Capítulo 6

— Ayla tá bom... — murmurei, quase como um sussurro, enquanto tentava cobrir meu corpo exposto com as mãos, sem saber onde me esconder. Sentia-me vulnerável, como se fosse uma adolescente acuada.

O nome Nyx, que Teri escolheu para mim logo que comecei a trabalhar, agora parecia um lembrete amargo de como eu havia tentado ser alguém diferente. Nyx, a deusa da noite, envolta em escuridão, como a própria noite que me consumia. Eu era uma sombra da mulher que um dia fui, escondida atrás de um nome que sugeria poder, mas que, na verdade, refletia minha própria fragilidade.

Miguel deu um passo à frente, e automaticamente meu corpo recuou, minhas costas pressionando-se contra a parede fria do camarim. Seus olhos percorriam meu corpo sem qualquer resquício de respeito, e o sorriso arrogante que ele exibia me fazia querer desaparecer.

— Nunca imaginei que você chegaria a esse ponto — disse ele, a voz impregnada de desprezo. — Passar por essa humilhação... Eu sempre achei que você tivesse mais orgulho.

Minhas mãos tremiam, mas eu apertei os punhos, tentando controlar a onda de vergonha e raiva que subia pelo meu peito. Olhei diretamente para ele, forçando as palavras a saírem.

— É um trabalho digno. — Minha voz estava baixa, mas firme. — Pelo menos eu não estou roubando. Estou dançando.

Miguel deu uma risada curta, amarga.

— Isso você faz muito bem, Ayla. — Seus olhos se estreitaram, e eu senti o calor de sua presença enquanto ele se aproximava ainda mais. — Você sempre foi sexy dançando... Sabe disso. Eu sentia falta de como você era quente. Pelo menos agora eu sei onde te encontrar quando precisar.

Suas palavras eram um golpe. Eu recuei o máximo que pude, mas a parede estava ali, fria e implacável, não me deixando mais espaço para fugir. Ele continuou se aproximando, e logo estava tão perto que eu podia sentir seu hálito quente contra minha pele. Minha respiração ficou pesada, o pânico subindo como uma maré crescente.

— Miguel, por favor... Não faça isso. — Minha voz soava mais fraca do que eu gostaria. — Você vai se casar. Me deixa em paz.

Ele sorriu, como se o que eu tivesse dito fosse irrelevante.

— Casamento nunca impediu ninguém de se divertir um pouco, não é?

Antes que eu pudesse reagir, ele puxou meu corpo contra o dele, suas mãos segurando meus braços com força enquanto sua boca encontrava meu pescoço. O toque dele me fez congelar. Por um instante, fui transportada para o passado, para o tempo em que tudo parecia mais fácil. Para o tempo em que eu o amava, em que éramos felizes. Mas aquele Miguel que eu amei não existia mais, e o homem à minha frente era o mesmo que me abandonou no hospital, no momento mais difícil da minha vida.

Eu o empurrei, com o coração acelerado.

— O que você fez comigo ainda dói — disse, minha voz tomada pela emoção. — Não é assim tão fácil. Você não pode me reconquistar com um beijo.

Ele riu, um som cruel que ecoou pelo camarim.

— Reconquistar? — Ele balançou a cabeça, seus olhos brilhando de desprezo. — Quem falou em reconquistar, Ayla? Eu só quero transar com você de novo. E pelo visto, isso é sim fácil de conseguir.

Senti um nó no estômago. Ele olhou para mim como se eu fosse uma mercadoria, algo que ele já havia provado e aprovado.

— Quanto? — perguntou, a voz baixa e cínica.

— O quê? — balbuciei, incapaz de compreender de imediato o que ele queria dizer.

— Quanto você cobra? — Ele cruzou os braços, como se estivesse fazendo uma proposta comercial.

A indignação me atingiu como um soco no peito.

— Eu não faço isso, Miguel. Eu só danço.

Ele sorriu com desdém.

— Duvido. Não precisa se fazer de difícil. Eu sei que vale a pena. Já provei antes. Posso ser seu cliente fixo.

A humilhação foi instantânea. Cada palavra, cada olhar, me fazia sentir menor, insignificante. Ele realmente acreditava que podia comprar o que quisesse de mim, como se eu fosse um objeto. Senti o calor subir pelo meu corpo, o estômago revirando de repulsa.

— Me solta! — gritei, tentando me desvencilhar de seus braços.

Mas ele me segurava com força, suas mãos apertando meus pulsos, seus olhos fixos nos meus, divertidos com meu sofrimento. Em um movimento desesperado, estiquei a mão e agarrei o primeiro objeto que vi: um vaso pequeno sobre a mesa do camarim. Com toda a força que tinha, acertei o vaso na cabeça dele.

Miguel recuou, atordoado pelo golpe, e eu aproveitei o momento para correr. Saí do camarim em disparada, meu coração batendo tão rápido que eu mal conseguia respirar. Ao atravessar a porta dos fundos do clube, ouvi a voz dele, raivosa, ecoando atrás de mim.

— Vagabunda! Quer me matar, assim como matou nossos filhos?!

Aquelas palavras eram como facas cortando minha alma. Corri ainda mais rápido, saindo pela rua enquanto a chuva caía pesadamente sobre mim. Logo estava completamente encharcada, as penas e plumas da minha fantasia grudando na minha pele, pesando, me arrastando para baixo. A água escorria pelo meu rosto, misturando-se com as lágrimas que eu não conseguia mais conter.

Cada passo que eu dava era como se afundasse mais no poço de dor que me cercava. As lembranças vinham com uma força esmagadora: a morte dos meus filhos, o abandono de Miguel, o fato de estar trabalhando em um clube de stripper e nunca conseguir sair. E agora, ver Miguel, prestes a se casar, levando a vida adiante enquanto eu permanecia estagnada, como se estivesse presa em um ciclo interminável de dor.

Aquelas palavras, "você matou nossos filhos", ecoavam na minha cabeça. Como se o acidente tivesse sido minha culpa. Como se eu tivesse escolhido aquele destino. Não. Não tinha sido minha culpa, mas Miguel, com sua frieza e desprezo, sempre me culpou. Sempre me fez sentir que eu era a assassina dos nossos filhos.

A chuva apertava ainda mais, as gotas caindo pesadas sobre mim, e eu vagava sem rumo, sem saber para onde ir. Até que, de repente, vi um prédio comercial, suas luzes ainda acesas. Entrei, ofegante, tentando escapar da tempestade e dos olhares curiosos que se voltavam para mim. Os corredores ecoavam meus passos apressados enquanto me dirigia ao elevador. Apertei o botão para o último andar e esperei, o peito subindo e descendo rapidamente, minha mente um turbilhão de dor e confusão.

Quando as portas se abriram, saí em uma sala de espera ampla e vazia. Não havia ninguém ali, nem secretária, nem recepcionista. Atravessei o lugar com passos rápidos, como se estivesse sendo guiada por uma força invisível. Subi as escadas até o terraço, e quando empurrei a porta, a chuva fria me envolveu novamente. O vento soprava forte, e a cidade brilhava abaixo de mim, envolta na tempestade.

Eu caminhei até a beira do terraço, sentindo a água escorrer pelo meu rosto, misturada às minhas lágrimas. O mundo ao meu redor parecia desmoronar. As lembranças, o sofrimento, o vazio. Tudo me empurrava para um lugar do qual eu não via saída. Meu corpo se moveu sozinho, meus pés subindo no pequeno muro que separava a vida da morte.

O vento frio da noite parecia cortar minha pele, mas eu não sentia nada, a não ser a dor que me apertava o peito. Eu estava à beira do abismo, olhando a cidade lá embaixo, sem saber se o que me separava da liberdade era um passo, uma decisão. Era como se tudo o que me restava fosse a escuridão, como se nada além da dor me coubesse. O peso da culpa, do vazio, de um amor que nunca mais seria meu... Tudo isso me empurrava para aquele momento. O que restava? Um corpo cansado, uma alma dilacerada, sem mais forças para lutar. A lembrança dos meus filhos, o rosto de Miguel, as palavras cruéis... Eles se misturavam numa dança insana na minha mente, e eu não conseguia escapar. Meus olhos se fechavam e eu senti uma última lágrima escorrer pela minha face. O que eu procurava, afinal? A morte? A paz? Ou apenas o fim dessa eterna luta contra mim mesma?

Eu me inclinei ainda mais para a grade, o vento me empurrando suavemente, como se quisesse me guiar. Meu coração batia mais rápido, e eu já não sabia mais se estava respirando ou apenas existindo. Nada me prendia ali, a não ser o medo de seguir em frente. A vida me parecia uma mentira cruel, uma prisão sem portas. Eu sabia que, em algum lugar, havia algo esperando por mim, mas não conseguia encontrar forças para seguir adiante. A dor de perder meus filhos, o abandono de Miguel, e agora a minha própria vida, caindo aos pedaços... Não havia saída, a não ser dar aquele último passo.

Foi então que uma voz reverberou pela chuva, cortando o ar como um trovão.

— Não! Não faça isso!

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