S E L E N
Silêncio, isso, apenas o... silêncio. Era tudo o que eu pensava e desejava estar apreciando, invés da voz estridente da minha irmã.
Levanto minha cabeça que estava entre meus braços em cima da mesa, e olho incrivelmente entediada para a morena falsa que falava incansavelmente mais uma marca de seguidores no I*******m. Quantos eram mesmo?
– 750 mil seguidores! – Selina exclama com um sorriso maior que a cara, ela era insuportável, jamais irei entender o porque meus pais sempre amaram mais ela que a mim. Mas algo me dizia que era porque ela era um reflexo fiel a ambição do meu pai e a maldade da minha mãe. E eu? Eu não sei nem quem eu sou. Mas eu me questionava a cada fim de semana que eu era obrigada a ficar aqui, em cada um deles minha irmã esfregava na minha cara que eu não tinha nada em comum com ela.
– Ah, e você? Filha? Alguma novidade que queira nos contar? – A voz fina da minha mãe me chama a atenção, olho para ela que tem uma expressão de puro e genuíno desinteresse em saber seja lá o que for da minha vida. Meus pais eram obrigados pela vovó a fingirem que se importam comigo, pelo menos sexta, sábado e domingo.
Eu tinha sim algumas, mas não era com eles que eu gostaria de compartilhar. Balanço a cabeça que não, voltando a atenção para as minhas mãos agora em cima da mesa. Só queria ir logo para casa, longe deles.
Olho novamente para minha irmã que estava super empolgada falando sobre as suas parceiras e etc. Observo seus longos cabelos pretos escorridos e a maquiagem destacando seus olhos. Éramos idênticas mas diferentes ao mesmo tempo, claro, ela possuía veneno na ponta da língua, o mesmo escorre no canto direito da sua boca. Como se ela pudesse ler meus pensamentos, ela limpa a boca com o guardanapo e eu rio-me internamente.
Ela odeia a ideia de que existe alguém idêntica a ela na aparência, acho que seu narcisismo beira á loucura. Então desde que me lembro ela tenta ao máximo me afastar da vida dela e consequentemente da dos meus pais.
Lembro-me quando ela convenceu meus pais a me entregarem a minha avó. E eu sinceramente mesmo... nunca estive tão grata, fui criada longe de toda a toxidade dessa casa, arrisco a dizer até que sinto uma queimação nas minhas narinas quando tento respirar.
– Deveria voltar a ser loira, não é? Irmãzinha? – A voz nojenta ecoa, ai, eu odeio quando ela me chama de "irmãzinha". Sorrio falsamente.
– Não, eu gosto dessa cor – Mantenho o sorriso e ela desfaz o dela, revirando os olhos. Meus pais como sempre nada percebem ou fingem não perceber.
Meus cabelos estavam um castanho escuro e eram mais curtos que o da cobra. Não estávamos nada parecidas.
– Se pintar de preto e emagrecer uns 20 quilos, talvez fique parecida comigo, nem ao menos parecemos gêmeas – Ela diz séria, forçando um tom preocupado. Olho para minha mãe que rir.
– Bem que um dieta não te faria mal algum, Selen – Minha mãe completa. Sinto minhas bochechas pegarem fogo. Eu as odeio e odeio estar aqui.
– Ah, e também pôr um mega-hair, quem sabe, qual shampoo barato você usa para eles estarem assim com as pontas ralas? – Decido ignorar.
Meu pai permanece em silêncio. Ele não fede e nem cheira.
Logo depois, elas duas voltam a conversar animadamente. O que a minha irmã via em mim para tentar me deixar mal? Parece que está competindo comigo. Que horror.
Balanço minha cabeça e foco minha atenção em terminar o café da manhã, eu já havia chegado a algumas boas horas. Nosso aniversário de 19 anos é amanhã e eu estava pensando em como pedirei a meu pai para que pudesse ir para casa.
– Estou tão ansioso para a minha festa de aniversário! O que vai me dar de presente, paizinho? – Ela se inclina aos ombros do papai, com um sorriso branco que podia até me cegar. Ele olha para ela abrindo um sorriso e em seguida para mim como se não quisesse que eu visse essa cena. Tarde demais.
– O que querem ganhar? – Ele pergunta agora alternando o olhar entre nós duas, ela desfaz o sorriso branco rapidamente. Agora iremos ver o próximo ataque de drama.
– Querem? Foi eu quem perguntei! E pode ver que ela não precisa de nada – Engulo em seco diante seu olhar de nojo. Balanço minha cabeça, já estava para lá de acostumada a isso, já nem doía mais. um– Eu quero aquela Ferrari rosa que te pedi no aniversário passado, por favor! – Ela volta a sorrir. Já meu pai desfaz o dele.
– Por que quer outra? Já te dei aquela preta a alguns anos – Olha desconfiado para mim. Enquanto eu, só tenho uma bicicleta e ela constantemente quebra a corrente. Antes eu tentava entender o porquê de ser excluída, mas hoje já estou até cansada de pensar sobre. Não tenho mais energia.
– Não tem mesmo nenhuma novidade, querida? – Agora minha mãe se dirige a mim, claro que era para que a minha atenção não tivesse na minha irmã e no papai.
Sorrio para ela.
– Na verdade eu tenho uma – Tomo um gole do café agora gelado. – Consegui uma bolsa de estudos para estudar no Canadá. – Vejo a surpresa em seus olhos assim que termino de falar. Apenas minha avó e Victor sabiam disso.
– Jura? – Pergunta como se não conseguisse acreditar. Era tão incrível assim eu ter conseguido algo que eles com certeza pagariam para que a minha irmã tivesse ganho?
– Do que estão falando? – Meu pai pergunta e eu então repito a novidade para ele, já ele, nada diz e olha para minha irmã que está vermelha de raiva.
– Esqueci de dizer a vocês que estou sendo perseguida por um homem! – Exclama e do nada a vejo começar a chorar. Logo a atenção de todos está nela novamente.
– O que? Como assim, meu amor? – Minha mãe que estava ao meu lado afasta sua cadeira para mais perto da minha irmã.
– Sim, mamãe, faz quase um ano, ele vive me mandando mensagens nojentas! – Continua, reviro os olhos. Ela odeia quando a atenção não está totalmente nela.
Ela pega o celular que estava com a tela virada para baixo na mesa e parece procurar algo.
– Olhem as últimas que ele me mandou! – Ela entrega o celular para a mamãe, permaneço sem esboçar alguma reação. Ela percebendo, manda mamãe me entregar o celular.
Sem ter opção, eu o pego e tento entender o que vejo. Meus olhos se arregalam com a última mensagem escrita em letras maiúsculas:
"VOCÊ ME DEIXA QUENTE FEITO O INFERNO E UM DIA A FAREI QUEIMAR JUNTO Á MIM"
A S L A N Embora eu procurasse uma solução incansavelmente, nenhuma ideia parecia boa o suficiente.Assim completados meus 18 anos, escolhi viver longe de toda a responsabilidade da organização e também da minha família. Saí do Brasil dedicado a continuar mantendo tudo assim: longe de mim. Mas o muro que criei ao meu redor, não me salvou da responsabilidade que eu acreditei ter conseguido escapar. Sendo filho de Benjamin Belvoir, eu já deveria saber que é impossível fugir do próprio sangue e do destino já traçado antes mesmo de dar meus primeiros passos, pronunciar a primeira sílaba ou a primeira palavra pronunciada corretamente. Agora eu estava no avião, voltando para o Brasil, ainda sem saber o que faria depois que visse os olhos angustiados da minha mãe. Ela teve que enterrar o próprio marido sozinha, sem direito a abrir o caixão ou velar o corpo. Sem nada e também sem mim. Minha mãe é italiana, meu pai a conheceu em uma das viagens a Itália. Lembro-me das várias histórias e
S E L E N Hoje é sábado, dia 25 de junho, meu aniversário assim como o de Selina. As vozes dos meus pais conversando era um som quase perturbador. Normalmente o motorista deles me deixam em casa após o café da manhã de domingo, mas espero que por ser também meu aniversário, eu poderia pedir para ir hoje mesmo, óbvio que isso faz com o que eu desça as escadas mais rápido.– Não estamos conseguindo nem manter a casa e ela quer uma nova Ferrari? – Paro, assim que escuto a voz do meu pai se dirigindo a minha mãe. – Eu entendo meu amor, tentarei conversar com ela – Minha mãe passa a mão nos ombros de papai e ele suspira pesado. Então eles estão falidos? Tapo minha boca para abafar a gargalhada. Que tristeza! Não poderão comprar a Ferrari rosa para minha querida irmã. Reviro os olhos entrando no lugar e sento-me na cadeira de sempre, ao lado da mamãe. Já que dava para a vista da enorme janela de vidro onde se podia ver o jardim. – Bom dia – Leila, minha mãe desejo, em um tom repreen
A S L A N Tento me despedir de minha mãe, sentindo meu coração apertar em meu peito. Nunca a vi chorando tanto quanto a alguns minutos atrás. Ela chamava meu pai como se ele pudesse ouvi-la, a sensação de impotência por não conseguir desta vez resolver o problema, me quebrava por dentro. – Filho, vamos para casa comigo – Pede mais uma vez. Suspiro pesado, não sabendo como dizer que não posso ficar. Pego suas mãos pálidas, vendo o anel dourado de casamento, tenho certeza que demorará muito tempo para que ela tire do dedo. Embora hoje fosse um dia quente, as suas mãos estavam frias como o gelo. Passo meu dedo por cima das suas veias e penso em uma forma de dizer que não posso ficar e que não doa tanto assim. – Você não pode ficar, não é? – Sua voz sai em tom baixo, como se não quisesse dizer em voz alta. – Não, mamãe – Respondo em um suspiro, baixando minha cabeça. Ela assente e tira suas mãos das minhas, virando as costas e indo em direção aos seguranças. Ela me olha por cim
L E I L A V A L L E N C E Meus braços estavam carregados das recentes compras. Comprei diversas joias para Selina. Minha querida filha havia ficado tão triste com o presente que meu marido deu para Selen, precisava anima-la.Sua festa de aniversário foi um sucesso e eu fiquei tão feliz por sua felicidade.Deixo minhas sacolas no quarto e vou para o de Selina, as pousando na cama ao lado dela, como sempre ela estava com os fones nos ouvidos, ignorando minha presença, ainda irritada. Me aproximo sutilmente e tiro seus fones, ignorando seus resmungos.– Olhe o que comprei para você! – Digo animada, olhando para as sacolas, ela logo se levanta abrindo as mesmas e jogando as embalagens no chão.– Mãe! Não acredito! Obrigada! – Apenas diz, fico feliz. Mas toda sua animação some quando ela escuta seu celular vibrar, com uma nova notificação. Continuo o que ela estava fazendo e desembalo tudo. – Olha só! – Ela me empurra seu celular. – Ele agora me mandou uma foto, isso não é a praia
A S L A N Me olho no espelho, apreciando o terno perfeitamente alinhado em meu corpo. Estava muito ansioso para ver Selina de perto.Thomás me ligou hoje mais cedo, confirmando um almoço. Mal me lembro do caminho que fiz até o restaurante, até vê-la jogando o cabelo para trás, enquanto conversava com o pai. Comprimento todos antes de sentar, logo Thomás fica sério, mas a sua esposa continua com um sorriso de orelha a orelha. – Olá querido, me chamo Leila – Em estica a mão, se levantando, faço o mesmo e aperto sua delicada mão, desvio o olhar para Selina que está com os olhos arregalados para mim. – Sou Aslan, e você deve ser Selina – Ela aperta minha mão.– Prazer em conhecê-lo, Senhor – Engole em seco, não tenho dúvidas de que ela se lembre de mim, a alguns meses atrás eu a presenteei com um vídeo meu em frente ao espelho, enquanto me tocava para ela. Ela olha para meu pescoço, com certeza reconhecendo as tatuagens. Falamos um pouco sobre negócios no decorrer o almoço, mas e
O caminho para casa nunca me pareceu tão longo, deixar Victor sozinho no hospital era algo que me partia o coração. Mas eu precisava ficar com a vovó.Paro o carro em frente a casa e procuro a capa dele que deixo na varanda, para evitar a chuva ácida e manchar a pintura. Minha avó sai na porta alegando que escutou o som do carro. Sorrio para ela, cobrindo o carro. – Fiz uma sopa deliciosa! – Ela toca minhas costas assim que chego na porta, Vovó mesmo com seus 68 anos, não parecia nunca ter essa idade, no máximo 50, eu diria, era magra e se importava demais com a aparência, principalmente com a moda. A casa só era simples de fora, mas por dentro se assemelhava um pouco a casa dos meus pais. Claro que ela arrumou tudo com o tempo. Não temos muito dinheiro para reformar tudo de uma vez. – Está realmente um delícia, vovó! – Elogio e ela sorrir, feliz, ela adora ser elogiada. Conversamos um pouco sobre meus pais e de como estão as coisas, sobre minha bolsa de estudos e como faremos
A vovó resmungava alto enquanto eu permanecia em silêncio. Faz dias desde meu acordo com papai e que Selina e eu tivemos que trocar os celulares. Eu tinha que ir até a casa de Victor explicar o que estava acontecendo, mas temia que a minha adorável irmã já tivesse feito antes de mim. Fui orientada a continuar postando nas redes sociais de Selina mesmo após ela ter feito um vídeo dizendo que iria se ausentar mais das redes sociais. Tiro uma foto do meu café e posto nos story dela, desejando um bom dia, enchendo a foto de efeitos que o próprio Instagram disponibiliza. Seguindo o que minha irmã fazia sempre. Exagerada. – Vovó! Está tudo bem – Digo mais uma vez. Ela não parava de reclamar. Ela para a minha frente e me olha tristemente. – Não quero isso, Selen! Me perdoa mas ela é um diabo, olha o tanto de coisas ruins que ela faz, é só procurar notícias da cidade no Google que aparece uma foto dela! – Passa a mão na cabeça. Era verdade. Torço o nariz, minha avó está certa.– Mas é
A S L A N Sempre tive a convicção de que a vida é curta demais para lamentações. Pensamentos de auto-critica e arrependimentos sem cabimentos como se no momento passado pudéssemos adivinhar o futuro. Uma grande e enorme perca de tempo. Mas agora eu estava mordendo minha própria língua, pensando no que eu poderia ter evitado para não estar nessa situação. E se eu tivesse resolvido ficar aquele dia em casa, almoçado com meus pais, invés de simplesmente arrumar minhas coisas e ir embora? Eu poderia ter ajudado meu pai a lavar o dinheiro o quanto antes, já que o plano dele antes de conhecer minha mãe, já era ir embora do país...– Não se martirize, meu filho, nada disso é culpa sua... – Minha mãe diz ao telefone. Decidi ligar para ela antes de ir para o almoço. Pretendia voltar ao Brasil novamente assim que marcar a data do casamento. O timbre da sua voz era pesado, carregado, forçado, isso me partia o coração. Eu podia ser o homem mais frio já existente, mas a família era meu ponto