3. O Novato

“Amar é cuidar do outro sem anular a si mesmo.” (Augusto Cury)

Laura

Vou buscar a Flora na casa da dona Dissaura e, como era de se esperar, ela está dormindo. A trago nos braços e, assim que chego em casa, a coloco na cama. Depois, volto para a sala, onde meu pai está deitado no chão com duas garrafas de bebida ao lado. O acordo e o ajudo a sentar no sofá. Em seguida, entrego-lhe a quentinha para que coma, mas ele está tão bêbado que mal consegue levantar a colher. Então, dou a comida para ele e, logo depois, ele adormece novamente no sofá. Pego uma coberta no meu quarto, tiro seus sapatos, suas meias e o cubro. Fico o observando por algum tempo, e algumas lágrimas rolam dos meus olhos ao relembrar como tudo era diferente quando mamãe estava conosco. Apesar das dificuldades, éramos uma família unida e feliz. Agora, tudo o que vejo é tristeza, dor e meu pai se auto destruindo pouco a pouco. Será que nunca mais voltaremos a ser felizes?

Me aproximo dele, dou um beijo em sua testa e vou para o meu quarto.

Já no quarto, fecho a porta e começo a tirar minha roupa. Recolho tudo e sigo até o banheiro para tomar banho. Agora, de banho tomado, vou até o armário pegar uma camisola, mas, assim que aproximo a mão do meu rosto, sinto o cheiro do Álvaro, que parece ter grudado em minha pele. Como uma menina boba, fico cheirando e lembrando do momento em que ele me beijou. Aquele olhar ficou na minha mente. Por um instante, até gostei do que as meninas fizeram, porque assim pude conhecê-lo. Ele foi muito gentil comigo; outro, em seu lugar, teria chamado a polícia para me deter ou, no mínimo, me dado uma pilha de louça suja para lavar. Mas ele, não. Foi amável e até se preocupou comigo. Álvaro foi um anjo que Deus colocou em minha vida, e espero que, algum dia, eu possa agradecê-lo por tudo o que fez por mim nesta noite.

Será que foi obra do destino? Será que o nosso encontro já estava predestinado?

Fico pensativa, mas logo decido dormir. Afinal, quem se interessaria por mim? Pobre, desajeitada e com um pai alcoólatra. São problemas demais para uma única pessoa, e homem nenhum iria querer carregar esse fardo nas costas.

A melhor coisa que posso fazer é dormir, enfrentar minha realidade e parar de sonhar com o príncipe encantado. Afinal de contas, eles não existem.

[...]

Na manhã seguinte, preparo a Flora para ir à escola. Meu pai já saiu antes do galo cantar, como sempre. Deixo-a na escola e, em seguida, vou para a minha. Estou cursando o último ano do ensino médio e, se Deus permitir, em breve estarei na faculdade de psicologia. Ao chegar, tenho o desprazer de ver as três donzelas sonsas vindo na minha direção.

— Laura, me desculpa por ontem — diz Mônica, com a maior cara de pau.

Não dou atenção a elas e continuo caminhando para a sala, mas, insatisfeitas com o que fizeram, insistem em me seguir.

— Laura, você tem que nos escutar! Você é nossa amiga — fala Bia.

Na mesma hora, paro, cruzo os braços e a encaro com raiva.

— Ah, então eu tenho que escutar vocês? Agora sou sua amiga? Mas ontem, na hora de me abandonar sentada naquele restaurante, passando vergonha, vocês não pensaram nisso. Me humilharam sem pensar duas vezes! — falo, aumentando um pouco o tom de voz devido à raiva.

— Ah, Laura, amiga! Sei o quanto erramos com você, mas, olha, foi um caso de urgência. Meu pai me ligou dizendo que minha mãe estava passando mal, e eu nem lembrei de você, eu juro! — diz Mônica, com seu deboche de sempre.

— Ah, conta outra, vai! Vocês tentaram me fazer de idiota, mas isso nunca mais vai acontecer. De "amigas" como vocês, eu quero distância!

Mônica me olha com cara de choro, mas isso pouco me importa. Tudo o que menos preciso é de falsidade ao meu redor.

— Ai, amiga, você não se põe no meu lugar? Imagina se fosse sua mãe. Você não ficaria sem ação numa situação dessas? — diz ela.

— Não toque no nome da minha mãe nunca mais! Ouviu, cretina? — falo, apontando o dedo no rosto dela, que começa a chorar feito uma bezerra desmamada.

Ela que se dane. Me fez de palhaça, e, se não fosse pelo Álvaro, sabe-se lá Deus o que teria acontecido comigo.

Dou alguns passos para me afastar delas, mas Mônica segura meu braço e diz:

— Me perdoa, Laura! Nós erramos, mas isso nunca mais vai acontecer. Eu juro! — fala com a voz embargada, segurando meu braço com uma mão enquanto a outra está virada para trás.

Reviro os olhos, penso, repenso e, ao ver que ela realmente está prestes a chorar, acabo acreditando em suas palavras. Devo ser uma tonta mesmo por ainda dar oportunidade para essas cobras.

— Tá bom... Dessa vez vou perdoá-la.

Então, elas pulam e me abraçam.

— Ai, amiga, você sabe que jamais faria algo assim de propósito com você, jamais! — diz Mônica, e eu finjo que acredito.

Em seguida, ela nota um carro chegando ao estacionamento da escola e volta a ser a mesma de sempre.

— Ai, meu Deus! O que é aquilo?

— Nossa, que carrão, hein! Quem será? — comenta Beth.

Logo depois, Wallace, nosso colega de classe, chega e vem em nossa direção.

— Wallace, quem é esse no carro? — pergunta Bia.

— Ah, deve ser o cara novato! Chegou agora na cidade — responde ele.

— Ai, meninas, rápido! Olhem meus cabelos e vejam se estão bem. Minha maquiagem está certinha? — pergunta Mônica, eufórica.

— Claro, amiga, você sempre arrasa — respondem as duas torres gêmeas.

— Toma, Laura, leva nossas bolsas. Vamos ali receber esse deus grego! — diz Mônica, jogando a bolsa nos meus braços.

Propositalmente, deixo-a cair no chão e ainda piso em cima.

Como se fossem celebridades, elas saem em direção ao carro. O rapaz nem desceu ainda, mas elas sempre agem assim com os garotos novatos, principalmente se forem bonitos e ricos. Como não gosto de me envolver nisso, vou para a sala, pisando mais uma vez nas bolsas e deixando aquelas imbecis para trás.

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