Assim que o advogado terminou a leitura, a sala se tornou um completo silêncio. Aquilo durou apenas alguns segundos, até que Wendy soltou uma gargalhada alta e estridente, fazendo com que todos os seus irmãos a olhassem.
— Muito bom. — ela diz, ainda rindo. — Eu não sei com qual intuito vocês fizeram essa pegadinha comigo, mas foi boa.
— Pegadinha? — Pietra pergunta, encarando sua gêmea.
— Wendy, nós não temos nada a ver com isso.
Ao perceber que seus irmãos mantinham o semblante sério, tão confusos quanto ela com aquele final de testamento, ela se vira para o advogado.
— Então foi uma pegadinha do meu pai. Não foi, Guilhermo?
Guilhermo não precisava reler aquele documento, para responder à pergunta de Wendy. Ele era advogado da família há tantos anos, que esteve em todas as reuniões que Oliver teve. Principalmente aquela em que fora incluído o adendo do testamento.
— O seu pai sempre foi um homem muito sério e odiava brincadeiras sem graça. O testamento é válido. Cada lacuna dele.
Wendy arrastou a cadeira e andou até Guilhermo, arrancando a folha da mão dele. Ela ignorou todo o começo e focou apenas no último parágrafo.
Com um adendo, Wendy só poderá herdar tudo o que lhe deixei, com uma única condição. Desde a leitura desse testamento, ela terá o prazo de uma semana para se casar com Ethan Blackwell e se manter nesse casamento por pelo menos um ano. Só então, ela terá todo o acesso ao que lhe é por direito.
— Meu pai me odiava tanto a esse ponto? — ela murmura, encarnado a assinatura do falecido no final da filha. — Por que ele faria isso? — Wendy olha para o advogado novamente. — Por que ele fez isso?
— Presumo que eu não possa te dar essa resposta. Mas talvez devesse ligar para o seu futuro marido e descobrir.
— Eu não vou me casar com ninguém! — Wendy exclama e se vira para Theo, que permanecia imóvel. — Theo! Fala alguma coisa.
— O que...
— Eu vou contestar esse testamento! Não posso?
— Olha... você até pode, mas... — Guilhermo faz um suspense, levando todos os herdeiros a ficarem ansiosos. — os bens do seu pai ficarão retidos e ninguém poderá pegar o que lhe é por direito, até acabar o processo.
Provando que gêmeas pensam e dão chiliques ao mesmo tempo, Chloe e Pietra arrastam a cadeira e protestam:
— NEM PENSAR.
— Você tem noção de quanto tempo eu sonho com a mansão a beira mar? — Pietra questiona.
— Papai me deixou uma fortuna para investir na minha galeria de arte! Não, Wendy. Você não vai contestar nada.
— E o que querem que eu faça? — ela olha para suas irmãs intercaladamente. — Não posso me casar com um desconhecido. Não quero!
— Bem, se você vai se casar ou não, não é problema nosso. — Chloe diz, pegando em sua bolsa que estava na cadeira. — O que você não pode e não vai fazer, é tirar tudo o que é nosso por direito, só porque o papai lhe castigou por ter sido uma filha ruim.
Chloe sai do escritório, seguida por sua gêmea e deixa Wendy boquiaberta com a fala de sua irmã. Theo se levanta para consolá-la, ao mesmo tempo em que o advogado retira um cartão de seu bolso.
— Não sei qual será sua decisão, mas aqui está o telefone do senhor Blackwell. — vendo que Wendy não se moveu para pegar o cartão, Guilhermo o coloca em cima da mesa. — Lembre-se, senhorita Wendy. Tem uma semana para se casar ou sua herança será doada para instituições de caridade.
Wendy estava segurando o choro, pois se recusava demonstrar fraqueza na frente de qualquer pessoa.
— Theo... — ela murmura, quando seu irmão lhe oferece um abraço. — O que eu vou fazer?
— Não sei. O que você está sentindo?
— Ódio. Ódio do papai. Ódio desse cara que eu não faço ideia de quem é... aliás, você o conhece?
— O sobrenome não me é estranho, mas acho que nunca o vi.
— É loucura concordar com isso. Não é?
Wendy sabia que a resposta era sim. Até porque, que pessoa em sã consciência aceitaria se casar com um completo estranho?
— Wendy, você precisa ponderar as coisas. Pelo que você me contou quando estávamos vindo para cá, dinheiro é tudo o que você precisa no momento. Eu até cogitaria lhe dar uma parte da minha herança, mas eu tenho certeza de que Oliver Montenegro colocou alguma cláusula que proíba isso.
— Então ou eu me caso com esse sei lá quem, ou vou morar debaixo da ponte.
— Olha, você tem uma semana para o casamento. Que tal eu ligar para esse Ethan e marcar uma reunião amanhã?
— Será? Você vai estar lá? — Theo afirma com a cabeça. — Tudo bem. Liga.
Theodore pega o cartão e disca o número. No terceiro toque um homem atende. Bastou Theo dizer seu sobrenome, para que a reunião fosse aceita no mesmo instante.
— Ele disse que amanhã estará aqui as dez da manhã e espera poder tomar um café da manhã com você.
— De manhã? Não sei se consigo chegar aqui a essa hora...
— Você dorme aqui, maninha. — Theo coloca o braço em volta do pescoço de Wendy e a puxa para fora do escritório. — Seu quarto continua no mesmo corredor. Bem do lado do meu.
[...]
A noite de Wendy foi mais longa que o normal. Mesmo tendo tido uma refeição completa no jantar, com direito a sua sobremesa favorita, ela não conseguia tirar a estupida ideia de casamento da cabeça.
Como ainda mantinha o mesmo corpo de quando deixou a casa da família, Wendy pegou uma roupa aleatória no guarda-roupa e desceu. Ao ver que a sala de jantar estava vazia, Wendy questionou a uma das empregadas sobre o café da manhã.
— Não entendi o motivo de você querer tomar café da manhã no jardim. — ela diz para Theo, assim que se senta na mesa.
— As gêmeas tomam café no quarto, mas fazem yoga na sala da frente as onze. Você não quer que elas fiquem olhando tudo. Ou quer?
— Bem pensado.
Os irmãos tomavam o desjejum em completa harmonia, dividindo algumas boas histórias de quando ficaram afastados. No momento em que ela estava prestes a questionar o atraso do noivo desconhecido, um pigarro forte soa atrás deles.
Wendy se vira no exato instante em que o homem para em sua frente.
— Olá. — ele diz, sem sorrir. — Sou Ethan Blackwell.
A mulher sente que há algo de familiar naquele homem tão intrigante, mas no momento em que ele retira os óculos escuros e a encara fixamente, Wendy sente sua mente explodir com lembranças adormecidas.
Olhos verdes.
Londres, 2019. — Não é possível. Vazio? — Totalmente vazio. — Não pode ser! — Oliver arrasta sua cadeira e se levanta, caminhando de um lado para o outro de sua sala. — Nós fundamos a primeira e única vinícola de vinho em Londres. Nossos cofres não podem estar vazios! — Eu entendo sua frustração, Oliver. Parece inacreditável que nossos cofres estejam vazios, especialmente considerando todo o trabalho duro que investimos na fundação da vinícola. No entanto, é importante mantermos a calma e abordarmos a situação de forma racional. — Primeiro, como isso aconteceu? Será que houve algum problema contábil ou financeiro? Será que houve alguma fraude ou erro? Aidan, o secretário e braço direito de Oliver, olha diretamente para Guilhermo, o advogado e pondera. Ele tinha certeza que seu chefe não iria gostar do real motivo. — O que foi? — Oliver questiona, notando a troca de olhares entre os outros dois homens. — O que foi? Falem. — Bem, senhor... não houve nenhum erro. Foram apenas...
Londres, 2023. — O meu pai não faria isso. Theo diz, assim que Ethan termina o seu relato de como chegaram àquele acordo sobre o casamento por contrato com Wendy. Já ela, permanecia em silêncio e imóvel. E ao mesmo tempo que evitava enfrentar os olhos verdes dele, se questionava como um quarentão podia ser tão bonito quanto Ethan era. — Você trabalhava ao lado dele na fábrica, Theodore. Realmente acha que ele se importava com alguma coisa, tanto quanto com a vinícola? Wendy finalmente ergue o olhar para encarar Ethan, seus olhos azuis brilhando com uma mistura de tristeza e determinação. — Theo, eu sei que para você pode parecer difícil de acreditar, mas... Nosso pai nunca foi realmente presente. Ele sempre esteve obcecado com a Vinhos Montenegro e deixou muitas responsabilidades pessoais de lado. Eu cresci vendo isso, sentindo a falta dele. Aí quando a empresa esteve à beira da falência e ele poderia perder tudo o que mais amou, papai não hesitou em me vender. Theo suspira pro
Wendy e Ethan concordaram em se encontrar naquele mesmo dia, para determinar todos os próximos passos. Ele enviou um carro de aplicativo para buscá-la e levá-la até o restaurante mais chique da cidade. Antes de entrar no restaurante, Wendy se olhou no vidro do lugar e teve certeza de que seria julgada pela sua escolha de roupa. Jeans e moletom não parecia ser o modelito que os clientes daquele lugar usariam. — Olá... — a recepcionista a encara de lado. — Tem reserva? — Blackwell? É. Ethan. A recepcionista sai de trás do balcão para direcionar Wendy até a mesa em que Ethan está, mas ela não faz isso sem antes dar uma boa encarada na garota. Wendy sente-se desconfortável com o olhar da recepcionista, mas mantém a compostura e a acompanha até a mesa onde Ethan está sentado. Ela dá um sorriso nervoso ao se aproximar. — Desculpe a demora. O trânsito estava terrível. — Wendy cumprimenta-o, tentando disfarçar sua insegurança. Ethan olha para Wendy, notando sua expressão preocupada e o
Após o almoço, Ethan se propôs a levar Wendy de volta para o seu apartamento. Eles não trocaram uma palavra sequer durante o caminho. Ethan permaneceu com a cara enfiada no celular, enquanto a mulher se perguntava o que iria comer a noite. — Ainda hoje alguém virá trazer opções de vestidos para você escolher. — ele diz, sem olhar para ela. — Não acha que eu deveria saber mais informações sobre amanhã? Como onde será... o horário. Ethan lançou um olhar de relance para Wendy, seus olhos carregados de desinteresse. — Escolha o que quiser, Wendy. Não faz diferença. Seu irmão e o advogado da sua família só estarão lá, porque precisamos de testemunhas. Wendy sentiu um nó no estômago com a falta de interesse de Ethan e a forma desinteressada com que ele abordava os detalhes do casamento. Ela queria que fosse algo mais significativo, mesmo que fosse apenas um casamento por contrato. — Não é porque esse casamento é mera formalidade e minha opinião não é válida para nada, que eu não
Não era dez da manhã ainda, quando a campainha do apartamento de Wendy começou a soar como uma sinfonia. Ela abandonou suas cobertas extremamente irritada e foi até a porta, louca para gritar com quem estava do outro lado. — Chegamoooos! — Pierre cantarola, assim que Wendy abre a porta. — Vamos! Entre todos. Há bastante espaço na sala. — O que é tudo isso? Wendy questiona, ao ver diversas pessoas desconhecidas tomando posse de seu apartamento. Enquanto alguns improvisavam um salão de beleza próximo a janela, outros arrumavam uma farta mesa com diversos alimentos e bebidas, deixando tudo em um completo caos. — O que está acontecendo aqui? Eu não autorizei tudo isso! — Wendy exclama, sua irritação evidente em sua voz. Pierre Dubois se aproxima, com um sorriso presunçoso no rosto e começa a enrolar o cabelo escorrido de Wendy, em seu dedo. — Queridinha, você não precisa autorizar nada. O seu noivo nos enviou para transformar você em uma noiva digna e tentar deixá-la bonita. Ele até
— Você ainda pode desistir. — Theo murmura para Wendy, ao vê-la paralisada na porta do apartamento de Ethan. — Nós damos um jeito. Wendy olha nos olhos de seu irmão, apreciando seu apoio incondicional. Por um momento, ela considera a possibilidade de desistir, mas a determinação toma conta de seu coração. Ela balança a cabeça, transmitindo a decisão tomada. — Theo, eu entendo que esteja preocupado comigo, mas já tomei minha decisão. Preciso fazer isso por mim e pela nossa família. Eu vou entrar nesse apartamento e cumprir com o compromisso que foi estabelecido. Theo suspira novamente, resignado, mas respeitando a escolha de sua irmã. Ele dá um abraço apertado em Wendy, desejando-lhe coragem e felicidade. Enquanto Wendy se aproxima da porta do apartamento de Ethan, seu coração bate acelerado. Ela respira fundo e toca a campainha, esperando com uma mistura de ansiedade e determinação. Após alguns instantes, a porta se abre, revelando Ethan parado diante dela. Ethan, alto e elegante
Logo que o juiz de paz deixa o apartamento, Ethan surge com um contrato para que Wendy assine. — Deixe o advogado dar uma lida e revisar, antes que você assine. — ele diz, esticando o papel na direção de Guilhermo. Em um rápido golpe, Wendy puxa a folha e se afasta um pouco. — Eu sou muito capaz de ler um documento. — Há termos que possam ser difíceis de você entender, Wendy. — Ethan responde, olhando o seu relógio de pulso. — Um advogado é a melhor pessoa para ler um contrato. Wendy o ignora totalmente e continua a ler o documento que está em mãos. Theo se vira para o novo cunhado e diz: — Wendy sabe o que faz. Ela fez advocacia. — Ah, é? — os olhos de Ethan brilham, ao olhar para Wendy novamente. Ele não imaginava que ela tivesse pretensões para sua vida. — Então me casei com uma advogada? — Quase. Ainda não fiz o exame da ordem. — Não? — Theo questiona, confuso. — Minha vida começou a afundar antes que eu fosse capaz de fazê-la. — Wendy coloca o contrato sobre a mesa e
Doze horas haviam se passado e Wendy permanecia dentro da cela. Cansada de esperar pelo seu direito de ligação, que lhe disseram só ser possível na manhã seguinte, ela estava adormecendo, quando os primeiros e tímidos raios solares passaram pelas pequenas grades da cela. — Ei, garota? — um guarda bateu com sua caneca de alumínio na grade, fazendo com que Wendy o olhe assustada. — Cinco minutos para fazer sua tão esperada ligação. Sentada na cama estreita, Wendy olhou em volta da cela. Era um espaço pequeno e frio, com paredes de concreto desgastadas e uma única janela gradeada que oferecia uma vista limitada para o céu londrino. Os sons abafados da movimentação na prisão ecoavam pelos corredores, indicando que mais um dia estava começando. Wendy se perguntava o que o dia lhe reservava. Ela ansiava pelo momento de ligar para o único telefone que ainda lembrava. O da casa que cresceu. Os cinco minutos se passam e o mesmo guarda se aproxima para abrir a cela. — Você só pode ligar