CAPÍTULO 6 - DESAPARECIDA

***André Burck***

A sustentação oral durou apenas 20 minutos. Meu olhar encontra nos olhos de cada um dos jurados a resposta que eu quero, a resposta que a família da vítima merece.

— Diante de todo o exposto, senhores, acredito verdadeiramente que aqui, hoje, será feita justiça à vítima. E não só a ela, mas a toda sua família, principalmente a filhinha de apenas 5 anos, obrigada a assistir a sua mãe ser agredida física e emocionalmente pelo homem que deveria protegê-la.

Após mais algumas palavras, finalizo o meu discurso confiante de que mais um assassino será retirado das ruas.

A defesa ainda tenta reverter a opinião do júri, mas depois de aproximadamente uma hora, quando o juiz lê a sentença, saio do tribunal com a certeza do dever cumprido, pois o monte de estrume que matou a esposa diante da própria filha pegou pena máxima, 30 anos de reclusão, o que para mim ainda é pouco.

“Fui educado por uma mulher, que criou a mim e aos meus irmãos, sozinha. Sei de todas as dificuldades que ela passou e sei também que muitas mulheres se submetem a esses crápulas por não enxergarem outra saída, ainda mais ao ter filhos. A maioria deles abusa desse “poder” para ameaçá-las e coagi-las, pois sabem que elas, na maioria das vezes, colocam os interesses dos filhos antes de si mesmas. O problema nisso é que muitas não conseguem sair do ciclo de violência e, infelizmente, acabam sendo mortas pelos respetivos agressores”.

Os meus pensamentos me tornam alheio ao resto do mundo e só saio do modo silencioso quando o meu caminho é interceptado por Helena, uma brilhante advogada com quem saí logo que cheguei na cidade.

— Parabéns, doutor Burck! Mais um excelente trabalho da promotoria.

— Obrigada, Helena! Mas como você mesma mencionou, esse é o meu trabalho. — falo e desvio dela, seguindo pelo corredor até o meu gabinete, mas ela acompanha.

— Credo, estou apenas sendo gentil. Poderia sorrir e agradecer, sem ser grosseiro? — reclama, fazendo um bico que só ficaria bem numa criança menor de 4 anos.

Contenho-me para não revirar os olhos. Não tenho paciência para imaturidade.

Deixei claro a ela, na única vez em que saímos juntos, que não me envolvo emocionalmente com ninguém, nem me relaciono amorosamente. Ainda assim, depois de quase 2 anos, Helena não perde uma oportunidade de me bajular, sempre encontra motivos para forçar uma aproximação.

Paro e olho para ela, esperando que se flagre da sua inconveniência.

— Já agradeci, Helena. Agora, se me der licença, tenho trabalho a fazer.

Entro no gabinete com ela no meu encalço. Passo pela minha assistente que se levanta e vem atrás de nós, aflita.

— Doutor Burck, o seu… — Melinda tenta falar, mas Helena a corta.

— Dá um tempo, mocinha… estou terminando um assunto com seu chefe, já vou liberar ele pra você.

Melinda baixa a cabeça constrangida e faz menção de se retirar, mas eu a impeço.

— Fique, Melinda. Já terminamos aqui. Helena já está de saída, não é mesmo? — olho para minha colega de forma enfática, mas ela não parece compreender ou apenas se faz de desentendida.

— Bom, André, estive pensando… — ela fala com o corpo junto ao meu, puxando pela minha gravata. — E se a gente saísse para jantar um dia desses? Sabe o quanto aprecio a sua companhia, não sabe?

A sua insinuação é explicita, Melinda nos encara perplexa, com as bochechas coradas, o que eu chamo de vergonha alheia.

Sem me preocupar em ser indelicado, afasto Helena e dou alguns passos para longe dela.

— Me desculpe, Helena, isso não vai acontecer, não sou o tipo de pessoa que goste de socializar.

— Você é um grosseirão convencido, isso que você é, Doutor Burck. — ela diz, demonstrando o quanto está desapontada — passar bem.

Acompanho Helena sair pisando duro e bater a porta com força. Tamanha infantilidade me deixa ainda mais irritado.

— Essa mulher perdeu totalmente a compostura.

— Acho que o senhor magoou os sentimentos dela. — Melinda fala e a vejo segurar o riso.

— Fui apenas sincero. Não tenho tempo nem disposição para chatear pessoas apenas pelo prazer de fazê-lo. Segundo o meu irmão, irritar as pessoas,  é meu dom natural.

A minha assistente deixa escapar um riso baixo, mas engole em seco quando não me vê achando graça.

— Vamos ao trabalho, Melinda. O que você ia me dizer quando Helena interrompeu?

— Ah! Eu ia lhe avisar que o seu irmão ligou. Ele parecia bastante aflito e pediu que o senhor retornasse a ligação assim que possível.

— Ele não disse do que se trata?

— Não, apenas que era urgente.

Daniel não costuma ligar durante o horário de trabalho, então presumo que seja algo realmente importante. Por isso, pego o telefone e imediatamente completo a ligação para ele.

📲Mano, ainda bem que ligou. — a voz dele soa realmente preocupada e isso acende um alerta em mim — Estou quase entrando numa cirurgia, mas preciso falar sobre a Gaya.

📲 Gaya, o que tem ela?

📲 Aí é que tá o problema, eu não sei direito, mas algo está acontecendo. Recebi uma ligação estranha da Beta, governanta dos Matarazzo.

📲 Hum! Fala logo, o que ela queria?

📲 Eu não sei, brother. Quase não dava pra escutar o que ela dizia, parece que estava falando baixo, como se não quisesse que outras pessoas escutassem. Só entendi ser sobre Gaya estar em perigo.

Daniel fala num fôlego só, ele nem deveria estar tão nervoso assim, pois em poucos minutos estará no centro cirúrgico.

📲 Fica calmo, Dani, eu vou resolver.

Digo mais para convencer a mim mesmo do que a ele. Afinal, prometi ao pai de Gaya a protegeria com a minha vida, não posso falhar com ela nem quebrar a minha promessa.

Nãna Nascimento

Curte e comente. Isso incentiva o autor a continuar escrevendo e a melhorar sua escrita.

| 17
Leia este capítulo gratuitamente no aplicativo >

Capítulos relacionados

Último capítulo