A verdade não dita

Parte 2...

Aurora

— Minha filha querida.

Me virei e vi minha mãe, ao lado de um homem todo de branco. Acho que era um médico. Ele se aproximou de mim e pegou uma lanterninha fina, abrindo meus olhos e quase me deixando cega com aquela luz.

— Como ela está, doutor? - minha mãe ficou ao meu lado.

— As pupilas estão bem e os exames não mostram nada mais grave - ele suspirou parecendo aborrecido — Mas a senhora sabe que a polícia vai questionar o ocorrido. Sua filha está muito machucada.

A cara que minha mãe fez foi de nervosismo. Eu a conheço.

— Sim, eu sei - ela tentou dar um pequeno sorriso e olhou pra mim — É que minha Aurora é muito danada e não fica quieta - segurou meu braço — Foi mais um susto grande que ela nos deu, não foi, meu amor?

Eu entendi que ela queria que eu mentisse. Apertou meu braço de leve, só com um toque. Eu concordei com a cabeça e ainda assim, o médico me olhou de um jeito desconfiado.

— Nós temos alguns cães na casa - ela contou, meio sem jeito — E Aurora estava brincando com eles, quando um deles disparou e a puxou pela coleira. Ela caiu feio no chão e foi arrastada pela casa... Acabou caindo pela escada...

— Sei... - o homem enfiou as mãos nos bolsos — Bem, senhora Deluca, essas coisas podem acabar matando - ele olhou de um modo estranho para minha mãe — É sempre bom ter muito cuidado com crianças e esses tipos de animais. Uma hora a brincadeira pode acabar mal.

Vi o rosto de minha mãe ficar vermelho.

— Sim... É claro, o senhor tem razão - ela mexeu no cabelo de modo desajeitado — Mas meu marido vai resolver isso... E parar... De criar animais dentro de casa - minha mãe tentou passar confiança — Eu agradeço pela ajuda.

O médico me deu outra olhada e saiu. De imediato minha mãe deixou os ombros relaxarem e me olhou, com os olhos cheios de água.

— Meu amor, você está se sentido bem? Sente dor no corpo? - ela tocou minha testa — E a cabeça, dói muito?

— Dói sim, mãe - respondi com a voz fraca — Minhas costas e minhas pernas estão doendo muito - fiz uma careta de dor.

— Sinto muito, minha querida - me deu um beijo de leve na testa — Eu te amo muito - ela começou a chorar — Me desculpa por ser tão fraca... Desculpa por não poder ter forças pra te ajudar - a voz dela ficou rouca e baixa — Eu sou uma fraca mesmo...

Fiquei triste. Eu não gosto de ver minha mãe chorar. Então me lembrei do acontecido. Dos gritos dela, dos meus, de meu pai me dizendo coisas horríveis e da surra que ele me deu, usando aquela régua de madeira.

— Mãe... Cadê o pai?

— Ele está resolvendo a questão, querida - ela fungou, fazendo um carinho em minha cabeça — Não pense nele agora.

— Não quero que ele entre aqui, mãe - eu pedi, sentindo vontade de chorar também. Meu corpo todo estava dolorido.

— Ele não vai vir... - ela respirou fundo e segurou minha mão — Meu amor, eu tenho que... Te pedir uma coisa muito importante.

— O que é, mãe?

— Você viu que eu disse ao médico, que você tinha se machucado enquanto brincava com os cachorros... - ela esfregou — E é essa história que você deve contar, quando alguém perguntar o que houve, está bem, meu amor?

Eu franzi os olhos. Minha mãe queria que eu mentisse? Pra todo mundo?

— Mas, mãe...

— Minha filha, me escute - ela pegou minhas mãos entre as dela — Aurora, é muito, muito importante que ninguém saiba que seu pai machucou você... Ou que ele me machuca... Eu sei que é difícil eu te pedir isso, mas por favor minha filha, não conte nada a ninguém... Se ele souber que contamos o que fez para outra pessoa, ele é capaz de tudo... Ele pode... Nos matar.

Eu levei uns segundos para entender de verdade. Ele nos mata, foi isso que ela disse. Fiquei sem saber o que fazer. Era algo grave, eu sei disso, não sou tão pequena assim, mas se minha mãe queria que eu fizesse isso, então faria.

— Mãe, eu não quero que o...

— Aurora, por favor, por favor... - sua voz estava trêmula, baixa — Não diga nada a ninguém, me prometa que não vai falar e que vai repetir o que eu disse ao médico. Me prometa isso.

— Sim, senhora - apertei os lábios — Eu prometo que não conto nada.

— O que eu disse aqui vai ser nossa versão para todos, me entende? - eu abaixei a cabeça — E principalmente, não pode contar para seu tio Pietro. Ele vai ficar furioso com seu pai e ele vai descontar em nós duas.

Eu estava certa. A única pessoa que meu pai respeita e tem medo, é meu tio Pietro. Senti uma tristeza grande passar por mim e dei um suspiro cansado. Era muito triste ter que mentir e esconder que meu pai faz essas coisas com a gente. Não foi a primeira vez e meu medo é que continue e fique pior. Ele nunca me bateu da forma como fez agora.

— Mãe, isso é errado - ela levantou meu rosto segurando meu queixo — O tio Pietro e o tio Antônio não batem nas mulheres deles... E nem nas minhas primas.

Na verdade, nenhum dos dois é meu tio, é apenas o modo como eu os chamo. Tio Pietro é chefe do meu pai e tio Antônio é o advogado que ajuda meu pai.

— Eu sei, filha... Mas olha... Seu pai já me pediu desculpas - ela tentou sorrir, mas seu rosto ainda estava marcado pela tristeza — Ele teve um problema sério no trabalho e... E bom, ele bebeu um pouco mais e acabou perdendo a cabeça... Mas ele não vai repetir, ele me disse.

Eu não acredito nisso. Papai já machucou minha mãe outras vezes e ele também xinga ela de coisas feias e diz que vai embora.

Me sentia tão mal que eu não queria ver meu pai de novo. Queria que ele sumisse, que deixasse minha mãe em paz pra ela nunca mais chorar.

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