Fernando Duarte:O sol escaldante brilha implacável sobre o asfalto enquanto eu me aproximo da entrada da empresa, criando uma atmosfera sufocante que reflete minha própria tensão interna. Cada passo que dou parece mais pesado do que o anterior, como se estivesse carregando o peso de todo o mundo nos ombros. Os repórteres se amontoam, me cercando como abelhas furiosas, suas vozes soando como zumbidos irritantes em meus ouvidos, empurrando microfones em minha direção enquanto suas perguntas cortam como facas afiadas. Os flashes das câmeras piscam incessantemente, capturando cada movimento meu. — Senhor Duarte, como você se sente sobre as acusações contra os seus funcionários?— O que o senhor tem a dizer sobre o roubo dos modelos da empresa de seu padrasto?— O senhor tem algum envolvimento com o roubo?Eu os ignoro, com os lábios serrados e deixando meus olhos fixos à frente, mantendo minha expressão impassível enquanto avanço para a entrada do prédio, meu silêncio servindo como uma b
Fernando Duarte:O som das portas se fechando ainda ecoa pelo hall enquanto continuo encarando o ponto onde Laura desapareceu. O silêncio que se segue é ensurdecedor, mas eu sei que todos na sala estão me observando e cochichando baixo sobre a minha atitude com uma funcionária, esperando minha próxima ação para fuxicarem ainda mais. Sinto o peso dos olhares em minhas costas, mas não me importo.Encaro as portas fechadas, intimamente tenho a esperança de que ela vai voltar por elas a qualquer momento, porém cada segundo parece uma eternidade enquanto a imagem de Laura, com os olhos cheios de raiva e lágrimas, está gravada em minha mente. Meu coração ainda está acelerado, mas eu não posso permitir que isso me controle.Artur se aproxima, seus passos ecoando no chão de mármore, ele para o meu lado. Com uma rápida olhada, vejo o seu rosto contorcido em uma expressão de desagrado misturado com curiosidade.— Aquela é Laura? A mulher que estava com você no evento do hospital?Faço um gesto
Mike Silva:O ambiente é familiar. As paredes brancas e frias da delegacia de Salvador não mudaram muito desde a última vez que estive aqui –quando tinha dezesseis anos, denunciado por minha própria mãe–. O som abafado de vozes e passos ecoa pelos corredores para dentro dessa sala, e a luz fluorescente sobre mim projeta sombras alongadas, criando um cenário austero e opressivo, trazendo à tona memórias das quais eu preferia esquecer. Estou com as mãos algemadas pousadas sob meu colo, sentindo o metal frio e apertado nos meus pulsos, sentado em uma cadeira dura de madeira, de frente para o delegado Correia.O delegado Correia, agora com sessenta e pouco anos, parece não ter mudado muito desde aquela época. Seus cabelos estão mais grisalhos, mas o olhar firme e o ar de autoridade permanecem. Ele foi o responsável por investigar meu caso anos atrás e, me deu seu contato, oferecendo sua ajuda sempre que eu viesse a precisar. O que nunca aconteceu, até o dia de hoje.— Mike Silva — Começa,
Cristiane Mendonça:O som de coisas se quebrando atinge meus ouvidos antes mesmo de eu chegar à porta de Fernando. Meu coração palpita, o medo querendo me dominar. Eu paro por um momento, respirando fundo, tentando acalmar meu coração. Meu filho está berrando tão alto que as palavras são indistinguíveis, mas a raiva é clara. Tento bater na porta, mas minha mão treme. Não há resposta. O desespero me consome. Pego a cópia da chave que fiz escondido de sua casa.A porta se abre com um ranger suave e entro cautelosamente, o som das minhas sapatilhas abafadas pelo caos que encontro. A sala está em desordem completa, com móveis virados e cacos de vidro espalhados pelo chão. Fernando está no meio de tudo, com os cabelos bagunçados e os olhos nublados, como se estivesse lutando contra algo invisível.— Fernando! — chamo, minha voz trêmula.Ele não me nota. Cada vez que me aproximo, parece que ele se afunda mais e mais na escuridão, gritando com vozes que só ele ouve. Sinto um medo antigo e fam
Laura Martins:O olhar intenso e raivoso de Cristiane pausa sobre mim, durante todo o caminho até a minha casa, ela não me dirigiu a palavra e nem me olhou, mas assim que atravessamos o umbral da porta e a fechei, seus olhos miram-me com tanta fúria que quase consigo sentir perfurarem a minha pele.Ana, de pé ao lado do sofá, está de braços cruzados, seus olhos apesar de neutros não me ajudam a sentir menos a tensão palpável dentro da minha sala, e mesmo eu estando em um ambiente familiar, não me sinto mais confortável, pelo contrário, as paredes parecem fechar-se ao meu redor, fazendo esse espaço parecer ainda menor e mais sufocante.— Não querem se sentar, não? — Ofereço, tentando manter a minha voz calma.Vejo Cristiane respira fundo, mas não se move. Seus olhos permanecem fixos em mim, acusadores e cheios de raiva e dor. Me sinto deslocada dentro da minha própria casa. Isso é ridículo! Não fiz nada de errado para receber esse tipo de olhar vindo dela.— O que a senhora quer comigo?
Laura Martins:“Você não tem ideia do que é ver seu filho se despedaçando, dia após dia, e não poder fazer nada”. — As palavras de Cristiane ecoam em minha mente, meus olhos capturam a visão devastadora à minha frente que chega a me deixar sem ar enquanto a culpa pesa em minha mente.Caminho devagar, cada passo cuidadoso para não me machucar no mar de cacos de vidros espalhados pelo chão. Minha respiração está pesada e o meu coração palpita ritmicamente em meu peito. A figura de Fernando vai ficando mais clara à medida que me aproximo, consigo ver seus ombros balançando com os soluços baixos.Com os pés, afasto os vidros e me ajoelho ao seu lado, agora posso ver claramente o rastro das lágrimas em sua face. Sinto um nó se forma na minha garganta.A minha mente é arrastada para a primeira coisa que Ana me deixo claro quando me visitou pela primeira vez: a depressão que assolava Fernando; ela me contou do acidente onde ele perdeu a esposa e a filha que estava prestes a nascer. Contou de
Laura Martins:A noite é envolta em um silêncio que parece amplificar cada batida do meu coração. Estamos sentados no jardim, a grama fria e gélida contra minhas pernas, mas não me importo. A lua cheia lança uma luz suave sobre nós, iluminando tudo com um brilho prateado. Olho para Fernando ao meu lado, seu perfil destacado pelas luzes brancas da sua casa. Ele está tão perto, mas sinto que há um abismo tão grande entre nós.Observo o contorno de seu rosto, a linha forte do queixo e o traço das sobrancelhas escuras que agora estão relaxadas. Seus olhos, que antes estavam turvos de dor e tristeza, agora refletem a luz da lua. Seus cabelos dançam com o assobiar do vento, que também chacoalha as folhas das árvores e espalha o perfume das flores ao nosso redor.A respiração de Fernando é lenta e profunda, como se ele estivesse tentando encontrar algum tipo de paz. Ele fecha os olhos e solta um longo suspiro, deixando escapar a tensão acumulada.— Por que veio aqui, Laura? — Fernando questi
Laura Martins:— Você ainda quer ficar aí, sabendo que está ao lado de um assassino?A pergunta é um desafio, uma prova de fogo para o que sinto por ele. Mas ao invés de me afastar, sinto-me compelida a me aproximar ainda mais.— Você estava bêbado? — Indago, tentando manter minha voz estável. Ele nega com a cabeça. — Então nessa história tem mais coisas que você não quer conta — digo, a certeza crescendo dentro de mim. Ele parece atordoado, como se eu tivesse lido um segredo guardado a sete chaves. — No hospital, naquele evento, uma senhora se aproximou de nós e eu não pude ignora o rancor nos olhos dela ao mirarem em você, ela é a mãe da sua falecida esposa, não é?Ele suspira, desviando o olhar do meu.— Sim — responde. — Ela me culpa, eu também me culpo, assim como todos ao meu redor. E todos tem razão, distraindo enquanto gritava com ela, eu não vi que fui para a contramão.O ar ao nosso redor parece congelar, e a gravidade da confissão pesa sobre nós. Sinto as lágrimas queimarem