Laura Stevens –As contrações vinham como ondas violentas e a cada nova dor, parecia que o chão fugia debaixo dos meus pés.Amanda tentava se manter firme, mas eu sentia o desespero nos olhos dela. Cada vez que eu apertava sua mão no banco do carro, ela soltava um suspiro trêmulo e dizia:—Já estamos chegando, aguenta só mais um pouco…Mas não era só o corpo que doía.Era o coração.A alma.A ferida aberta que queimava mais do que qualquer contração.Ele deveria estar aqui, mas ele estava em outro lugar.Com outra.A mão que deveria estar segurando a minha, estava tocando outra mulher naquele maldito avião.Não era só ausência. Era traição. Era mentira. Era covardia.Quando chegamos ao hospital, fui recebida por uma equipe médica que já estava em prontidão. Amanda gritava instruções, entregava documentos, e eu... eu só gemia, já sem conseguir falar, tentando manter os olhos abertos.Fui colocada em uma cadeira de rodas e levada às pressas.Tudo ao meu redor parecia girar em câmera len
Laura Stevens –A sala estava em silêncio agora. Só se ouvia o som suave do monitor cardíaco, o respirar lento de Tereza no bercinho ao lado, e o zumbido constante da minha cabeça tentando se acostumar com a ausência dele. Com a ausência daquilo que um dia eu jurei que era amor.Amanda dormia recostada no sofá ao fundo do quarto, exausta. E eu... eu apenas observava minha filha.Ela havia acabado de mamar e agora dormia com aquela expressão serena, de quem não conhece ainda a dor do mundo. Eu passei os dedos suavemente por sua bochecha e sorri, com o coração remendado às pressas por aquele pedacinho de gente.Foi então que a porta se abriu.Christian.Meu olhar se ergueu devagar e encontrei o dele. Estava cansado, abatido, como se tivesse corrido mil quilômetros para chegar até mim.—Amor... meu Deus, vocês estão bem? — Ele perguntou, entrando devagar, sendo cauteloso.Amanda, que estava ao meu lado, despertou com a voz dele e se levantou num pulo, olhando de mim para ele com uma expr
Christian Müller –Eu ainda não conseguia acreditar que tudo aquilo tinha tomado uma proporção tão grande.Quatro dias. Só quatro dias atrás, eu estava embarcando em um voo, pensando em como seria emocionante segurar minha filha nos braços. E agora... agora minha vida inteira parecia desmoronar diante dos meus olhos.Fechei os olhos e deixei minha mente me arrastar de volta, tentando entender onde tudo tinha começado a dar errado.Foi naquele dia, no aeroporto.Eu já estava prestes a embarcar, conferindo pela última vez as mensagens no celular, quando vi uma mulher a alguns metros de distância.Ela segurava a barriga, com a outra mão apoiada na poltrona, como se buscasse forças para ficar de pé. Ao lado dela, uma garotinha — devia ter uns cinco anos, no máximo — a olhava com preocupação.As duas tinham a pele dourada, os cabelos pretos e lisos. Pareciam chilenas, pelo sotaque e pelas roupas pesadas de lã que usavam para se proteger do frio cortante."Logo tudo vai melhorar, meu amor",
Christian Müller –O corredor do hospital cheirava a antisséptico e medo.Era um cheiro que entrava pelas narinas e se alojava direto no peito, misturando-se com a angústia que me corroía por dentro.Estava sentado em um dos bancos duros da sala de espera, com a cabeça baixa, tentando organizar a tempestade que girava na minha mente. Tudo parecia um borrão desde que eu recebera aquela ligação desesperada de Dominic. Minha filha. Minha mulher. Em risco. E eu... tão longe.Levantei os olhos quando vi Amanda se aproximar. Ela vinha a passos firmes, os braços cruzados à frente do peito, a expressão dura. As sobrancelhas franzidas denunciavam que ela não ia pegar leve. Eu já sabia o que vinha.— Você tem noção do que quase aconteceu? — ela disparou, sem cerimônias. A voz dela, normalmente firme, agora estava embargada de preocupação e raiva. — Se a sua filha não estivesse com um peso e tamanho bons, talvez agora estivesse numa incubadora... ou nem tivesse resistido.As palavras dela batera
Christian Müller –O quarto estava silencioso, iluminado apenas pela luz suave de uma luminária no canto. O som do monitor cardíaco e da respiração tranquila de Laura eram quase um mantra para o caos que ainda fervilhava dentro de mim.Entrei devagar, como se pudesse quebrar o pouco de paz que havia ali. Assim que atravessei a porta, ouvi um choramingo fino e baixo vindo do berço ao lado da cama.Minha filha.Dei alguns passos até ela, o coração acelerando ao vê-la tão pequena, tão perfeita, mesmo em meio a tanto tumulto.Seus bracinhos se agitavam, o rostinho vermelho pelo choro. Ela precisava de colo, de conforto. De mim.Peguei-a nos braços com todo o cuidado do mundo, como se fosse feita de vidro. Ela se aninhou contra o meu peito num movimento instintivo e aos poucos o choro foi diminuindo.— Você é tão linda... — murmurei, emocionado, admirando os traços delicados que começavam a se formar. Havia algo da Laura nela — o formato do queixo, o nariz pequeno — mas também vi um pouco
Christian Müller -O som agudo do choro da minha filha me arrancou de um cochilo leve.Abri os olhos devagar, piscando para afastar a névoa do cansaço. O quarto ainda estava mergulhado naquela luz fraca, mas agora o ambiente parecia mais denso, carregado. Meus músculos doíam, e a poltrona onde eu estava parecia ainda mais desconfortável do que algumas horas atrás.Me levantei rapidamente, indo até o bercinho.Ela chorava com força agora, o rostinho vermelho, os bracinhos agitados em busca de conforto. Peguei-a nos braços, sentindo o corpinho quente e trêmulo contra o meu peito.— Shhh... calma, minha pequena — murmurei, embalando-a suavemente.O choro diminuiu um pouco, mas ela ainda se contorcia, inquieta. De repente, ouvi um movimento na cama.Virei a cabeça e vi Laura se mexendo, despertando aos poucos. Ela piscou algumas vezes, confusa, até que seus olhos encontraram os meus. E, instantaneamente, o gelo entre nós se fez presente novamente.Ela se sentou na cama com dificuldade, ap
Laura Stevens –A luz suave do quarto misturava-se ao som calmo da respiração da minha filha adormecida nos meus braços. Eu acariciava devagar seus cabelos finos, sentindo aquele cheirinho de bebê que parecia uma mistura de amor e esperança.Christian estava sentado na poltrona ao lado da porta, com os olhos pesados e a expressão cansada. Eu podia sentir sua inquietação, mas, por ora, precisava de espaço. De tempo para processar tudo. E ele parecia entender isso.Pouco depois, Amanda entrou no quarto, trazendo consigo aquele ar leve que ela sempre carregava, mesmo nas situações mais tensas.— Vai tomar um café, Christian. Eu fico aqui com elas um pouquinho.Christian hesitou por um momento, como se não quisesse sair, mas acabou se levantando e se espreguiçando discretamente. Passou por mim devagar e por um breve instante nossos olhares se cruzaram.Senti o aperto no peito de novo, mas desviei, focando na neném.Ele saiu sem dizer nada, e o silêncio se instalou.Amanda fechou a porta s
Laura Stevens –Sair do hospital foi como atravessar uma fronteira invisível. Deixávamos para trás a angústia dos dias difíceis, mas ainda carregávamos o peso das emoções.Amanda caminhava ao meu lado, carregando a bolsa da bebê, enquanto eu embalava minha pequena nos braços, protegendo-a do vento suave da manhã.Assim que chegamos perto do estacionamento, meus passos vacilaram.O que eu via, e pegou de surpresa.Christian estava a poucos metros de nós, abraçado com uma menina.Ela tinha traços levemente puxados, a pele bronzeada e um sorriso tímido. Era magra, franzina e não parecia ter mais do que a idade do Nathan.Antes que eu pudesse reagir, meu olhar deslizou para o lado.Ali, ao lado de Christian, havia uma mulher. Também de pele morena, traços delicados e o mesmo ar cansado e gentil. Ela segurava um bebê enrolado em uma manta clara, como quem carrega o maior tesouro do mundo.Fui me aproximando devagar, sem entender nada do que estava acontecendo.Christian me viu chegando e i