Cansado e decepcionado por não encontrar Sara como planejou ao sair de casa, Rodrigo entrou em seu escritório e analisou friamente a ex-noiva. Seguindo a sugestão do casal de amigos, procurou Sara na casa de Tatiana, determinado a fazê-la escuta-lo, porém, não a encontrou. Com humor desnecessário, Jerson, o marido de Tatiana, disse para ficar feliz por Sara sair para passear, que caminhadas fariam bem a saúde dela e ajudavam a pensar. Gostaria de ter tamanha certeza que uma caminhada colocaria na cabeça de Sara que deviam ficar juntos. Pensou em ir ao hospital, mas Jerson garantiu que Sara não estaria lá, que pediu o dia de folga. Saia do apartamento da médica quando recebeu um telefonema da empresa, informado que Karen se apossou de seu escritório. Entre retornar para o apartamento e amargurar a solidão que se instalou, ou confrontar e expulsar Karen de sua sala, decidiu-se pela segunda opção. — Não passe nenhuma ligação e nem deixe ninguém entrar na minha sala — pediu para Mirn
Sara retornou ao apartamento de sua madrinha, sendo recepcionada por Jerson. Ele estava no sofá da sala, com o notebook no colo, mas levantou para ajudá-la a carregar a enorme mala até o quarto. — Seu marido te procurou — ele contou. — Pediu que telefonasse para ele e avisou que voltará mais tarde. Sara sentou na beira da cama sem dizer nada. Não telefonaria e preferia só voltar a ver o marido quando assinassem o divórcio. — Tati se preocupou por você ter saído sem comer. Exigiu que se alimente corretamente. — Estou bem — mentiu. — E não tenho fome. — “Não sinto nada”, queria acrescentar, mas se limitou a olhar para as mãos fechadas sobre as coxas. — Deveria comer mesmo sem fome, no seu estado... — Jerson se calou ao notar as lágrimas descendo velozes pela face pálida. Ficou sem ação. Não sabia o que fazer ou dizer. — Vocês irão se acertar — garantiu para animá-la. O resultado foi Sara tremer e entregar-se de vez ao choro. ~*~ Tatiana comunicou às enfermeiras que Sara ficaria
Após dois dias inteiros sofrendo e evitando falar sobre o que a deixou naquele estado, Sara sentia-se cansada e a beira da depressão. A companhia de Tatiana e Jerson a distraia, pois, ambos respeitavam seu silêncio, oferecendo mais que um teto provisório. Tatiana prometeu que quando quisesse desabafar estaria disponível. Jerson era galante e bem humorado, sempre tentando fazê-la rir e às vezes conseguia. Sara percebia que ele se esforçava ao máximo para não vê-la chorar novamente. Quando Rodrigo ligava, ou aparecia no prédio, eles atendiam com os olhos grudados em sua face, bastava um sinal e informavam que ela não queria falar. Tanta atenção e carinho deixavam Sara envergonhada. Não podia passar a vida toda se escondendo, obrigando Tatiana e Jerson a convencer Rodrigo a lhe dar mais tempo. Por isso, e por querer rever os rostinhos de suas crianças, decidiu voltar ao trabalho. Embora não se sentisse preparada para correr o risco de encontrar Rodrigo - duvidava que algum dia estaria
Sara molhou o rosto, o pescoço e os pulsos, depois, ainda se sentindo zonza, apoio as mãos na pia, fitando no espelho oval seu rosto lívido. Por pouco pensou que desmaiaria. Deveria ter se alimentado direito durante a manhã, mas o estresse tirou seu apetite. Pronta para enfrentar a ira de Tatiana, virou, dando-se conta só naquele momento que não estava sozinha no pequeno banheiro. Encostado na porta fechada, de braços cruzados, Rodrigo a observava como um leão prestes a atacar sua vítima. Desviou o olhar e forçou as pernas a seguirem em frente. — Com licença — pediu olhando para um ponto entre o queixo e o pescoço dele. — Até que me ouça, não sairemos daqui. ~*~ Os nós dos dedos esbranquiçaram, tamanha a pressão exercida em volta do volante. Apesar de Robson declarar que Sara e Rodrigo se divorciariam, o automóvel do Montenegro parado a poucos metros de onde estava, e a determinação do ex-noivo em declarar amar a esposa, deixavam claro que ele não desistiria do casamento. Pelo
Com aflição, Rodrigo passou os dedos entre os fios escuros bagunçando-os. — Entenda, você estava fora de controle. Não adiantava falar ou argumentar. As brigas, o ciúme e o alvoroço diário eram insuportáveis — desabafou. — Estava esgotado, não conseguia enxergar uma solução, então aceitei um conselho da Karen. — Aposto que era para nos separar — Sara resmungou, indignada por Rorigo aceitar qualquer ideia dada pela ex. — Karen fazia-se de amiga na frente dos outros, mas não cansava de dizer que você jamais me amaria como a amava. E eu passava como lunática quando xingava aquela cínica. — Sua atitude ofensiva e violenta não se limitava Karen e, na maioria das vezes, eram sem proposito ou justificativa. Sara ficou envergonhada com o comentário, admitindo a veracidade dele. Agora conseguia ver que exagerou na maioria dos ataques de ciúmes. — Afinal, do que se tratava aquele documento? — questionou curiosa. — Da sua internação. A confusão tomou a face de Sara, estreitando seus olhos,
Após a confissão, Sara não teve coragem de encarar Rodrigo, tinha medo do que encontraria nas íris escuras. — Por isso quer a separação? — Rodrigo questionou deslizando as mãos pelos braços dela com suavidade. — Sim... E não é só isso... — Sara sentiu os olhos arderem e sua a voz ficou imediatamente embargada. — Antes de casarmos, comecei um tratamento para impedir uma possível gravidez... Desculpe-me... — Sentiu a garganta travar por um instante, as lágrimas descendo quentes por seu rosto enquanto expurgava seus pecados. — Você e Izaque tiveram algo depois de...? — Não! — Sara apressou-se a negar. — Foi uma noite, antes do seu término... Um erro que levou a outros... — confessou erguendo o olhar, tentando visualizá-lo em meios às lágrimas que embaçavam sua visão. — Entendo. — Sara imaginou que ele amaldiçoaria o dia que a conheceu, motivo que a fez receber com surpresa a ordem que se seguiu: — Não se preocupe com isso, esqueça o divórcio e volte comigo para nossa casa. — Depois
Tatiana moveu o olhar das costas do Montenegro para fixa-lo no rosto pálido da afilhada. — Foi impressão ou o Montenegro estava chorando? Sara saiu do banheiro esfregava as mãos nos braços, esperando aquecer-se, colocar fim a angústia que a envolvia. — Foi tudo tão confuso... — Sara, essa situação está fora de controle — Tatiana declarou, acrescentando com autoridade: — Se ama seu marido, e ele claramente te ama, não existe razão para que continuem brigados e separados. — É complicado... — murmurou angustiada. — Não quero destruir a vida dele mais do que já fiz. — Destruirá a vida dos dois se persistir em ignorar a oportunidade bem na sua frente — Tatiana alertou. — Volte para sua casa e para seu marido. Logo terão um bebê para mimar e esquecer, de vez e de forma correta, o início conturbado que tiveram. — Acha mesmo? — Claro, querida! Não importa o que ambos fizeram, é passado, no presente, entre erros e acertos vocês se amam e formarão uma família em breve. — Sorrindo, pousou
A vida costuma dar rasteiras em seres que se julgam superiores, para que aprendam a se erguer e lembrar, mesmo que só um pouco, que podem cair várias vezes se assim ela desejar. Rodrigo sofreu muitas quedas em seus vinte e sete anos de vida, mas três foram as mais cruéis e difíceis de levantar. A primeira grande rasteira ocorreu na adolescência. Tinha sido um jovem mimado, não por Sérgio Montenegro, seu pai, que passava mais tempo com Izaque, o primogênito, mas por sua mãe e pelo irmão, quando esse tinha tempo para gastar com o caçula três anos mais novo. Foi por causa do tratamento diferenciado do pai para com ele e Izaque que seu instinto de desafio iniciou. Se Izaque era bom em algo, ele se esforçava para ser melhor. A rivalidade unilateral, aliada a ânsia de agradar o pai, o motivou a namorar Karen, filha do melhor amigo de Sérgio. Decisão infantil, mas não uma “tarefa” difícil, até por costume essa tinha sido a escolha óbvia. Cresceram juntos, ela se derretia só em olha-la e,