Dias atuais…
Buenos Aires,ArgentinaEscolher brinquedinhos de tortura se tornou a parte mais divertida do meu trabalho. Pego o machado em meio às diversas variedades jogadas pela mesa e me volto a cadeira onde meu interrogado está amarrado e amordaçado. Olho para Ametista que sorri imaginando meu próximo passo. Me sento na mesa à sua frente,cruzando as pernas,chamando a atenção do homem. Engraçado,mesmo com o medo do que pode lhe acontecer,o desgraçado não trai seus instintos sexuais.Pigarreio com um sorriso diabólico.— Seria mais interessante se me olhasse nos olhos em vez das minhas pernas. — Olho para Ametista e ela atende ao comando,retirando a mordaça. Sorrio para meu prisioneiro. — Alejandro González.O homem cerra os dentes e me encara com uma face nada amigável.— Rubi Jenner — ele cospe meu nome com ódio na voz. — O que quer comigo?Estudo-o com os olhos.— Você tem algo que eu quero e eu posso garantir que minha superior não faça nada a sua família. — Desço da mesa e me aproximo. — No mundo da máfia,quem tem família,tem tudo. Não acha?Ele ri.— E por que eu deveria seguir ordens de uma vagabunda como você?Sorri com deleite.Ah,você não disse isso… Largo o machado recostado na mesa e pego uma pistola pequena,atirando rapidamente no ombro do infeliz.Ele urra de dor.Minha mira sempre é impecável.— Acha que isso aqui é brincadeira? — Me aproximo e com as mãos enluvadas espremo o local onde a bala o atingiu,fazendo-o gritar. — Quando é um homem,vocês baixam a cabeça e obedecem. Mas quando é uma mulher,vocês a atacam com palavras sujas… — Ele baixa a cabeça,agonizando. Acerto um tiro no seu pé. Mais gritos. — Olhe para mim,seu monte de lixo!Nos encaramos.— Escuta,monte de merda. — Levanto seu queixo e aponto a pistola na sua testa. — Palavras não ofendem mulheres,assim como não é com palavras que as conquistam. Gostamos muito mais de caráter,responsabilidade e lealdade,acima de tudo,ações. Lixos como você,covardes e que acham que palavras rotulam as pessoas,não passam de apenas um brinquedinho descartável nas nossas mãos.Dou as costas e coloco a pistola sobre a mesa novamente,pegando agora uma faca e me sento novamente.— Me fala,o que sabe sobre Soraya Albuquerque?O homem suspira.Olho para a faca em minhas mãos e começo a brincar com ela.— Sabia que sou ótima nos lances de facas? — pergunto olhando-o séria.Ele pigarreia e olha para o teto.Fecha os olhos,e diz:— Soraya Albuquerque é a primeira-dama do Brasil. Há oito anos atrás,se casou com Edgar Albuquerque,atual presidente,o tão falado,naquela época,grande empresário do país. Trabalhei na sua casa durante três meses,mas a verdade é que estava atrás de algo na casa dela e acabei encontrando o que não era pro meu bico.Ele geme por causa da dor.Bato a unha na lateral da mesa,impaciente.— O que queria na casa de Soraya?— Estava atrás da minha filha adotiva. Há oito anos adotamos Mirella de uma senhora doente que viajava a pé de muito distante,ela parou na soleira da minha porta,quase moribunda,e nos entregou a menina. Ela tinha sete anos na época.Pisquei os olhos.— O que houve com a menina?Ele abaixa a cabeça.— Quatro meses depois ela foi sequestrada e os sequestradores nos deixaram um bilhete em que dizia: estamos pegando o que é nosso de volta. Minha esposa nunca se conformou,nem eu. — Seus olhos brilham. — Mas tinha uma simbologia em “S” na parte inferior do bilhete e,desde então,tenho pesquisado o que isso significa.Esse “S” me é muito familiar.— E o que descobriu?— Descobri que pertence à marca da máfia brasileira. Então peguei minhas economias e viajei pro Brasil. Seguindo minhas pesquisas,descobri que Soraya tinha relação com ela,então me enfiei em sua casa e passei por um simples jardineiro. Foi então que reencontrei minha filha. — Suas mãos amarradas uma na outra apertaram os nós em seus dedos. — Crescida e de cabelos loiros cacheados,aparentando ter quinze anos,atendendo pelo nome de Samanta,era ela,a minha Mirella. De alguma forma,agora era uma Albuquerque e filha única de Soraya e Edgar.Soraya roubou a filha desse homem? De nada me admira,afinal,ela é capaz de tudo e disso sei muito bem.— Investiguei demais e… Descobri sua facção criminosa e que Soraya é o braço direito do chefe da máfia. E em meio a isso fui pego e usado como cobaia para implantar as bombas na boate onde Scarlett e todas as membras de sua máfia estavam.Ametista olha para mim em busca de algum novo comando. Mas a verdade é que sei quando as pessoas mentem para mim e deste homem só me veio sinceridade. Ele realmente estava sofrendo por causa da filha.— Ametista — chamo-a. — Leve-o até a enfermaria e deem comida,água e roupas limpas. Vejo-o mais tarde.Ela assente ,mas depois pergunta:— E Scarlett?— Falarei com ela.Dou as costas e saio da sala de interrogatório batendo a porta.Caminho até o refeitório da sede e sorrio para Carmín que me entrega a bandeja com minhas porções de todas as sextas,onde estava me esperando numa das mesas próximas ao balcão. Me sento com minha amiga da cantina e conversamos sobre assuntos aleatórios. Sinto os olhos de Safira nas minhas costas, então simplesmente ignoro. A garota levanta de uma das últimas mesas e deixa sua bandeja sob o balcão e ruma até a mesa a qual estou. Carmín sinaliza para mim com as sobrancelhas e me preparo. Deixo os talheres baterem no prato e me viro de imediato para ela.— Pois não?Safira me estuda com os olhos.— Todas as outras meninas foram para a patrulha no esconderijo do Ferráz. Por que você não foi?Realmente penso muito bem se devo respondê-la. Sou uma mulher independente de 21 anos que lutou muito aqui dentro para conquistar meu cargo como braço direito da chefe,que venho me esforçando todos esses anos para abandonar a imagem errônea que tinha de mim há nove anos atrás,onde tenho metas e objetivos,dentro e fora da máfia. É,não devo nada a ela.— Isso não a diz respeito — começo e arqueio uma sobrancelha — , mas estou de bom humor. Estava em uma missão especial.— Conta outra,Rubi! — Ela ri com ironia. — Está fazendo corpo mole porque conseguiu se tornar a futura sucessora da Scarlett,você se acha melhor que todas nós,mas,presta atenção,quanto mais alto se auto coloca,de mais alto poderá cair.Continuo analisando a garota com desinteresse.— Eu tenho cara de psicóloga para você,Safira? — pergunto. — Não tenho paciência para suas crises de inveja ou ataques de frustração. Se quer ser melhor que alguém,então seja melhor. Eu lutei muito para conseguir a atenção da nossa superior,e pode crer que não fiquei um segundo sequer me lamentando para as outras meninas. Eu corri atrás.Largo a comida na mesa e me despeço de Carmín. Perdi o apetite. Desprezo pessoas fracas que não possuem determinação e procura culpados para o seu fracasso. Dou três passos para fora do refeitório até ouvir a segunda bobagem da boca daquela garota.— Você não lutou por nada,Rubi. Você apenas se vitimizou desde que chegou à Euforia com aquele papo de ter perdido sua irmã e seu pai,somado a mais um caralho a quatro. Isso se chama vitimismo. — Vitimismo? Que porra ela está falando? — Aposto que nem mais se lembra da sua família,nem da sua irmã,mal sabe se ela de fato está morta,ou talvez,você tenha a deixado morrer porque quis naquele carro e não procurou salvá-la. Deve ser uma daquelas irmãs invejosas e diabólicas. Você é uma farsa,Rubi Jenner.Viro-me e olho para Safira.— Acha que pode me afetar com isso?Ela dá de ombros.— Melhore suas táticas,Safira.Dou as costas e continuo a caminhar.— Você é como a mulher que diz ter matado seu pai. Uma cópia da outra.Rapidamente saco minha pistola e prendo o corpo de Safira na parede,empurrando-a com a força do cano da arma em sua testa. Ela congela no lugar e Carmín tampa a boca,com medo.— Nunca mais… Jamais volte a abrir essa porcaria de boca para falar sobre algo que não sabe,ou eu mesmo garanto que não a faça,empurrando as porras das minhas balas pela sua garganta. — Engatilho minha belezinha em sua testa e a garota treme,fechando os olhos. — E se eu tivesse mesmo matado minha própria irmã,hein? Não tem medo que possa ser a próxima? Que se foda o juramento de irmandade entre todas nós,eu não ligo. Tenho sangue frio para estourar seus miolos aqui e agora mesmo.Suas pernas estão trêmulas e sua respiração está ofegante… Eu gosto. Gosto muito disso.Solto-a e guardo minha pistola,olhando para Carmín e peço desculpas. Saio daquele refeitório com meu sangue borbulhando nas veias. Subo as escadas até os estúdios de dança e me sento no meu lugar preferido. Nas enormes janelas com vitrais italianos,no alto,logo abaixo,a turma da tarde ensaia seus passos de balé. Scarlett designou cada uma de suas pedras preciosas para diferentes funções,sem deixar de exaltar que cada uma de nós já somos belas e a beleza é a arma mais perigosa que existe. Existem as preciosas para ataques aos inimigos e excelentes nas linhas frontais,existem as sensuais para distração de nossos rivais,e,por último,as pedras do encanto,que são como se fossem cristais com refletores capazes de nos cegar com tanto brilho: as dançarinas. Elas dançam com leveza e delicadeza,atingindo com força os nossos olhos,nos prendendo aos seus passos enquanto as pedras do ataque fazem o resto do tra
Fecho o caderno e checo meus olhos. Estão secos. Há mais ou menos oito ou seis anos atrás,essas palavras escritas por mim ainda causavam algum rebuliço por dentro. Mas não sinto mais nada. Meu coração tinha se tornado uma pedra como aquele rubi em minhas mãos. E eu não ligava.Olho para baixo e Esmeralda e as demais bailarinas não estavam mais lá. Eu estava sozinha. Desço da janela com o auxílio das escadas e rumo até os espelhos do estúdio. Estou mudada. Tingi meus cabelos castanhos-escuros há cinco anos de ruivo,comecei a fazer academia e ganhei mais corpo,enquanto moldava minha postura para algo amedrontante e intimidador. Deixei aquela Sofia morrer. E sabe,eu não me arrependo disso,e isso não me preocupa. E sei que é assustador.Nem mesmo as memórias em um papel embalam o coração de rubi.Saio do estúdio levando o caderno comigo. ***Rio de janeiro, Brasil27 de Abril,2012.Eu gostava de andar de bicicleta toda tarde pela nossa rua.
Dias atuais…Buenos Aires,ArgentinaFecho o caderno e amasso aquele bilhete que tinha escrito para entregar a Marcos e nunca o fiz. Procuro pela lata de lixo no quarto e não encontro,retorno para a cama e jogo o pedaço tosco de papel de volta no caderno velho. Nem sei o porquê de ter trago isso comigo para cá,devia ter deixado onde estava,onde é o seu lugar,sufocado no passado daquela garota franzina e fraca de anos atrás. Caminho para o banheiro e arranco a camisola de seda,passando pelas pernas,enquanto me inclino para girar a torneira para encher a banheira. Ponho o roupão e abro a embalagem dos sais e deposito dentro da água,formando espumas atrativas. Me sento na tampa do vaso sanitário e gasto o resto do tempo de espera até a banheira estar cheia de água para navegar pela internet.Abro meu Instagram e troco meu pessoal por uma conta fake que criei há uns dias para stalkear a vida perfeita da primeira-dama. Digito Soraya Albuquerque na barra de pesquisa e clico no perfil verific
Rio de Janeiro,BrasilO barulho do meu salto ecoa pelo chão do aeroporto enquanto vejo meu mais novo motorista carregar minha bagagem. Volto os olhos para o tablet e mal me concentro nas dezenas de coisas que Susy começa a falar toda empolgada. Na verdade estou vendo uns stories de Pâmella. A morena está em frente ao mar azul da praia de Copacabana segurando uma água de côco em que ela divide com dois canudos,certamente o do namorado. Está usando um bíquini verdinho e em seus olhos exibe seus óculos — uma juliete,devo complementar — que dão um charme a top model.— Rubi,este é Henrique — diz Susy,alegre. Maravilha,minha amiga de infância quer transar com o meu motorista e segurança.Retiro os óculos de sol do rosto e os guardo na bolsa enquanto estendo a mão para cumprimentar Henrique.— Olá,Henrique. Sou Rubi Jenner.— Olá,Srta. Jenner. Como já sabe,sou Henrique Fernandes. Seu motorista e segurança.Assinto.— Sim,Susy me mandou seus dados por e-mail. Algo que me chamou atenção em
Henrique seria o meu motorista e o cara de exterminador o meu segurança leal. Susy disse que Cris,como o cara mesmo pediu para nós o chamá-lo,é um dos melhores ali presente e que ficará mais aliviada se ele for comigo para todos os lugares. Peter também é meu segurança,mas é aquele tipo que ficará sempre à espreita,observando tudo de longe. Fui ao shopping e comprei todos os utensílios que precisarei para dar vida a minha nova personagem que futuramente será uma das melhores amigas de uma certa Albuquerque. Tive de comprar um calção tactel para o exterminador,já que ele se passará como meu amigo por causa de sempre estar comigo na maioria das vezes. Minha nova casa seria o apartamento no centro da cidade e próximo da faculdade em que Pâmella frequenta. Deixei os gêmeos encarregados com a missão de providenciar documentos falsos a Rubi Jenner e matriculá-la no curso de Direito para o próximo semestre e fazê-la ser do mesmo período que a patricinha metida a top model. Hanabi iria atrás
Pâmella me convida para me juntar a eles e aceito,procuro me manter o mais distante possível do tal Marcos Logan. Estendo um pano ao lado de Cristiano e aceito uma garrafinha de Guaraná que meu segurança teve o trabalho de ir buscar. Atencioso. Abro a garrafinha e dou o primeiro gole. Percebo o olhar do loiro encabulado comigo,mas ele sorri e olha para a namorada que conta algo sobre sua viagem à Disney ano passado com o namorado. Sinto vontade de revirar os olhos com a chatice da menina riquinha e tento entrar no personagem de Rubi Jenner que gosta dessas futilidades. Meu celular vibra e visualizo a mensagem de Camilla:Camila: Criei seu novo perfil no Instagram como “rubijenner”.Rubi: Perfeito!Camila: Poste sua primeira foto,Rubi.Uma foto… Não gosto de tirar fotos. Sempre que papai pedia para tirarmos fotos em família,Soraya me cortava,ou, muitas das vezes,meu avô me cortava. Comecei a não gostar muito da imagem de mim mesma,e embora já se faça muitos anos e eu tenha superado alg
Cristiano me acompanha até meu apartamento por mais que tenha dito para que ele ficasse com Peter lá fora ou que fossem juntos comer algo em algum lugar e jogarem conversa fora,mas o robótico não disse nada e continuou me perseguindo ao elevador,nos corredores e agora está parado em frente a minha porta enquanto destranco-a. Não gosto de ser observada,por mais que a Euforia tenha me preparado para qualquer coisa. Confio plenamente que se caso a máfia brasileira descubra que estou viva e venha atrás de mim,de que posso lidar com eles e proteger a minha vida. Essa ideia de segurança foi obra inteiramente de Susy e Scarlett com suas neuras. Ninguém sabe que estou viva. E posso cuidar de mim mesma. Não sou uma donzela em perigo que precisa de um príncipe ou seja lá o que esse exterminador possa ser,sou capaz de trocar uns tiros com os tiras e escapar.Entro no apartamento e tento fechar a porta,mas Cristiano impede com seus pés e invade a minha casa. Fico boquiaberta. O robótico se senta
Mais tarde,após muitas bebedeiras,o povo desmaia no sofá da sala,exceto por Cristiano que me ajuda a carregar Susy que estava jogada no meio do corredor e a colocamos em um dos quartos de hóspedes. Ela começa a roncar parecendo um porco e não consigo não rir. Fechamos a porta e me despeço de Cristiano que ruma para o quarto ao lado. Caminho para o meu e tranco a porta. Me jogo na cama sem sono e me remexo nela,até que por fim decido abrir minhas malas e pegar o maldito diário. Lembro que comecei a escrever essas cartas para suprimir a solidão que sentia e,de alguma forma,Marcos me parecia o único elo que ainda tinha com a minha vida antiga. Sei que existia Susy,mas ela era minha amiga da escola,não morava na minha rua tampouco conviveu com a minha família. Marcos tinha isso. Era o nosso amigo. Era o amigo de Ágata. Era o meu crush. Papai gostava dele.Me deito na cama e abro o diário,virando as páginas para o meu segundo relato em meio aos meus dias de treinamento na Euforia.02 de Fe