POV - Bethoven
Direita. Esquerda. Para cima. Direita. Para cima. Esquerda. Direita. Mal consigo decidir o lado em que vou ficar na minha cama, sequer tenho sono. A imagem de sua pele branca com aquele bronze, a franja preta com a entrada bagunçada na testa e os lábios vermelhos chamativos ecoam na minha cabeça. É insuficiente mantê-la na minha cabeça, preciso acender o abajur para pegar o telefone e ver a sua imagem de perfil pelo aplicativo de mensagens. Anahi é tentadora.
Noto que já são seis da manhã. Não sei quanto tempo dormi, se dormi, mas já era a hora de levantar. Me coloco de pé, mandando-lhe uma mensagem de bom dia no privado, e, em seguida, fazendo o mesmo no grupo da empresa. Ignoro o grupo da família, as crianças não gostam.
Tomo meu banho, escovo os dentes. Não demoro no banheiro. Logo, começo a me arrumar, vestindo a mesma calça preta e a blusa social com a gravata preta e o terno azulado. Em meu guarda roupa havia uma coleção de peças idênticas. Não gostava muito de variar, cansava ter que escolher, então sempre optava pelo o que estava disponível.
Desço as escadas da minha mansão, segurando a pasta que contém meu laptop e alguns documentos pessoais referentes à reunião que terei mais tarde. Adão, o segurança, já está de pé em frente a porta de vidro conversando com o meu motorista particular, Wendler. Ambos já trabalham na família há bons anos. São homens de confiança. Se tivessem o mínimo de intelecto, certamente seriam meu braço direito na empresa.
A frase de Anahi martelava na minha cabeça feito sinusite, incapaz de controlar. Era difícil ter um homem de confiança ali, entre tantas desavenças e intrigas. O mundo corporativo é tão perigoso quanto desafiador. Sei que ali comigo tenho os homens mais capacitados para seus cargos. Mas estamos em um momento bom na empresa. Quem iria me dar amparo caso as coisas fugissem do controle? Eu não tenho um nome agora.
Lembro, enquanto me sento para tomar café da manhã, do ocorrido, há dez anos atrás. Ainda jovem, dirigindo bêbado, ostentando o dinheiro de minha família. Maldito inconsequente. Se meu pai não tivesse os contatos jornalísticos e judiciais, a essa hora eu poderia estar na cadeia. Aquele dia me mudou para sempre. Me fez ir de um garoto inconsequente a um homem com pé no chão.
— Bom dia, pai. — Sabina me dá um beijo na bochecha ao sentar-se na mesa. — Está tudo bem?
Minha filha sempre foi muito amigável. Não puxou somente a bondade de sua mãe, mas também a aparência. Os olhos castanhos, o cabelo ondulado e acima de tudo: a bondade. Tal como Sierra, Sabina, mesmo jovem, se importa com causas nobres. Doa metade da sua mesada para instituições de apoio à animais abandonados e sonha em ser presidenta do Brasil. Nem preciso falar de suas notas no colégio. Nunca soube de uma nota menor do que oito. Minha filha é o meu maior orgulho.
Beijo a sua bochecha de volta, sorrindo com gosto ao ver a sua presença. Não sinto fome, na verdade, mas faço questão de estar todos os dias com Sabina para que ela sempre tenha a presença de seu pai ali com ela.
— Como estão as coisas na escola? — Pergunto, curioso. — Está tudo bem, nessa nova fase? — Sabina havia acabado de entrar no Ensino Médio.
— Está tudo bem sim! As matérias são um pouco mais difíceis, mas... Nada que eu não consiga fazer. — Ela sorri, passando uma certa quantia de patê nas torradas para comer.
— Seu irmão, você sabe? — Indago, sem saber do paradeiro de Benjamin. — Cheguei ontem à noite e ele não estava no quarto.
— Ele foi para a casa da namorada ontem, é tudo que sei. — Franzo a sobrancelha.
— Namorada? — Coloco a mão na cabeça, surpreso.
A relação entre eu e Benjamin não tem sido fácil depois da morte de Sierra. Ele quase nunca está em casa e quase nunca conversa comigo. Honestamente, não tenho muito tempo. Ontem mesmo sequer pude ver os dois. Eu confirmei que Sabina estava dormindo, mas o moleque não estava no quarto. Imaginei que estivesse na casa de algum de seus amigos delinquentes, mas uma namorada era novidade para mim.
— Falando nele... — A pequena anunciava.
Em cima de uma plataforma de rodas, com um capacete que esconde seus cabelos longos, o jovem para perto da mesa, chacoalhando-a a ponto de derramar uma quantidade de suco na mesa.
— Benjamin. — O repreendo. — O que conversamos sobre plataformas motorizadas em casa?
— É skate, pai. — Ele me corrige. — Foi mal.
Foi mal?
Benjamin sabia que eu detestava que ele usasse esses termos, mas eu não iria repreendê-lo novamente. Ele estava distante, e por mais que a morte de sua mãe tivesse abalado a todos nós, eu evitava pegar um pouco pesado com o garoto.
— Benjamin, sente a mesa e tome café com a gente. — Ele se sentou, obedecendo as ordens, pegando uma quantidade enorme de comida e levando a boca, sem nenhuma educação.
— Aí, pai, tá ligado que a galera vai vir toda pro rolê no final de semana, não é? — A minha vontade era de mergulhar o rosto dentro da jarra de suco e morrer asfixiado ao ouvir tantas gírias seguidas. — A festa vai ser top.
— Festa, Benjamin? — Questiono.
— Do meu aniversário, pô! — Ele fala após dar uma golada do suco. — Você não esqueceu, né?
O aniversário de Benjamin era em três dias e eu havia esquecido completamente de preparar a cerimônia.
— Mas é claro que não. — Me levanto para dar-lhe um beijo no couro cabeludo, antes de me despedir. — A questão é que seu linguajar não me apetece. Parece que está falando uma outra língua. — Invento a desculpa.
— E é Benji, pai. Benji. É assim que a galera me chama. — Respiro fundo, tentando ser compreensível. Contorno a mesa para me despedir de Sabina.
— Se comportem. — Ordeno enquanto me afasto.
— Não é como se ele fosse ver mesmo. — Ouço o garoto fazer a piada, rindo. De certa forma, minha ausência o incomodava.
Sierra morreu de câncer de cólon. Nós tentamos de tudo, mas nem todo o dinheiro foi o suficiente para mantê-la viva. O que vivemos durante o processo deveria ter nos mantido unidos, e durante aquele momento, nos mantinha. Mas após a sua partida, cada um começou a reagir de uma forma diferente. Benjamin se afastou dos amigos antigos, trocou de escola e começou a andar com uns rapazes estranhos; Sabina, apesar de ainda se dedicar muito a tudo que faz, agora busca o perfeccionismo. Ela se esforça além do que uma garota normal estudaria; E eu, bem, eu ocupo a minha mente na PAVAN Co., é a única forma que eu tenho de me distrair.
Ao entrar no carro, cumprimento Wendler e peço para que ele pare em uma floricultura no processo.
— Floricultura? — Ele se surpreende.
— Há contratações novas na empresa. Bem, pelo menos as mulheres merecem um pouco, não é? — Questiono, vendo o seu sorriso se abrir.
— O Chefe se encantou por alguém novo da empresa? — Wendler tinha intimidade suficiente para tal pergunta, ele não era apenas um motorista. Era um amigo de longa data meu.
— Eu só quero causar uma boa impressão, Wendler. — Afirmo, ainda com os pensamentos voltados para ela.
Desde a morte de Sierra, três anos atrás, eu nunca mais me envolvi com uma mulher outra vez. Nem mesmo para algo casual. Mas eu confesso: havia algo no olhar de Anahi que me chamava atenção. Era uma doçura de menina incorporada a uma atitude de mulher e um intelecto admirável. Há poucas como ela no mercado de trabalho.
Ao parar na floricultura fui pessoalmente até o balcão pedir ajuda a responsável pela loja. Era uma mulher jovem, deveria ter seus vinte anos, mais ou menos. Provavelmente filha do dono da loja, supus.
— Gostaria de um bouquet de flores vermelhas, mas não sou bom em escolher. — Falei, um pouco vermelho.
— Alguma ocasião em específica? — Ela pergunta para tentar me ajudar.
— Não necessariamente... Mas busco algo exótico, entende? — A jovem parece confusa, sem saber como me ajudar corretamente. — Você teria algo italiano?
Eu realmente não levava jeito para aquilo, mas queria impressionar a nova contratada da PAVAN. Seu curriculo não precisava destacar as suas origens italianas, a sua aparência única já era chamativa o bastante, tão bonita quanto uma noite em Verona. Entretanto, comprar as flores para Anahi não era apenas um sinal de respeito e agradecimento pela sua chegada na empresa, mas também, um símbolo do meu carinho pela figura que seu nome representa. Lembrar de minha avó me trouxe boas memórias; espero, ao entregar-lhe flores, trazer-lhe bons pensamentos também.
Retornei ao carro com um bouquet de Dálias Marinas Vermelhas. Não era uma flor típica, mas era algo comum na Italia, disse a vendedora. Não quis confirmar, mas o cheiro que elas exalavam perfumou todo o carro.
— A contratada deve ser muito especial. — Wendler brincou. — Parece que o senhor comprou uma perfumaria inteira.
Ignorei a brincadeira de Wendler quando a notificação da resposta de "bom dia" de Anahi apitou em meu telefone. As bochechas coraram, e os lábios apertados se esticaram para formar um sorriso despretensioso em meu rosto. Visualizei a mensagem prontamente, enquanto o telefone marcava meia hora para às oito.
Anahi me respondeu de uma forma seca, a princípio. Ela ainda estava terminando de digitar, o que me impediu de dar outra resposta. Foi quando notei, com a mensagem que chegou, o emoji de lábios vermelhos finalizando a frase enviada a seguir.
"Bom dia.
Que essa parceria nos traga sucesso!"Dizia a mensagem, que segundos após, ela editou, retirando o emoji.
Por quê?
Ela o teria colocado errado na frase ou modificou para não ser mal interpretada?
Olhei para as flores em cima do banco do carona. Agora me pergunto se estou me precipitando em entregá-las a ela.
De qualquer forma, Anahi havia mexido comigo. E eu preciso saber se o sentimento é recíproco.
POV - AnahiCravos. Dálias. Girassóis. Margaridas. Orquídeas. Rosas. Tulipas. Eu odeio todos os tipos de flores. Mas recebê-las no momento da apresentação aos funcionários arrancou um sorriso genuíno de meus lábios. Bethoven estava realmente disposto a me agradar. Seja pela mensagem editada propositalmente com um batom vermelho ou pelo meu comportamento atrativo. O que ele não sabia era que a flor tinha seus espinhos.Na sala, estavam todos reunidos antes de começarmos o expediente: Bethoven, o CEO; Oliver, o Vice Presidente; Felix, o Diretor Financeiro, Salma, a Diretora de Marketing; Nestor, Diretor de Tecnologia; Levi, do RH; Andreas, diretor de Relações Internacionais, alguns funcionários e secretários como Luigi. Todos brindavam pela nova etapa que a empresa iniciaria. — Será inesquecível! — Salma brindou a taça com os demais. *Eu concordo, querida. Será.— Seja bem-vinda, Anahi. — Cumprimentou a mim o vice presidente. Todos foram bem simpáticos, com exceção de dois: o Diretor
POV - AnahiNove. Dez. Onze. Meio Dia. Uma. Duas. As horas se passaram até a primeira mensagem de Nestor ser enviada até a mim, negando a possibilidade de entrar no sistema de segurança do Setor Financeiro. — Você está brincando comigo? — Falo o encarando em minha frente após chamá-lo para minha sala novamente. — Eu sei que você invadiu sistemas muito mais fortes do que este.— Você ainda não me deu a oportunidade de falar. — Ele me interrompia. — Eu não consigo acessar daqui de fora. — Ele retirou um pen-drive. — Coloque no computador dele.— É disso que você precisa? — Indago, pegando o objeto.— O Sistema de Segurança não é difícil de invadir, mas o computador, que obtém as informações bancárias tem reconhecimento facial. Eu preciso desativá-lo. — Ele alertou.— Por quanto tempo?— Pelo menos, quinze minutos.— Os aposentados primeiro. — Indico a passagem para o lado de fora da sala.Abri a porta da sala de Felix Vitorio sem sequer bater nela, me dirigindo até a sua cadeira. O home
POV - AnahiAlexander. Henry. James. Luke. Taylor. Vincent. Foram vários os homens que passaram pela minha cabeça enquanto meu corpo pulava sobre o membro pequeno do velho barrigudo. Além de não ser atraente, não aguentou muito tempo e chegou ao orgasmo depois dos primeiros quinze minutos. Estava tão velho que não se importava em retribuir. Não que houvesse algum prazer da minha parte de qualquer forma.— Você... É... Fantástica. — Ele falava com dificuldade em sua respiração. Eu olhava para ele com um sorriso, saindo de cima de seu corpo e deitando ao seu lado. — Nunca estive com uma mulher como você.— E eu nunca estive com um homem tão experiente... — O elogiei, sussurrando.Me levantei da cama, sentando, para colocar a minha roupa, enquanto o homem se dirigia ao banheiro. O quarto, completamente bagunçado, mostrava sua pacata vida solitária. Sua última esposa havia morrido há alguns anos e os filhos não se importavam em visitá-lo. Essa última informação eu não obtive pelos arquivos
POV - BethovenCintura. Costela. Busto. Nuca. Rosto. Cabelo. Finalmente tive uma de minhas mãos segurando os cabelos de Anahi. Desde o momento em que lhe entregava as flores, havia me convencido que estava fascinado pela sua aparência. Mas a atração ia além das suas características físicas. Sua voz suave atiçava a minha curiosidade em saber se sua pele tinha a mesma textura. A postura determinada e imponente me fazia questionar como ela se comportaria sob a minha dominância.Sierra foi a única que me fez sentir-me daquele jeito. Pelo menos, até o dia de sua entrevista. Nenhuma mulher normal corrigiria o nome que o seu futuro chefe pronunciaria errado. Mas Anahi não era uma mulher comum, ela era única, de aparência e personalidade. Em três dias eu estava fascinado pelo ser que se escondia naquela mulher.Meu rosto foi de encontro ao seu, de forma que senti o seu ar entrar pelas minhas narinas e vice-versa. Ela, estranhamente, não se afastou, tampouco reclamou. Também não se aproximou.
POV - AnahiÁgua. Fogo. Terra. Vento. Quatro elementos distintos, que quando se encontram, geram uma nova sensação na natureza. A água, embora apague o fogo, evapora ao destruir a chama; O vento, mesmo que mais leve que a terra, é capaz de construir tempestades de areia. O fogo e a terra constroem a lava que faz um vulcão erudir. Igualmente, a minha conexão com Bethoven na noite anterior havia me despertado fortes sensações.Em primeiro lugar, o prazer acima de tudo. Não foram muitos os homens que conseguiram me satisfazer, mas ele se esforçou, confesso que chegou perto. Se não estivesse tão retraído, talvez a noite poderia ter sido mais prazerosa para mim, mas não é uma crítica. Os últimos homens com quem havia me envolvido sexualmente ou não duravam o suficiente, ou não aguardavam a minha vez. Geralmente, não é algo que me incomoda tanto, já que essas últimas relações foram todas por mútuo interesse: eles em transar comigo e eu em destruí-los. Mas algo entre Bethoven e eu se destaco
POV - AnahiEletrônica. Funk. Hip Hop. Pop. Rap. Trap. O barulho alto da música reverberava por todo o salão de festas. O bilionário era tão rico que possuía o próprio cômodo para festas dentro de sua mansão. As bexigas alternadas entre as cores bege e prata davam um ar menos infantil ao aniversário de dezoito anos do bilionário. O salão estava repleto de jovens adolescentes da sua mesma faixa etária, que se vestiam feito delinquentes, incapazes de definir o ambiente que residiam.— Eu disse que os amigos dele eram estranhos. — Bethoven me entregava uma taça de vinho branco, sorrindo. — Mas estou feliz que esteja aqui.A pista de dança alternava suas cores pelo reflexo do globo espelhado. Luigi, andando de um lado para o outro, trajado de um terno rosa belíssimo, fazia questão de que cada detalhe saísse como combinado; planejar uma boa festa para ele era tão importante quanto respirar. Noto que ele prova um dos pratos de entrada enquanto os adolescentes dançam na pista.— Qual deles é
POV - AnahiAthena. Diana. Elektra. Joan. Monalisa. Nikita. Petra. Rebeca. Samira. Tahani. Ao longo dos últimos quinze anos, essas foram algumas das identidades que assumi em meus trabalhos. Em algumas culturas, acredita-se que o nome de uma mulher reflete sua autenticidade e como ela se manifesta no mundo. Eu discordo. Reduzir os valores de uma mulher ao seu nome é minimizar suas conquistas; é nos simplificar à única posse que não tivemos o direito de escolha: o nome. Por isso, a cada missão, escolho uma identidade diferente. Por agora, podem me chamar de Anahi.Apesar de não ser do meu fetiche repetir a letra inicial dos nomes que uso em meu trabalho, acreditem, logo vocês descobrirão o motivo de minha pertinente decisão.Hidratante. Protetor Solar. Corretor. Primer. Sombra. Delineador. Base. Pó Facial. Batom vermelho. E um pouco de blush rosado nas bochechas. Esses dois últimos são fundamentais: enquanto o batom fortifica a sua imagem de amadurecimento, o blush suaviza o seu intele
POV - AnahiAdagas. Clavas. Espadas. Fundas. Machados. Punhais. Tridentes. Ao redor das histórias, guerreiros usaram grandes armas para derrotar seus inimigos. Mas até os dias de hoje, nenhuma espada se tornou maior que o poder escondido atrás do olhar. E quanto mais olhos, mais armas você tem. Ao entrar em uma guerra, você nunca deve entrar sozinho. Você precisa ter um aliado. Ou como eu prefiro chamar, uma coruja. Alguém que veja quando você não estiver presente para ver.Enquanto entrevisto a décima sétima candidata, Leah, uma garota de cabelos loiros curtos e um entusiasmo exuberante, noto os olhares de Bethoven, sentado à direita em uma das poltronas para me avaliar. Seus olhos percorrem as coxas da garota como uma raposa caçando sua presa. Apesar do bom currículo, ela será dispensada. Os olhares daquele homem só terão direção para mim.Leah, apesar de nervosa, terminou a entrevista recebendo um aperto de mão do CEO, saindo pela porta enquanto o candidato seguinte ainda não entra