— E sobre aquela gerente de contas... Eu encerrei o contrato com ela porque ela tentou me seduzir. Ainda teve a audácia de debochar de você na minha frente, dizendo que você e o Eduardo eram amantes. Eu queria que ela te pedisse desculpas, que te tratasse bem, que fizesse você se sentir feliz. Mas eu estraguei tudo. Nunca imaginei que ela fosse te sequestrar... e ainda por duas vezes!Sílvio respirou fundo, com a voz embargada, antes de continuar:— E a Giovana... Lúcia, eu nunca encostei nela. Nunca. Nem com um dedo. A única mulher que eu já toquei foi você. Só você, Lúcia.Ele passou a mão pelos cabelos, como se lutasse contra a dor que o consumia:— Quanto às pílulas... Eu queria que você engravidasse. Foi por ciúmes, por insegurança. Você e o Basílio não têm limites, e isso me deixava louco. Eu ficava furioso, mas mesmo assim, nunca consegui te deixar. O Sílvio que você via era agressivo, sempre te forçando, te intimidando, te ameaçando. Mas isso era só uma fachada, Lúcia. O verdad
Leopoldo sentiu o pálpebra tremer, mas, mesmo assim, arriscou perguntar com cuidado:— Vamos levar a Sra. Lúcia para casa? Ou para o crematório?Assim que terminou a frase, sentiu o olhar afiado de Sílvio pousar sobre ele como uma lâmina fria.Leopoldo imediatamente fechou a boca, engolindo seco. Sabia que tinha falado mais do que devia.— Leve a Lúcia de volta para a UTI! Continuem tentando reanimá-la! — Ordenou Sílvio.— Mas... — Leopoldo ficou atônito. Como assim continuar tentando? Ela já estava sem sinais vitais!Antes que pudesse dizer mais alguma coisa, Sílvio cortou sua dúvida com firmeza:— Vou ligar para o Daulo. Ele pode tentar.Sem questionar mais, Leopoldo rapidamente organizou os funcionários para levar Lúcia de volta. O corpo foi retirado da gelada sala do necrotério e colocado na maca, sendo transportado pelo elevador exclusivo para pacientes. Quando chegou à UTI, ela foi conectada novamente aos aparelhos. Monitores começaram a emitir seus sons regulares, mas o traçado
Sílvio dirigiu a noite inteira em direção à Serra Encantada, sem sequer parar para comer. Seu estômago, vazio há horas, já estava tão acostumado à fome que parecia ter perdido a sensibilidade.A neve em Serra Encantada caía muito mais intensa que na Cidade A. O chão estava coberto por uma grossa camada de gelo, tornando as estradas traiçoeiras. A pista de asfalto que levava à Serra era estreita e íngreme, e os pneus do carro deslizavam a cada curva. Por várias vezes, ele quase perdeu o controle e viu o carro flertar perigosamente com o abismo ao lado.Com uma das mãos firmes no volante, Sílvio pegou um chocolate com a outra, rasgando o papel com os dentes e colocando o doce na boca. Em momentos de fome extrema, o açúcar era a única coisa que lhe dava energia.Talvez fossem seus pais, falecidos há tantos anos, que lá do céu estivessem cuidando dele. Às duas da madrugada, ele finalmente chegou ao pé da Serra Encantada. Assim que estacionou o carro e abriu a porta, o frio cortante o envol
"Eu só quero que ela viva bem."Sílvio apertou os punhos com força, olhando para o céu escuro enquanto a neve caía ao seu redor. "Deus, agora eu acredito em causa e efeito, em retribuição. Mas nunca imaginei que a minha seria perder a Lúcia para sempre. Já estou com leucemia em estágio terminal... Que todos os sofrimentos recaiam sobre mim. Eu sou um homem. Sou eu quem deve suportar tudo isso. Poupe a Lúcia. A vida tranquila dela foi destruída por mim. Quem fez todas as coisas ruins fui eu, então quem deve ser punido também sou eu."O vento uivava ao redor. Seus ouvidos estavam tão congelados que já não sentia nada. As longas pestanas de Sílvio tremiam levemente. A madrugada era escura como um poço sem fundo, e a neve caía tão forte que sua visão começava a se turvar.Enquanto caminhava, a culpa corroía sua mente. Ele se arrependia de tudo, mas o frio extremo já tinha entorpecido seu corpo. Ele estava congelado, faminto e exausto.O sangue começou a escorrer de seu nariz, pingando em g
O padre olhou para Sílvio, balançou a cabeça em silêncio e o conduziu para a nave principal da igreja. Sílvio ajoelhou-se diante do crucifixo.Em sua mente, uma oração fervorosa se formava: se Lúcia pudesse acordar, ele estaria disposto a trocar dez anos de sua vida por isso. Se fosse necessário morrer imediatamente, ele aceitaria, contanto que a mulher que amava superasse aquele momento difícil.Após terminar a oração, Sílvio seguiu os passos do padre até o pátio dos fundos. A neve ainda caía em silêncio, cobrindo tudo ao redor com um manto branco.Eles pararam ao lado de uma árvore antiga e imponente. Os galhos grossos da árvore estavam cobertos de neve. Quando o vento cortante soprou, a neve acumulada nos galhos caiu de forma abrupta, criando uma cena desoladora, quase melancólica.Os galhos, embora ainda com um pouco de neve pendurada, pareciam tão frágeis quanto os sentimentos que Sílvio carregava no peito.[Que Sílvio acorde em paz.]Seus olhos foram imediatamente atraídos para u
— Sílvio, finalmente me tornei sua esposa! Estou tão feliz! Espero que todos os nossos dias sejam tão alegres quanto hoje!— Este é o relógio que estou te dando de presente, Sílvio. Coloque-o no pulso e prometa que nunca vai tirá-lo escondido! Você trabalha tanto, nem tem tempo para ficar comigo. Mas sei que é pelo nosso futuro, afinal, não podemos depender para sempre dos nossos pais, não é? Meu pai pode ser muito capaz, mas não vai estar aqui para sempre para nos proteger de tudo. Temos que construir nosso próprio caminho. Quando você estiver no trabalho, olhe para o relógio e pense em mim, só um pouquinho. Enquanto isso, eu fico aqui, sem nada para fazer além de pensar em você o dia inteiro.— Sílvio, você prefere ter um menino ou uma menina? Se você gostar dos dois, posso te dar dois filhos! Um menino e uma menina, que tal? Você escolhe o nome do menino, e eu escolho o da menina. Será que eles vão se parecer mais com você ou comigo?— Sílvio, hoje é Natal! Você sabe o que significa
Basílio ergueu o punho novamente, pronto para acertar outro soco em Sílvio.— Sr. Basílio, acalme-se! O que está feito, está feito. Mesmo que o senhor mate o Sr. Sílvio de tanto bater, isso não vai mudar nada! A raiva é sua pior inimiga! — Leopoldo segurou Basílio pelo braço, impedindo-o de continuar a agressão.O rosto de Basílio ficou ainda mais sombrio.— Solte ele! — Ordenou Sílvio.— Sr. Sílvio, o senhor perdeu o juízo? Ele está te batendo e me pede pra soltá-lo? — Leopoldo ficou atônito.Sílvio riu com desprezo:— Vou repetir: solte ele!Mesmo contrariado, Leopoldo não teve escolha. Soltou o braço de Basílio e deu um passo para trás.Sílvio, com esforço, levantou-se do chão. Limpou o sangue que escorria do canto da boca, soltando um gemido de dor ao tocar na ferida.— Lúcia já acordou? — Perguntou Sílvio, aproximando-se de Basílio.Se Basílio estava ali, então talvez Daulo também estivesse. Será que Lúcia finalmente havia sido salva?Mas antes que pudesse dizer mais alguma coisa,
— Eu só queria que ela voltasse a viver. — Sílvio murmurou com um sorriso amargo.— Ela não vai voltar! Acorde! Lúcia precisa ser levada ao crematório e cremada! Como amigo dela, é meu dever garantir que ela tenha uma despedida digna! — Basílio estreitou os olhos, sua voz fria como gelo. — Você vai levá-la ou eu levo por você?— Eu mesmo a levarei. — Respondeu Sílvio, com a voz firme.O corpo de Lúcia foi trazido para fora da UTI pelos enfermeiros. Talvez por conta das medicações ou dos tratamentos, seu rosto estava inchado, assim como o resto do corpo. Quando o corpo chegou à entrada do hospital, a van funerária, organizada por Basílio, já estava à espera.Os funcionários do necrotério, vestidos de preto e usando luvas descartáveis, carregaram o corpo de Lúcia com expressões solenes e o colocaram na van.Sílvio seguiu o cortejo, entrando no banco traseiro da van. Leopoldo, preocupado com ele, sentou-se no banco do passageiro. Basílio, por sua vez, foi em seu próprio carro, dirigindo s