AliceJoel parecia ler meus pensamentos e com sua voz firme fala:— Não, aqui não tem um restaurante, mas tem uma comida deliciosa. Vem comigo. — Joel já fora do carro abre a porta do carona e estende a mão em minha direção. Mesmo assustada e temerosa, confio nele e o sigo. Entramos no elevador e subimos até a cobertura. Eu ainda estava estranhando todo aquele mistério, mas fiquei em silêncio, pois eu confiava no Joel, afinal ele nunca fez algo de errado para perder a minha confiança. A porta do elevador é aberta e ficamos de frente com a entrada de um apartamento. Encaro para Joel e falo:— O que estamos fazendo aqui, Jô? Pensei que fossemos numa lanchonete ou até em um quiosque na praia. — falo desacreditada — Acha mesmo que na nossa primeira chance de passar um tempo juntos eu te levaria para comer em qualquer lugar? — Então, não entendi. De quem é esse apartamento?Ao perguntar Joel abre a porta e sorrindo fala:— Bem vinda a minha nova casa, me mudei ontem, e você é a minha pr
Joel AraújoSou o típico cara tímido, e que ao mesmo tempo, é um amigo para todas as horas. Tenho dificuldades de me relacionar com as mulheres, primeiro pela timidez e segundo pelo medo de ser rejeitado. Nunca tive muitas amizades, as únicas que conquistei foram Damares e Alice, que carrego dentro do meu coração aonde quer que eu vá. Damares é uma grande amiga e a irmã que nunca tive. Já a Alice é a mulher mais perfeita que conheci nessa vida e a dona do meu coração. Nos afastamos desde o ginásio, ela teve que acompanhar a família para Minas Gerais, onde conseguiram um emprego de caseiro, e eu fiquei aqui no Rio de Janeiro distante e com uma saudade imensurável dela. Até tentei manter contato, mas ela ficou incomunicável e minha vida também estava tomando outro rumo... Entrei na Universidade da USP para cursar Psicopedagogia e depois Educação Física. Me aprofundei em meus estudos com o único pensamento, oferecer o melhor para a mulher que tanto amava. Os anos se passaram e quando Da
AlicePG continuava perdendo muito sangue e cada vez mais a possibilidade dele sobreviver diminuía. Ainda não sabia a razão por esse sangramento e isso só aumentava a minha aflição. Eu estava desesperada e sem saber o que fazer. Presa dentro daquele carro, com a roupa lavada de sangue, tudo o que eu conseguia fazer era implorar à Deus por sua misericórdia. Seu semblante era pálido, mas seu corpo ainda estava quente e seu pulso estava fraco, quase imperceptível. O sujeito que estava atrás do volante dirigia como um louco e não parava de subir e descer o morro fazendo várias curvas. Aquilo estava estranho, porque o posto de saúde ficava logo na entrada da comunidade e com o tanto de volta que já tinha sido feita já éramos para estar lá e PG sendo atendido. Percebendo que algo de errado estava acontecendo por ali, impaciente e aflita decido falar. — Pra onde vocês estão indo? — pergunto nervosa e não ouço resposta, mas não me dou por vencida — PG precisa chegar ao hospital o quanto ante
Alice O tempo não parava de correr e com ele aumentava a minha aflição. Eu não sabia exatamente que horas eram, mas era evidente que faltava muito pouco para amanhecer. Eu sequer havia pregado os olhos, mas naquele momento tudo o que eu menos tinha era sono, parecia que a adrenalina do meu corpo havia jogado o cansaço para bem longe. O doutor se preparava para iniciar a cirurgia, mas o pavor em seus olhos era visível e deixava bastante claro que aquela era a primeira vez que passava por algo assim. Naquela sala minúscula, além do PG, só estavam o médico, Nocaute e eu. Ainda não conseguia acreditar que tudo aquilo estava realmente acontecendo, minha ficha ainda não tinha caído e eu me imaginava vivendo uma cena de filme. Homens fortemente armados cercando todo o barraco, o chefe do morro baleado e com grandes chances de morrer. Um médico trêmulo com medo de algo dar errado e ele pagar com a própria vida pelo erro cometido. E eu ali, parada com a roupa lavada de sangue, com os olhos a
AliceMais agitada do que nunca, sigo meu caminho e dou passos firmes em direção à casa da dona Olga. Estava com a roupa lavada de sangue e precisava urgentemente tomar um banho para ir trabalhar. Mesmo sem ter tido tempo para descansar, eu preciso cumprir com minhas responsabilidades, e a creche era uma delas. Com as mãos nos bolsos da minha calça e pensativa caminho por algum tempo. As ruas da comunidade já estavam movimentadas, moradores descendo para iniciar mais um dia de trabalho e outros subindo após longas horas trabalhando a noite. Os comerciantes pouco a pouco abrindo suas portas para mais um dia agitado. Eu continuava a minha caminhada, cumprimentando alguns e sendo observada por outros. Estava distraída e sequer percebo que tinha alguém ao meu lado seguindo meus passos, até o mesmo abrir a boca e quase me matar de susto.— Sobe ai mulher maravilhaque te deixo em casa. Era Nocaute em cima de uma moto, sem camisa e com sua arma à mostra.— Que susto! Quer me matar? — falo
AliceSem responder a minha pergunta, Joel fica de pé, e com passos rápidos se aproxima de mim. Seu olhar era de espanto, com toda certeza por ver o estado que eu me encontrava, sem falar na minha roupa que estava imunda. Mas algo estava estranho, primeiro pelo fato dele estar aqui tão cedo e segundo pelo seu olhar que a princípio era assustado, mas logo depois ficou distante, e confesso que isso não me agradou e muito menos me trouxe boas sensações. Só espero que minha intuição esteja errada, assim não corro o risco de ter problemas por um bom tempo, porque minha cota de aborrecimentos e estresses já tinha ultrapassado o nível máximo nesses últimos dias.Tento fechar a porta e entrar em casa, mas sou impedida por Joel que fala:— Você está bem, princesa? — Joel pergunta aflito segurando a minha mão e ao mesmo tempo com o olhar examinava o meu corpo de cima abaixo — Sim. Estou bem, na medida do possível. — respondo sem ânimo e um pouco preocupada com a situação do PG. Enfim consigo
AliceDeixo o cartão em cima da pia do banheiro e entro no box para tomar um banho. Enquanto a água fria caía sobre meu corpo, eu tentava esquecer as imagens difíceis e todo medo que senti nessa madrugada. O som dos trovões seguido pelo estrondo da queda de PG, ainda ecoava em minha mente, e a sensação de impotência diante do sofrimento dele me assombrava. Fechei os olhos, deixando que a água levasse embora a angústia e a sujeira, mas sabia que algumas manchas não se apagam com facilidade.Após o banho, procurei por uma roupa para ir trabalhar, mas tudo o que eu tinha era uma blusa branca de algodão, então o jeito era ir até o quarto da Damares e usar alguma roupa dela. Não vejo a hora de receber o meu pagamento e assim poder comprar algumas coisas pra mim, porque ficar usando roupas da Damares para sempre não dá. Não que ela se queixava, muito pelo contrário, desde o início me recebeu de braços abertos, mas nada é tão maravilhoso do que pouco a pouco ir conquistando as coisas pelo pr
Alice— Oi, Alice! Como você...Não o deixo terminar.— Eu perguntei, o que você faz aqui? — falo seria, fria e pausadamente, para que ele pudesse compreender de uma vez por todas, que tanto a sua presença quanto a de seu irmão não eram bem vindas nem aqui ou em outro lugar que eu estivesse presente.Se tratava do Rubens, tio da Sophia e irmão do tal Saulo, que era uma das pessoas que eu não gostaria de ver na minha frente em momento algum. Ele estava encostado no carro e caminha em minha direção tentando compreender o que estava acontecendo. Mas ele chegou no pior momento da minha vida, eu estava exausta tanto fisicamente quanto emocionalmente e psicologicamente, portanto conversar com um desconhecido estava totalmente fora das minhas possibilidades. Odeio ser grosseira com quem quer que seja, mas tem momentos, como esse, que precisamos mostrar o nosso pior lado ou então as pessoas não entendem quando estão sendo inconvenientes. E esse era o caso do Rubens, que já estava se tornando