Capítulo 3
Jussara entrou no quarto e, ao fechar a porta atrás de si, recostou-se nela, ainda tentando assimilar o que acabara de acontecer. Sentia o coração batendo rápido e as mãos trêmulas, enquanto lembrava do beijo intenso de Gabriel. Uma sensação de vulnerabilidade a pegou de surpresa; ele a havia deixado abalada, e a imagem daquele momento ainda girava em sua mente. Ela passou a mão nos lábios, onde o toque dele parecia ainda presente, e suspirou, um tanto indignada consigo mesma. Não fazia sentido. O que ele estava pensando? E por que ela reagiu daquela forma, caindo tão facilmente na provocação dele? "Caí como um patinho," pensou, sentindo-se incrédula. Era impossível negar que aquele fora o melhor beijo que já tivera. Mas, ao mesmo tempo, uma dúvida insistente começava a se formar. Será que ele apenas estava testando os limites? Ou era uma espécie de jogo para ele? Ainda que ela tentasse manter o profissionalismo, Gabriel estava conseguindo abalar suas defesas. Respirando fundo, Jussara afastou-se da porta, tentando se recompor. Sabia que precisava manter o foco. Estava ali para cuidar dele, nada mais. Mas, conforme fechava as cortinas e se preparava para dormir, uma sensação inesperada de antecipação fazia seu coração bater mais forte. Por mais que tentasse negar, sabia que enfrentar Gabriel nos próximos dias não seria uma tarefa tão simples quanto imaginava. *** Na manhã seguinte, Jussara despertou antes do sol nascer, lembrando-se de que precisava dar o remédio a Gabriel pontualmente às seis horas. Sabia que ele estaria em seu quarto, e uma parte dela simplesmente não queria ir até lá. Ainda estava abalada pela intensidade do dia anterior, pelo beijo que a deixara confusa, e a última coisa que desejava era enfrentar Gabriel Monteiro de novo tão cedo, especialmente se ele decidisse brincar com ela da mesma forma. Mas não tinha escolha. Era seu trabalho, afinal. "Agora faz sentido o salário alto," pensou, irritada. Cuidar de Gabriel Monteiro não era apenas uma questão de tratamentos e remédios, mas também de aguentar seu temperamento difícil. Ele era insuportável, arrogante, e, apesar de tudo, por alguma razão, ela ainda se sentia vulnerável perto dele. Respirando fundo, Jussara ajeitou o uniforme e se preparou para encarar o início de mais um dia. Ela respirou fundo antes de abrir a porta que conectava os dois quartos. Era cedo, e ela esperava que a manhã fosse tranquila, com Gabriel, sem disposição para mais provocações. Atravessou o quarto em silêncio, esperando que seus olhos se acostumassem à pouca luz. Quando se aproximou da cama, a visão do tórax definido dele, parcialmente descoberto, a deixou boquiaberta. Por um momento, esqueceu-se do porque estava ali; ele tinha um corpo tão bonito, mais imponente do que ela esperava. Tentando manter o foco, Jussara deu um passo à frente e ligou o abajur, chamando-o com a voz baixa: — Senhor Monteiro… está na hora do seu remédio. Mas antes que pudesse terminar a frase, Gabriel despertou com um grito: — NÃO! O coração dela deu um salto, e ela recuou um passo, surpresa pela intensidade do grito. Ele respirava pesadamente, os olhos ainda semicerrados, como se estivesse preso a um pesadelo. O rosto parecia tenso. Jussara permaneceu quieta, esperando ele se acalmar, o tom de voz agora mais suave: — Ei… você está bem? Gabriel abriu os olhos lentamente, e a visão de Jussara ao seu lado, o deixou irritado de imediato. Sentia-se exposto, vulnerável, principalmente por ela ter testemunhado um momento tão íntimo, um resquício dos pesadelos que o perseguiam desde o acidente. Os sonhos eram intensos, como se fossem reais, e ele odiava a sensação de estar fora de controle. Com a voz grave e baixa, quase sussurrando, ele falou, mas o tom carregava uma frieza que fez Jussara estremecer: — Saia daqui. Jussara engoliu seco, os olhos fixos nele por um instante, antes de colocar o remédio cuidadosamente sobre a mesa de cabeceira. Sem dizer uma palavra, deu um passo para trás, afastando-se em silêncio até a porta, e saiu do quarto, o coração batendo rápido. *** A manhã passou devagar para Jussara, cada hora parecendo mais longa que a anterior. O encontro com Gabriel a deixara abalada, e ela decidiu não retornar ao quarto dele até o horário do próximo remédio. Tentou se distrair, mas seus pensamentos continuavam voltando ao olhar gélido e ao tom de voz que ele usara. Pela primeira vez desde que aceitara o emprego, questionou se realmente deveria continuar ali. Quando o horário do almoço chegou, ela nem sequer teve vontade de ir se alimentar. O estômago parecia embrulhado pela intensidade de seus sentimentos. A lembrança do beijo do dia anterior ainda pairava, misturada com a estranha vulnerabilidade que testemunhara naquela manhã. Trancada no quarto, Jussara se deu um tempo para tentar reorganizar os pensamentos. Precisaria encarar Gabriel mais uma vez, e, apesar de tudo, não permitiria que ele a abalasse de novo. Quando o horário do próximo remédio chegou, Jussara respirou fundo e bateu à porta do escritório. Gabriel, sem levantar o olhar dos documentos que espalhava pela mesa, estendeu a mão automaticamente. Ela entregou o comprimido e um copo d'água, e ele o tomou sem sequer desviar os olhos para ela. Em um esforço para ser educada e profissional, perguntou calmamente: — O senhor conseguiu almoçar? Ele não respondeu, focado nos papéis, parecendo ignorar sua presença. Com uma expressão neutra, Jussara se deu por vencida e saiu, indo direto para a cozinha para se certificar. Perguntou aos funcionários, e eles confirmaram que Gabriel estava fazendo todas as refeições normalmente. Um alívio a tomou, e ela saiu satisfeita, embora ainda sem entender por que isso a deixava tão tranquila. De volta ao quarto, Jussara ainda não sentia fome. Decidiu aproveitar o intervalo do próximo horário de medicação para descansar um pouco. Assim que se deitou, percebeu o quanto o dia fora desgastante, e, antes que pudesse evitar, acabou adormecendo profundamente. Acordou assustada com o despertador tocando, lembrando que já estava em cima da hora para o remédio e o curativo de Gabriel. Arrumou-se rapidamente e foi até o escritório, mas ele não estava lá. Decidida a encontrá-lo, foi até a sala de estar e o encontrou lá, sentado no sofá, vestido apenas com uma bermuda, descalço e sem camisa. O corpo bem definido a deixou paralisada por um momento. O cheiro de banho recém tomado invadiu o ambiente. Gabriel notou a presença dela, levantou uma sobrancelha e perguntou com um tom ligeiramente debochado: — Gostou do que viu? Jussara se recompôs rapidamente, tentando ignorar o calor que subiu em seu rosto. Mantendo a postura profissional, respondeu calmamente: — Só vim trazer seu remédio e fazer o curativo. Se puder colaborar, isso vai ser rápido. Ele sorriu de lado, um sorriso que parecia misturar desafio e provocação. Sem dizer nada, Gabriel apenas acenou com a cabeça, como quem concede permissão, e esticou a mão para pegar o comprimido, que engoliu com a água que ela ofereceu. — Agora, se puder mostrar o machucado, farei o curativo. Gabriel suspirou, com uma expressão de impaciência, mas abaixou levemente a borda da bermuda, revelando a área machucada perto do abdômen. Ela tentou manter a concentração, mas a proximidade e o cheiro dele deixaram o ar pesado. Enquanto fazia o curativo, Jussara sentiu o olhar de Gabriel sobre ela, observando-a atentamente, quase desconfiado. Por um breve instante, ele parecia se deixar levar por algo além da frustração e da raiva. — Você tem mãos de anjo — disse ele, com a voz suave. Gabriel a olhou com intensidade, como se estivesse tentando decifrar algo mais profundo nela. Então, para sua surpresa, ele tocou levemente o rosto dela, fazendo com que seu coração disparasse. Jussara sentiu uma onda de calor invadir seu corpo. Aquele gesto de ternura a pegou desprevenida, e por um momento, ela se permitiu pensar que talvez, por trás da fachada dura e irritada, existisse um homem bom. Com todo carinho, Gabriel a puxou suavemente, fazendo-a sentar em seu colo. A proximidade entre eles era elétrica. Os lábios dele pressionaram os seus de maneira inesperada. A sensação era intensa, uma mistura de paixão e confusão que tomou conta dela. E se viu o beijando com fervor. Ela tentou se afastar, mas não conseguiu resistir ao calor do momento. A mente lutava contra o corpo; a última coisa que ela queria era se deixar levar por um homem que parecia tão complicado. Mas a intensidade do beijo e a forma como ele a segurava a deixaram sem fôlego. Era como se todos os sentimentos reprimidos e a dor do dia anterior fossem engolidos naquele beijo. Com muito esforço, empurrou Gabriel levemente, recuando e encarando-o com olhos confusos repletos de desejo e indignação. — O que foi isso? — perguntou, a voz trêmula, ainda sentindo a intensidade do beijo. Ele a olhou de volta, um sorriso arrogante e provocador se formando em seus lábios. — Apenas um teste, Jussara. Queria ver até onde você iria. Ela se levantou rapidamente, afastando-se dele e tentando recuperar a compostura. O coração ainda batia acelerado, e sua mente girava com o ocorrido. Sem dizer mais nada, Jussara se retirou, fechando a porta atrás de si, tentando processar a intensidade do momento. Gabriel, por sua vez, permaneceu no sofá, um sorriso satisfeito no rosto ao perceber que havia conseguido despertar algo nela.Capítulo 4Uma semana se passou desde aquele beijo inesperado, e Jussara ficou impressionada com o comportamento de Gabriel. Ele não havia feito mais nenhuma tentativa de se aproximar dela de maneira íntima. Na verdade, sua atitude tinha sido bastante neutra, quase indiferente, como se o momento que compartilharam tivesse sido apenas um capricho passageiro. Mas, por outro lado, a ausência de suas investidas deixou Jussara com uma sensação estranha, como se um vazio tivesse se instalado entre eles.No entanto, suas noites mudaram. Desde aquele dia, seus sonhos começaram a ser invadidos por ele. Todas as noites, Gabriel aparecia em sua mente, sempre a beijando com a mesma intensidade e paixão que ela havia sentido em seus lábios. No último sonho, os dois foram além, e Jussara acordou com o coração acelerado, a respiração entrecortada e a sensação de seus lábios ainda quentes.Ela se pegou pensando nos detalhes vívidos: a forma como ele a segurava, o toque firme de suas mãos, o jeito com
Capítulo 5Gabriel afastou seus lábios dos dela, deslizando os dedos suavemente pelo rosto delicado.— Você vai ser minha.Jussara sentiu o corpo inteiro em chamas ao ouvir as palavras dele e, quase sem pensar, murmurou:— Vou...Para Gabriel, isso só confirmava o que ele já imaginava: Jussara era uma acompanhante. Se ela era uma profissional, certamente não se importaria em estar no controle. Apenas a ideia de tê-la despertava nele sensações intensas, algo que o surpreendia, pois, dias atrás, ele achava que o acidente e a quantidade de remédios que tomava impediriam qualquer desejo.No entanto, após a consulta médica de dois dias atrás, as doses foram reduzidas, e o corte no abdômen estava completamente cicatrizado. O maior obstáculo agora era ainda depender da cadeira de rodas. Apesar de já sentir alguma resposta nas pernas, ainda não conseguia movê-las como desejava, efeito do trauma. Mas o médico garantira que, em breve, ele voltaria ao normal.Enquanto isso, iria se satisfazer no
Capítulo 6Ao fechar a porta atrás de si, Jussara encostou-se, deixando finalmente as lágrimas rolarem livres. Ela se amaldiçoava por ter cedido tão fácil, se entregando àquele completo idiota. Mas, apesar de tudo, ela não podia negar: tinha sido bom. Talvez o melhor que já tivera. Ainda assim, decidiu que seria a primeira e última vez com ele.Com passos lentos, seguiu até o banheiro, onde lavou os vestígios do tempo que passaram juntos, como se quisesse apagar as lembranças daquela noite. Seus olhos estavam vermelhos, ardendo pela tristeza e raiva que borbulhava dentro dela.No final do dia, Jussara levou o remédio até o escritório de Gabriel. Ele parecia relaxado, mas sua expressão ainda era séria. Ao entregar o medicamento, ele a encarou e disse, com um tom provocativo:— Me encontre mais tarde no meu quarto.Ela sorriu, mas sua resposta foi firme.— Só nos seus sonhos.Virando-se para sair, Jussara mal percebeu a surpresa em seu rosto quando ele perguntou:— Você não gostou?Ela
Capítulo 7Ele segurou o braço dela e disse:— Preciso de você mais uma vez antes que vá.Ela ficou surpresa; hoje, ele estava diferente, quase educado. Então, se virou, e todo o desejo que tentou esconder nas últimas semanas relampejou em seus olhos. — O que você quer de mim? — perguntou, a voz tremendo levemente, dividida entre a esperança dele a querer como algo a mais e a dúvida.Gabriel a olhou com intensidade, seu olhar carregado de uma necessidade que ela nunca havia visto antes.— Jussara — começou ele, a voz baixa e hesitante —, eu preciso fazer amor com você antes que você se vá.A declaração caiu como uma bomba, fazendo seu coração disparar. Jussara ficou sem palavras, a mente em um turbilhão. Ele estava sendo sincero, e a intensidade do desejo em seu olhar a fez vacilar. — Gabriel, você... você não pode simplesmente me pedir isso assim — respondeu, a voz trêmula, tentando encontrar um equilíbrio entre o que desejava e o que sabia ser prudente.Ele se aproximou mais, a mã
Capítulo 8Jussara estava em casa, sentada no sofá, segurando o envelope que Gabriel lhe entregara. Ao abri-lo, ficou boquiaberta: em vez dos cinco mil reais mensais combinados, ele lhe dera quinze mil. Ficou surpresa e ao mesmo tempo aliviada. Com essa quantia, poderia se manter por um tempo até encontrar outro emprego.Conforme os dias se passaram, ela organizou sua vida. Quitou todas as contas atrasadas e decidiu mudar-se para uma kitnet num bairro mais barato. Agora, tinha o aluguel garantido por cinco meses, a despensa cheia, e as finanças em dia.Dois meses depois, a incerteza sobre o futuro ainda a preocupava; precisava encontrar outro trabalho dentro de um mês, mas, por algum motivo, ainda não havia sido chamada para nenhuma entrevista.Enquanto isso, Gabriel, após meses de recuperação, preparava-se para voltar ao trabalho. Ajustava o nó da gravata em frente ao espelho, sentindo-se aliviado por estar finalmente retomando sua rotina. Ainda mancava um pouco e, embora as muletas
Capítulo 9Jussara apertou o botão do elevador, tentando manter a compostura. Enquanto descia, pensava em como as coisas haviam saído de controle. Parecia que, desde o término com Marcos, tudo andava de mal a pior. Ela suspirou, reprimindo as lágrimas. Apaixonar-se por Gabriel havia sido um erro, e agora era ela quem pagava o preço. Decidida, concluiu que precisava de um novo emprego. No escritório, Gabriel ainda estava processando o que acabara de acontecer. O rosto ardia, e ele passou a mão pelos cabelos, exasperado. Por um momento, refletiu sobre sua abordagem impulsiva. Será que havia passado dos limites? Mal teve tempo de reorganizar os pensamentos quando a secretária entrou para confirmar a agenda do final do dia. Ela ficou muda ao notar a marca vermelha em seu rosto, mas, com profissionalismo, decidiu não comentar nada e confirmou a agenda antes de se retirar.Logo em seguida, Marcos entrou, já pedindo café para a secretária antes de fechar a porta. Ele se jogou na cadeira à f
Capítulo 10Gabriel decidiu que era melhor manter distância de Jussara por enquanto, até esclarecer todas as suas dúvidas. No final do dia, despediu-se da secretária e saiu apressado. Ele pegou o carro na garagem subterrânea e, ao chegar em casa, dirigiu-se diretamente à sala de leitura da mãe. Ela estava sentada em uma poltrona, devaneando em um livro.— Mamãe... — ele a chamou.— Ah, meu querido! — ela exclamou, sorrindo ao vê-lo. Desde o acidente que quase lhe custou a vida, ela se tornou mais carinhosa e atenta com o filho. Para ela, Gabriel era o resultado de um amor profundo que teve por seu falecido marido. — Estava ansiosa para saber sobre o que você quer conversar.— Preciso saber sobre a Jussara, mãe.— É mesmo? — perguntou, colocando o livro fechado sobre a mesinha ao lado e tirando os óculos. — O que você quer saber?Gabriel respirou fundo, sentindo a ansiedade crescer dentro dele. A última coisa que ele queria era parecer frágil ou confuso, mas a verdade era que Jussara e
Capítulo 11No dia seguinte, Gabriel chegou à empresa ao amanhecer, determinado a entender melhor a situação de Jussara. Sabia que o setor de telemarketing funcionava 24 horas, então queria garantir que estivesse por perto assim que ela chegasse. Aproveitando o silêncio da manhã, ele adiantou alguns documentos e organizou a mesa, tentando desviar a mente do que realmente o inquietava.Quando sua secretária entrou, estava tão acostumada a encontrar o escritório vazio àquela hora que deu um pequeno grito de surpresa ao vê-lo ali.— Senhor Gabriel! Desculpe, o susto — ela disse, colocando a mão no peito, enquanto ligava os computadores na mesa ao lado.Ele soltou um breve sorriso, tentando aliviar a tensão no ar.— Está tudo bem. Cheguei cedo para resolver algumas pendências.Ela assentiu, embora curiosa com a presença dele tão cedo. Gabriel voltou ao seu trabalho, mas, no fundo, aguardava o momento certo para verificar se Jussara estava no setor.Jussara se ajeitou no assento, sentindo