- Você fez eu bater, porra! – Gritei, saindo do carro, indignada.O homem gargalhou:- Moça, quem está guiando é você. Não sabe olhar nos espelhos? Não tem noção de espaço?Fui até a traseira do carro e percebi o estrago: um grande amassado.- Você é o culpado! – O olhei.- Escute aqui, mocinha, eu a ajudei.Os outros homens também riam de mim. Pus as mãos na cabeça, atordoada! Desgraçado! Ele havia feito propósito.Fui até a farmácia, peguei o remédio que minha mãe havia pedido e um teste de gravidez. Já estava extremamente nervosa e agora ainda mais aquilo para destruir meu dia. E se eu realmente estivesse grávida? Já tinha um bloqueio horrível para dirigir e agora com aquela batida certamente ficaria traumatizada, podendo causar ainda algum dano ao bebê.Sentei-me no volante e vi o homem que cuidava do estacionamento conversando com outro no portão de saída. Toquei meu ventre, impressionada com o quanto me preocupei com o bebê antes mesmo de me certificar de que ele estava ali. Não
- Você só pensa em comer. – Ela riu, limpando as lágrimas insistentes.Levantei e suspirei:- Vou ao banheiro fazer o teste. Me deseje boa sorte.- Boa sorte, amiga! Vai dar tudo certo... E o certo é ser NEGATIVO.Sorri e ela me abraçou com força. Ficamos um tempo ali, cada uma com seus próprios pensamentos. Os meus era de agradecimento por ela estar ali comigo naquele momento. Os dela, certamente era no meu irmão.Levantei e fui ao banheiro. Abri a caixa e avistei o pequeno copo transparente, onde deveria ser feita a urina. Após se colocava uma das fitas brancas dentro do copo e aguardava as listras vermelhas aparecerem. Uma listra, não grávida. Duas listras, grávida.Fiz tudo conforme solicitado e aguardei os cinco minutos necessários até que retirei a fita do copo. Uma listra. Senti meu coração acelerar e pulei sozinha de felicidade com resultado.Saí dali e voltei para o quarto.- E então? – Flora estava me esperando, ansiosa.- Não é desta vez que você será tia ou dinda. – Ri, al
Naquela tarde eu estava saindo da escola quando o carro do senhor Amorin estacionou ao meu lado. Flora não havia vindo na aula então eu já imaginava que algo tinha acontecido.Abaixei-me e olhei pelo vidro do carro, que desceu lentamente:- Olá, Clara.- O que aconteceu com Flora, senhor Amorin? – Fui direta.- Ela não está nada bem. Desde ontem à noite tudo que tem feito é chorar. E sabe como Flora é... Não costuma se abrir comigo e com a mãe dela. Creio que você seja a única que possa ajudá-la.- Claro... – Não pensei duas vezes e antes mesmo de ele me convidar, abri a porta do carro e sentei-me ao seu lado, pondo o cinto.Apesar do que havia acontecido no domingo, na segunda-feira Flora tinha vindo na escola e nos encontramos e ficou tudo bem. Ou melhor, bem nunca ficaria novamente, já que ela não poderia mais ir na minha casa.Mas minha amiga sempre foi muito compreensiva, mesmo sem ter visto exatamente a forma como meu pai agia quando bebia e ficava violento. Infelizmente ela tev
Quando cheguei na frente da casa onde meu irmão residia, nos fundos, estacionei o carro, feliz por ter pouco movimento e não precisar dar voltas e voltas na quadra até ter um lugar numa esquina para que eu pudesse deixar o carro de uma forma que me desse tranquilidade e segurança na hora de sair.Apertei a campainha que havia no portão e quem me atendeu foi uma mulher aparentando uns 40/45 anos.- Boa noite... Eu sou irmã do Renan Versiani. Gostaria de saber se ele está em casa.Ela sorriu:- Entre! O portão está aberto.Abri o portão e estava me dirigindo para o corredor ao lado da casa quando ela disse:- Renan está aqui. Entre, por favor.A olhei, confusa. A mulher veio até mim e cumprimentou-me com um beijo na bochecha:- Você deve ser a Clara.- Sim. – Afirmei, certa de que Renan havia falado sobre mim com ela.- Sou Talía. Muito prazer.Sorri, achando-a muito simpática enquanto era conduzida para dentro de sua residência.A casa de Talía aparentava ser grande por fora. E o seu i
Meu mundo desabou depois daquilo. Certamente dirigir era coisa que eu não faria novamente, por todos os problemas que tive ao longo de minha jornada como motorista. Ser forte era uma coisa. Insistir numa coisa que eu não sabia fazer era burrice.Dei o recado ao meu pai tal e qual o homem mandou. No entanto tudo que consegui foi uma risada irônica e se ele realmente ficou preocupado, não demonstrou.Dizer que fui tirada do carro com uma arma na cabeça foi o mesmo que explicar que tropecei no portão antes de entrar. Para Joaquim Versiani não era motivo de pânico ou mesmo registrar uma ocorrência policial. Questionado pela minha mãe sobre no que estava envolvido, meu pai negou qualquer coisa. Ela insistia que eram jogos de azar.Naquela noite Pipeline estava inquieta e não queria de maneira alguma ficar na minha cama. Estava visivelmente mais pesada e barriguda e escondi de todos, inclusive de Pedro, que imaginava que ela estaria prenha. Meu namorado não sabia das ameaças de meu pai com
Suspirei e a encarei:- Sei que não devia fazer isto... Mas... Já fiz.- Tente não fazer aqui em casa, Clara. Você e Pedro estão brincando com fogo.- Eu... Prometo que tentarei.- Você... Sente prazer com Pedro?- Sim. – Respondi de forma sincera – Todas as vezes. Ele foi paciente para minha primeira vez... Respeitou meu tempo. E o amo... Por isso e todas as coisas que ele faz por mim.- Você é tão jovem... E se realmente não for amor? Eu também achava amar seu pai.- Meu pai nunca foi uma pessoa capaz de ser amada... Desde que nasci ele sempre foi o mesmo sujeito egoísta, prepotente e que se acha o dono do mundo. Não sei como foi capaz de achar que sentiu algo por ele um dia. Tampouco como ainda estamos aqui, depois de tudo que ele fez e faz de ruim.Retirei meu braço do poder dela e saí.Eu estava organizando minhas coisas para ir para a escola quando ouvi do quarto uma buzina insistente, parecendo ser na frente de casa.Meu coração acelerou e por um momento imaginei que pudesse s
- Onde... Estão Pipe e os filhotes? – Tentei gritar, mas minha voz não acompanhou o tom que eu queria, saindo rouca e cheia de medo.- Botei todos no carro e joguei numa lixeira. Eu sabia que ele não estava blefando. Conhecia sua maldade a ponto de ter certeza de que realmente havia botado a minha cachorra, que tinha recém parido, junto dos filhotes numa lata de lixo.- Em que lugar? – implorei – Eu preciso resgatá-los.- Eles não ficarão nesta casa. - Eu... Só quero salvá-los. Acharei um lar para eles. – A dor dentro de mim era insuportável.- Larguei-os na cidade de Preston. Mas não os encontrará novamente. - Em qual... Rua?- Aquela deserta, que acaba no cemitério. Alguém vai encontrar eles e lhes dar um lar, não se preocupe. Só não quero aquela bicharada na minha casa. - Onde está mamãe? - Ela foi ao mercado... Ou está rodando a bolsa numa esquina, que é o que vagabundas fazem de melhor. – Riu, com escárnio.Pus minha mochila nas costas e saí sem olhar para trás. Era o fim. N
Ainda assim vovó nunca me disse o nome dele. E creio que fosse exatamente por medo que eu fizesse o que estava fazendo naquele momento: tentando descobrir quem ele era. Para poder entender o que tinha acontecido e se fosse o caso, fazê-lo pagar pela dor que minha mãe passou e o luto da minha vida inteira, por ter crescido sem meus pais. Quando parei o carro na calçada de casa, ajeitando sua frente para entrar na garagem, avistei Clara sentada no chão, na calçada, de frente para o portão.Desliguei o automóvel e corri na direção dela, que estava com a cabeça baixa. Percebi que tinha a mochila nas costas. Mas já era final de tarde. Então ela não havia ido para a escola?Assim que me viu ela levantou o rosto e percebi seus olhos vermelhos e inchados. Nitidamente havia chorado. E aquilo fez com que meu coração acelerasse e um frio percorresse meu estômago.Peguei suas mãos e a ajudei a levantar-se. Clara me abraçou, sem dizer nada. Deixei que suas lágrimas molhassem minha camiseta e alis