Harvey tinha razão em dizer que estes eventos eram chatos. Passei os últimos 40 minutos ouvindo homens falar sobre negócios, contar piadas sem graça, e observando suas esposas, que pareciam mais acessórios do que acompanhantes.De vez em quando, elas se afastavam, formando seus próprios grupinhos para fofocar. Era óbvio, o círculo de amizade perfeito para mulheres como aquelas: muitas com procedimentos estéticos, vestidos exuberantes e sexys. E eu ali, como uma fuga para o meu namorado. Pelo menos, me confortava saber que não era como elas. Ainda assim, devo confessar que aquilo me dava sono.O salto alto apertava meus dedos e machucava o calcanhar. O vestido não me incomodava tanto, mas eu me sentia exposta. Minha amiga estava certa: eu tinha curvas, mas nunca havia me acostumado a mostrar tanto.Minhas roupas normais eram sempre largas, estilo adolescente rebelde ou de alguém deprimida. E, apesar de eu me sentir assim muitas vezes, hoje eu só queria ir embora.Me dei conta de que es
PovSamanta parou a uma certa distância, longe das pessoas do evento, do barulho, que até era bem-vindo, a distraindo da sua realidade. Tudo o que ela mais desejava aquele momento era esquecer.Ela usou sua experiência de anos para controlar o que sentia. Pelo menos externamente. Ao fechar os olhos, se imaginou debaixo d’agua, em um completo vazio, sendo rodeada apenas pela sensação de estar se afogando, contudo, isso não era tão ruim. Na verdade, era acolhedor. Ser abraçada e confortada, mesmo sendo uma presença ameaçadora.Aquilo era a sua mente. Ela não tinha com o que se preocupar. Se existia algo que pudesse a machucar, estava dentro da sua mente, não fora.A menina amedrontada surgiu do nada, ao ouvir as palavras de Mary Ann. Jamais pode imaginar que algo assim pudesse acontecer. Uma parte, lhe dizia para acreditar na mera fantasia. Mary era sua mãe. Ela nunca a abandonou, mas sim foi forçada a isso.Entretanto, essa versão era tão absurda que ela optava por ignorar, rindo de si
SamantaEra bom acordar com a sensação de que eu não estava sozinha naquela cama enorme. Claro, ela não era minha, mas fazia parte da minha vida agora. Era reconfortante ouvir alguém ao meu lado, alguém que se importava, perguntando por que eu estava tão estranha. Harvey era assim, perceptivo. Ele sabia quando eu precisava de espaço, quando minhas próprias sombras me dominavam. E ele respeitava isso, nunca forçava, apenas deixava claro que estava ali, ao meu lado, em silêncio.Jamais imaginei encontrar alguém assim. Harvey foi uma surpresa, uma dessas que você nunca espera, mas que secretamente deseja a vida inteira. E eu estava amando ter essa surpresa. Com ele ao meu lado, eu me sentia capaz de qualquer coisa.Mas, ao mesmo tempo, algo dentro de mim insistia que eu não estava sendo suficiente para ele. Era uma culpa que me corroía. Como alguém podia se doar tanto e não receber de volta na mesma medida?Eu o amava, e amava tanto que era difícil até explicar. Mas abrir-me completamen
SamantaNosso início de manhã foi melhor do que eu esperava, especialmente depois da noite anterior. Ao tomarmos café, tudo parecia tão perfeito, relaxado, tranquilo. A atmosfera era de pura calma, quase irreal, e por um momento me permiti acreditar que estava tudo resolvido. Mas a verdade é que ainda havia questões não ditas, e isso me incomodava.Porém, naquela manhã, eu me sentia confiante, pronta para falar. O café da manhã foi maravilhoso, e eu tinha que admitir: Harvey tinha um talento especial para a culinária, muito diferente de mim. Sim, éramos o casal perfeito à nossa maneira, mas eu sabia que poderia me esforçar mais. Não porque sentisse que as mulheres deviam cozinhar para agradar seus maridos, mas porque era algo pessoal. Ele se dedicava tanto a mim, que eu queria retribuir de alguma forma, mas isso ficaria para depois.Agora, havia algo mais importante para ser dito, algo que me fazia molhar os lábios de nervosismo. Cruzei os braços, buscando algum tipo de conforto naque
Aquela conversa foi reveladora. Harvey abriu os meus olhos, e ele tinha razão. Estava na hora de parar de ter medo. Eu sempre usei o medo e a fuga como uma capa de proteção, uma forma de evitar que o mundo me atingisse de novo. Enquanto me escondesse, ninguém poderia me machucar. Ninguém iria me usar como antes. Mas eu precisava deixar o passado onde ele pertencia. Ou melhor, precisava deixar os medos no passado. Era óbvio que tudo o que vivi me moldou e me trouxe até aqui. Mas agora eu já era adulta. Já tinha conquistado tanto. E não podia, simplesmente, perder tudo o que construí tão rapidamente.Este era Harvey na minha vida. Ele chegou para mudar completamente o conceito que eu acreditava ter. Ele protegia as minhas barreiras, mesmo que, de algum jeito, tivesse sido ele a derrubá-las. E o mais estranho é que não sei exatamente quando isso aconteceu. Quando foi que me apaixonei por ele? Tudo o que sei é que entrei naquele elevador, ficamos presos... e essa foi a melhor c
Voltei a andar no meio da calçada, minhas passadas firmes como se pudessem esmagar a indignação que crescia dentro de mim. Cruzei os braços, tentando manter o controle enquanto o calor subia pelo meu pescoço, fazendo meu rosto arder de raiva. De todas as pessoas do mundo, ela escolheu logo aquele homem. Não era como se ela não soubesse quem ele era — Adam, o mesmo Adam que eu passei os últimos anos reclamando, o mesmo que eu odiava com cada fibra do meu ser. Eu contei para ela, detalhadamente, cada provocação, cada vez que ele roubou uma ideia minha, cada promoção que ele me tirou das mãos.E agora... agora eu simplesmente a vejo, confortável, no sofá com ele. Não, não pode ser. Eu ainda estava em descrença, como se meu cérebro estivesse se recusando a aceitar o que meus olhos testemunharam. Isso não podia ser real. Eu devo estar sonhando. Não, pior. Isso é um pesadelo. Um pesadelo do qual eu não conseguia acordar.— Certo. Vamos tentar ficar calmos — falou Harvey
Ao voltar para casa, Harvey vinha atrás de mim, como um guarda-costas, me ajudando a subir os degraus da minha própria casa. Cada passo era uma luta, e enquanto eu subia, as lembranças voltavam à minha mente, aquelas que eu desejava apagar. Preferiria estar fazendo isso com qualquer outra pessoa no mundo. Qualquer um com quem eu tivesse ensaiado uma noite ou duas. Mas não Adam.Ele tocou a campainha, um gesto que eu deveria ter feito na primeira vez. Mas, como aquele lugar também era minha moradia, jamais imaginei que teria que tocar para entrar. Quando a porta se abriu, lá estava ela. Sua pele, suave e bronzeada, os cabelos bagunçados, mas desta vez presos no topo da cabeça. Graças a Deus, estava vestida.Eu a encarei, sentindo a raiva fervendo dentro de mim, um incêndio que poderia explodir apenas com o peso dos meus olhos. As memórias daquela noite tumultuada ainda estavam frescas, e a presença dela ali, tão tranquila, me incomodava mais do que eu queria admitir
SamantaHoje acordei cedo e saí de casa antes que Hope conseguisse acordar. Bem, ela nunca dormia até muito tarde, o que significava que eu realmente havia levantado cedo demais. Ainda não tinha processado tudo o que aconteceu na noite passada, e a ideia de olhar para o rosto dela só me trazia de volta todos aqueles sentimentos confusos. Passei as primeiras horas da manhã vagando pelo parque, com a cabeça cheia, incapaz de focar em uma única coisa. Minha possível mãe, Adam, o emprego, Harvey, a empresa... era como se tudo se misturasse, um turbilhão que fazia meu peito palpitar de ansiedade. A sensação de que eu estava prestes a explodir me acompanhava a cada passo.Coloquei meus fones de ouvido, tentando focar na música. Talvez isso ajudasse. Quando finalmente olhei as horas, percebi que era hora de pegar o metrô. Caminhei até a estação mais pró