Capítulo 6 - Larissa

(Larissa)

Mais uma vez, o outro lado da cama amanheceu vazio. As imagens da noite passada vieram a minha mente fazendo com que logo cedo, meu dia iniciasse cinzento. 

Forcei meu corpo a se levantar e fui até o banheiro fazer minha higiene matinal. Enquanto escovava os dentes, me olhava no espelho vendo que a cada dia, meu olhar perdia o pouco que restava do brilho. 

Alessandro, que sempre abominou a traição depois de ter presenciado sua mãe sofrer tanto por causa do seu pai, agora agiu como o mesmo, provando que o sangue intervém no carácter. 

Terminei de me arrumar e fui tomar o café da manhã. Margarida sempre fazia uma mesa bonita, cheia de coisas e com dois lugares à mesa quando Alessandro não estava viajando, como agora. 

Encarei o lugar de Alessandro feito, sabendo que ele não viria para tomar café. 

一 O Sr. Moratti já vai descer? Vou trazer o leite quente. 

Olhei para ela e neguei com a cabeça, prestes a abrir a boca para falar quando o som do carro estacionando chamou a nossa atenção. Margarida me olhou com confusão e eu forcei um sorriso. 

Logo seu rosto se expressou em entendimento. 

一 Pode trazer o leite. - Eu disse e ela acenou confirmando antes de sair. 

Ouvi a porta sendo aberta e fechando e seus passos passando pela sala antes de subir as escadas. Margarida voltou com o leite e eu senti seu olhar de pena na minha direção, mas o ignorei e me servi. 

Quando estava finalizando, Alessandro apareceu já tomado banho. Hoje sábado, só acordei cedo porque não tinha conseguido dormir direito como na noite passada. 

Ele se acomodou e começou a se servir. O silêncio que antes era confortável, hoje estava constrangedor e incômodo. 

Sentindo a fome passar, deixei o restante do meu café da manhã na mesa e me levantei, chamando a sua atenção. 

一 Não vai terminar? - Estranhou, sabendo que eu não gostava de deixar comida no prato. 

一 Perdi a fome. - Respondi com um sorriso forçado e saí da sala de jantar. 

Caminhei até a varanda e me acomodei no sofá, tendo mais uma vez as imagens de Chiara beijando Alessandro no estacionamento. 

Fechei os olhos com força tentando afastar as imagens, mas elas estavam vívidas para a minha perturbação. 

Meu celular notificou com uma mensagem de Catherine, dizendo que Pedro havia viajado para Londres e em seguida me encaminhou uma foto dele com outra mulher. Não tinha nada demais, mas a proximidade deles parecia bem intima. 

Larissa: Que babaca. Espero que ele realmente caia na real e perceba que o que está fazendo, não é o certo. E só por isso, hoje você vai sair daquele clube com pelo menos uma boca beijada! É uma promessa. 

Enviei a mensagem com um sorriso no rosto, vendo que ela estava digitando. 

Catherine: Não sei se estou pronta. Acho que vai ser muito estranho. Podemos apenas tentar nos divertir?

Larissa: Não vou te forçar a ficar com ninguém e claro que vamos nos divertir. Mas se qualquer um te interessar, me avisa que eu fico de vela ;) 

Catherine mandou outra mensagem rindo e eu acabei me distraindo conversando com ela. 

Um tempo depois resolvi subir para o quarto em busca do meu carregador quando parei do lado de fora, ouvindo a voz de Alessandro. 

一 Chiara, você sabe que não precisa me pedir… se eu te dei o cartão foi porque eu quis… tudo bem, eu te busco às nove horas… até mais tarde. 

A sensação de antes voltou e saí dali praticamente correndo. 

De repente, essa casa que é tão grande, me pareceu pequena. Minha mente estava pedindo um pouco de distância de Alessandro, porque sabia que a proximidade machucaria ainda mais o meu coração. 

Peguei as chaves do carro e estava prestes a sair de casa quando ouvi Margarida me chamar. 

一  A senhora vem para o almoço? 

Olhei o relógio no meu pulso, vendo que ainda eram 08:40.

 一 Umas dez horas eu te aviso, tudo bem?

Margarida acenou confirmando e eu saí de casa. 

Não sabia para onde iria, mas tinha que ser para longe de Alessandro. Acabei parando em um bar próximo ao centro e entrei nele, pedindo um drink e me acomodando no banco da bancada. 

Não costumava beber muito, mas no momento eu precisava relaxar. Quando finalizei a bebida, eu estava mais calma e decidi caminhar um pouco. 

一 Lari? 

 Uma voz conhecida chamou a minha atenção, fazendo meu coração tremer em meu peito. 

Lentamente, me virei para a direção da voz, encontrando com Guilherme, meu ex, parado em minha frente e com um belo sorriso no rosto. Sem querer, o olhei por inteiro vendo como ele tinha mudado, para melhor, claro. 

Tinha namorado Guilherme na adolescência, antes de conhecer Luciano.

一  Guilherme? - Quis confirmar o fazendo rir mais ainda. 

一  Sim, quanto tempo, em?

Acenei confirmando, o vendo me olhar de cima a baixo também. Só então percebi que eu estava com um short jeans e uma camisa preta. Além das minhas Havaianas. 

一  Você voltou para a cidade? - Perguntei, tentando desviar a sua atenção.

一  Tem duas semanas. Minha mãe adoeceu e eu decidi ficar por perto. 

一  Entendo…

一  E você, como anda as coisas? Casou?

Sua última pergunta fizeram as borboletas do meu estômago agitarem. Pensei uns segundos antes de negar com a cabeça. 

一  Ainda não encontrei um homem que me amasse o suficiente para casar comigo. - Meu sorriso estava bem forçado e eu sabia que ele percebeu. 

Quando nós dois terminamos, eu tinha apenas 16 anos e ele 18. Acabamos tudo porque Guilherme passou em uma universidade em outro país e foi estudar fora. 

一 Bem, quem sabe você ainda pode encontrá-lo? - Ele ainda tinha o sorriso de covinhas mais lindo que eu já vi.

一  É, quem sabe… - Disse um pouco perdida em seu sorriso. Pisquei os olhos tentando me concentrar. 

一  Larissa? - Meu corpo travou quando a voz de Alessandro soou atrás de mim. 

Os olhos de Guilherme se ergueram e ele olhou com cautela. Virei-me, vendo Alessandro encarando Guilherme. 

一 Sr. Moratti, o que faz aqui? - Meus olhos estavam arregalados. 

Alessandro voltou a me encarar, agora com uma sobrancelha erguida. Ele desviou o olhar para Guilherme uma última vez antes de os fixar nos meus. 

一  Eu te liguei, esperando falar com você sobre o novo projeto. - Disse com seu tom rude, fazendo os pelos dos meu braço se arrepiarem. 

一  Sinto muito, esqueci meu celular em casa carregando.

一  Vamos, precisamos resolver esse assunto. 

Virou as costas pronto para que eu o seguisse. Voltei-me para Guilherme com um sorriso de desculpas.

一  Desculpe, mas tenho que ir. A gente se vê?

一  Claro. Pode me dar o seu número, minha mãe vive perguntando sobre você. 

一  Larissa? - Alessandro me chamou totalmente impaciente. 

一  Tem rede social? - Perguntei e ele acenou confirmando. 一  Te mando por lá, até mais. 

Disse antes de correr para o carro de Alessandro, que estava estacionado logo perto. 

Assim que coloquei o cinto de segurança, ele saiu com o carro em uma velocidade absurda, me fazendo agarrar o acolchoado do banco. Olhei para ele assustada. 

一  Vai mais devagar, por favor. - Mas ele parecia não me ouvir. 一  Alessandro, você está me assustando, vai mais devagar. 

一  Quem era aquele cara? - Perguntou com a raiva pingando em sua voz. 

一  É… -Parei de falar deixando um gemido de medo escapar dos meus lábios quando ele costurou entre os carros, quase batendo em uma moto. 一  É um antigo conhecido… Dirija mais devagar, pelo amor de Deus. 

一  Antigo conhecido? O que isso significa?

 Seu pé afundou mais no acelerador enquanto ele pegava outra rota, que levava a BR. Tendo a estrada livre, Alessandro usou o máximo de potência do seu carro esportivo. 

As lágrimas estavam transbordando em meu rosto, o medo vívido de que ele podia causar algum acidente. 

一  Não significa nada, pare esse carro, Alessandro! - Gritei, totalmente desesperada. 

一  Me diz que porra isso significa, Larissa? - Gritou comigo, sua voz com uma raiva que eu nunca tinha presenciado antes. 

一  O mesmo que você e a Chiara! Agora pare esse carro! - Gritei em desespero, sentindo as cenas vindo à minha mente. 

Um caminhão surgiu no nosso campo de visão e cada vez mais Alessandro acelerava. Fechei meus olhos sentindo o desespero, o medo me tomar em saber perderia a minha vida dessa forma. 

De repente o carro freou de vez, fazendo meu corpo avançar para a frente com o impulso e o cinto de segurança me manter no banco. A poucos metros do caminhão, Alessandro girou o volante para o acostamento, fazendo o caminhão passar por nós balançando o carro com a velocidade. 

 O soluço me sufocava causando dor, enquanto sentia meu coração batendo como um louco em meu peito.

一  Saia do carro. - Disse, sem olhar na minha direção. 

O encarei, em choque. Estávamos no meio do nada, a não sei quantos quilómetros da cidade. Ele iria me deixar aqui?

一  Você é surda? Eu disse para sair da porra do carro! - Gritou, me assustando ainda mais. 

Soltei o cinto e abri a porta, mal descendo e ele já saindo em alta velocidade. 

O observei fazer a curva e voltar para a cidade. O cinza do seu carro esportivo aos poucos foi sumindo do meu campo de visão. 

Olhei para os lados, chorando desesperada. O que eu faria? O quão longe estava de casa? 

Mal se passava um carro aqui. E se passasse, seria com pessoas de bom coração?. 

Juntei os braços, me abraçando e comecei a caminhar enquanto as lágrimas se derramavam em meu rosto. Alguns carros passavam, buzinando e falando coisas obscenas e tentei ignorar, mas o medo de eles pararem e me sequestrar estava me sufocando. 

Como ele pôde me deixar aqui sozinha? Ele quem veio atrás de mim, ele quem me traiu beijando a Chiara. Por que diabos ele me tratou assim?

Minhas pernas estavam doendo, o peito do meu pé machucado. Já faz quatro horas que eu estava caminhando e pela placa que vi uns cinco segundos atrás, ainda faltavam mais cinco quilômetros para eu chegar à cidade. 

Parei um pouco debaixo de uma árvore em busca de sombra. O sol do meio dia estava escaldante e a sede aumentava cada vez mais. Suspirei, sentindo a vontade de chorar vir à tona mais uma vez. 

一 Nunca imaginei que ele faria algo assim comigo. - Disse baixinho, limpando o suor da testa. 

Felizmente, os carros pararam de aparecer e eu consegui pelo menos diminuir o medo de ser raptada. Depois de uns minutos descansando, voltei a caminhar debaixo do sol. 

Ao avistar as casas, uma sensação de alegria me tomou. Caminhei mais alguns minutos e vi um moto-táxi parado em uma praça. 

一  Com licença. - O chamei. 

一  Sim, senhora. 

一  Você está livre para uma corrida?

一  Estou sim. 

一  Graças a Deus, você pode me… - Parei de falar, não querendo voltar para casa e encontrar com Alessandro. Decidida, dei o endereço de um hotel próximo ao nosso bairro e o moto-táxi me deixou lá. 

Depois de fazer o check in, subi e a primeira coisa que fiz foi pedir o serviço de quarto e procurar água no frigobar. Bebi o quanto pude e deixei meu corpo se acalmar um pouco antes de ir tomar um banho. Vesti o roupão e pedi para lavarem a roupa que eu estava usando. 

Esses serviços me sairiam um pouco caros, mas estava tudo bem e graças a Deus eu trouxe minha bolsa comigo.

Quando sai do banho, a comida já estava no quarto e eu comi como se estivesse há anos sem comer. Mas a dor em meu pé não me deixava saborear a comida como eu queria. 

Sentei-me na cama, vendo as bolhas feias no meu pé. Minha pele estava ardendo por causa do sol. 

Deitei na cama, pensando no que Alessandro tinha feito. Em algum momento, pouco depois que ele me deixou lá, eu até pensei que ele se arrependeria e voltaria para me buscar, mas eu não podia estar mais enganada.

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