Capítulo 2

Capítulo 2

Jussara ouviu uma leve batida em sua porta. Ela abriu e viu Dona Amélia, que parecia já estar de saída, carregando uma pequena bolsa de viagem.

— Jussara, querida, eu preciso sair agora. A situação da minha irmã é delicada, e vou direto para o aeroporto — disse Dona Amélia, ajeitando o casaco enquanto dava um sorriso breve, mas preocupado.

— Claro, Dona Amélia. Pode deixar que eu cuido de tudo aqui — respondeu Jussara, passando segurança.

Dona Amélia suspirou em alívio, segurando a mão de Jussara por um instante.

— Obrigada, minha querida. Ele é teimoso, mas tenha paciência. O Gabriel... — ela hesitou, buscando as palavras. — Ele está com a alma tão ferida quanto o corpo.

Jussara assentiu, vendo o amor e a dor que transpareciam nos olhos da mãe. Com um aceno breve, Dona Amélia partiu, deixando a mansão em um silêncio quase absoluto.

Assim que fechou a porta, Jussara foi até a mesa onde havia anotado os horários dos remédios de Gabriel. O primeiro deles estava próximo, então pegou o comprimido e um copo de água e seguiu até o quarto dele. Ao abrir a porta e encontrar o espaço vazio, franziu o cenho.

“Será que ele está na sala?”, pensou, indo direto para a sala, mas Gabriel não estava ali. Olhou ao redor, até que avistou um dos empregados passando pelo corredor.

— Com licença — chamou ela, com um sorriso educado. — Você sabe onde o senhor Gabriel está?

O empregado inclinou a cabeça em um gesto respeitoso.

— Ele está no escritório, senhorita.

Agradecendo, Jussara se dirigiu ao escritório, onde a porta estava fechada. Respirou fundo e bateu duas vezes. De dentro, a voz firme de Gabriel ecoou:

— Entre.

Jussara abriu a porta devagar, encontrando Gabriel concentrado, com os olhos fixos nos papéis à sua frente. Ele mal levantou a cabeça para vê-la, mas o ar de irritação era inconfundível.

Ela se aproximou com calma, segurando o copo de água e o comprimido.

— Está na hora do seu remédio — disse ela, em um tom firme, mas amigável.

Ele não reagiu. Os olhos continuavam fixos nos documentos como se ela não estivesse ali.

Ignorando a atitude, Jussara aproximou-se ainda mais, posicionando o comprimido na frente dele. Com a mão firme, estendeu o copo d’água.

Gabriel bufou, desviando o olhar dos papéis apenas o suficiente para lançar-lhe um olhar de irritação.

— Não tenho tempo para isso.

Ela manteve a postura, sem se abalar.

— É importante, senhor Monteiro. Quanto mais o senhor evitar o tratamento, mais tempo levará para a recuperação.

Ele cerrou os lábios, olhando para o comprimido com uma expressão amarga. Finalmente, pegou o remédio e o copo da mão dela, engolindo ambos com visível desgosto. Quando terminou, devolveu o copo, seu rosto tenso.

Jussara sorriu de leve, com paciência.

— Obrigada. Daqui a pouco voltarei para ver o curativo, se o senhor estiver disponível.

Ele não respondeu, voltando a encarar os papéis, visivelmente desconfortável com o ato de ser cuidado. Sem mais palavras, Jussara saiu do escritório, fechando a porta com cuidado. Sabia que esse era apenas o começo de uma longa batalha, mas estava disposta a enfrentar cada momento com a mesma calma, mesmo que Gabriel continuasse a se comportar como um paciente teimoso e resistente.

Mais tarde, já no final da tarde, Jussara se dirigiu ao escritório novamente, com o kit de primeiros socorros em mãos. Bateu levemente na porta e, após a permissão um pouco relutante dele, entrou. Gabriel estava na mesma posição, imerso nos documentos, mas quando a viu entrar, soltou um suspiro curto.

Ela se aproximou, mantendo o tom profissional:

— É hora do outro comprimido, e eu também preciso fazer o curativo — disse, estendendo o remédio e o copo d'água.

Dessa vez, sem dizer nada, Gabriel pegou o comprimido, tomou a água, e então, sem hesitar, tirou a camisa. Jussara sentiu o coração acelerar por um momento ao ver o tórax bem definido e marcado por hematomas, resultado do acidente recente. Engoliu em seco e forçou-se a manter a compostura, estendendo as mãos para que ele lhe mostrasse o ferimento.

Ele abaixou um pouco a borda da calça de moletom, revelando o corte já parcialmente cicatrizado. Jussara prendeu a respiração mais uma vez, tentando focar no curativo, mas consciente de cada detalhe. Gabriel ergueu uma sobrancelha, notando sua hesitação com um olhar desconfiado.

Ela começou a limpar o ferimento com mãos firmes, mas enquanto trabalhava, ele a observava atentamente, como se tentasse decifrar seus pensamentos. De repente, ele quebrou o silêncio.

— Já sei por que você está aqui.

Jussara ergueu os olhos, surpresa, enquanto retirava as luvas.

— Não entendi…

— Não se faça de boba — ele disse, o tom de voz carregado de ironia. — Não imaginei que minha mãe faria uma coisa dessas… Mas vamos ver como você reage.

Antes que Jussara pudesse protestar, Gabriel a puxou para si, fazendo com que caísse em seu colo. E, sem aviso, aproximou-se e tomou seus lábios em um beijo intenso, a desafiando e a provocando ao mesmo tempo. Ela sentiu o coração disparar, e por um momento, tudo o que conseguia pensar era na intensidade daquele contato.

Ela o empurrou apesar de ter gostado do contato, então se afastou, com as bochechas quentes, respirando fundo para retomar o controle.

— Senhor Monteiro — disse ela, recobrando o tom profissional. — Eu estou aqui para cuidar da sua recuperação, não para… isso.

Gabriel a soltou, um leve sorriso debochado nos lábios, mas não disse nada. O olhar intenso, porém, a acompanhou enquanto ela se levantava e ajeitava o uniforme, determinada a manter sua postura.

— Boa noite, senhor — disse, antes de sair do escritório com a cabeça erguida, ainda sentindo o pressão dos lábios nos seus.

Gabriel observou enquanto Jussara fechava a porta, o rosto dela estava sério, mas com uma expressão que ele interpretou como uma confirmação das suas suspeitas. Um sorriso discreto e satisfeito surgiu em seus lábios. Ele não tinha mais dúvidas: estava certo sobre ela, estava ali para algo mais.

Ela havia aceitado o beijo, ainda que tenha se afastado depois. Mas para Gabriel, isso só confirmava suas suspeitas de que sua mãe lhe trouxera uma “enfermeira” com intenções muito além dos cuidados médicos. A ideia de que sua mãe teria contratado alguém para distrair sua solidão, alguém para lhe proporcionar um tipo de alívio, soava quase cômica, mas conveniente.

Era inegável que Jussara era uma mulher atraente, com um jeito que o intrigava, e o toque delicado dos dedos dela em sua pele o deixou arrepiado. Aquele toque, somado à inesperada resposta ao seu beijo, só reforçava suas conclusões. Os lábios dela são macios, se ela não tivesse se desvencilhado ainda estariam se beijando, iria explorar cada canto daquela boca.

O único problema era que ele não tinha certeza se seu corpo estava pronto para esse tipo de “aventura”, ao menos, não ainda. Mas, ao olhar para a porta onde ela saíra, sabia que o tempo e a convivência tratariam de resolver essa dúvida. Ele sorriu a imaginar a quantidade de beijos que sabiam que iriam trocar depois desse primeiro.

Por ora, ele iria observar, testar e, se tudo ocorresse como previa, descobrir o quanto aquela enfermeira realmente estava disposta a agradá-lo.

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