Christian Müller –O quarto estava silencioso, iluminado apenas pela luz suave de uma luminária no canto. O som do monitor cardíaco e da respiração tranquila de Laura eram quase um mantra para o caos que ainda fervilhava dentro de mim.Entrei devagar, como se pudesse quebrar o pouco de paz que havia ali. Assim que atravessei a porta, ouvi um choramingo fino e baixo vindo do berço ao lado da cama.Minha filha.Dei alguns passos até ela, o coração acelerando ao vê-la tão pequena, tão perfeita, mesmo em meio a tanto tumulto.Seus bracinhos se agitavam, o rostinho vermelho pelo choro. Ela precisava de colo, de conforto. De mim.Peguei-a nos braços com todo o cuidado do mundo, como se fosse feita de vidro. Ela se aninhou contra o meu peito num movimento instintivo e aos poucos o choro foi diminuindo.— Você é tão linda... — murmurei, emocionado, admirando os traços delicados que começavam a se formar. Havia algo da Laura nela — o formato do queixo, o nariz pequeno — mas também vi um pouco
Christian Müller -O som agudo do choro da minha filha me arrancou de um cochilo leve.Abri os olhos devagar, piscando para afastar a névoa do cansaço. O quarto ainda estava mergulhado naquela luz fraca, mas agora o ambiente parecia mais denso, carregado. Meus músculos doíam, e a poltrona onde eu estava parecia ainda mais desconfortável do que algumas horas atrás.Me levantei rapidamente, indo até o bercinho.Ela chorava com força agora, o rostinho vermelho, os bracinhos agitados em busca de conforto. Peguei-a nos braços, sentindo o corpinho quente e trêmulo contra o meu peito.— Shhh... calma, minha pequena — murmurei, embalando-a suavemente.O choro diminuiu um pouco, mas ela ainda se contorcia, inquieta. De repente, ouvi um movimento na cama.Virei a cabeça e vi Laura se mexendo, despertando aos poucos. Ela piscou algumas vezes, confusa, até que seus olhos encontraram os meus. E, instantaneamente, o gelo entre nós se fez presente novamente.Ela se sentou na cama com dificuldade, ap
Laura Stevens –A luz suave do quarto misturava-se ao som calmo da respiração da minha filha adormecida nos meus braços. Eu acariciava devagar seus cabelos finos, sentindo aquele cheirinho de bebê que parecia uma mistura de amor e esperança.Christian estava sentado na poltrona ao lado da porta, com os olhos pesados e a expressão cansada. Eu podia sentir sua inquietação, mas, por ora, precisava de espaço. De tempo para processar tudo. E ele parecia entender isso.Pouco depois, Amanda entrou no quarto, trazendo consigo aquele ar leve que ela sempre carregava, mesmo nas situações mais tensas.— Vai tomar um café, Christian. Eu fico aqui com elas um pouquinho.Christian hesitou por um momento, como se não quisesse sair, mas acabou se levantando e se espreguiçando discretamente. Passou por mim devagar e por um breve instante nossos olhares se cruzaram.Senti o aperto no peito de novo, mas desviei, focando na neném.Ele saiu sem dizer nada, e o silêncio se instalou.Amanda fechou a porta s
Laura Stevens –Sair do hospital foi como atravessar uma fronteira invisível. Deixávamos para trás a angústia dos dias difíceis, mas ainda carregávamos o peso das emoções.Amanda caminhava ao meu lado, carregando a bolsa da bebê, enquanto eu embalava minha pequena nos braços, protegendo-a do vento suave da manhã.Assim que chegamos perto do estacionamento, meus passos vacilaram.O que eu via, e pegou de surpresa.Christian estava a poucos metros de nós, abraçado com uma menina.Ela tinha traços levemente puxados, a pele bronzeada e um sorriso tímido. Era magra, franzina e não parecia ter mais do que a idade do Nathan.Antes que eu pudesse reagir, meu olhar deslizou para o lado.Ali, ao lado de Christian, havia uma mulher. Também de pele morena, traços delicados e o mesmo ar cansado e gentil. Ela segurava um bebê enrolado em uma manta clara, como quem carrega o maior tesouro do mundo.Fui me aproximando devagar, sem entender nada do que estava acontecendo.Christian me viu chegando e i
Laura Stevens –Estar em casa novamente, por mais que eu não tenha passado muitos dias fora, foi como se uma sensação de alívio e leveza me cobrisse. Nada mais aconchegante do que estar de volta ao seu próprio lar.Assim que Christian abriu a porta, o cheiro familiar da nossa casa me envolveu como um abraço, e senti a emoção transbordar em mim.No instante seguinte, ouvi os passos apressados de Nathan ecoando pelo corredor. Ele surgiu na sala como um foguete, os olhos brilhando de ansiedade e felicidade. Meu coração quase não coube no peito.Antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, ele já corria na nossa direção.Christian se agachou ao lado dele, colocando uma mão firme em seu ombro e apontando para a bebê nos meus braços.— Campeão — disse ele, com a voz cheia de orgulho — essa é a nossa princesinha. A Tereza. Olha como ela se parece com você?Nathan arregalou os olhos, formando um perfeito "o" com os lábios, maravilhado. Eu me abaixei cuidadosamente, trazendo Tereza para mais per
Christian Müller –Nathan ria alto enquanto corria pela sala, puxando as peças da pista de corrida para perto de mim.Me sentei no tapete macio, pronto para ajudá-lo a montar aquele verdadeiro labirinto de curvas e descidas radicais. Era engraçado como meu pequeno era incansável; mesmo com tanta emoção rolando desde que Laura e Tereza chegaram, ele parecia mais energizado do que nunca.— Papai, essa parte aqui é a descida! — explicou Nathan, apontando para uma peça laranja curvada.— Isso mesmo, campeão — respondi, rindo. — Vamos fazer a maior pista de todas!Enquanto encaixávamos as peças, eu olhava para Nathan e sentia uma paz difícil de explicar. Minha família estava em casa. Completos. Tereza, tão pequena e frágil, e Laura, a mulher que lutou tanto para nos dar tudo isso. O amor que eu sentia por eles parecia maior que o próprio mundo.Nathan se inclinou para colocar um carrinho azul brilhante no topo da rampa recém-montada e, juntos, contamos até três para lançá-lo:— Um... dois.
Christian Müller –Eu ainda não conseguia acreditar no que estava vendo. E nem ouvindo.Naquele momento, meu peito se apertou. Como tudo pode ter chegado aquela situação? Por que ele estava com marcas no rosto e o que verdadeiramente aconteceu para que ele tenha mudado de ideia? – Aquelas perguntas estavam rodeando a minha mente.Eu fiquei parado ao lado da maca, com os braços cruzados, sentindo a raiva ferver sob a superfície da pele.Raiva dele, da situação e de mim. Principalmente de mim.Arthur não dizia nada. Fitava o teto com uma expressão vazia, a mandíbula tensa, como se estivesse pronto para aguentar qualquer golpe que viesse.Um velho reflexo de defesa.Suspirei pesado me virando para o olhar.— Você é mais teimoso do que eu lembrava — falei com a voz baixa, controlada.Ele virou o rosto devagar, me lançando um olhar cansado. Mas não respondeu.Me aproximei um passo, sem pressa. Não estava ali para forçá-lo a nada. Não adiantava.— Não vim para fazer discurso, Arthur. Não so
Christian Müller –A noite estava fria, mas não fazia muita diferença para mim. Eu já estava sendo envolvido pelo frio das minhas escolhas.Caminhei até o carro, joguei as chaves no banco do passageiro e me sentei atrás do volante, soltando um suspiro pesado.A verdade é que, no fundo, eu já esperava por aquilo. Já sabia que tudo estava indo bem demais para ser verdade.Arthur sempre teve esse talento para escolher os caminhos errados. Ele sempre optou pela rota mais fácil, pelo que o beneficiava.E, ainda assim, eu não conseguia virar as costas para ele. Não totalmente. Até porque, ao ver as marcas em seu rosto e ele ter tomado uma atitude tão drástica, me fez pensar que havia algo a mais envolvido nisso.Minha cabeça se encheu de repente. Várias possibilidades, e aquilo me frustrou.Peguei o celular e disquei o número de Amanda. Eu precisava de algo para me refugiar.Ela atendeu no segundo toque.— Alô? - A voz dela soou do outro lado da ligação.— Só queria saber se está tudo bem —