Camila
A esposa de Henrique direciona seu olhar para nós com uma expressão confusa. Percebo que ele está tenso e não sabe o que fazer. Divirto-me internamente com a situação. Ela não pode ser tão idiota. Deve saber reconhecer uma mulher que acabou de ter um orgasmo de contorcer os dedos dos pés. Mas, ainda assim, decido testá-la:
— Muito obrigada — agradeço a Henrique. Ele me olha confuso e parece não entender. — Se você não me segurasse, eu teria caído. Acho que minha pressão baixou de repente — continuo dissimuladamente. Henrique parece finalmente entender a minha cena e entra também em ação:
— Não precisa agradecer — diz acenando de leve, tirando com relutância sua mão da minha cintura.
A esposa dele atenua a expressão. Aparentemente tentando convencer a si mesma de que seja essa a verdade. — Algum problema, Cristina? — pergunta ainda de costas para ela.— Você demorou... — explica hesitante. — Fiquei preocupada.
Merda. Ela realmente o ama. Nenhuma mulher que quisesse por um fim ao casamento acreditaria numa desculpa dessas. Inalo uma inspiração profunda e aliso o meu vestido, caminhando lentamente em direção aos corredores.— Você não vem, Henrique? — ouço-a perguntar.
— Espere um pouco, Cristina. Daqui a pouco eu te encontro na mesa — avisa num tom de voz tenso. Sorrio ao me dar conta do motivo de ele não se virar para ela. Henrique está completamente excitado e não seria nada convincente a nossa desculpa se sua esposa o visse nesse estado.
Visualizo minha mãe sentada sozinha em uma mesa, olhando algumas crianças que brincam ao redor do jardim. Caminho ao seu encontro e sento-me ao seu lado.— Pela sua cara já sei que acabou de ter um orgasmo daqueles — afirma mamãe dando um sorriso divertido.
— Sim — confirmo. — E fomos interrompidos pela mulher dele justamente quando eu iria retribuir.
— Camila... — começa a falar me olhando fixamente — Você sabe o que precisa fazer.
— Sim, eu sei. Mas é difícil abrir mão de uma boa foda.
— Não me venha com essa! Você não está fazendo isso apenas pelo sexo — indaga firmemente. — Você sabe que ele é casado. Notou, assim como eu, que a mulher dele o ama. E como se não bastasse, é filho daquela mulher horrível!
— Eu sei, mamãe. Vou resolver isso. Henrique está ocupando muito meus pensamentos... Não deveríamos ter ido além daquela noite. Aliás, aquela noite nem deveria ter acontecido.
— É o melhor, querida. Para vocês dois — conforta-me colocando sua mão esquerda sobre a minha. — Você está se apaixonando, e isso não é bom.
— Eu não estou me apaixonando! — respondo com veemência. — Eu não me apaixono.
— Você não se apaixonava — corrige ela. — Eu conheço você, minha filha. Você jamais passaria por cima dos seus ideais se não estivesse gostando desse Henrique — Solto um suspiro pesado e não a respondo. — Você sabe que digo isso para o seu bem. Só quero vê-la feliz — elucida apertando minha mão e a beijando.
— Eu sei — assinto retribuindo o beijo em sua mão.
— É muita coragem sua vir até aqui! — esbraveja uma voz atrás de mim. Mamãe transforma seu sorriso numa linha dura e levanta-se, me trazendo consigo. Fico ao lado dela e ergo os meus olhos para ver de quem se trata. A mãe de Henrique.
— Boa tarde para a senhora também — replico tentando manter o meu controle. Cristina vem logo atrás, claramente constrangida pela atitude da sogra.
— Não me venha com essa! — retorque elevando o tom de voz, atraindo a atenção de algumas pessoas. — Você deveria se envergonhar de impor sua presença a essas crianças! Uma mulher como você não pode estar aqui!
— Uma mulher como eu? — questiono. — E o que seria uma mulher como eu?
— Uma prostituta!
— Eu não sou uma prostituta — respondo sem me alterar. — E ainda que eu fosse, isso não faria de mim alguém inferior.
— Mas é mesmo uma sem-vergonha! Você não tem respeito por ninguém?
— A senhora é que não sabe respeitar os outros! — replico, irritada. — Eu ajudo essas crianças. Faço isso por amor a elas, por saber que precisam de mim, e não é a senhora quem vai me impedir de fazer isso.
— Sua vagabunda!
— O que é isso, mamãe? — questiona Henrique aproximando-se de nós. — O que a senhora está fazendo?
— Estou colocando essa mulherzinha no lugar dela! — diz aos berros.
Minha mãe dá um passo a frente, mas eu a detenho com um braço.— O meu lugar é onde eu quiser — replico a olhando firme. — Não é a senhora quem tem poder sobre mim. A única pessoa responsável por minhas atitudes sou eu mesma — Ela me lança um olhar repulsivo e cospe próximo aos meus pés.
— Eu tenho é pena dos homens que frequentam aquele seu bordel. E mais ainda dos que se deitam com você — Direciono meu olhar para Henrique, mas ele se mantém quieto, sem dizer nada.
— A senhora deveria tomar cuidado com o que diz — aviso olhando diretamente para Henrique. — E não é um bordel, é uma Casa de Prazer — Dou as costas para ela e saio sem olhar para trás, segurando firme a mão da minha mãe.
— Você não sabe o esforço que fiz para não bater naquela mulher! — explode minha mãe quando chegamos ao carro.
— Sei sim. Foi o mesmo que o meu.
— Você tem que manter distância dessas pessoas, minha filha — pede acariciando o meu rosto.
— Eu vou, mamãe. Mas não sem antes ter minha pequena vingança contra Henrique.
— O que pretende fazer? — pergunta, aflita.
— Não gostei nada da sua covardia perante a mãe dele. Ele pagará por isso da melhor forma que eu conheço — explico com malícia na voz.
— Que seria? — pergunta mamãe com um sorriso nos lábios.
— Prazer, mamãe. O meu prazer.
~~•~~
Deixo minha mãe em sua casa e sigo para o meu apartamento. Durante um sinal vermelho, digito uma mensagem para Caíque pedindo para que me encontre em alguns minutos. Ele responde quase que imediatamente confirmando.
Entro no meu apartamento e vou direto para o banheiro, tirando minha roupa no caminho. Solto um suspiro ao sentir o contato da água fria contra a minha pele quente, e rezo para que ela seja o suficiente para aliviar minha irritação.Lido com mulheres como a mãe de Henrique o tempo todo. Mulheres essas arraigadas a valores e convenções sobre a conduta feminina que sempre fiz questão de manter longe da minha vida. Pessoas que usam dogmas religiosos para submeter e reprimir a liberdade da mulher. Tento ser indiferente, mas as vezes é difícil ouvir tantos absurdos calada. Para minha mãe também não é fácil. Eles a julgam e a acusam de não ter me ensinado a comportar-me como uma mulher de respeito. Eu agradeço todos os dias pela mãe que tenho. Pela liberdade que ela sempre me deu para fazer as escolhas que quis para a minha vida. Meu pai faleceu quando eu tinha doze anos e ela teve que ser forte por mim e por ela durante muito tempo. Sinto falta da época em que tia Malu viera morar conosco. Ela estava sempre com um sorriso no rosto e com um namorado diferente. Ela está há dois anos morando no sul do país com um homem que, segundo ela, é tudo o que sempre quis. Fico feliz por ela, mas triste por desde então minha mãe passar mais tempo sozinha naquela casa tão grande. Ela se recusa a vender o imóvel e nega todos os meus pedidos para que venha morar comigo.Saio do banho e vou até o meu closet, tirando de lá um conjunto de short e blusa monocromáticos em tom lilás e lingerie preta. Visto-me e calço um par de sandálias rasteiras, prendendo o meu cabelo num coque abacaxi no momento em que a campainha toca. Caminho até a sala e abro a porta, ganhando o vislumbre de um lindo homem e seu cabelo Black Power, que esbanja estilo e graciosidade.
— Oi, meu doce — cumprimenta Caíque puxando-me pela cintura e dando um beijo em meu pescoço.
— Oi — respondo envolvendo meu braço em seus quadris. Conduzo-o para dentro, fechando a porta atrás de mim.
— Preciso da sua ajuda — digo sentando-me ao seu lado no sofá.
— Conheço este olhar — fala sorrindo maliciosamente. — Estou até com pena do sujeito — ironiza tentando conter o sorriso.
— Não sinta — peço mordiscando os meus lábios. — Ele merece tudo o que pretendo fazer.
HenriqueMEUS olhos se mantêm fixos no trânsito à minha frente, e mesmo aos sinais vermelhos, evito fazer qualquer tipo de contato visual com Cristina.Adentro ao condomínio e paro o carro em frente à casa da minha mãe esperando que ela desça, mas ela não desce.— Você não vai descer também, Henrique? — pergunta mamãe. — Por que está com esta cara? Você não disse nada desde que saímos do evento.— Desça logo, mamãe! — peço ríspido.— Isso é jeito de falar comigo? Não foi essa a educação que te dei!— A senhora é a última pessoa que pode falar comigo sobre educação — digo com sarcasmo.— Ora, tudo isso é por causa daquela mulherzinha? — indaga lançando um olhar incrédulo para Cristina. — Ela precisava saber que não era bem-vinda ali.— Cale a boca, mamãe! — grito fazendo ela e Cristina saltarem no banco de trás. — A senhora não poderia ter dito aquelas coisas para Camila! Não pode dizer para
CamilaMEUS olhos se abrem preguiçosamente, tendo como primeira visão do dia o rosto sereno de Henrique, que ainda dorme ao meu lado. Não me recordo de em algum outro momento da minha vida ter acordado com um homem em minha cama. É estranho, e ao mesmo tempo, é muito bom.Deslizo meus dedos por sua barba, com cuidado para não despertá-lo. Algumas mechas onduladas caem sobre os seus olhos e eu as retiro. Ao contemplar sua face, sinto algo dentro de mim florescer. Nós mal nos conhecemos, e no entanto, é como se ele estivesse na minha vida desde o princípio.Um sorriso se desenha em minha face ao me recordar da noite que tivemos juntos. Ele fez exatamente o que disse que faria. Ele me comeu na cama, no banheiro, no chão e nas três mesas do quarto. Beijou-me com delicadeza e brutalidade, me masturbou e me proporcionou vários orgasmos vaginais somente por penetração.Henrique é um deus do sexo no sentido amplo do termo. Quase não deixou que eu o acaricias
HenriqueSÓ Deus sabe o quanto foi difícil para mim ouvir aquelas palavras de Camila. Porém sei que ela está coberta de razão. Não posso dizer que estou me apaixonando por ela e no entanto continuar casado com uma mulher por quem só nutro sentimentos de amizade e cuidado. Por que é tão complicado para mim por um fim a esse casamento? Por que Cristina continua comigo mesmo sabendo que eu não a desejo?Ligo o celular e a tela é tomada por mensagens de Cristina, querendo saber onde passei a noite. A última foi mandada há alguns minutos atrás dizendo que estava indo para a casa da minha mãe. Claro, o almoço de domingo.O sinal volta a abrir e eu me junto aos inúmeros veículos que dominam o tráfego do Jardim Paulistano. Ativo o sistema de voz do carro, sincronizado ao meu celular, e ligo para Marcone. Ele atende ao terceiro toque:— Eu disse a você, meu amigo — começa ele numa voz sonolenta —, você está literalmente de quatro por Camila.— Tod
HenriqueÉ quase cômica a distância que separa a casa da minha mãe da minha. A pé, o percurso não demoraria mais que dez minutos. Mas um leve congestionamento me tomou pouco mais de trinta minutos até chegar ao condomínio em que eu e Cristina moramos. Peguei somente algumas coisas que precisaria pelos próximos dias e saí antes que ela retornasse. Não queria ser confrontado por ela.Ter um escritório na Avenida Brigadeiro Faria Lima sempre foi um símbolo de orgulho para mim e Marcone. Não somente por ser um dos principais centros comerciais e financeiros de São Paulo, mas também por nosso escritório não ser apenas mais um na Avenida.Como era de se esperar, não havia nenhum funcionário além dos seguranças no escritório. Fui para a minha sala e adiantei a leitura de alguns processos e documentos que precisavam da minha assinatura, e depois, passei o resto da tarde em contato com corretores de imóveis. Agora, só me resta rezar para que Camila não imponha nenhum
CamilaAPRECIO a paisagem que me cerca através da janela do carro de Henrique. Tínhamos acordado às cinco da manhã para seguir sabe-se lá para onde. Se bem que acordar não é a palavra. Nós nos entregamos um ao outro por toda a noite. Estou ficando viciada. Tê-lo em minha cama, sentir o seu toque sobre a minha pele, a maciez de seus lábios, a sensação de completude quando ele investe fundo em mim... Eu estou me viciando nele. Só não sei ao certo se isso é bom ou ruim.Henrique para o carro em frente a um chalé, com sua fachada em pedras marrom. Ao redor, somente as árvores e as montanhas ao longe são testemunhas do nosso esconderijo. Ele desce do carro, faz a volta e abre a porta para mim.— Obrigada — agradeço apoiando-me na mão que ele estende para mim. — Então este é o seu plano? — pergunto colocando minhas mãos em volta da sua cintura. — Passarmos duas semanas neste lugar maravilhoso sem ninguém para nos atrapalhar?— Sim — responde puxando-
HenriqueO ipod de Camila reproduz uma canção alegre e dançante que domina toda a suíte. Saio do banheiro com uma toalha envolvendo os meus quadris e a encontro vestida numa camisa social branca minha, rebolando com os braços estendidos para cima no ritmo da música. Já tinha percebido o quanto Camila adora dançar. Sempre está ouvindo alguma batida envolvente e sensual. Ela se volta em minha direção e me lança um olhar lascivo. Fica de lado e coloca as mãos sobre os joelhos, remexendo os quadris lentamente em movimentos de vai e vem. Libero um suspiro pesado e percorro as mãos por meu cabelo molhado. Mal acabamos de ter a transa mais apaixonada entre nós dois e eu já estou louco de tesão por ela.— Vem aqui — pede num sussurro, estendendo sua mão para mim. Pego minha mão na sua e a abraço por trás. Ela roça sua bunda em minha pélvis sem o menor pudor. Coloco minhas mãos em seus quadris e começo a acompanhar o seu ritmo, a trazendo ainda mais para mim. Passo minha lí
CamilaVIRO meu corpo de lado e contemplo a beleza do homem que está deitado comigo na cama. Depois da foda insana que tivemos, dormimos, completamente exaustos. Olho para fora da janela e percebo que já está quase anoitecendo. Faço um esforço e levanto-me da cama devagar para não acordá-lo.Abro minha mala e pego um short moletom cinza, blusa de algodão com mangas branca e calcinha preta. Visto-me e apanho na bolsa meu elástico, prendendo meus cachos num rabo de cavalo frouxo. Calço minhas sandálias rasteiras e saio do quarto com o máximo de cuidado possível para não fazer barulho.Da varanda é possível apreciar o belo e confuso contraste de cores alaranjadas no céu, assemelhando-se a como se tornou a minha vida desde que Henrique apareceu. É errado, eu sei. Estar com ele vai contra a tudo que acredito. Mas eu não posso ser hipócrita. Estar ao lado de Henrique me faz bem. Eu estaria mentindo se dissesse o contrário. Claro, quando esta viagem chegar ao fim eu
HenriquePRESSIONO minhas mãos sobre a bunda de Camila e a trago para ainda mais perto de mim, passando minha língua por sua clavícula e distribuindo beijos em seu pescoço. Ela joga a sua cabeça para trás, facilitando o meu acesso.Não é somente o sexo que nos une. Na verdade, acredito que nunca foi. Nós não teríamos ido contra a tudo que acreditamos se não houvesse sentimento desde o início. Até porque eu também estou fechando os meus olhos para muitas coisas. Eu fui criado para ter uma única mulher e ser completamente fiel a ela. Uma mulher que correspondesse às expectativas da minha mãe, que seguisse os preceitos da nossa religião, e principalmente, vivesse em função da família. Não achava essas coisas corretas, mas também nunca contestei nada. É desse modo que minha mãe sempre levou sua vida e a mãe de Cristina também. Elas me pareciam felizes desse jeito, então por que contestar? Mas estando agora com Camila e vendo sua determinação em seguir sua vida da forma co