Laura Stevens –Sair do hospital foi como atravessar uma fronteira invisível. Deixávamos para trás a angústia dos dias difíceis, mas ainda carregávamos o peso das emoções.Amanda caminhava ao meu lado, carregando a bolsa da bebê, enquanto eu embalava minha pequena nos braços, protegendo-a do vento suave da manhã.Assim que chegamos perto do estacionamento, meus passos vacilaram.O que eu via, e pegou de surpresa.Christian estava a poucos metros de nós, abraçado com uma menina.Ela tinha traços levemente puxados, a pele bronzeada e um sorriso tímido. Era magra, franzina e não parecia ter mais do que a idade do Nathan.Antes que eu pudesse reagir, meu olhar deslizou para o lado.Ali, ao lado de Christian, havia uma mulher. Também de pele morena, traços delicados e o mesmo ar cansado e gentil. Ela segurava um bebê enrolado em uma manta clara, como quem carrega o maior tesouro do mundo.Fui me aproximando devagar, sem entender nada do que estava acontecendo.Christian me viu chegando e i
Laura Stevens –Estar em casa novamente, por mais que eu não tenha passado muitos dias fora, foi como se uma sensação de alívio e leveza me cobrisse. Nada mais aconchegante do que estar de volta ao seu próprio lar.Assim que Christian abriu a porta, o cheiro familiar da nossa casa me envolveu como um abraço, e senti a emoção transbordar em mim.No instante seguinte, ouvi os passos apressados de Nathan ecoando pelo corredor. Ele surgiu na sala como um foguete, os olhos brilhando de ansiedade e felicidade. Meu coração quase não coube no peito.Antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, ele já corria na nossa direção.Christian se agachou ao lado dele, colocando uma mão firme em seu ombro e apontando para a bebê nos meus braços.— Campeão — disse ele, com a voz cheia de orgulho — essa é a nossa princesinha. A Tereza. Olha como ela se parece com você?Nathan arregalou os olhos, formando um perfeito "o" com os lábios, maravilhado. Eu me abaixei cuidadosamente, trazendo Tereza para mais per
Christian Müller –Nathan ria alto enquanto corria pela sala, puxando as peças da pista de corrida para perto de mim.Me sentei no tapete macio, pronto para ajudá-lo a montar aquele verdadeiro labirinto de curvas e descidas radicais. Era engraçado como meu pequeno era incansável; mesmo com tanta emoção rolando desde que Laura e Tereza chegaram, ele parecia mais energizado do que nunca.— Papai, essa parte aqui é a descida! — explicou Nathan, apontando para uma peça laranja curvada.— Isso mesmo, campeão — respondi, rindo. — Vamos fazer a maior pista de todas!Enquanto encaixávamos as peças, eu olhava para Nathan e sentia uma paz difícil de explicar. Minha família estava em casa. Completos. Tereza, tão pequena e frágil, e Laura, a mulher que lutou tanto para nos dar tudo isso. O amor que eu sentia por eles parecia maior que o próprio mundo.Nathan se inclinou para colocar um carrinho azul brilhante no topo da rampa recém-montada e, juntos, contamos até três para lançá-lo:— Um... dois.
Christian Müller –Eu ainda não conseguia acreditar no que estava vendo. E nem ouvindo.Naquele momento, meu peito se apertou. Como tudo pode ter chegado aquela situação? Por que ele estava com marcas no rosto e o que verdadeiramente aconteceu para que ele tenha mudado de ideia? – Aquelas perguntas estavam rodeando a minha mente.Eu fiquei parado ao lado da maca, com os braços cruzados, sentindo a raiva ferver sob a superfície da pele.Raiva dele, da situação e de mim. Principalmente de mim.Arthur não dizia nada. Fitava o teto com uma expressão vazia, a mandíbula tensa, como se estivesse pronto para aguentar qualquer golpe que viesse.Um velho reflexo de defesa.Suspirei pesado me virando para o olhar.— Você é mais teimoso do que eu lembrava — falei com a voz baixa, controlada.Ele virou o rosto devagar, me lançando um olhar cansado. Mas não respondeu.Me aproximei um passo, sem pressa. Não estava ali para forçá-lo a nada. Não adiantava.— Não vim para fazer discurso, Arthur. Não so
Christian Müller –A noite estava fria, mas não fazia muita diferença para mim. Eu já estava sendo envolvido pelo frio das minhas escolhas.Caminhei até o carro, joguei as chaves no banco do passageiro e me sentei atrás do volante, soltando um suspiro pesado.A verdade é que, no fundo, eu já esperava por aquilo. Já sabia que tudo estava indo bem demais para ser verdade.Arthur sempre teve esse talento para escolher os caminhos errados. Ele sempre optou pela rota mais fácil, pelo que o beneficiava.E, ainda assim, eu não conseguia virar as costas para ele. Não totalmente. Até porque, ao ver as marcas em seu rosto e ele ter tomado uma atitude tão drástica, me fez pensar que havia algo a mais envolvido nisso.Minha cabeça se encheu de repente. Várias possibilidades, e aquilo me frustrou.Peguei o celular e disquei o número de Amanda. Eu precisava de algo para me refugiar.Ela atendeu no segundo toque.— Alô? - A voz dela soou do outro lado da ligação.— Só queria saber se está tudo bem —
Christian Müller –A manhã começou diferente. Sem pressa, sem tensão.Acordei com os sons da casa viva — risadas, passos correndo pelo piso de madeira, o cheiro de café fresco no ar e choro de bebê.Desci as escadas devagar, ainda me adaptando ao contraste da noite anterior.Na cozinha, Dominic e Nathan estavam na ponta da mesa, brincando de alguma coisa que parecia mais bagunça do que qualquer jogo real.Amanda estava sentada na cadeira, balançando Tereza nos braços com aquela paciência infinita que ela parecia ter nascido sabendo exercer.Laura, minha Laura, tomava café, tentando ignorar o sermão de Amanda, que a mandava comer direito se quisesse continuar amamentando bem.Não havia brigas. Não havia discussões.Só... paz. A paz do nosso jeito.Me encostei no batente da porta, cruzando os braços e observando a cena por um momento, sem querer interferir. – Era aquela cena que todo Homem espera encontrar quando volta para o aconchego do seu lar.Aquela família sempre esteve ali. O tem
Christian Müller –Depois do café da manhã, quando a casa voltou a se aquietar, pedi que Amanda e Dominic me acompanhassem até o escritório.Eles estranharam o meu tom — sério demais para um domingo — mas não questionaram.Fechei a porta atrás de nós, nos isolando do restante da casa. O cheiro de madeira antiga misturado ao couro dos móveis impregnava o ambiente, carregado com a sensação de que algo importante estava prestes a acontecer.Caminhei até a escrivaninha e abri a gaveta inferior.De lá, retirei uma pasta gasta, abarrotada de documentos envelhecidos pelo tempo, mas que, para mim, pesavam como se fossem feitos de chumbo.Dominic se encostou na parede, cruzando os braços. Amanda se sentou no sofá, com Tereza já entregue a Laura lá fora, permitindo que ela estivesse ali agora.Respirei fundo antes de começar.Eu devia isso a eles.A verdade inteira.— Há alguns meses... — comecei, minha voz soando rouca no ambiente silencioso — o prédio da Müller Corporation foi demolido. E com
Christian Müller –O sol já estava alto quando ela me chamou.Amanda não disse nada direto, não pediu com palavras bonitas, não fez rodeios. Apenas entrou no escritório novamente, com os olhos inchados, mas secos. Ela me olhou como se quisesse dizer mil coisas, mas escolheu a mais simples:— Você pode me levar até onde ela está?Eu soube imediatamente do que ela estava falando.Assenti.Não falamos mais nada. Apenas saímos.Dominic ficou na porta da casa, segurando Tereza nos braços, como se dissesse silenciosamente que estaria esperando por ela. Amanda não o encarou. Talvez não conseguisse.Talvez fosse apenas medo de desmoronar novamente.O caminho foi silencioso.Um silêncio espesso, que apertava o peito. A estrada parecia mais longa do que era de fato. Vi as mãos dela tremerem levemente sobre o colo. Amanda olhava pela janela, mas eu sabia que os olhos dela não viam a paisagem. Estavam presos em outra época, em outro rosto, talvez no de uma mulher que ela nunca conheceu.Estacione