade, e fugir agora não era uma opção. — Porque... — suspirei, buscando as palavras certas. — Eu havia perdido meus pais quando era nova e vim
Lívia Costa —Estou atrapalhando algo?—perguntei olhando para os dois. —Não, eu já estou de saída. Olhei para a Aurora saindo em direção a porta e então disse: —Espera!—entreguei o cartão da minha confeitaria.—Apareça na minha confeitaria, será muito bem-vinda. O aroma adocicado ainda pairava no ar quando a Aurora saiu do escritório dele.Ainda sentia a presença de Aurora e Theo queimando na minha mente, como se aquelas cenas de um passado que eu lutava para apagar continuassem tão presente. —O que você e a Aurora estavam fazendo?— perguntei e fiquei pensativa. — O que disse?— A voz de Theo me tirou do transe. Ele piscou algumas vezes antes de finalmente me encarar. Parecia perdido, como se ainda pudesse sentir o perfume de Aurora no ar. Engoli em seco. —Quer uma xícara de café para acompanhar o bolo? Theo hesitou antes de assentir. Servi-lhe o café e observei enquanto ele levava o garfo à boca, degustando o bolo que eu mesma havia preparado. Seus traços se suav
Aurora Duarte Ricci O quarto de hotel estava mergulhado em um silêncio reconfortante, interrompido apenas pelo som da minha respiração controlada. Eu estava sentada na beira da cama, encarando a mala semiaberta. As lembranças do passado voltavam a me atormentar, como se tivessem esperado o momento certo para me assombrar. Então, a campainha tocou. Meu coração acelerou. Nenhuma visita era esperada. Levantei-me hesitante e abri a porta. E lá estava ela. Isabela sorriu ao ver o pequeno no sofá e, sem cerimônia, disse: — Sentiu minha falta, irmã? Fechei os olhos por um segundo. Eu sabia que ela viria. Ester nunca guardava segredo por muito tempo. — O que aconteceu? Quando chegou? — Já tem dois dias. Achou que Ester não me contaria que você veio aqui novamente? Só que, dessa vez, cuidei pessoalmente do pedido que fez a Ester. — Sua voz carregava aquele tom autoritário que sempre teve. Ela entrou e se acomodou no sofá, cruzando as pernas com a elegância de quem já sabia
Theo Lima Olhei para Aurora e a beijei, o gosto dela ainda nos meus lábios. Aurora. O nome ecoava em minha mente, mas algo estava errado. O beijo foi intenso, cheio de emoção, mas... vazio. Deveria ter sido diferente. Deveria ter sido como uma explosão dentro de mim, mas ao invés disso, parecia... estranho. Ela se afastou, os olhos me analisando em busca de algo que eu não conseguia lhe dar. — Preciso voltar para o hotel — sua voz era baixa, mas firme. Assenti, sentindo um aperto inexplicável no peito. Eu a levei, deixei-a na porta do hotel e, antes que ela entrasse, me inclinei e capturei seus lábios novamente. Talvez eu só precisasse de mais um beijo para sentir o que deveria sentir. Mas não senti. Nada além de confusão. Aurora me olhou por um momento antes de sussurrar um boa noite e desaparecer para dentro do prédio. Entrei no carro e segui para casa. Meus dedos apertavam o volante com força, minha mente rodopiando. Por que eu não senti nada? Por que, ao invés d
Theo Lima O som da água caindo no chão do box ecoava pelo banheiro enquanto eu terminava meu banho. A noite tinha sido longa, e minha mente ainda estava uma bagunça. Aurora, Lívia, o passado… Tudo parecia embaralhado dentro de mim. Mas uma coisa eu sabia: não podia continuar assim. Precisava colocar a cabeça no lugar. Depois de me vestir, desci as escadas, sentindo o cheiro familiar de café e pão quente. Quando cheguei à sala de estar, vi Lívia colocando a mesa com um cuidado quase automático, como se estivesse imersa em seus próprios pensamentos. Ela ergueu os olhos ao me ver e hesitou por um instante. — Preciso falar algo com você — sua voz saiu suave, mas firme. Aquela frase bastou para que um nó se formasse em meu peito. — O que foi? — perguntei, dando um passo mais próximo. Mas antes que ela pudesse responder, sua expressão mudou. Seus ombros caíram levemente, e ela levou uma das mãos à testa, piscando algumas vezes como se o mundo ao seu redor estivesse girando.
Theo Lima O peso da verdade ainda pulsava em minha mente enquanto dirigia de volta para casa, com Lívia ao meu lado. Meu coração batia acelerado, como se quisesse sair do peito. Tudo o que havíamos vivido até agora era uma mentira cruelmente arquitetada. Eu olhava para Lívia, que estava tão abalada quanto eu. Seu rosto estava pálido, e suas mãos tremiam levemente sobre as pernas. Eu queria dizer algo, mas que palavras poderiam confortá-la depois de tudo? Assim que chegamos à mansão, Aurora já nos esperava. Seus olhos analisaram a mim e a Lívia, e vi o momento exato em que ela compreendeu. Seu rosto endureceu, mas não havia raiva ali. Apenas um cansaço profundo e uma tristeza devastadora. Ela não precisou perguntar nada. Nós também não. O silêncio foi a resposta. Mas eu tinha que dizer. — Nós três fomos enganados — minha voz soou firme, mas o nó na garganta quase me impediu de continuar. — Isabella e Gabriel nos manipularam desde o início. Os olhos de Aurora se fec