AYLA..Quando os lábios de Azrael tocaram os meus novamente, era como se o tempo se curvasse. Tudo ao meu redor desapareceu , a luz fraca do quarto, o som do meu coração descompassado, a respiração ofegante que escapava de mim sem controle. Era só ele. Só nós.Seu corpo estava sobre o meu, mas não havia medo. Havia calor. Um calor antigo, como se eu já o conhecesse há séculos. As mãos dele percorriam minha pele com reverência, como se eu fosse algo sagrado… e ainda assim, tão intensamente desejada. Eu sentia isso. Sentia seu desejo como uma onda, e meu corpo respondia, ainda que minha mente gritasse por limites.Mas foi quando ele parou que percebi algo diferente. O peito dele subia e descia, o olhar ardente e ofegante. Seus olhos encontraram os meus e, por um segundo, ele pareceu lutar contra ele mesmo. Como se estivesse se obrigando a parar, mesmo que não quisesse.Mas ele não podia, ele me explicou motivo.Senti meu rosto pegar fogo. A vergonha me atingiu como uma onda fria. Eu a
Eu pulei da cama em um pulo, o coração disparado, o suor frio escorrendo pelas minhas costas. Aquele… aquele monstro ainda estava ali. Hariel. O anjo das trevas. O mesmo do meu sonho.Tentei correr até a porta. Minhas mãos tremiam tanto que mal consegui segurar a maçaneta. Girei. Tentei puxar. Nada. A porta não abria. Tranquei e destranquei. Nada. Estava presa. Comecei a bater, a gritar:— SOCORRO! ALGUÉM ME AJUDA!Mas ele riu. Um riso cruel, zombeteiro, que ecoou pelas paredes como um trovão perverso.— Ninguém pode te ouvir, Ayla.Ele disse, com a voz baixa e venenosa. — Seus gritos são inúteis.Me encolhi ali, no chão frio, encostada à porta, o corpo inteiro tremendo. As lágrimas escorriam sem que eu pudesse conter. Eu estava com medo. Um medo real. Um medo que não me deixava respirar.— Azrael… Sussurrei desesperada. — Azrael, por favor…Hariel soltou um rugido que sacudiu o quarto, sua forma vibrando com fúria.— Azrael? Ele gritou, com os olhos ardendo como brasas. — Acha me
O grito dela me atravessou como uma lança.Estava muito longe, voando em meio às sombras do céu, quando senti. Era mais do que um pedido de socorro. Era um eco da alma. Uma dor tão profunda que parecia arrancar meu peito do lugar.Eu parei. No mesmo instante, parei de voar. Meu corpo pairou no ar, suspenso pelo desespero. A dor dela era a minha. O medo dela era o meu inferno.Subi o mais alto que pude, atravessando o véu da terra, deixando tudo para trás: tempo, espaço, limites. Eu precisava alcançá-la. Mas não podia. Eu não tinha esse poder. Ainda não. A magia me havia devolvido muito, mas não o dom de atravessar distâncias num piscar.Fechei os olhos.E ali, no silêncio mais profundo, onde só os deuses ouvem, clamei.— Seres da luz que regem os destinos da terra... Minha voz tremia, algo que nunca imaginei acontecer, eu sei quem sou. Sei o que represento. Meu povo não é bem-vindo entre vocês. Mas tudo o que fiz... tudo... foi por ela.Minha garganta se apertou. Continuei.— Não peço
Fui imediatamente para o hospital, sentindo uma energia forte passar por todo o meu corpo, como se fosse o universo trabalhando a meu favor.Quando alcancei o hospital, ninguém me viu passar. Corri pelos corredores como vento, atravessando portas, cortinas, pessoas. Meu coração batia num ritmo que eu nunca havia conhecido antes. O medo da perda ainda martelava dentro de mim, mesmo sabendo que ela estava viva.Eu precisava vê-la.E então a encontrei.Ali estava ela…Deitada em uma maca, conectada ao oxigênio, as pálpebras pesadas, a pele pálida. Seu braço repousava ao lado do corpo, e notei uma pequena queimadura em sua mão, provavelmente na tentativa de sobreviver. Meu sangue ferveu de dor.Meu corpo inteiro paralisou por um instante. A sala estava tranquila, havia uma única enfermeira ao lado dela, ajustando os aparelhos. Ayla… mesmo naquela fraqueza… me viu.Seus olhos, cansados, me encontraram no silêncio.Ela era a única que podia me ver.Levei o dedo aos lábios, pedindo silêncio.
O sol já havia nascido quando deixei para trás os destroços do hospital. Os primeiros raios da manhã desenhavam sombras suaves no céu, como se o mundo tentasse fingir que nada havia acontecido. Mas eu sabia. Ayla sabia. O inferno havia passado por nós.Carregava seu corpo frágil em meus braços, envolta em meu manto, protegida do vento cortante da altitude. Ela ainda tremia, mesmo com o calor do dia tentando aquecer sua pele. A queimadura na mão era visível, mas nada comparado ao vazio em seus olhos.A cada minuto de voo, meu coração pesava mais.Eu voava em direção ao único lugar onde ela estaria segura: A cabana de Ethan, escondida na floresta esquecida da civilização, no norte dos Estados Unidos. Era um abrigo de proteção antiga, um refúgio entre mundos. Só ali, talvez, conseguiríamos pensar, respirar... sobreviver.— Está com frio? Perguntei, tentando aquecê-la com a asa boa.Ela assentiu levemente. Seu rosto descansava contra meu peito, os olhos vermelhos de tanto chorar, mas sem
AYLA..Eu me lembro do cheiro primeiro. Um cheiro acre, pesado, queimando o fundo da garganta. Depois, o calor. Um calor sufocante que se espalhou pela casa antes mesmo que eu pudesse ter uma chance. Quando pensei em fazer algo, tudo já estava tomado.Chamas lambiam as paredes. A madeira rangia como se chorasse, implorando para não ruir. A fumaça entrava pelos meus pulmões como se quisesse me arrancar a alma. Ouvi gritos. Gritos da minha mãe. Do meu pai. Mas eu não os via.— Mãe! Eu tentei gritar. — Pai!Mas minha voz se perdeu entre o estalar do fogo.Corri, tropeçando em cacos, tentando encontrar alguma saída, alguma luz. Meus pés descalços ardiam com o calor do chão. Meu corpo tremia inteiro. Cada segundo parecia uma eternidade. Eu queria voltar no tempo. Voltar para quando tudo estava intacto. Para quando minha família ainda existia.Foi quando meus pais pararam de responder.A dor que senti não tinha nome. Gritei como nunca antes. Gritei até minha garganta se ferir. O mundo p
A porta da cabana se abriu devagar. Um homem idoso surgiu, passos firmes, apesar da idade. Seus olhos estavam nublados pelo tempo, mas quando me viu… eles brilharam. Como se vissem algo que ele esperava há muito.Ele parou.E sorriu.Um sorriso largo, sincero, que encheu meu peito de calor. Eu realmente senti que aquele homem me conhecia, mesmo que eu não soubesse quem ele era. Azrael caminhou até ele e me levou junto, como se aquele momento fosse precioso demais para acontecer de longe.— Ayla, esse é Ethan. Meu único e melhor amigo… além de você. Ele sorriu, mas seus olhos ficaram úmidos. — Vocês se conheceram na sua vida passada. Ele me ajudou quando perdi a memória, me deu abrigo, ficou ao meu lado nos meus piores dias. O tempo passou apenas pra ele… espero que aguente mais uns anos.Estiquei minha mão, mas Ethan não a segurou. Ele me puxou para um abraço, forte, acolhedor, verdadeiro. Um nó se formou na minha garganta. E lágrimas brotaram sem que eu conseguisse impedir.Eu me
AZRAEL ..Quando Ethan abriu aquele sorriso ao ver Ayla, algo dentro de mim se aqueceu. Eu conhecia aquele sorriso. Era o tipo de sorriso que ele só dava quando via algo raro, algo precioso. E ver Ayla nos braços dele, sendo envolvida num abraço tão puro, me desmontou por dentro.Ela não se afastou. Pelo contrário, se entregou àquele gesto. E naquele instante, eu percebi que os dois corações reconheciam algo que talvez nem a lógica humana fosse capaz de explicar: eles já se conheciam… de outra vida.Eu não disse nada. Só observei. E senti.Quando Ayla agradeceu a ele por ter cuidado de mim, por ter me abrigado quando nem eu sabia quem eu era, minha garganta apertou. Eu lembrava de cada segundo daquela fase sombria, dos dias em que eu vagava sem saber meu nome, sem saber por que meu peito doía tanto. Ethan me acolheu como um pai, como um irmão, como... como o último elo que me mantinha firme.E agora, vê-la ali, viva, me olhando com aquele amor nos olhos, dizendo que eu não precisav