Capítulo: 8
Uma Proposta Inesperada A manhã em Santa Clara estava serena, com o sol dourado iluminando os vastos campos da fazenda de Antônio, um fazendeiro respeitado na região. O vento soprava suave entre as plantações, carregando consigo o cheiro de terra molhada e flores silvestres. No casarão principal, Antônio, um homem robusto de chapéu de palha e olhar severo, observava a chegada de uma charrete elegante. Dentro dela, estavam Sr. Eduardo e Dona Clarissa, um casal rico vindo de Orlando. Eles eram velhos amigos de Antônio, parceiros de negócios que sempre que podiam, visitavam Santa Clara. — Antônio! — chamou Eduardo, descendo com cuidado da charrete. — Como está, meu velho amigo? — Ora, ora, que boa surpresa! — respondeu Antônio, com um sorriso contido, apertando a mão de Eduardo. — Entrem, vamos conversar na varanda. Dona Clarissa, sempre elegante! A mulher sorriu, ajeitando o chapéu de abas largas enquanto descia da charrete. — Que lugar lindo, Antônio! É sempre um prazer visitar sua fazenda. Enquanto seguiam até a varanda, os trabalhadores da fazenda passavam apressados, carregando cestos de frutas e ferramentas. Entre eles, uma figura delicada chamou a atenção de Clarissa. Era Ariadne, uma jovem de longos cabelos brancos e olhos azuis expressivos, que caminhava com um balde de água nas mãos. Antônio percebeu o olhar curioso de Clarissa e pigarreou. — É filha de um casal que se instalou aqui há alguns anos — explicou. — O pai, Joaquim, é um homem trabalhador, cuida de uma pequena horta ao lado do rio. A mãe, Rosa, ajuda na escola do povoado quando pode. Clarissa olhou novamente para Ariadne, que desapareceu por trás de um galpão. — Que menina linda... Quantos anos ela tem? — Deve estar com uns 15 anos, mais ou menos — respondeu Antônio. — Uma moça prendada, trabalhadora. Mas, infelizmente, a situação da família não é das melhores. Estão passando por dificuldades desde que chegaram aqui. Clarissa trocou um olhar rápido com Eduardo, que parecia alheio à conversa enquanto falava com Antônio sobre plantações. — Antônio, você acha que a mãe dela aceitaria... bem, que a menina fosse para Orlando comigo? — perguntou Clarissa com cautela. — Minha casa é grande, meu marido passa muito tempo fora... Às vezes, me sinto tão sozinha. Ter uma companhia feminina me faria muito bem. Antônio arqueou uma sobrancelha, pensativo. — Não sei, Dona Clarissa. Eles são idosos, têm um jeito muito unido de viver. Mas... creio que se for apresentado como uma oportunidade para a menina, talvez eles aceitem. A família precisa de ajuda. — Eu cuidaria dela como se fosse minha filha — assegurou Clarissa. — Ela teria um bom lar, comida, roupas bonitas... E, quem sabe, até poderia estudar. Antônio assentiu lentamente. — Hoje à tarde, posso levar vocês até lá para conversarem com Rosa e Joaquim. Mas não prometo nada. Clarissa sorriu, satisfeita. — Obrigada, Antônio. Eu adoraria conhecê-los. No pequeno pedaço de terra que Joaquim e Rosa chamavam de lar, a vida seguia simples e cheia de desafios. A casa de madeira era modesta, mas limpa e acolhedora. Rosa costurava perto da janela enquanto Joaquim afiava uma ferramenta na varanda. Ariadne estava no quintal, cuidando dos vasos de flores que a mãe tanto amava. O som dos cascos de cavalo interrompeu a paz do lugar. Antônio desceu de sua charrete, acompanhado por Eduardo e Clarissa. — Joaquim! Rosa! — chamou Antônio, com sua voz firme. — Temos visitas! Joaquim enxugou as mãos no avental e caminhou até o portão. Rosa saiu da casa, ajeitando os cabelos grisalhos. — Senhor Antônio — cumprimentou Joaquim com um leve aceno de cabeça. — Sejam bem-vindos. — Estes são Eduardo e Clarissa, amigos meus lá de Orlando — apresentou Antônio. Clarissa sorriu calorosamente para Rosa, enquanto seus olhos discretamente buscavam Ariadne, que observava tudo de longe. — É um prazer conhecê-los — disse Clarissa. — Antônio me falou muito sobre vocês... E também sobre sua filha. Rosa e Joaquim trocaram um olhar rápido. — Ariadne! — chamou Rosa com suavidade. — Venha cá, minha filha. A jovem se aproximou, tímida, com as mãos sujas de terra e os olhos baixos. — Que menina linda! — exclamou Clarissa, sorrindo. — Rosa, Joaquim... Eu tive uma ideia que pode beneficiar a todos nós. O casal ouviu atentamente enquanto Clarissa explicava sua proposta. Falou sobre sua casa grande, sobre sua solidão, e como gostaria de ter Ariadne ao seu lado para ajudá-la e, em troca, ofereceria uma vida mais confortável para a menina. Rosa apertou o avental com força entre os dedos. Joaquim suspirou pesadamente. — Senhora Clarissa... — começou Joaquim, com a voz embargada. — Nossa filha é tudo que temos de mais precioso. Nós fugimos de uma guerra, de perseguições, para protegê-la. Não sei se conseguiríamos suportar vê-la partir. — Eu entendo — respondeu Clarissa com doçura. — Mas eu prometo cuidar dela. Ela terá uma vida melhor, oportunidades que talvez aqui não consiga. Rosa olhou para Ariadne, que permanecia calada, observando a mãe com olhos brilhantes de lágrimas contidas. — E o que você acha, minha filha? — perguntou Rosa, com a voz trêmula. Ariadne hesitou. Seu coração jovem estava dividido entre o amor por sua família e a promessa de uma vida melhor. — Eu... eu farei o que vocês acharem melhor — respondeu Ariadne baixinho. Joaquim colocou a mão no ombro da filha e encarou Clarissa com seriedade. — Nos dêem um tempo para pensar — disse ele firmemente. — É uma decisão difícil para nós. — Claro, Joaquim. Claro — respondeu Clarissa com um sorriso gentil. — Pensem com calma. Enquanto a charrete se afastava, Ariadne permaneceu parada no mesmo lugar, com o vento soprando suavemente seus cabelos. O destino, mais uma vez, sussurrava mudanças no horizonte.Capítulo: 9 Uma Decisão DolorosaO pôr do sol tingia o céu de tons alaranjados quando Rosa e Joaquim finalmente puderam sentar-se no pequeno banco de madeira na varanda de casa. A brisa suave soprava entre as árvores, trazendo consigo o aroma da terra úmida e o som distante dos grilos.Rosa segurava um pano entre os dedos, torcendo-o de maneira nervosa. Joaquim, sentado ao seu lado, olhava para o horizonte, com os ombros caídos e o semblante carregado de preocupação.— Joaquim... — começou Rosa, com a voz baixa, quase um sussurro. — Eu não me sinto em paz com isso. Meu coração... ele está apertado, como se algo estivesse errado.Joaquim suspirou, passando a mão pelo rosto cansado.— Rosa, minha querida... Eu entendo você. A Ariadne é nossa menina, nosso bem mais precioso. Mas olha ao nosso redor. Essa terra mal tem nos dado o suficiente para comer, quem dirá para dar um futuro para Helena e João.Ele fez uma pausa, olhando diretamente nos olhos marejados da esposa.— Nós temos dois f
Capítulo 10: Um Novo Mundo, Um Novo DestinoA manhã estava coberta por uma fina neblina quando Ariadne terminou de arrumar sua pequena mala. Dentro dela, cabiam poucas roupas simples, uma fotografia da família e um lenço bordado à mão por Rosa. Seus cabelos brancos, sempre um reflexo de sua fragilidade física, estavam presos em uma trança delicada que sua mãe havia feito naquela madrugada.Do lado de fora da casa, Joaquim e Rosa estavam parados, com os olhos marejados, segurando as mãos um do outro. Helena e João, seus irmãos, abraçavam Ariadne com força, como se o gesto pudesse impedir sua partida.— Minha filha, — disse Rosa, com a voz trêmula. — Cuide-se. Seja forte. E nunca, nunca se esqueça de quem você é.— Vou deixar vocês orgulhosos, mãe. Prometo. — respondeu Ariadne, com lágrimas nos olhos, mas com um sorriso suave nos lábios.Joaquim aproximou-se e colocou uma pequena correntinha de prata no pescoço da filha.— Essa corrente era da minha mãe. Ela sempre dizia que trazia pr
Capítulo 11: As Sombras da Casa GrandeO relógio marcava 4h45 da manhã quando Eduardo levantou-se suavemente da cama, para não acordar Clarissa. Vestiu-se com cuidado, ajeitou a gravata diante do espelho e saiu do quarto com passos leves. A rotina era sempre a mesma: antes de sair para o trabalho, ele passava no quarto de Ariadne.A porta rangeu baixinho quando ele entrou no pequeno cômodo onde a jovem dormia profundamente. Seus cabelos brancos estavam espalhados sobre o travesseiro, iluminados pela luz tímida do abajur. Eduardo aproximou-se devagar, tocou suavemente sua testa com os lábios e sussurrou:— Tenha um bom dia, minha filha. Fique com Deus.Ariadne abriu os olhos por um instante, sorrindo suavemente antes de voltar a fechar.Eduardo saiu, fechando a porta com cuidado, e deixou a casa. Assim que o som da porta da frente batendo ecoou pela casa, o silêncio foi cortado bruscamente pelo barulho de outro quarto se abrindo. Clarissa surgiu no corredor, vestida com um robe de sed
Capítulo 12: O Fim da IlusãoO sol de sábado de manhã entrava pelas cortinas brancas do quarto do casal. O relógio marcava 8h, e Eduardo se espreguiçou com calma, aproveitando o raro privilégio de dormir até mais tarde. Ao seu lado, Clarissa ainda parecia dormir, mas seu rosto estava virado para o outro lado, os olhos fechados com força.Eduardo inclinou-se para beijar o rosto da esposa, sorrindo suavemente.— Bom dia, amor. Vamos levantar? Hoje é sábado.Clarissa abriu os olhos lentamente, esticando os braços com um sorriso forçado.— Hum... adoro quando você me acorda assim. O que nós vamos fazer hoje, meu bem? — perguntou ela, com a voz doce e olhar brilhante.Eduardo levantou-se e começou a vestir uma roupa mais leve, visivelmente animado.— Pensei em algo diferente hoje. Vamos sair todos juntos! Primeiro, um piquenique no parque. Depois, podemos ir ao cinema. E, mais tarde, podemos dar uma volta na roda-gigante. O que acha?O sorriso de Clarissa congelou no rosto. Sua expressão
Capítulo 13: Mentiras e Manipulação O cheiro de café fresco preenchia a cozinha enquanto Eduardo terminava seu café da manhã calmamente, revisando algumas mensagens no celular. Clarissa, sentada à sua frente, mexia distraidamente na xícara com a colher, seus olhos fixos em algum ponto distante.— Amor… — começou ela, com a voz doce, mas carregada de falsa preocupação. — Acho que Ariadne não está bem. Ela estava pálida hoje cedo, parecia desconfortável. Acho que está com cólica ou talvez vai menstruar pela primeira vez.Eduardo levantou os olhos, franzindo a testa com preocupação.— Sério, Clarissa? Coitada da menina… Quer que eu vá falar com ela? Talvez eu possa perguntar se ela precisa de algo.— Não, não! — interrompeu Clarissa apressadamente, colocando a mão sobre a de Eduardo. — Isso é coisa de mulher, amor. Deixa que eu cuido dela. Só… faz um favor para mim? Pode ir até a farmácia comprar absorventes e remédio para cólica? Por favor?Eduardo assentiu rapidamente.— Claro, amor.
Capítulo 14: O Dia Mais Triste da Minha VidaA noite estava calma na casa de Eduardo e Clarissa. O relógio marcava 11 horas no Brasil, algo em torno das 21 horas nos Estados Unidos. O telefone tocou, ecoando pelo silêncio. Eduardo atendeu ao ver o nome de Antônio na tela.— Boa noite, Antônio! Tudo bem por aí? — perguntou Eduardo, tentando soar animado.— Boa noite, Eduardo! Como estão as coisas? E nossa querida Ariadne, como está se saindo?Eduardo hesitou por um momento. Ele sabia que Ariadne não estava bem, que não conhecia nada da cidade e que sua rotina estava longe de ser feliz. Mas ele não queria preocupar Antônio nem a família dela.— Ela está bem, Antônio. Está se adaptando, já conhece algumas partes da cidade e começou a aprender inglês. Ela é uma menina esforçada.Antônio sorriu do outro lado da linha.— Fico muito feliz em ouvir isso. Joaquim e Rosa vão ficar mais tranquilos quando souberem. E, aliás, liguei por outro motivo: amanhã é o aniversário de Ariadne. Nós queríam
Capítulo 15: Sobrevivendo às SombrasAs luzes brilhantes de Orlando nunca pareceram tão frias quanto nas últimas oito semanas para Ariadne. Aos 16 anos, a jovem caminhava pelas ruas, arrastando os pés descalços e carregando apenas uma pequena sacola com algumas roupas desgastadas. Seus cabelos brancos, que já chamavam atenção antes, agora estavam sujos e embaraçados, destacando ainda mais sua figura frágil e abatida.Os primeiros dias foram os mais difíceis. Ariadne procurava restos de comida em lixeiras atrás de restaurantes, enfrentando o olhar de desprezo das pessoas que cruzavam seu caminho. Quando a fome apertava demais, ela tentava pedir esmolas, mas poucos paravam para ouvi-la. O frio das madrugadas castigava seu corpo fraco, obrigando-a a se encolher sob caixas de papelão ou procurar abrigo em becos sujos e úmidos.— Por favor… só um pedaço de pão… — murmurava ela, com a voz quase sumindo, enquanto estendia a mão para desconhecidos que passavam apressados.A noite era o pior
Capítulo 16:A Chuva e a MúsicaMarcos assentiu. Ele caminhou até a recepção, preencheu os formulários com informações básicas e, com um último olhar preocupado em direção à ala de emergência, saiu do hospital com Amélia.Horas depois, Ariadne acordou em um quarto pequeno, mas limpo. Ela estava deitada em uma cama macia, com um soro ligado em seu braço. Uma enfermeira loira entrou no quarto, com um sorriso caloroso.— Hello, sweetheart. Are you feeling better?Ariadne franziu o cenho, tentando entender o que a mulher dizia. Ela não falava inglês. A enfermeira percebeu a confusão no rosto dela.— Oh… You don’t understand, do you? Wait here, okay?A mulher saiu e voltou alguns minutos depois com outra enfermeira, esta de cabelos castanhos e pele morena. Ao abrir a porta, a nova enfermeira sorriu suavemente.— Oi, querida. Você fala português?Os olhos de Ariadne se encheram de lágrimas. Finalmente, alguém que a entendia.— Sim… sim, eu falo.— Meu nome é Luciana, sou brasileira. Como vo