— Sr. Sílvio, por favor, mantenha a calma! — Implorou Arthur.Sílvio agarrou a gola do jaleco de Arthur e, com um soco firme e cheio de raiva, acertou o rosto do médico. O impacto foi tão forte que um dos dentes de Arthur foi cuspido no chão.— Manter a calma? Você quer que eu mantenha a calma? Me diz como, desgraçado! Vocês estão cada vez mais ousados! Quem autorizou vocês a interromper a cirurgia? Quem mandou levar ela pra cá, hein? Responde!Com um chute certeiro no peito de Arthur, Sílvio o fez gemer de dor, enquanto o médico, suando frio, não ousava reagir:— Sr. Sílvio, eu fiz o possível, mas a Sra. Lúcia... ela não resistiu. Foi o destino, senhor.— Destino, o caralho! Levanta agora! Vai continuar a tentar salvar ela, já! — Gritou Sílvio, agarrando o braço de Arthur e o puxando com força, tentando obrigá-lo a se levantar.Arthur foi arrastado pelo chão, o jaleco branco se rasgando enquanto tentava resistir.— Sr. Sílvio, mesmo que o senhor queira a minha vida, eu não posso fazer
Aquelas palavras atingiram Sílvio como uma faca no peito, fazendo sua raiva explodir.— Saiam daqui! Todos vocês, agora! Sumam da minha frente! — Berrou Sílvio, sua voz ecoando pelas paredes frias do necrotério.— Sr. Sílvio, por favor, tente se acalmar... meus pêsames. — Leopoldo observava o estado emocional crítico do chefe com preocupação.Ninguém conhecia melhor que Leopoldo o quanto Lúcia significava para Sílvio. Ele sabia que Sílvio era capaz de qualquer coisa por ela, até mesmo doar uma parte do próprio fígado, como já havia feito uma vez. Apesar de sua dificuldade em expressar sentimentos, o amor que ele sentia por Lúcia era inquestionável.— Eu mandei vocês saírem! Vocês estão surdos ou o quê? Ninguém entra aqui sem a minha permissão, entendeu? Fora! — Rugiu Sílvio, ainda mais furioso, os olhos brilhando de ódio.Leopoldo e Arthur trocaram olhares tensos. Ambos se levantaram do chão com dificuldade, ainda sentindo os golpes de Sílvio, e deixaram o necrotério em silêncio. Antes
— Boa notícia. — Disse Giovana.— Lúcia morreu. Desta vez é de verdade.— Morreu mesmo? Mas há poucos dias ela também tinha “morrido”. Será que desta vez...— Não vai ter volta. Nem Jesus pode salvá-la agora.— E a má notícia?— Lúcia já era, mas se você não conseguir fazer o Sílvio se apaixonar por você dentro de um mês, você também não terá mais utilidade como peça no meu jogo.— Pode confiar em mim. Com a Lúcia fora do caminho, nenhum problema será grande demais!Giovana sentiu os olhos se encherem de lágrimas de felicidade. Lúcia estava morta. Finalmente morta. Ela chorava, mas de alegria. Era como se já tivesse um pé dentro da família Baptista. Durante todo esse tempo, aquele velho desgraçado a havia torturado, mas agora ela tinha entendido: grandes conquistas exigem grandes sacrifícios, e ela estava disposta a pagar o preço.Sílvio seria dela. A fortuna da família Baptista também. Ela sabia esperar. Quando finalmente se tornasse a Sra. Baptista, daria cabo daquele velho nojento,
Na maca, havia alguém deitado. Todo o corpo estava coberto por um lençol branco, escondendo completamente o rosto e a identidade da pessoa.Os dedos longos e ossudos de Sílvio se aproximaram, hesitantes, para puxar o lençol. Mas suas mãos tremiam incontrolavelmente. Ele não queria encarar o que estava debaixo do tecido.Pelo contorno do corpo, pela silhueta inconfundível, parecia ser Lúcia. Mas ele ainda se agarrava à ilusão, à esperança de que fosse outra pessoa. Não podia ser ela. Era impossível que fosse.Com um movimento brusco, ele puxou o lençol. O tecido deslizou de sua mão e caiu no chão com um som seco. O impacto ecoou na sala fria, mas não se comparava ao golpe que ele sentiu no peito ao ver o que estava diante dele.Era Lúcia. Vestida com um uniforme de hospital, deitada ali, imóvel. A roupa estava impecável, limpa e organizada. Obviamente, as enfermeiras haviam trocado as roupas que ela usava antes de pular.O rosto de Lúcia estava pálido como uma folha de papel. Seus longo
— Eu não tinha outra escolha, Lúcia. Foi por isso que fiz o que fiz. Suas memórias eram dolorosas demais... Eu só queria que você fosse feliz, que pudesse viver sem aquele peso. Eu queria que voltássemos a ser como antes. Mas você acabou se lembrando de tudo, não foi? Lembrou de cada detalhe. Mas o erro é meu, eu admito. Eu mereço o seu ódio, mereço as suas maldições. Só quero que você abra os olhos, apenas uma vez. Tudo o que você quiser saber, eu posso te contar. Tudo o que você quiser ouvir, eu vou dizer.A voz de Sílvio tremia. Ele segurava a mão dela com força, como se temesse que ela desaparecesse para sempre:— Qualquer coisa que você queira fazer, eu vou te apoiar. Sem condições, sem limites. Lúcia, na verdade... eu escondi tantas coisas de você, tantas! E agora, eu posso te contar tudo. Por exemplo, quando você fez a cirurgia, eu não saí do país para negociar um contrato. Seu fígado é o meu. Os médicos disseram que o risco de substituir o órgão inteiro era enorme, que talvez e
— E sobre aquela gerente de contas... Eu encerrei o contrato com ela porque ela tentou me seduzir. Ainda teve a audácia de debochar de você na minha frente, dizendo que você e o Eduardo eram amantes. Eu queria que ela te pedisse desculpas, que te tratasse bem, que fizesse você se sentir feliz. Mas eu estraguei tudo. Nunca imaginei que ela fosse te sequestrar... e ainda por duas vezes!Sílvio respirou fundo, com a voz embargada, antes de continuar:— E a Giovana... Lúcia, eu nunca encostei nela. Nunca. Nem com um dedo. A única mulher que eu já toquei foi você. Só você, Lúcia.Ele passou a mão pelos cabelos, como se lutasse contra a dor que o consumia:— Quanto às pílulas... Eu queria que você engravidasse. Foi por ciúmes, por insegurança. Você e o Basílio não têm limites, e isso me deixava louco. Eu ficava furioso, mas mesmo assim, nunca consegui te deixar. O Sílvio que você via era agressivo, sempre te forçando, te intimidando, te ameaçando. Mas isso era só uma fachada, Lúcia. O verdad
Leopoldo sentiu o pálpebra tremer, mas, mesmo assim, arriscou perguntar com cuidado:— Vamos levar a Sra. Lúcia para casa? Ou para o crematório?Assim que terminou a frase, sentiu o olhar afiado de Sílvio pousar sobre ele como uma lâmina fria.Leopoldo imediatamente fechou a boca, engolindo seco. Sabia que tinha falado mais do que devia.— Leve a Lúcia de volta para a UTI! Continuem tentando reanimá-la! — Ordenou Sílvio.— Mas... — Leopoldo ficou atônito. Como assim continuar tentando? Ela já estava sem sinais vitais!Antes que pudesse dizer mais alguma coisa, Sílvio cortou sua dúvida com firmeza:— Vou ligar para o Daulo. Ele pode tentar.Sem questionar mais, Leopoldo rapidamente organizou os funcionários para levar Lúcia de volta. O corpo foi retirado da gelada sala do necrotério e colocado na maca, sendo transportado pelo elevador exclusivo para pacientes. Quando chegou à UTI, ela foi conectada novamente aos aparelhos. Monitores começaram a emitir seus sons regulares, mas o traçado
Sílvio dirigiu a noite inteira em direção à Serra Encantada, sem sequer parar para comer. Seu estômago, vazio há horas, já estava tão acostumado à fome que parecia ter perdido a sensibilidade.A neve em Serra Encantada caía muito mais intensa que na Cidade A. O chão estava coberto por uma grossa camada de gelo, tornando as estradas traiçoeiras. A pista de asfalto que levava à Serra era estreita e íngreme, e os pneus do carro deslizavam a cada curva. Por várias vezes, ele quase perdeu o controle e viu o carro flertar perigosamente com o abismo ao lado.Com uma das mãos firmes no volante, Sílvio pegou um chocolate com a outra, rasgando o papel com os dentes e colocando o doce na boca. Em momentos de fome extrema, o açúcar era a única coisa que lhe dava energia.Talvez fossem seus pais, falecidos há tantos anos, que lá do céu estivessem cuidando dele. Às duas da madrugada, ele finalmente chegou ao pé da Serra Encantada. Assim que estacionou o carro e abriu a porta, o frio cortante o envol