Capítulo 1
Brasil — São Paulo — SP. Gabriel Monteiro, CEO de uma das maiores empresas de tecnologia médica do país, estava no centro do silêncio da sala de estar, observando a chuva bater nas imensas janelas de vidro. Desde o acidente que o deixou numa cadeira de rodas, seu temperamento, já severo, piorara ainda mais. Ele odiava a ideia de depender de alguém, especialmente agora que sua mãe, a única pessoa em quem confiava, estava para viajar. Gabriel escutou um barulho às suas costas e se virou, ficou observando a mãe. Ela começou a falar toda ansiosa sobre a viagem para a Europa. Ele não a ouvia. Sua mente estava presa ao incômodo de ser tratado como se jamais fosse se recuperar do acidente que sofreu. Ficou perturbado ao ouvir que teria uma enfermeira para cuidar dele. - Eu não preciso de nenhuma babá cuidando de mim, mãe - ele grunhiu, com a voz firme. Ela suspirou, ignorando sua explosão de raiva com a paciência de quem já estava acostumada com o temperamento difícil do filho. - Gabriel, você ainda precisa de cuidados. Já conversamos sobre isso. Vou viajar para ver sua tia, e você não pode ficar sozinho, não nesse estado. Gabriel cerrou os punhos, sentindo o peso do orgulho esmagar sua resistência. Ser cuidado por uma estranha era insuportável para ele. - Contratei uma enfermeira de confiança. É uma jovem recém-formada. Ela começará amanhã - disse sua mãe, finalizando a conversa sem abrir espaço para mais protestos. Ele apenas bufou, virando a cadeira de rodas com um movimento brusco e saindo da sala. Não havia mais o que discutir. *** Jussara estava no estacionamento da mansão Monteiro, observando a imponente fachada à sua frente. Ela respirou fundo, tentando ignorar o nó em seu estômago. Trabalhar para uma das famílias mais ricas e influentes do país já seria desafiador por si só, mas o que a deixava realmente desconfortável era o peso da descoberta que ainda estava fresca em sua mente. Fazia apenas uma semana que havia terminado com Marcos, seu namorado e traidor. A traição de Marcos com sua melhor amiga a devastara, mas o que mais a atormentava era a sensação de estar sem chão, sem rumo. O convite para trabalhar como enfermeira na mansão Monteiro havia surgido como uma tábua de salvação no meio do mar, algo que a manteria ocupada e longe da dor. Respirando fundo, ela seguiu pelo caminho até a entrada da casa. *** Gabriel estava sentado em seu escritório quando ouviu batidas suaves na porta. - O que é agora? - ele murmurou, irritado. Sua mãe entrou primeiro, seguida por uma jovem de cabelos escuros. A garota olhava ao redor, incerta, claramente desconfortável com o clima tenso. - Gabriel, essa é Jussara, sua enfermeira. Ela cuidará de você enquanto estou fora - disse a mãe, com um sorriso encorajador para a jovem. Gabriel a encarou por um momento, o olhar duro e analítico. Era jovem, talvez cedo demais para lidar com alguém como ele. E o que mais o incomodava era a ideia de ter alguém tão... próximo. Ele não queria ajuda, muito menos de alguém tão frágil à primeira vista. - Espero que saiba que não preciso de você - ele disparou de maneira seca, sem tirar os olhos dela. Jussara engoliu em seco. O desafio no olhar dele era claro. E por mais que estivesse magoada e abalada com seus próprios problemas pessoais, decidiu que não seria vencida pela arrogância de um homem que parecia tão determinado a afastar qualquer um que tentasse se aproximar. - Não estou aqui porque você precisa, senhor Monteiro. Estou aqui porque fui contratada para estar. Se quiser, podemos tornar isso mais fácil ou mais difícil, fica a seu critério - respondeu Jussara, com a voz firme. Gabriel estreitou os olhos, avaliando a resposta dela. Talvez, pela primeira vez, alguém não tivesse recuado diante dele. Algo na postura de Jussara o desafiava, mesmo que ele ainda não conseguisse entender por quê. Ela era diferente. E isso o irritava ainda mais. Ficou olhando a mãe levar a jovem para o quarto que ela iria ocupar e para seu desagrado ao lado do dele. *** Depois que Dona Amélia saiu, Jussara passou alguns minutos organizando suas coisas no quarto. Ela estava aliviada por estar sozinha, mas sabia que em breve precisaria encarar Gabriel novamente. No entanto, o trabalho não poderia esperar. Dona Amélia havia deixado instruções claras, e, apesar da resistência de Gabriel, Jussara estava determinada a cumprir seu papel. Ela revisou os horários das medicações, organizou o kit de primeiros socorros e, por fim, tomou coragem para entrar no quarto ao lado. Bateu na porta antes de abri-la, mas não obteve resposta. Quando entrou, encontrou Gabriel sentado junto à janela, observando a paisagem, o semblante sombrio e a expressão de poucos amigos. Ele nem sequer virou o rosto quando ela se aproximou. — Preciso conversar com o senhor sobre sua rotina de cuidados — disse Jussara, em tom formal, tentando parecer mais segura do que se sentia. — Minha rotina é muito simples, enfermeira. Eu não preciso de você — ele retrucou, o olhar fixo na janela, sem ao menos dirigir um olhar a ela. Ela respirou fundo, mantendo a compostura. — Sei que quer manter sua independência, e respeito isso. Mas estou aqui para garantir que receba os cuidados necessários. É meu trabalho — disse ela, com firmeza. Gabriel bufou, finalmente desviando o olhar para ela, com uma expressão de tédio e irritação. — Meu trabalho é administrar uma empresa multimilionária. Eu sou um CEO, não uma criança. Não preciso de babás, nem de jovens inexperientes tentando me dizer o que fazer. Jussara sentiu o rosto corar, mas se recusou a recuar. Ela cruzou os braços, sustentando o olhar dele. — E o meu trabalho, senhor Monteiro, é cuidar de pessoas, independentemente do quão difíceis elas possam ser. Gabriel a olhou irritado. Ele parecia pronto para responder, mas se conteve, desviando o olhar novamente para a janela. Por um momento, o silêncio se instalou entre eles, carregado, até que ele finalmente suspirou. — Faça o que quiser — murmurou, quase relutante. — Mas não espere que eu facilite. Ela assentiu, reconhecendo que aquele mínimo de cooperação já era uma vitória. — Só preciso que tome sua medicação na hora certa e que me permita verificar o machucado. Prometo que, fora isso, ficarei fora do seu caminho. Gabriel fez um som de desdém, mas não protestou mais. Com passos leves, ela se aproximou da mesa onde ele mantinha os comprimidos, checando os horários. Por um momento, enquanto ajustava tudo, sentiu o olhar dele sobre ela, avaliando-a em silêncio. Quando terminou de organizar as coisas, ela olhou para ele e, entregou a medicação e a água. — Vou deixá-lo descansar agora, mas volto em breve para verificar o curativo. E sem esperar por uma resposta, se dirigiu à porta. Quando saiu, fechou a porta devagar e, no corredor, respirou fundo, tentando se acalmar. Mesmo com a hostilidade inicial, havia algo em Gabriel que a intrigava. Ele era rígido, cheio de orgulho e dor, mas ela também podia perceber, por trás de toda a resistência, um homem que carregava o peso de uma situação que não controlava. Ela ainda não sabia se estava preparada para lidar com ele, mas, com certeza, este seria um desafio em tanto.Capítulo 2Jussara ouviu uma leve batida em sua porta. Ela abriu e viu Dona Amélia, que parecia já estar de saída, carregando uma pequena bolsa de viagem.— Jussara, querida, eu preciso sair agora. A situação da minha irmã é delicada, e vou direto para o aeroporto — disse Dona Amélia, ajeitando o casaco enquanto dava um sorriso breve, mas preocupado.— Claro, Dona Amélia. Pode deixar que eu cuido de tudo aqui — respondeu Jussara, passando segurança.Dona Amélia suspirou em alívio, segurando a mão de Jussara por um instante.— Obrigada, minha querida. Ele é teimoso, mas tenha paciência. O Gabriel... — ela hesitou, buscando as palavras. — Ele está com a alma tão ferida quanto o corpo.Jussara assentiu, vendo o amor e a dor que transpareciam nos olhos da mãe. Com um aceno breve, Dona Amélia partiu, deixando a mansão em um silêncio quase absoluto.Assim que fechou a porta, Jussara foi até a mesa onde havia anotado os horários dos remédios de Gabriel. O primeiro deles estava próximo, então
Capítulo 3Jussara entrou no quarto e, ao fechar a porta atrás de si, recostou-se nela, ainda tentando assimilar o que acabara de acontecer. Sentia o coração batendo rápido e as mãos trêmulas, enquanto lembrava do beijo intenso de Gabriel. Uma sensação de vulnerabilidade a pegou de surpresa; ele a havia deixado abalada, e a imagem daquele momento ainda girava em sua mente.Ela passou a mão nos lábios, onde o toque dele parecia ainda presente, e suspirou, um tanto indignada consigo mesma. Não fazia sentido. O que ele estava pensando? E por que ela reagiu daquela forma, caindo tão facilmente na provocação dele?"Caí como um patinho," pensou, sentindo-se incrédula. Era impossível negar que aquele fora o melhor beijo que já tivera.Mas, ao mesmo tempo, uma dúvida insistente começava a se formar. Será que ele apenas estava testando os limites? Ou era uma espécie de jogo para ele? Ainda que ela tentasse manter o profissionalismo, Gabriel estava conseguindo abalar suas defesas.Respirando fu
Capítulo 4Uma semana se passou desde aquele beijo inesperado, e Jussara ficou impressionada com o comportamento de Gabriel. Ele não havia feito mais nenhuma tentativa de se aproximar dela de maneira íntima. Na verdade, sua atitude tinha sido bastante neutra, quase indiferente, como se o momento que compartilharam tivesse sido apenas um capricho passageiro. Mas, por outro lado, a ausência de suas investidas deixou Jussara com uma sensação estranha, como se um vazio tivesse se instalado entre eles.No entanto, suas noites mudaram. Desde aquele dia, seus sonhos começaram a ser invadidos por ele. Todas as noites, Gabriel aparecia em sua mente, sempre a beijando com a mesma intensidade e paixão que ela havia sentido em seus lábios. No último sonho, os dois foram além, e Jussara acordou com o coração acelerado, a respiração entrecortada e a sensação de seus lábios ainda quentes.Ela se pegou pensando nos detalhes vívidos: a forma como ele a segurava, o toque firme de suas mãos, o jeito com
Capítulo 5Gabriel afastou seus lábios dos dela, deslizando os dedos suavemente pelo rosto delicado.— Você vai ser minha.Jussara sentiu o corpo inteiro em chamas ao ouvir as palavras dele e, quase sem pensar, murmurou:— Vou...Para Gabriel, isso só confirmava o que ele já imaginava: Jussara era uma acompanhante. Se ela era uma profissional, certamente não se importaria em estar no controle. Apenas a ideia de tê-la despertava nele sensações intensas, algo que o surpreendia, pois, dias atrás, ele achava que o acidente e a quantidade de remédios que tomava impediriam qualquer desejo.No entanto, após a consulta médica de dois dias atrás, as doses foram reduzidas, e o corte no abdômen estava completamente cicatrizado. O maior obstáculo agora era ainda depender da cadeira de rodas. Apesar de já sentir alguma resposta nas pernas, ainda não conseguia movê-las como desejava, efeito do trauma. Mas o médico garantira que, em breve, ele voltaria ao normal.Enquanto isso, iria se satisfazer no
Capítulo 6Ao fechar a porta atrás de si, Jussara encostou-se, deixando finalmente as lágrimas rolarem livres. Ela se amaldiçoava por ter cedido tão fácil, se entregando àquele completo idiota. Mas, apesar de tudo, ela não podia negar: tinha sido bom. Talvez o melhor que já tivera. Ainda assim, decidiu que seria a primeira e última vez com ele.Com passos lentos, seguiu até o banheiro, onde lavou os vestígios do tempo que passaram juntos, como se quisesse apagar as lembranças daquela noite. Seus olhos estavam vermelhos, ardendo pela tristeza e raiva que borbulhava dentro dela.No final do dia, Jussara levou o remédio até o escritório de Gabriel. Ele parecia relaxado, mas sua expressão ainda era séria. Ao entregar o medicamento, ele a encarou e disse, com um tom provocativo:— Me encontre mais tarde no meu quarto.Ela sorriu, mas sua resposta foi firme.— Só nos seus sonhos.Virando-se para sair, Jussara mal percebeu a surpresa em seu rosto quando ele perguntou:— Você não gostou?Ela
Capítulo 7Ele segurou o braço dela e disse:— Preciso de você mais uma vez antes que vá.Ela ficou surpresa; hoje, ele estava diferente, quase educado. Então, se virou, e todo o desejo que tentou esconder nas últimas semanas relampejou em seus olhos. — O que você quer de mim? — perguntou, a voz tremendo levemente, dividida entre a esperança dele a querer como algo a mais e a dúvida.Gabriel a olhou com intensidade, seu olhar carregado de uma necessidade que ela nunca havia visto antes.— Jussara — começou ele, a voz baixa e hesitante —, eu preciso fazer amor com você antes que você se vá.A declaração caiu como uma bomba, fazendo seu coração disparar. Jussara ficou sem palavras, a mente em um turbilhão. Ele estava sendo sincero, e a intensidade do desejo em seu olhar a fez vacilar. — Gabriel, você... você não pode simplesmente me pedir isso assim — respondeu, a voz trêmula, tentando encontrar um equilíbrio entre o que desejava e o que sabia ser prudente.Ele se aproximou mais, a mã
Capítulo 8Jussara estava em casa, sentada no sofá, segurando o envelope que Gabriel lhe entregara. Ao abri-lo, ficou boquiaberta: em vez dos cinco mil reais mensais combinados, ele lhe dera quinze mil. Ficou surpresa e ao mesmo tempo aliviada. Com essa quantia, poderia se manter por um tempo até encontrar outro emprego.Conforme os dias se passaram, ela organizou sua vida. Quitou todas as contas atrasadas e decidiu mudar-se para uma kitnet num bairro mais barato. Agora, tinha o aluguel garantido por cinco meses, a despensa cheia, e as finanças em dia.Dois meses depois, a incerteza sobre o futuro ainda a preocupava; precisava encontrar outro trabalho dentro de um mês, mas, por algum motivo, ainda não havia sido chamada para nenhuma entrevista.Enquanto isso, Gabriel, após meses de recuperação, preparava-se para voltar ao trabalho. Ajustava o nó da gravata em frente ao espelho, sentindo-se aliviado por estar finalmente retomando sua rotina. Ainda mancava um pouco e, embora as muletas
Capítulo 9Jussara apertou o botão do elevador, tentando manter a compostura. Enquanto descia, pensava em como as coisas haviam saído de controle. Parecia que, desde o término com Marcos, tudo andava de mal a pior. Ela suspirou, reprimindo as lágrimas. Apaixonar-se por Gabriel havia sido um erro, e agora era ela quem pagava o preço. Decidida, concluiu que precisava de um novo emprego. No escritório, Gabriel ainda estava processando o que acabara de acontecer. O rosto ardia, e ele passou a mão pelos cabelos, exasperado. Por um momento, refletiu sobre sua abordagem impulsiva. Será que havia passado dos limites? Mal teve tempo de reorganizar os pensamentos quando a secretária entrou para confirmar a agenda do final do dia. Ela ficou muda ao notar a marca vermelha em seu rosto, mas, com profissionalismo, decidiu não comentar nada e confirmou a agenda antes de se retirar.Logo em seguida, Marcos entrou, já pedindo café para a secretária antes de fechar a porta. Ele se jogou na cadeira à f