Passaram-se muitos anos desde a última vez que Wendy tinha visto seu pai pela última vez. A vida a havia levado por caminhos diferentes dos planos que ele tinha para ela, e isso havia causado um distanciamento entre os dois. No entanto, agora, ela estava prestes a enfrentar uma visita ao cemitério da família para o enterro de seu pai.
Wendy estava nervosa enquanto dirigia pelo caminho familiar que a levava ao cemitério. A paisagem ao redor estava repleta de memórias de sua infância, as quais havia tentado suprimir ao longo dos anos. Mas agora, elas vinham à tona com força total.
Ao chegar ao cemitério, Wendy sentiu um aperto no peito. O ambiente tranquilo e sereno transmitia uma sensação de solenidade, ecoando o peso do momento que estava por vir. Ela desceu do carro que lhe fora enviado e respirou fundo, buscando coragem para enfrentar a situação.
Ao adentrar o cemitério, Wendy caminhou entre os túmulos da família. Cada lápide era um lembrete tangível de suas raízes, uma conexão com o passado que ela havia deixado para trás. O silêncio era opressivo, e ela podia ouvir apenas seus próprios passos, acompanhados pelo sussurro do vento.
Finalmente, Wendy chegou ao local onde seu pai seria sepultado. A sepultura estava cercada por parentes e amigos próximos, todos reunidos para prestar suas últimas homenagens. Ela não ousou de aproximar, ansiando alguma represália daqueles que não via há tanto tempo.
Durante a cerimônia, as palavras do pastor pareciam distantes para Wendy. Sua mente estava ocupada com uma enxurrada de lembranças e emoções conflitantes. Ela recordou os momentos felizes que compartilharam juntos, mas também as divergências e desentendimentos que os afastaram.
Enquanto o caixão de seu pai era baixado à terra, Wendy sentiu uma mistura de tristeza e arrependimento. Ela lamentou as oportunidades perdidas de reconciliação, de construir uma relação mais próxima com seu pai. Agora, era tarde demais para consertar o passado.
Wendy esperou que todos se despedissem, ficando por último para fazer o mesmo. Quando chegou sua vez, Wendy se aproximou da sepultura com seu coração pesando de dor e remorso. Ela fez uma breve oração silenciosa, buscando encontrar paz em meio à complexidade de suas emoções.
Ao fim do enterro, Wendy caminhava para fora daquele cemitério, desejando que o motorista a levasse de volta para a sua casa. Quando estava chegando no enorme portão da saída, ela encontrou alguém que um dia foi seu melhor amigo.
— Wendy.
— Oi, Theo.
Theodore Montenegro, irmão cinco anos mais velho que Wendy e braço direito do falecido Oliver. O único dos três irmãos de Wendy, a continuar um contato com a garota, após ela decidir seguir seu caminho sozinha.
Os dois trocam um abraço longo, repleto de saudade e dor pela perda do pai.
— O que aconteceu com seu celular? — ele pergunta, quando se afastam. — Quando falei com Benjamin, ele disse que vocês tinham terminado e que não tinham contato... achei que você não viria.
— Ah, Theo... é uma longa história.
— Então você me conta no caminho de casa.
Theo passa o braço em volta do pescoço da irmã e a puxa na direção de seu carro, sobre o olhar de algumas pessoas ranzinzas.
— Que casa?
— A nossa, Wendy.
— A do papai que você quer dizer. — Theo abre a porta do carro para sua irmã. — Aliás, por que vamos para lá?
— O que aquele seu namorado te contou? Eu falei que após o enterro nós iriamos para casa, pois teria a leitura do testamento.
Ainda absorvendo aquela última palavra, Wendy espera seu irmão entrar no carro, para perguntar:
— Ele me incluiu no testamento?
— Apesar de você ter sido a rebelde que não quis cuidar da fábrica como todos os outros e resolveu ser advogada, você sempre foi a filhinha dele, Wendy. Papai jamais deixaria você sem nada. — ela sorri de lado, mas de forma melancólica. — Agora me conta tudo o que aconteceu com o Benjamin.
Eram quinze minutos de distância do cemitério até a casa em que Wendy cresceu com os irmãos. Theo não conheceu o namorado de sua irmã pessoalmente, mas foi capaz de nutrir um ódio mortal ao saber das coisas que aconteceram.
Ao chegarem na mansão, a mente de Wendy divaga com as lembranças de sua vida por ali. Ela se obriga a não reviver a última briga com seu pai, quando entra em seu antigo escritório.
— Eu não acredito que ela está aqui! — Chloe Montenegro revira os olhos e se vira na direção contraria da porta.
— Claro que ela está aqui. Wendy tem tantos direitos quanto você.
— Não deveria, já que ela abdicou de tudo, quando resolveu se mandar de casa.
— Pietra cala a boca. — Theo intervém a fala da outra irmã. Chloe e Pietra eram gêmeas e insuportáveis. — Ela está aqui porque o papai pediu. Ele mandou chamar todos os filhos. Então se puderem fazer silêncio, o advogado começará a leitura.
As gêmeas – que estavam sentadas uma ao lado da outra – cruzaram os braços e se viraram na direção do advogado da família. Ele esperou apenas que Theo e Wendy ocupassem as outras cadeiras vazias, para ler o documento em suas mãos.
Eu, Oliver Montenegro, sendo de mente sã e em pleno uso de minhas faculdades mentais, declaro este documento como meu testamento válido e definitivo. Por meio deste testamento, estabeleço a divisão de minha fortuna entre meus amados filhos Theodore, Pietra, Chloe e Wendy, de acordo com os seguintes termos:
1: Nomeio meus quatro filhos como meus únicos herdeiros e beneficiários de todos os meus bens, ativos, propriedades e investimentos, conhecidos coletivamente como minha fortuna, independentemente de sua natureza ou localização.
2: Minha fortuna avaliada em mais de cinco bilhões de euros, será dividida igualmente entre meus quatro filhos, Theodore, Pietra, Chloe e Wendy. Cada filho receberá um quarto do total de meus ativos líquidos.
3: Além da divisão igualitária de minha fortuna, gostaria de fazer as seguintes disposições específicas:
a) Para Theodore, deixo minha vinícola principal, juntamente com todos os vinhedos e instalações relacionadas. Também deixo a ele minha vasta coleção pessoal de vinhos raros, como reconhecimento por seu interesse e dedicação ao negócio familiar.
b) Para Chloe, deixo uma quantia em dinheiro considerável, a fim de apoiar sua paixão pela arte e permitir que ela explore seus talentos criativos. Além disso, Chloe terá direito a uma propriedade específica de minha escolha, que será designada em um documento separado.
c) Para Pietra, deixo minha mansão à beira-mar, juntamente com todas as propriedades e pertences relacionados a ela. Além disso, Pietra receberá uma quantia generosa em dinheiro para investir em seus próprios empreendimentos e aspirações.
d) Para Wendy, deixo uma quantia significativa em dinheiro para apoiar sua educação e desenvolvimento pessoal. Wendy também terá direito a uma participação igualitária na empresa de distribuição de vinhos associada à minha vinícola
Com um adendo, Wendy só poderá herdar tudo o que lhe deixei, com uma única condição. Desde a leitura desse testamento, ela terá o prazo de uma semana para se casar com Ethan Blackwell e se manter nesse casamento por pelo menos um ano. Só então, ela terá todo o acesso ao que lhe é por direito.
Assim que o advogado terminou a leitura, a sala se tornou um completo silêncio. Aquilo durou apenas alguns segundos, até que Wendy soltou uma gargalhada alta e estridente, fazendo com que todos os seus irmãos a olhassem. — Muito bom. — ela diz, ainda rindo. — Eu não sei com qual intuito vocês fizeram essa pegadinha comigo, mas foi boa. — Pegadinha? — Pietra pergunta, encarando sua gêmea. — Wendy, nós não temos nada a ver com isso. Ao perceber que seus irmãos mantinham o semblante sério, tão confusos quanto ela com aquele final de testamento, ela se vira para o advogado. — Então foi uma pegadinha do meu pai. Não foi, Guilhermo? Guilhermo não precisava reler aquele documento, para responder à pergunta de Wendy. Ele era advogado da família há tantos anos, que esteve em todas as reuniões que Oliver teve. Principalmente aquela em que fora incluído o adendo do testamento. — O seu pai sempre foi um homem muito sério e odiava brincadeiras sem graça. O testamento é válido. Cada lacu
Londres, 2019. — Não é possível. Vazio? — Totalmente vazio. — Não pode ser! — Oliver arrasta sua cadeira e se levanta, caminhando de um lado para o outro de sua sala. — Nós fundamos a primeira e única vinícola de vinho em Londres. Nossos cofres não podem estar vazios! — Eu entendo sua frustração, Oliver. Parece inacreditável que nossos cofres estejam vazios, especialmente considerando todo o trabalho duro que investimos na fundação da vinícola. No entanto, é importante mantermos a calma e abordarmos a situação de forma racional. — Primeiro, como isso aconteceu? Será que houve algum problema contábil ou financeiro? Será que houve alguma fraude ou erro? Aidan, o secretário e braço direito de Oliver, olha diretamente para Guilhermo, o advogado e pondera. Ele tinha certeza que seu chefe não iria gostar do real motivo. — O que foi? — Oliver questiona, notando a troca de olhares entre os outros dois homens. — O que foi? Falem. — Bem, senhor... não houve nenhum erro. Foram apenas...
Londres, 2023. — O meu pai não faria isso. Theo diz, assim que Ethan termina o seu relato de como chegaram àquele acordo sobre o casamento por contrato com Wendy. Já ela, permanecia em silêncio e imóvel. E ao mesmo tempo que evitava enfrentar os olhos verdes dele, se questionava como um quarentão podia ser tão bonito quanto Ethan era. — Você trabalhava ao lado dele na fábrica, Theodore. Realmente acha que ele se importava com alguma coisa, tanto quanto com a vinícola? Wendy finalmente ergue o olhar para encarar Ethan, seus olhos azuis brilhando com uma mistura de tristeza e determinação. — Theo, eu sei que para você pode parecer difícil de acreditar, mas... Nosso pai nunca foi realmente presente. Ele sempre esteve obcecado com a Vinhos Montenegro e deixou muitas responsabilidades pessoais de lado. Eu cresci vendo isso, sentindo a falta dele. Aí quando a empresa esteve à beira da falência e ele poderia perder tudo o que mais amou, papai não hesitou em me vender. Theo suspira pro
Wendy e Ethan concordaram em se encontrar naquele mesmo dia, para determinar todos os próximos passos. Ele enviou um carro de aplicativo para buscá-la e levá-la até o restaurante mais chique da cidade. Antes de entrar no restaurante, Wendy se olhou no vidro do lugar e teve certeza de que seria julgada pela sua escolha de roupa. Jeans e moletom não parecia ser o modelito que os clientes daquele lugar usariam. — Olá... — a recepcionista a encara de lado. — Tem reserva? — Blackwell? É. Ethan. A recepcionista sai de trás do balcão para direcionar Wendy até a mesa em que Ethan está, mas ela não faz isso sem antes dar uma boa encarada na garota. Wendy sente-se desconfortável com o olhar da recepcionista, mas mantém a compostura e a acompanha até a mesa onde Ethan está sentado. Ela dá um sorriso nervoso ao se aproximar. — Desculpe a demora. O trânsito estava terrível. — Wendy cumprimenta-o, tentando disfarçar sua insegurança. Ethan olha para Wendy, notando sua expressão preocupada e o
Após o almoço, Ethan se propôs a levar Wendy de volta para o seu apartamento. Eles não trocaram uma palavra sequer durante o caminho. Ethan permaneceu com a cara enfiada no celular, enquanto a mulher se perguntava o que iria comer a noite. — Ainda hoje alguém virá trazer opções de vestidos para você escolher. — ele diz, sem olhar para ela. — Não acha que eu deveria saber mais informações sobre amanhã? Como onde será... o horário. Ethan lançou um olhar de relance para Wendy, seus olhos carregados de desinteresse. — Escolha o que quiser, Wendy. Não faz diferença. Seu irmão e o advogado da sua família só estarão lá, porque precisamos de testemunhas. Wendy sentiu um nó no estômago com a falta de interesse de Ethan e a forma desinteressada com que ele abordava os detalhes do casamento. Ela queria que fosse algo mais significativo, mesmo que fosse apenas um casamento por contrato. — Não é porque esse casamento é mera formalidade e minha opinião não é válida para nada, que eu não
Não era dez da manhã ainda, quando a campainha do apartamento de Wendy começou a soar como uma sinfonia. Ela abandonou suas cobertas extremamente irritada e foi até a porta, louca para gritar com quem estava do outro lado. — Chegamoooos! — Pierre cantarola, assim que Wendy abre a porta. — Vamos! Entre todos. Há bastante espaço na sala. — O que é tudo isso? Wendy questiona, ao ver diversas pessoas desconhecidas tomando posse de seu apartamento. Enquanto alguns improvisavam um salão de beleza próximo a janela, outros arrumavam uma farta mesa com diversos alimentos e bebidas, deixando tudo em um completo caos. — O que está acontecendo aqui? Eu não autorizei tudo isso! — Wendy exclama, sua irritação evidente em sua voz. Pierre Dubois se aproxima, com um sorriso presunçoso no rosto e começa a enrolar o cabelo escorrido de Wendy, em seu dedo. — Queridinha, você não precisa autorizar nada. O seu noivo nos enviou para transformar você em uma noiva digna e tentar deixá-la bonita. Ele até
— Você ainda pode desistir. — Theo murmura para Wendy, ao vê-la paralisada na porta do apartamento de Ethan. — Nós damos um jeito. Wendy olha nos olhos de seu irmão, apreciando seu apoio incondicional. Por um momento, ela considera a possibilidade de desistir, mas a determinação toma conta de seu coração. Ela balança a cabeça, transmitindo a decisão tomada. — Theo, eu entendo que esteja preocupado comigo, mas já tomei minha decisão. Preciso fazer isso por mim e pela nossa família. Eu vou entrar nesse apartamento e cumprir com o compromisso que foi estabelecido. Theo suspira novamente, resignado, mas respeitando a escolha de sua irmã. Ele dá um abraço apertado em Wendy, desejando-lhe coragem e felicidade. Enquanto Wendy se aproxima da porta do apartamento de Ethan, seu coração bate acelerado. Ela respira fundo e toca a campainha, esperando com uma mistura de ansiedade e determinação. Após alguns instantes, a porta se abre, revelando Ethan parado diante dela. Ethan, alto e elegante
Logo que o juiz de paz deixa o apartamento, Ethan surge com um contrato para que Wendy assine. — Deixe o advogado dar uma lida e revisar, antes que você assine. — ele diz, esticando o papel na direção de Guilhermo. Em um rápido golpe, Wendy puxa a folha e se afasta um pouco. — Eu sou muito capaz de ler um documento. — Há termos que possam ser difíceis de você entender, Wendy. — Ethan responde, olhando o seu relógio de pulso. — Um advogado é a melhor pessoa para ler um contrato. Wendy o ignora totalmente e continua a ler o documento que está em mãos. Theo se vira para o novo cunhado e diz: — Wendy sabe o que faz. Ela fez advocacia. — Ah, é? — os olhos de Ethan brilham, ao olhar para Wendy novamente. Ele não imaginava que ela tivesse pretensões para sua vida. — Então me casei com uma advogada? — Quase. Ainda não fiz o exame da ordem. — Não? — Theo questiona, confuso. — Minha vida começou a afundar antes que eu fosse capaz de fazê-la. — Wendy coloca o contrato sobre a mesa e