~AYLA~Quando olhei para meu reflexo no espelho, senti meu coração disparar. O vestido preto justo, com alças finas e um decote elegante, abraçava meu corpo de forma impecável. Meus cabelos caíam em ondas suaves sobre os ombros, e a maquiagem leve destacava meus olhos castanhos. Eu parecia... eu mesma. Não Nyx, não a personagem que eu vestia todas as noites sob as luzes frias do palco, mas Ayla. Apenas Ayla.Respirei fundo, sentindo o nervosismo borbulhar no estômago. Nicolas havia se oferecido para me buscar, até sugeriu mandar o motorista. Mas eu recusei. De alguma forma, parecia importante manter algo só meu, um espaço onde ele ainda não pudesse entrar. Então, peguei um Uber e segui para o Hotel Milani.Assim que saí do carro e fiquei diante do prédio imponente, uma onda de insegurança me envolveu. O hotel era majestoso, com sua fachada de vidro reluzente e um tapete vermelho se estendendo até as portas giratórias. Pessoas bem-vestidas passavam por mim, e por um segundo, me senti f
— "Ayla, me desculpe. Eu achei que poderia seguir com isso, mas percebi que não estou pronto. Aproveite a noite, tudo está pago. Mas acredito que não posso mais ver você. Ou a Nyx."Minha voz falhou ao final da mensagem. O silêncio que seguiu foi cortante, como se cada palavra ainda ecoasse no fundo da minha mente. O tom dele era frio, distante. Parecia um estranho falando comigo, não o homem que me fazia sentir viva, desejada… importante.Meus olhos estavam marejados, mas eu me recusei a deixar as lágrimas caírem. Ter dignidade era o mínimo que eu podia fazer por mim mesma naquele momento.— Ah, vai se ferrar, Sartori! — Teri exclamou, terminando de engolir um pedaço de algo que parecia absurdamente caro. — Ele é um babaca, Ayla. Um tremendo de um babaca!Eu sorri fraco. Um sorriso sem cor, sem força. Assim que li aquela mensagem pela primeira vez, minha primeira reação foi ligar para Teri. Eu estava prestes a desabar, prestes a sair correndo daquele restaurante com os olhos cheios d
~ NICOLAS ~O som dos pneus no asfalto molhado ecoava enquanto eu dirigia pelas ruas vazias. As luzes difusas dos postes passavam rápido, mas minha mente estava presa em outro lugar. Por mais que eu tentasse, não conseguia afastar o rosto de Ayla dos meus pensamentos.Eu estava me apaixonando, e isso era um erro.Não importava o quanto eu quisesse estar com ela, eu não tinha o direito. Não depois de tudo. Não com o passado que nos conectava, mesmo que ela não soubesse.Fechei os olhos por um segundo, o peso da culpa se espalhando pelo meu peito. E então, como uma onda implacável, as lembranças voltaram — arrastando-me para um passado que eu passara anos tentando enterrar. Um passado que ainda me perturbava.~FLASHBACK – 3 ANOS ANTES ~O barulho do impacto ainda reverberava nos meus ouvidos. O som ensurdecedor de metal rasgando metal foi seguido por um silêncio opressor, pesado, como se o mundo inteiro tivesse parado. Meus dedos tremiam, agarrados ao painel do carro, enquanto tentava p
Aquela manhã no escritório tinha sido insuportável. Os números dançavam na tela do computador, os relatórios pareciam um emaranhado de letras sem sentido, e minha mente, minha maldita mente, estava presa em Ayla.Eu conseguia ver seu rosto toda vez que fechava os olhos. Seu olhar carregado sempre um pouco perdido, sua voz trêmula quando dizia meu nome. O nome que, na verdade, não significava nada para ela. Que ela sequer imaginava como se entrelaçava com o seu passado.Mas para mim… para mim era um peso insuportável.Porque eu sabia. Sabia exatamente quem ela era, agora. O nome dela tinha estampado jornais, sites de notícia, programas sensacionalistas. "Mãe perde filhos em trágico acidente de carro." Eu me lembrava do rosto dela nas fotos, dos olhos perdidos e vazios, das lágrimas silenciosas.E eu estava lá. Eu estava no outro carro naquela noite.De certa forma, eu era responsável pelas ações do meu irmão.Como eu podia me aproximar dela? Como eu podia tocar nela, beijá-la, envolvê-
~AYLA~O quarto estava silencioso, iluminado apenas pela luz fraca do abajur ao lado da cama. O espelho no teto refletia meu rosto cansado, os olhos fundos denunciando as noites mal dormidas. Lá fora, a música alta da boate abafava os pensamentos que insistiam em me assombrar.Nicolas não voltou.Naquela noite no restaurante, ele prometeu um encontro, uma chance para algo... diferente. Mas ele não apareceu. E, desde então, nunca mais voltou.Lorenzo, sempre sarcástico e desbocado, até tentou quebrar o gelo com suas piadas afiadas.— E aí, Nyx, seu cliente VIP já enjoou de você? — ele disse outro dia, rindo enquanto arrumava algumas bebidas no bar.Eu apenas lancei um olhar duro em sua direção, sem responder. Não havia graça em nada que envolvesse Nicolas.O pior era saber que o tempo estava acabando. Aquele contrato generoso que Nicolas pagou para garantir que eu fosse exclusivamente dele estava prestes a expirar. Em poucos dias, eu teria que voltar para outros clientes. Tocar outros
Eu não sabia como Teri e Paulo tinham me convencido a subir até ali. Talvez tenha sido o olhar determinado de Teri ou as palavras encorajadoras de Paulo, mas, de alguma forma, estávamos agora na sala de espera do Grupo Sartori.O ambiente era frio, sofisticado e impecavelmente silencioso. Cada detalhe, desde os móveis minimalistas até o aroma amadeirado que pairava no ar, parecia gritar “poder”. E, no meio daquele cenário, eu me sentia tão deslocada quanto um peixe fora d'água.Olhei para a porta de vidro no final do corredor, a mesma porta que levava ao terraço do prédio. A imagem veio como um soco no estômago: eu, atravessando aquela mesma porta, desesperada, correndo em direção ao vazio que parecia ser minha única saída. Pisquei algumas vezes, tentando afastar a lembrança. Era só uma memória distorcida, não era real. Não podia ser.— Eu não posso fazer isso — murmurei, virando-me para Teri. — Não tem a mínima chance de eu ficar frente a frente com Nicolas de novo.Teri franziu o ce
~TERI~Ficar sozinha em uma sala com um homem como Ricardo Belmonte não era exatamente um problema para mim. Eu já tinha enfrentado caras piores, com sorrisos mais perigosos e intenções mais nebulosas. Ainda assim, havia algo nele que me deixava em alerta. Talvez fosse aquele jeito de olhar, como se estivesse sempre dois passos à frente de qualquer jogada que eu pudesse fazer.Ele me observava com um sorriso quase indecifrável, como se estivesse tentando me desvendar enquanto inclinava a cabeça levemente para o lado.— Eu acho que conheço você de algum lugar — ele disse. — Mas não consigo me lembrar de onde.Inclinei a cabeça também, espelhando o gesto dele, e deixei um sorriso malicioso escapar pelos lábios pintados de vermelho.— Depende, senhor Belmonte. Você está acostumado a contratar garotas de programa de luxo?Ele riu, um pouco desconcertado, como se ele estivesse esperando por qualquer coisa que não aquela resposta tão direta. Seus dedos deslizaram pela gravata, ajustando o n
~NICOLAS~O bar que escolhemos estava quase vazio naquela noite de sábado. A iluminação baixa lançava sombras suaves sobre os copos de uísque e garrafas perfeitamente alinhadas atrás do balcão de mogno escuro. O som abafado de jazz tocava ao fundo, e o gelo no meu copo tilintava suavemente enquanto eu o girava entre os dedos.Ricardo estava sentado à minha frente, com a gravata frouxa e o paletó jogado displicentemente sobre o encosto da cadeira. Ele bebia devagar, mas seus olhos me analisavam com a intensidade de alguém que sabia mais do que dizia.— E então? Como está Isabela? — perguntou ele, rompendo o silêncio confortável entre nós.— Foi só um susto — respondi, com a voz rouca do álcool e do cansaço acumulado. — Mas você sabe... Na situação dela, não existe mais "bem". Cada dia é uma batalha que estamos perdendo.Ricardo assentiu, o olhar dele carregado de compreensão.— Talvez fosse melhor começar a preparar Amélie para o pior, Nico. Ela é esperta, mas ainda é uma criança.Solt