Anton
Meu andar apressado tem dois motivos muito específicos. Um deles ficou no quarto constantemente vigiado e com uma tranca especial. A mulher de olhar manso e ambarino, é dona de um dos rostos mais sensuais que eu já vi e isso na minha longa fila de mulheres exuberantes, é uma coisa e tanto. E se fosse só isso... A forma como meu corpo reagiu a proximidade do dela, o desejo que me corroeu, chegou a ser constrangedor.... e como se não bastasse todo esse drama...ainda tem o fato bizarro que ela me salvou... ou quase isso. Eu não esperava ser rastreado nesse país. A informação de onde Jakov estaria sendo internado era confidencial, mas não o suficiente pelo visto. Era para ser uma temporada tranquila, um lugar tranquilo, mas me vi diante de uma pistola, completamente desarmado. Quando a enfermeira entrou no quarto, minha mente já estava listando as diversas coisas que eu ainda não tinha terminado, que eu ainda queria concluir antes de realmente morrer. Não foi surpresa, que a vingança estivesse em primeiro lugar. Eu tenho contas muito altas a serem cobradas com Cielo, antes de conseguir descansar no inferno, pois não existem dúvidas de qual seria o destino para um homem como eu. Desde que assumi o lugar de meu pai, sendo um dos líderes mais jovens da família Volkov, eu não sei o que é dormir sem ter sangue manchando minhas mãos ou minhas decisões. Deixou de incomodar na primeira semana, afinal, meu pai sempre me dissera que temia o dia em que eu assumisse o seu lugar. “Há algo de doentio em você garoto.” Ele me dizia, sempre que enchia a cara. Hoje a quase dez anos de sua morte, eu não tenho como discordar dele. Fiz o que precisei, fiz o que queria e até o que não podia para manter o nome de minha família respeitada entre os mais poderosos, entre os mais fracos. Entro no elevador, o rosto de Eva, ainda muito presente em minha mente. A beleza dela nem é a questão, mas o óbvio fato que esconde algo. Eu poderia deixar isso tudo para lá. Eu poderia eliminar a mulher, cortar logo esse mal. Mas... Eva remexeu algo pouco comum em mim: a impulsividade. Há anos que não sinto o sangue correr solto pelas veias, a vontade de descobrir cada ponto delicado do corpo de uma mulher, fazê-la me dizer cada segredo, nem que eu a descarte depois disso, pois sei que é o que terei que fazer em um momento ou outro. Chego ao nível mais baixo do prédio que me pertence, respirando aliviado quando vejo a porta escura que indica o meu escritório. Aqui ao menos poderei fazer o que sei melhor. Abro a porta, vendo Nik, meu segundo em comando, digitando algo em seu celular, enquanto o executor frustrado está sentado, as mãos amarradas para trás, desacordado, os pontos sangrando no rosto e corpo, me indicando que Nik já começou a trabalhar nele. — Então? — pergunto, tirando a chave do bolso e o celular, os jogando em cima da mesa, enquanto me sento na cadeira atrás da mesa. — Falou fácil. Os Kavars, como sempre, mas gastaram pouco na contratação, considerando que o cara foi arriado por uma simples enfermeira. — Nik me informa, o desdém pelo executor claro, seus cabelos castanhos amarrados na nuca, claro, não querendo sujar os fios que tanto cuida. — Eu não estaria tão certo disso Nik. — Declaro, me lembrando de como os reflexos de Eva foram marcantes — Ele é um despreparado, sem dúvida, mas a garota sabia o que estava fazendo. Acho que até um de nós dois estaríamos em apuros com ela. — Hunn... verdade? — Nik pergunta e eu assinto — Mas você a apagou, não foi? Penso na minha reação ao desmaiar Eva, quando claramente ela foi pega de surpresa. Talvez ela até conseguisse se livrar do golpe, mas acredito que tenha ficado nervosa demais para pensar em algo. — Eu disse que poderíamos estar em apuros... não tenho certeza e nem vamos testar a teoria. — Declaro, sentindo-me um pouco possessivo com relação a moça. — Ela é sua, então? — Nik me pergunta, parecendo curioso, os olhos verdes nos meus. Mesmo ainda não sabendo o que quero realmente da garota, a resposta que sai por meus lábios é: — Sim.EvaAbro meus olhos devagar, a dor em minha garganta quando tento engolir me fazendo lembrar aos poucos, os eventos desastrosos. Eu salvei aquele filho da mãe e ele me apagou? Minha indignação é pausada, quando percebo que o teto revestido em madeira e a escuridão em meu entorno em nada se parece com o hospital. Ele não faria... faria? Me levanto, uma tontura me levando, mas estabilizo, tentando achar o interruptor do abajur ao meu lado. — Acordou. — Ouço uma voz grave, como o puro veludo me dizer, o sotaque russo, me dando uma vaga ideia de quem se trata. A luz se espalha ao meu redor, me mostrando detalhes do quarto sofisticado, a cama macia com um dossel em estilo clássico, me lembrando muito do passado. — O que quer de mim? — indago, sentindo o nervosismo permear minhas palavras. — Saber quem é você, seria um bom começo. — Ele me devolve a pergunta, o tom monótono não combinando com o ardor que vejo em seu olhar. — Não há muito para saber, senhor. — Digo, ouvindo meu timb
AntonNik assente, seu olhar voltando para o executor desmaiado na cadeira. — Já tirei tudo dele, quer fazer as honras ou deixa comigo? — ele me pergunta, retirando a sua faca de estimação, uma peça de coleção pavorosa, com o cabo branco, cheio de detalhes em dourado, girando em sua mão. Faço um sinal de despensa com a mão e ele entende. Nik pega um copo de agua no banheiro e quando volta, j**a com tudo na cara do executor, que mal consegue abrir os olhos inchados. Há uma sequencia de lamúrias e palavrões, enquanto o homem tenta entender onde está, o medo prevalecendo quando ele mira Nik, a faca ansiosa girando em sua mão, de novo e de novo. Nik tem complexo de diva e acredito que ele adore essa parte. — Por Favor... — O homem pede e eu perco o interesse nele de imediato. Já sei de cor o que acontecerá daqui para frente... Enquanto os sons gorgolejantes soam a minha frente, eu pego celular que pisca com o sinal de mensagens não vistas. As duas primeiras, eu ignoro, pois sei de
EvaIsso não pode estar acontecendo. De novo, não.Levou muito tempo para me afastar desse tipo de gente, desse tipo de vida. Não posso estar sendo imersa nisso tão profundamente.Meu olhar se desvia para a senhora atarracada, porém com uma estrutura óssea larga o suficiente para que eu tenha certeza do motivo de ter sido escolhida para me ajudar a arrumar a mala. Uma única mala.Ela separa algumas peças de roupa, deixando-as ao lado da cama, depois fecha a mala pequena.Seu olhar escuro e firme se concentra em mim.— A senhora pode tomar banho e se trocar. Se precisar de ajuda com o cabelo, também posso providenciar. — Ela diz, sem sutileza alguma sobre o estado caótico dos meus fios.Olho para as roupas na cama, sentindo a vontade de tomar um banho me dominar, mas não gosto do tom de ordem na voz dela. Minha teimosia vence quando respondo:— Estou bem, obrigada.Há um silêncio pesado no quarto. A mulher me olha primeiro como se eu fosse um inseto irritante, mas, depois de alguns seg
EvaIsso vai ser mais difícil do que imaginei.Tento mover o ombro, mas o corpo do segurança gigante, que agora sei se chamar Brann, prensa todo o meu lado esquerdo contra o estofado do carro. O espaço é mínimo, sufocante. Olho para o outro homem, Nick, que mexe no celular com as sobrancelhas franzidas. Ele me dá uma distância considerável, mas não me iludo, cada movimento meu está sendo monitorado.O carro freia um pouco mais bruscamente, e aproveito o balanço para me afastar de Brann o mais discretamente possível. Encosto a cabeça no banco, tentando acalmar os pensamentos. Sair daquele quarto depois de dias foi um alívio, mas a euforia se dissipou rápido quando percebi que já era noite.O pouco que vi me mostrou uma mansão luxuosa, isolada em meio a uma área florestal densa. Um frio percorre minha espinha.Eu nem sei se ainda estou no Rio de Janeiro.Pelo retrovisor, vejo pelo menos três carros saindo conosco, mas uma sensação amarga me preenche ao notar que Anton não está entre nós
EvaAcordar de um sono induzido nunca é uma experiência gentil. Há sempre uma névoa espessa entre o inconsciente e a realidade, e no meu caso, essa transição parece sempre vir acompanhada de pânico e violência.As pernas são as primeiras a reagir, um tranco seco que choca meus pés contra uma superfície macia. O carpete sob mim absorve o impacto, mas não suaviza o desconforto. Em seguida, meu tronco se ergue com brutalidade, os braços se lançam para frente, e a bile amarga sobe pela minha garganta. O coração martela contra o peito, bombeando sangue em disparada para o cérebro, rápido o bastante para me manter consciente, mas não lúcida.O quarto está em penumbra. Uma lareira crepita à minha frente, lançando sombras dançantes nas paredes. O calor que emana dela é quase reconfortante, mas o medo lateja mais alto que qualquer sensação agradável.— Mas o que… — Tento articular algo, mas minha língua está pesada, os pensamentos desordenados, atropelando-se dentro da cabeça. E então percebo:
EvaExistem dias bons, dias ruins, dias péssimos e dias como hoje.Olho pela quarta vez como o senhor de idade, os cabelos alvos como os lençóis que cobrem a cama em que está deitado, está retirando o soro do braço. Estreito meus olhos, a minha paciência tendo uma luta boa com o dever, à medida que me aproximo.— Senhor Francis, esse já é o quarto que o senhor tira. — Repreendo, meu tom suave em nada equivalendo com a irritação que me domina.Ele me olha com uma expressão desgostosa, como se eu fosse a culpada de ele estar em seu terceiro ataque cardíaco.— Maria, eu já lhe avisei que eu estou bem. — Ele me diz, claro, mais uma vez não me reconhecendo.Eu já trabalhei na emergência, na pediatria e até na oncologia, mas para mim, não há nada mais desgastante do que trabalhar na geriatria.É cruel ver a mente das pessoas que já foram ativas se deteriorando pouco a pouco.Odeio isso.— Meu nome é Eva, senhor Francis. — Digo firme, vendo a confusão se espalhar em seu rosto — Vamos trocar
Eva“O líquido escarlate escorria por entre os meus dedos, algo que não vinha me incomodando em mais de seis anos nesse ramo, mais de seis anos a cargo da morte e do que ela poderia me proporcionar.Não fazia sentido estar tão abalada ao olhar para um rosto já sem vida, mas então, por qual motivo eu estava assim?Deixei o corpo já inerte cair no chão com um baque pesado, desviando o olhar, me recusando a encarar aquela vida ceifada. Meu erro. Como em uma piada do destino, o rosto ao qual meus olhos se depositaram foram os dele.Cottelo. Ele inclinou a cabeça, os olhos escuros me mirando com descrença, como se não acreditasse que no que estava vendo.— É isso, Eva? — ele me perguntou, um sorriso de escárnio lhe escapando, enquanto ele se aproximava — Depois de tanto tempo, de tanta pompa, o que vejo nesses seus lindos olhos é culpa? Em meu estado de completa desconexão, eu não reagi quando ele pegou em meus cabelos com força bruta e virou meu olhar para o rosto sem vida no chão.— Is