A conversa, que acabei ouvindo por acidente, ficou impregnada em minha mente durante parte da noite insone que acabei tendo, queria que meus pais sentassem comigo e conversassem a respeito da situação. Eu já não era mais uma criança, e sentia que poderíamos mudar o rumo das coisas caso não omitissem tanto de mim. Alguns poucos dias se passaram desde o pronunciamento da polícia, inicialmente, foi feita uma assembleia com os pais e o corpo escolar, queriam que as aulas fossem suspensas, porém, o período de relativa tranquilidade acabou por animar um retorno às aulas. Obviamente, as medidas e regras de segurança aumentaram paulatinamente, a sensação de insegurança ainda estava presente, mas precisávamos seguir em frente. Sentei-me diante da mesa, abrindo o caderno no componente daquela aula e distrai-me rolando o lápis entre os dedos, perdendo-me em pensamentos rapidamente. As duas moças assassinadas consecutivamente retornaram a minha cabeça, eram adolescentes e tinh
Quando cheguei à casa de Mark, um complexo de apartamentos recém-construídos e onde inclusive meu pai havia auxiliado na produção da planta, parei em frente à porta da entrada, retirando meus sapatos e enquanto desafivelava o detalhe da sandália do pé esquerdo, deslizei os dedos pela planta do meu pé, sentindo uma longa e antiga cicatriz, o fitei melhor e notei que era o resultado do machucado que lembrava-me em meu sonho. Meu estômago se revirou ao perceber que aquilo realmente não havia sido um sonho e senti vertigem, percebendo que, na verdade, aquele pesadelo terrível era uma lembrança que tentei, inconscientemente, esquecer. Aquilo estava tão escondido em minha mente que se não fosse a cicatriz deixada pela pedra afiada, eu jamais teria percebido que aquilo realmente havia acontecido. Contudo, não pude comentar a respeito pois, me deparei com uma cena no mínimo inusitada em frente a porta de entrada, dona Emere, a mãe de Karen, estava discutindo de form
E novamente, a ansiedade resultava em uma insônia persistente, que me tomava com força e impedia de ter uma noite decente de sono, meus olhos secaram rapidamente e não demorou muito para os hematomas na perna atingida pelo carro começassem a doer, aparentemente, os medicamentos anti-inflamatórios estavam perdendo o efeito. Minha mente estava cheia de pensamentos confusos, e um amontoado de perguntas sem resposta mantinha-me acordada. Em parte, a explicação de Karen retirou um pouco do peso em meu peito, não parecia ser algo tão ruim como meus pesadelos faziam parecer, mas imaginar que minha amiga tivesse algum tipo de dívida com uma entidade pagã, ainda me assustava um pouco. Enquanto os primeiros raios de sol da manhã surgiam, o cansaço já me fazia rir dos meus próprios desalentos. A verdade era que as tragédias na minha vida eram como tsunamis, formando-se silenciosamente sob a água e que, de repente, irrompiam em ondas violentas que destruíam cada pequena const
Na manhã seguinte, acordei com os primeiros raios de sol adentrando pela janela, iluminando o quarto e afastando os últimos resquícios da noite. Bocejei, me remexendo sobre os lençóis, olhei para trás e notei o semblante adormecido do meu namorado que ainda dormia abraçado à minha cintura. Observando-o, tão tranquilo,e notei o quanto ficava bonito sonhando, seus cabelos claros estavam bagunçados e os lábios entreaberto, ressonando baixinho. Sorri com o pensamento, me erguendo e caminhei em direção ao banheiro, precisava ao menos escovar os dentes antes que ele acordasse.Tomei um banho, me sentindo diferente do habitual e sorri para o meu próprio reflexo, feliz por todas aquelas marcas deprimentes terem sumido. Parece que depois da noite que tivemos, o poder que aquela entidade tinha sobre mim, sumiu momentaneamente e isso renovou minhas esperanças.Naquele momento, decidi que não deixaria que aqueles acontecimentos me deixassem louca, a boa sensação que sentia me mostrava que poderia
Enquanto caminhávamos de volta em fila indiana, passamos por uma pequena trilha por dentro do bosque onde algumas pessoas gostavam de correr com cachorros durante as manhãs de verão, era um ambiente amistoso e quase todos os moradores o frequentavam. Gabriel, ao meu lado, observava as árvores com um interesse estranho, seus olhos claros estreitavam-se como se procurasse por algo que mais ninguém estava vendo, e quando percebeu que estava sendo observado, voltou-se a mim.– Está vendo aquilo? – questionou em um cochicho, ainda esticando o pescoço para visualizar melhor o ambiente a nossa volta. – Parece uma moça acenando, mas não se aproxima, será que está machucada?Ouvi suas palavras ficando ainda mais confusa, desviei meus olhos dele e voltei minha atenção na direção em que ele indicava, mas não conseguia ver nada que parecesse com uma pessoa. As intenções de Gabriel eram óbvias, mas nos embrenhar na mata seria perigoso e se fossemos pegos, certamente receberíamos alguns esporros por
Foi a primeira vez que vi algo em plena luz do dia... – murmurei, apertando as mãos em um gesto nervoso, que já estava tornando-se um hábito perceptível. – Estive pensando em conversar com alguém que entenda mais sobre isso, uma médium talvez.Gabriel ouvia minhas palavras, balançando a cabeça positivamente, mas mantinha seus olhos fixos na estrada, apertando o volante com certa força. Na verdade, ele estava em silêncio desde que conversamos a respeito da falta de segurança daquele local, havia deixado claro a sua desaprovação com a minha ideia de continuar investigando sobre os assassinatos, argumentando o quanto aquele assunto era delicado e muito mais complicado do que eu imaginava.– Diz ser complicado, mas o que você sabe sobre isso que eu não sei? – questionei voltando a tocar no assunto e notei como seus músculos pareceram enrijecer, mas mantive meu olhar firme sobre ele, esperando uma resposta. – Está me escondendo algo?– Sarah, você não percebe que esse problema é muito anti
Não era uma época de grandes chuvas, mas mesmo assim, aquele temporal repentino durou mais três dias. Rapidamente, as ruas estavam alagadas e tínhamos que retirar a água que empossava no porão, infiltrando pelas paredes de tábuas antigas, começando a fazer alguns estragos. Parecia que quanto mais a umidade entrava na casa, mais seus segredos vinham à tona, como se estivessem escondidos sob o papel de parede que descascava. Às vezes, durante a limpeza, passava a unha do indicador pela casca amarronzada que cobria a madeira, notando que ainda era a mesma matéria prima de anos atrás, quando a casa foi construída, mostrando que a reforma foi feita apenas superficialmente e, agora, a podridão daquele local começava a se mostrar. Através das grandes janelas em modelo colonial, eu podia ver as nuvens cinzentas que cobriam o sol, mantendo a cidade em um eterno estado nublado e aos poucos, névoa começava a se formar, vinda do bosque. Era como se a escuridão causada pelas forte
Desabafar com a minha mãe tirou um grande peso dos meus ombros, sorri feliz por finalmente termos aquela conversa tão necessária e fui trabalhar cheia de esperanças, sentindo que enfim, as soluções estavam aparecendo na minha vida. Quando cheguei à clínica, empurrei a maçaneta e fiquei surpresa ao perceber que estava trancada, voltei meus olhos ao relógio e notei que passava das 8h da manhã, arqueei uma sobrancelha confusa e fitei o primeiro andar onde ficava o apartamento da doutora Samanta.“– Será que aconteceu alguma coisa?”, me perguntei, ficando inquieta e mordi o lábio inferior, temendo que ela tivesse sido machucada pelo assassino em série, balancei a cabeça, afastando aqueles pensamentos ruins e estiquei-me apertando a campainha duas vezes.Em seguida, peguei meu celular dentro da bolsa, mandei algumas mensagens para ela e enquanto esperava, voltei minha atenção à vitrine, ficando surpresa ao me deparar com um vulto que se movia dentro da clínica. Espacei as mãos no vidro e ar