POV PATRICKJá fazia quase três meses que Clara não havia mandado mais uma única carta sequer. Eu estava na frente de casa quando o carteiro chegou, retirando alguns envelopes de sua sacola.- Bom dia, senhor Huxley. – Cumprimentou.- Bom dia. – Peguei as correspondências da mão dele, ansioso.- São todas para a senhora Huxley. – Avisou, acenando e seguindo em frente.Mesmo ele tendo garantido que nenhuma era minha, olhei uma por uma, para ter certeza. E realmente nada estava com meu nome como destinatário.Não que eu estivesse sentindo falta das cartas... Elas eram insignificantes. Inclusive eu estava pensando em jogá-las fora... Quando tivesse coragem. Afinal, quando eu não estava muito bem, elas faziam bem ao meu ego.O que teria acontecido com a fedelha? Será que estava apaixonada? Teria me esquecido?Clara não era feia. E era jovem, alegre e cheia de vida. Certamente mais cedo ou mais tarde encontraria alguém que se apaixonaria por ela... E talvez se apaixonasse também e me esque
Assim que sentamos no bar, na galeria onde ficava a locadora de CD’s no centro da cidade, pedi uma cerveja gelada e servi nos nossos copos.- Ao que brindaremos, amigo? – Artemis estava curioso.- Ao seu amigo que tem oficialmente um patrocinador no campeonato de surf.Artemis me encarou, incrédulo:- Não acredito!- Sim, amigo! Eu consegui.- Quem é o seu patrocinador?- Amanhã irei fechar o contrato. E levar o nome da Billabong.- Cara, isto é incrível! – Artemis levantou e me abraçou, de forma sincera.- Obrigado, Artemis!Artemis era o tipo de amigo verdadeiro, aquele que vibrava com cada conquista minha e que estava ao meu lado para qualquer situação. Tirando a situação com Clara, que foi a única vez que nos desentendemos, nunca estivemos fora de sintonia.Bebemos um pouco e conversamos sobre vários assuntos até que perguntei, como quem não queria nada, fingindo certo desinteresse:- Você... Chegou a ver a Clara com alguém?- Alguém quem? – Ele levantou a sobrancelha, curioso.-
POV CLARAEu estava usando óculos escuros e havia pintado meus cabelos de loiros novamente, retirando as mechas vermelhas. Tudo aquilo para não ser reconhecida na recepção do consultório da ginecologista, caso encontrasse algum conhecido por lá.- Relaxa, Clara. Vai ser bem tranquilo e você vai adorar a consulta. Aproveite e tire todas as suas dúvidas. – Flora apertou meus dedos entre os dela.Suspirei e tentei focar em outra coisa.- Clara, você precisa ver isto! – Flora disse, num tom de voz sério.- O quê?Ela me entregou o jornal daquele dia, aberto na página social. E lá estava a foto de Patrick, ao lado de uma bela morena, da altura dele. Era bonita... Talvez nem tanto quanto ele. A nota dizia: PATRICK HUXLEY, DONO DA CONHECIDA LOJA HUXLEY SURF E SKATE E SUA NOIVA, ADELE MARTINS, EM EVENTO SOCIAL DA CIDADE. OS POMBINHOS IRÃO CASAR EM BREVE.Patrick parecia feliz. Estava sorrindo. E a futura esposa dele também. Fechei o jornal e entreguei a Flora.- Está... Tudo bem? – ela se pre
- Não gosta... Tolera. Eu li numa revista que pessoas que não gostam de cachorros não são confiáveis e podem ter distúrbios mentais.- E você tem dúvidas de que o senhor Joaquim Versiani tem distúrbios mentais e não é confiável?Eu ri:- Não, não tenho dúvidas.- E a avó de Pedro, já aceitou o relacionamento dele com você?- Claro que não. A velhinha, que de boa não tem nada, ainda teve a capacidade de vir aqui me pedir que me afastasse do neto dela.- Não acredito! Quanta petulância! O que você fez a esta pobre senhora, Clara? – Debochou.- Talvez tenhamos uma pendência de outra vida... Só pode ser. Ou ela é muito, mas muito preconceituosa. E nem sei porque... Afinal, Pedro nem é rico, tipo milionário. É só bem de vida. – Dei de ombros.- E o que Pedro achou disto tudo?- Claro que ele ficou furioso e brigou com ela.- Que bom que ele ficou do seu lado.- Sabe de uma coisa, Renan? Eu tenho medo...- Medo?- Tudo sempre foi tão complicado para mim... Nada foi fácil e você sabe muito b
- Sua filha? – riu, de forma sarcástica – Vou jogar sua filha pela janela... - Pai, por favor... – Senti as lágrimas escorrerem pelas minhas bochechas. Joaquim levantou a chave: - Você tem opção, minha filha... Ou me leva e depois volta, trazendo seu monte de pulgas em segurança. Ou eu dirijo e jogo esta bola de pelos pela janela... E passo por cima. Engoli em seco e passei a mão na chave. Ele sorriu e pôs Pipeline no banco traseiro. Minha mãe tentou entrar no carro e ele não permitiu: - Você fica, vagabunda! Minha mãe não deu um passo a mais. Ficou imóvel e li seus lábios: - Vai dar tudo certo! Não fique nervosa. – Ela limpou a lágrima que escorria pela sua bochecha. Entrei no carro e pus o cinto. - Para que botar esta porra? – Ele debochou. Respirei fundo e liguei o carro. Eu nunca tinha dirigido um Pegeout e parecia que nem os botões ficavam no mesmo lugar. Onde ligava os faróis? Ah, eu não precisava ligar os faróis de dia! E se chovesse no meio do caminho? Não fazia idei
POV PEDROLiguei para Marcos e pedi o carro dele emprestado. Já passava da hora de comprar o meu. Certamente era o que eu faria no dia seguinte.Jamais pensei que excederia a velocidade assim que pegasse um carro em tão pouco tempo após fazer a autoescola. Mas meu coração estava apertado e não lembrava a última vez que fiquei tão nervoso. Tudo que eu queria era ver Clara para ter certeza de que ela estava bem.Ouvir o choro de Clara do outro lado da linha me deixou completamente sem chão. O medo dela se transformou na dor que senti ao saber que ela sofria por alguma coisa. E eu não estava com ela naquele momento em que precisava de mim!Se um dia acontecesse alguma coisa com Clara, não tinha certeza se eu conseguiria me manter vivo. A vontade de protegê-la e fazer com que nada a fizesse sofrer era maior que qualquer coisa dentro de mim.Cinco minutos depois eu estava no local onde ela havia mencionado ter atropelado o cachorro, me encaminhando para a descida da lomba gigantesca que ha
- Isso a deixaria melhor?- Sim... Muito. Ninguém o tiraria da rua e enterraria em tão pouco tempo.- Sim, também acho.Clara foi me dando as coordenadas do caminho até sua casa e para minha surpresa, num determinado ponto disse:- Pode parar aqui.Observei atentamente e não havia muitas casas por ali. Ainda assim fiz o que ela pediu:- Qual é a sua? – Quis saber, intrigado.- Eu... Moro próximo daqui. Como a rua é mais tranquila, me arriscarei a ir dirigindo até em casa.A encarei seriamente:- Qual o seu problema com relação à sua casa?- Não é a minha casa... E sim a minha família.Eu balancei a cabeça, aturdido e peguei a mão dela, tentando chegar no fundo daqueles olhos azuis claros, que tanto me faziam perder o sono:- Clara, eu duvido que sua família possa ter mais problemas do que a minha.Ela sorriu tristemente:- Sei que mais cedo ou mais tarde terei que lhe contar tudo... Mas não consigo fazer isto hoje. Não tenho condições.Eu gostaria de fazer muitas perguntas e claro que
POV CLARACheguei em casa e minha mãe não estava. Deixei o carro na rua, rente à calçada, mas não o pus na garagem. Meu pai que o fizesse. Minhas pernas ainda estavam trêmulas e o coração acelerado.Tomei um banho e aproveitei para dar banho em Pipeline. Ela esteve comigo o tempo todo e por ela que eu não joguei o carro numa árvore, correndo o risco de morrer. Sim, porque eu estaria morta, mas Joaquim Versiani também e parecia que aquela era a única maneira de ele não incomodar mais ninguém.Esperei, esperei e nada de minha mãe aparecer. Nem meu pai.Joaquim raramente parava em casa. E quando estava eu sempre sabia, porque passava o tempo inteiro me denegrindo de alguma forma ou perturbando minha mãe. Mas ela? Ela sempre estava em casa. E o fato de não estar, especialmente depois de eu ter saído com meu pai da maneira horrível com que fui obrigada... Causava muita estranheza.Fui na casa de tia Rute e me impressionei ao chegar e ver que ela já estava com tudo encaixotado para sua mud