Olhares...

Renê

   Quando meus olhos se cruzaram com a figura da bela morena em pé em frente a minha casa, confesso que me senti surpreendido. Não esperava que fosse a bela moça que vi organizando a mesa de jantar na casa do meu amigo. Senti uma certa ansiedade em me imaginar dividindo a casa com ela, uma mulher tão linda. Eu não deveria ter esse tipo de pensamento, mas é algo inevitável. Ela demonstrou ser tímida enquanto conversávamos, não queria fazer contato visual comigo, mas sou um homem que gosta de conversar olhando nos olhos.

   Não gostei quando perguntou da minha esposa, sei que fui ríspido em minha resposta, afinal de contas como ela iria adivinhar que sou viúvo? Mas compreendi quando ela me disse que não teve tempo para conversar com a dona Nice. Raiva e indignação tomaram conta de mim quando me contou que ficou desde cedo caminhando por aí enquanto aguardava o horário combinado. Me frustrou imaginar que enquanto eu dormia, ela estava tão desamparada. A Bárbara é definitivamente uma pessoa horrível, posso imaginar o que essa moça passou com ela.

   Decidi me retirar para organizar algumas coisas antes de sair para o trabalho, achei prudente dar espaço para a moça se acomodar com privacidade. A verdade é que já desaprendi a ter uma presença feminina em casa. De agora em diante preciso ser cuidadoso, não posso mais ficar circulando pela casa pelado.

Algumas horas depois…

   Depois de organizar minha maleta e fazer algumas ligações, desci as escadas e fiquei bem surpreso com a organização da minha sala. Nem parece que tudo estava fora do lugar antes como se tivesse passado um furacão. As roupas que estavam por todos os lados, garrafas de bebidas e embalagens de fast food que descartei por alguns cantos da casa haviam desaparecido. Não tenho como negar que sou bem desorganizado e a maneira como tenho levado a vida, a arrumação da casa não tem sido prioridade para mim. Caminhei até a cozinha que estava vazia, segui até o final do corredor em direção a lavanderia. Em pé na porta visualizei Celine concentrada separando várias roupas para colocar na lavadora. Não consegui desviar meus olhos das curvas do seu corpo, seu bumbum avantajado e o vestido branco na altura das coxas mexeu com meu imaginário. Preciso ter foco aqui, a Celine mal chegou nessa casa e meus pensamentos não param. Não quero em hipótese alguma que ela se sinta mal comigo ou desrespeitada.

- Celine! - Ela se assusta com a minha presença e derruba várias peças. Fica sem graça, pede desculpas e eu a ajudo a recolher as roupas do chão.

- Preciso trocar mais algumas palavrinhas com você. - Disfarço meu olhar de interesse e a  chamo. Ela assentiu me seguindo até a cozinha.

- Não sei se você chegou a ver, mas minha geladeira está vazia e minha dispensa zerada, não tenho tido tempo para fazer compras, e geralmente sempre tenho optado por fast food. Sei que não é saudável, mas é o que tem dado certo para mim. - Ela me observa de forma atenta e em silêncio.

- Deixei um envelope com o dinheiro embaixo do meu laptop para que você possa fazer as compras- 

- O senhor deseja que eu compre algo em especial?

- Sinceramente não tenho nada em mente, faça como você achar melhor, se não for hoje não tem problema, descanse e deixe para amanhã.

Ela só acena com a cabeça concordando comigo. Começo a sair da cozinha, quando uma pergunta me vem à mente, é mais forte do que eu. Preciso saber…

Celine

A casa do homem está de cabeça para baixo. Já vi que terei muito trabalho por aqui. Comecei dando uma geral na sala. Havia uma quantidade absurda de roupas por todos os lados, fora a quantidade de embalagens de comidas descartadas no chão e sobre os móveis. O que o homem tem de bonito tem de bagunceiro.

   Mais bagunçada fico eu, quando ele me olha com aquele par de olhos verdes. Fico imaginando a quantidade de mulheres atrás dele. No hospital em que trabalha deve haver várias delas. 

   Ele é um homem muito cheiroso, eu estava quase cheirando uma camisa social dele quando ouvi sua voz grossa atrás de mim. Levei um susto tão grande que derrubei todas as roupas no chão. Fiquei com medo de ser pega fazendo isso, mal cheguei em sua casa, o que ele iria pensar de mim?.

  A dispensa está zerada e a geladeira também, será necessário fazer compras de supermercado, e pela quantidade de embalagens, é perceptível que ele não faz comida em casa. O que me fez pensar que ele deve ter um ótimo Dna, pois tem um porte atlético e não aparenta ter barriga.

Agora estou parada na cozinha esperando que ele me pergunte algo que não faço ideia do que possa ser. Ele é tão lindo, mas sua expressão carrancuda me assusta.

“Celine você tem namorado?” Quase engasguei com sua pergunta, acho que estou muito emocionada, não é como se ele tivesse algum interesse em mim.

“Não senhor!” Acho que minha voz acabou saindo um pouco aguda. Percebi que ele franziu as sobrancelhas.

“Me desculpe se estou sendo invasivo!” Mas te faço essa pergunta porque não quero que traga pessoas na minha casa, terá seu dia de folga para sair e se divertir como quiser.

   Engoli em seco! Ah se ele soubesse que minha vida sentimental sempre foi parada. Namorei dois trastes, nunca tive sorte em relacionamentos. Na minha atual situação, a minha última prioridade é ter um relacionamento, mas tenho fé que um dia dará tudo certo. Mesmo que eu tivesse alguém não traria aqui, afinal de contas tenho bom senso, não desrespeitaria meu local de trabalho ou trairia a confiança de quem me ajudou. Pois mesmo recebendo um salário sou grata por ter me aceito aqui. 

   Seu olhar era intenso sobre mim, senti um tom de ansiedade em sua voz como se tivesse urgência em ouvir minha resposta, mas após eu ter falado, seu semblante suavizou. Com certeza ele deve ter uma fila de mulheres que frequentam essa casa. Esse pensamento me irritou, mas para desviar o foco de algo que não é da minha conta, aproveitei e perguntei se usaria uniforme. Ele me disse que não era necessário, dispensa esse tipo de formalidades. Lembrei de imediato da dona Bárbara, foi sua primeira exigência quando entrei em sua casa. Pediu o número do meu celular e me disse que somente em casos urgentes eu deveria ligar ou enviar mensagens, já que é muito ocupado. Me avisou que eu poderia ir e voltar de táxi ao mercado, que tinha dinheiro suficiente no envelope.

 Antes de sair me passou a senha do alarme e me orientou como era feita a ativação. Avisou que retornaria no outro dia cedo já que hoje têm de plantão a noite toda. Estranhei ele sair de casa tão cedo. Optei por não perguntar, não é da minha conta.

   Se eu achei que a sala estava bagunçada, o quarto dele estava bem pior. Esse homem tem muita roupa, mas ele definitivamente não guarda no lugar certo. Entrei no closet e comecei a organizar as roupas por cor e estilo. Separei as roupas casuais, sociais, roupas de frio, cintos, gravatas e até relógios. Troquei a roupa de cama, e fiz uma boa faxina no local. O quarto que possui uma decoração masculina muito elegante em tons azuis ficou simplesmente perfeito depois de arrumado. O cheiro do perfume masculino está ainda pairava no ar mesmo após horas da partida do dono dele.

  Decidi procurar pelo tal laptop, esqueci completamente de perguntar onde estava, vou comprar algumas coisas hoje, já vi que não tem nada de comer nessa casa. Aproveitei sua ausência para explorar com mais tranquilidade toda a casa, que apesar de bonita é sem vida. Muitas caixas fechadas em alguns cômodos passavam o ar de nostalgia e mudança. 

   A curiosidade foi mais forte do que eu, acabei abrindo algumas caixas que estavam guardadas na dispensa. Encontrei um grande álbum de fotos e alguns porta-retratos. Meu olhar atento em todos os detalhes. Vi várias fotos dele sorridente ao lado de uma mulher loira de olhos claros. Nas fotos ele em nada se parece com o homem cansado e carrancudo que conheci hoje. Devolvi o álbum e as caixas para o canto que se encontravam, com um sentimento de tristeza, pensando no quão duro deve ter sido essa perda e tudo o  que passei em minha vida até chegar aqui.

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