Olhei pela janela e vi que o céu estava um pouco mais escuro.
— Parece que vai chover — falei mais para mim do que para ele.
— É mesmo, o tempo aqui é sempre estranho — o homem me olhou pelo retrovisor.
Não gostei muito do que percebi em seus olhos. Me senti incomodada com ele sempre olhava para trás, mesmo que eu não estivesse dizendo nada.
— Vou pegar um atalho — ele falou me tirando de meus devaneios.
— Não precisa, não estou com pressa — falei o mais rápido que pude — Por favor, continue no caminho sugerido pelo aplicativo — ele sorriu pelo retrovisor.
Seus olhos eram negros e sua barba serrada. Os óculos de armação preta o faziam parecer inofensivo, mas estava começando a achar que tinha me colocado em uma enrascada.
— Você vai ver, docinho, vamos chegar bem mais rápido — o carro virou em outra direção e o pânico se instalou em meu peito.
— Senhor, pare o carro, eu não vou continuar essa corrida. — falei olhando para meu celular e printando a tela com as suas informações.
— Não se preocupe com nada — seus olhos estavam ainda mais desejosos vendo o meu desespero.
Voltei a olhar meu celular e a única pessoa em que pensei para me socorrer foi Drake.
Que Deus me ajudasse e ele estivesse com o celular nas mãos.
Mandei o print, minha localização em tempo real e um pedido de socorro.
— O que está fazendo? — o homem parou em um semáforo e virou para trás. Tentei puxar a maçaneta, mas estava trancada. — Me dá esse celular aqui.
— Não, o senhor está louco. Me deixe sair — tentei esconder o aparelho em minhas costas, mas o homem foi mais rápido e o pegou de minhas mãos.
— Isso fica comigo agora — o sorriso diabólico que ele exibiu me assustou ainda mais e comecei a chorar.
A pista por onde ele trafegava estava vazia e não conseguia chamar a atenção de ninguém.
Comecei a rezar esperando que um milagre acontecesse e Drake conseguisse me achar.
O homem avançou por uma parte mais afastada e jogou meu celular pela janela me fazendo chorar ainda mais. Agora Drake nunca me acharia.
— Não chore, docinho, você vai gostar do que vamos fazer — eu tinha vontade de vomitar.
Deitei minha cabeça sobre as pernas chorando e tremendo. Clamando a Deus por misericórdia. Como eu poderia estar atraindo coisas tão ruins em minha vida?
— Mas que porra é essa? — ouvi o homem dizer e parar o carro bruscamente. — O que é isso? — Levantei minha cabeça e vi o homem com as mãos para cima. Olhei a sua frente e vi Drake parado na frente do carro com uma arma apontada para ele.
O homem destravou a porta e a abri em desespero tropeçando e caindo logo em seguida.
— Calma, estou aqui — Drake me pegou no colo e chorei de alivio. — Ele tocou em você? — sua fala era urgente e neguei com a cabeça ainda chorando — Fique no carro, vou resolver isso. — ele me colocou delicadamente no banco e fechou a porta.
O vi voltar imponente até onde o homem estava com Mau e Mor o segurando.
Drake desabotoou o blazer e o tirou, jogando para o lado. Ele parecia dizer alguma coisa que eu não conseguia ouvir e vi os olhos do homem se arregalarem. O vi soltar os braços de forma graciosa e desabotoar os punhos, e enrolar a camisa até o antebraço.
O primeiro soco foi direto no estomago, o segundo no rosto fazendo o homem gritar de dor.
Meus pelos se arrepiaram com a cena, parecia que eu estava vendo tudo de novo, mas agora era Drake de desferia todos os golpes. O homem implorava para que ele parasse, mas issó só o instigava a bater mais nele.
Mau e Mor riam de alguma coisa que Drake disse e continuou a bater mais no homem até que ele ficou desacordado, com a cabeça pendurada para o lado.
O homem que dirigia o carro de Drake foi em sua direção com uma toalha e entregou a ele. Depois destampou uma garrafa e jogou água em suas mãos e ele as lavou e molhou um pouco da toalha para limpar o rosto. Indo em seguida em direção ao blazer e entregando tudo para o motorista.
Drake se virou para o carro onde eu estava e me sentei na outra extremidade com medo.
— O que é você? — falei assim que ele abriu a porta e se sentou.
— Eu? — ele não entendeu minha pergunta. Eu estava chorando muito. — Porque está assim, está segura agora, não precisa mais se preocupar.
— Você matou aquele homem? — apontei tremendo.
— Não! — ele falou sério — Por mais que ele merecesse.
— Por que não chamou a polícia?
— Você ligou para mim ou para a polícia?
— Drake, o que você é? — ele riu de lado.
— Achei que a essa altura já tivesse entendido. — ele tentou pegar minha mão, mas puxei de volta.
— Não entendi nada, você quase morreu a duas semanas e agora quase matou aquele homem. Vive com esse monte de seguranças a sua volta. Você é um gangster, traficante, algo assim? — meu coração batia nos meus ouvidos.
— Quase isso, mas saiba que não vou fazer mal a você — ele se aproximou. — Deixa eu te mostrar quem eu sou — meus olhos se arregalaram — Você vai entender tudo se me der essa chance — como eu diria não a ele? Ele acabou de me salvar.
— Tudo bem — respirei fundo e olhei para o outro lado intimidada com seus olhos sobre mim.
O motorista voltou para o carro e nos tirou dali. Mor e Mau não nos acompanharam.
— O que vai fazer com ele? — perguntei olhando para trás.
— Nunca mais ele vai encostar em uma mulher sem a autorização dela — ele fechou as mãos em punho.
— Senti tanto medo, nunca passei por nada assim. — sua mão segurou a minha — Achei que não chegaria a tempo.
— Fico triste por saber que possui tão pouca fé em mim — seu sorriso era brincalhão.
— Não é isso. — tentei me explicar — Enquanto meu celular estava comigo, eu tinha certeza que você chegaria, mas depois que ele o jogou pela janela, você não tinha mais a minha localização. Achei que quando me achasse ele já teria... — não consegui terminar a frase.
— Eu estava rastreando o celular dele, não o seu — o olhei sem entender — Imaginei que ele faria algo assim.
— Como teve acesso? — ele apenas sorriu e não explicou.
Paramos em um lugar deserto e outros carros estavam parados ali, todos pretos. Cinco de um lado e cinco do outro. Pelo que eu percebi, eles estavam esperando apenas Drake chegar.
Do outro lado da pista os homens começaram a descer e reconheci os três que bateram em Drake.
— Oh meu Deus, são eles. São os homens que te espancaram — olhei alarmada.
— Eu sei .
— Sabe? Como assim sabe? O que estamos fazendo aqui?
— Isso é o que eu sou. Faço parte da Familgia Unità. — nunca tinha ouvido falar sobre isso — Somos uma família italiana com bastante influência no Brasil.
— E o que isso tem a ver com eles?
— Nós todos fazemos parte da mesma família, mas não nos entendemos tão bem. Queremos ser o próximo padrinho. — meu olhar deveria ser um ponto de interrogação. — O padrinho é o chefe de tudo. Hoje eu lidero somente a Cacciatore. E aqueles ali são os Orrore. Nós dois queremos ser o próximo na liderança geral.
— Então isso é tipo uma máfia? — perguntei perdida.
— Sim. Somos uma família de mafiosos. — ele sorriu — Meu clã pediu uma reparação pelo que fizeram comigo. Vamos lutar de igual para igual.
— Você vai lutar? — minha boca ficou seca.
— Não precisa se preocupar. Já estou recuperado e já até me aqueci — ele segurou meu queixo. — Para que não se assuste, coloque esses fones — ele me entregou dois fones sem fio e depois localizou uma play list no spotify e me passou seu iphone. — Montei essa aqui logo após te deixar em casa — sorri com a gentileza. — Espero que goste. — confirmei com a cabeça e coloquei os fones e liguei a play list.
Beethoven invadiu meus tímpanos no mesmo momento em que ele saiu do carro.
Seus subordinados estavam ao seu lado. Vi quando Mau e Mor passaram por eles e pararam ao lado de Drake.
Eles conversaram algumas coisas e Drake começou a desabotoar a camisa. Me agarrei no banco para ver melhor aquela cena. Seus olhos me fitaram parecendo sentir os meus e corei.
Symphony n°9 explodiu em meus ouvidos assim que a briga começou. Dos dois lados os homens correram para atacar os outros e socos e chutes eram distribuídos gratuitamente. Eu nunca tinha visto nada daquilo e sentia meu coração afunda no peito vendo a luta. Todos eram extremamente treinados e não pareciam querer perder.
Drake olhou para mim e sorriu, voltando sua concentração em um dos homens que tinha batido nele naquele dia fatídico, contudo se não fosse por eles, ela nunca teria conhecido aquele homem.
Betina Depois do dia em que quase fui estuprada pelo motorista louco do aplicativo, se tornou um hábito ter Drake sempre por perto, me cativando e me mostrando o quanto gostava de ficar comigo. Demorou um tempo para ele entender que eu não queria Mor e Mau me seguindo dentro da faculdade. Era desnecessário. Mesmo assim ele insistiu para que viesse me buscar todos os dias, não queria que eu andasse de ônibus coletivo, nem pegasse qualquer carro de aplicativo. Esse último se tornou extremamente proibido após o que aconteceu. Se não bastasse ele ainda me deu um celular novo, mil vezes melhor do que eu tinha e ainda conseguiu baixar tudo o que eu tinha no outro celular sem qualquer ajuda minha. Esse negócio de ser da máfia realmente tinha seus benefícios. Não que eu estivesse pensando em me juntar a eles, já que eu nem sabia que tipo de trabalho faziam. A única coisa que eu sabia era que eles sempre queriam mais. Mais glória, mais poder, mais sucesso. Drake se mostrava um homem
Fechei meus olhos esperando os golpes começarem. Eu já tinha visto aquela cena, mais vezes do que gostaria de contar apenas naquele mês.Primeiro elas me dariam golpes no estomago e depois no rosto. Fraca do jeito que eu era cairia no primeiro golpe se elas não me soltassem. Quando soltassem levaria chutes e mais chutes até que ficasse desacordada. Esperei por mais tempo do que imaginei que demoraria, mas nada aconteceu. Até suas vozes sumiram e resolvi abrir os olhos devagar para espiar.Mau estava segurando a mão da mulher que estava agarrada a meus cabelos e Mor encarava as outras duas com cara de quem iria matá-las.— Soltem-na — ele falou e me encostei na parede com as pernas bambas. Olhei através deles e vi Drake vindo em nossa direção com os olhos crepitando. Ele parecia maior do que realmente era.— O que estão fazendo aqui? — Mau perguntou ainda segurando o braço da primeira mulher.— Ela merecia uma lição — ela falou num tão mais baixo. Mesmo que estivesse intimidada por el
Drake — Quer ir comigo a uma corrida de carro hoje a noite? — seus olhos azuis me sondaram. Eu já tinha memorizado cada pedacinho dele. A forma como eles pareciam mudar de cor dependendo do reflexo do sol. A quantidade de riscos marrons que possuía, a forma que se mexiam dependendo do estado de espírito dela. — Uma corrida de carros? — era engraçado como as suas sobrancelhas se juntavam quando ela processava algumas das coisas que eu dizia. Nossos mundos eram tão diferentes que as vezes eu me esquecia. — Sim, hoje a noite vai acontecer uma corrida com vários lideres de clãs espalhados pelo Brasil. Pensei que talvez você quisesse conhecer um pouco mais sobre o meu mundo. Até agora só viu uma parte bem feia, digamos assim — eu não tinha qualquer problema com a forma que tudo tinha acontecido, mas entendia que para ela tudo era novo e assustador. Betina era uma menina ingênua, sem maldade e sem entendimento do que realmente o mundo dele representava. Ele queria mostrar tudo a ela, ma
— Senhor Giordano — Afonso Ricci, meu fiel amigo se aproximou cumprimentando. — Passei para vê-lo mais cedo, mas me disseram que teve um problema.—Nada com que deva se preocupar — falei sem comentar nada. A presença dela diria tudo.— Ouvi dizer que temos uma nova Lady — o olhei sério. — Não que eu tenha alguma coisa a ver com isso. Somente fiquei preocupado com sua procedência. — eu sabia que ele queria me alertar sobre o que poderia ser dito pelos outros, mas não me importei.— Ouviu certo, e estou disposto a cortar a língua do primeiro que a desrespeitar — vi o homem engolir em seco e assentir com a cabeça.— Claro senhor, ninguém faria algo assim — ele se afastou me deixando preso a meus próprios pensamentos.O garçom que nos servia trouxe meu vinho branco e o degustei antes de realmente tomá-lo. Não havia nada mais delicioso do que uma boa taça de vinho.Ou havia?Me virei assim que a porta do elevador se abriu e vi Betina em um vestido vermelho com
Lady B.O dia da corrida foi um divisor de águas para nós. Ele sabia que queria estar mais próximo a mim e eu dele e era difícil quebrar a vontade louca que nos consumia.Todos os dias ele ia me buscar na faculdade e passava boa parte da nossa viagem até minha casa me contando sobre como era viver em uma família regida pelas regras do Clã.Às vezes me perdia em pensamento imaginando como seria ser vista com ele dentro de sua casa, de seus costumes. Nunca tinha pensado muito a respeito do que a outra parte da relação teria que suportar para ficar comigo, mas entendi o que eu precisaria para estar perto de Drake.— Quero te levar comigo em uma viagem de negócios que vou fazer.— Viagem? — tínhamos acabado de passar pela avenida principal.— Tenho que conversar com alguns fornecedores e estou atrasado — me senti um pouco responsável por
DrakeVê-la tocar foi como voltar no tempo.Os acordes produzidos pelo instrumento o levaram a uma infância que a muito tempo ele não pensava. Onde não havia tantas responsabilidades, nem tantas preocupações.Quando menina, adorava explorar cada canto do bairro onde morava com os amigos, Mauricio e Leandro.Eles sempre foram unidos e nunca pensou em ter pessoas de sua confiança que não fossem eles.Eles viviam vadiando quando os pais os perdiam de vista. A bicicletas tinham que ser reformadas de tempos em tempos pela quantidade de aventuras que lhes proporcionavam.— Para onde vamos agora?? — Leandro questionou assim que chegamos no limite permitido.— Além — olhei para depois da avenida que cortava o bairro.— Do que está falando? — Mauricio, ou Mau como todos o chamavam agora, observou minha expressão.N&oacut
O tempo que passei com Drake em Salvador foi muito mais esclarecedor do que imaginei. Ele me contou um pouco sobre a sua vida, sobre como se tornou o Capo da Máfia Cacciatore, me explicou como funcionavam algumas das leis e me deu um panorama geral do que era o trabalho dele.Drogas.Drake era um dos principais fornecedores de Drogas do país, abastecendo São Paulo, Rio de Janeiro e Salvador.Ainda estava em dúvida sobre o que eu achava sobre isso e me questionei sobre meus valores e princípios já que meus pais sempre fizeram questão de me deixar bem ciente do que era certo e errado. Agora eu tinha dúvidas porque ele não parecia ser alguém ruim, ele só trabalhava com coisas ruins. Deitada na cama de meu quarto eu voltei ao dia em que toquei piano para ele. Me lembrei de cada expressão que vi em seu rosto, desde a surpresa até o fogo que se espalhou em seguida. Ainda assim ele não fez o que eu queria. Não me tomou em seus braços, nem me beijou ardentemente como parecia querer seus olh
— O que aconteceu? — ele se virou completamente para mim e fechei os olhos pensando em como dizer aquilo.— Meus pais estão aqui — abri meus olhos e vi que sua expressão não se alterou.— E isso é bom, não é? — ele estava cauteloso.— Eles estão suspeitando que algo está acontecendo em minha vida, que existe alguém bagunçando os meus planos — abaixei meu rosto para minhas mãos.— Talvez eles tenham razão — me assustei com seu comentário e o olhei séria.— Por que diz isso depois de tudo que tem me mostrado?— Eu sei o que sou, Betina, sei minhas origens — ele suspirou — Tudo em mim é intenso e as vezes temos que abrir mão de coisas que queremos apenas para salvá-la.— O que quer dizer? — fiquei apavorada, nós não tínhamos começado nada para ele falar de fim. Me aproximei dele e segurei seu rosto. — O que quer dizer com isso, Drake? — ele pousou suas mãos sobre a minha.— Quero dizer que talvez seus pais estejam vendo mais do que nós dois. — seus olhos se fecharam e senti uma pontada e