Capítulo 6

Irina

Pensei que esse lugar recebia pessoas de todos os lugares de braços abertos, mas me enganei. Eu fiz uma amizade no último lugar em que trabalhei, uma senhora muito gentil, ela pegou o número para contato lá de casa e disse que vai me avisar quando aparecer algum trabalho fixo para mim.

O Boris está trabalhando com um amigo dele em construções civis. Fiquei impressionada como ele conseguiu um trabalho mais rápido do que eu e não está sofrendo o que estou sofrendo.

Hoje vou até uma floricultura onde me disseram que estão precisando de atendente e a pessoa que arrumou para mim foi uma vizinha daqui, ela disse que com a minha beleza vou chamar bastante atenção no balcão.

Espero que eles não me contratem apenas pela minha beleza. Eu quero ser tratada pela forma que trabalho e não por ter um rosto bonito. Quero ser valorizada pelo meu trabalho e não pela minha aparência.

Finalmente consegui um emprego, não me paga muito bem, mas o suficiente para conseguir levar a minha vó ao hospital. E eu já fico feliz por isso. Com dois meses de salário finalmente tenho o suficiente para levar a minha vó ao médico e comprar remédios se assim ela precisar.

Consigo marcar a consulta e assim que chegamos na clínica, a médica já passa uma bateria de exames para minha vó, e só os valores dos exames foi uma parte boa do dinheiro.

Mas pelo menos teremos o resultado em breve. Ela passou alguns remédios e vitaminas para minha vó e claro que eu comprei, não poderia deixá-la sem os remédios.

Alguns dias depois voltamos para a segunda consulta só que as notícias não são boas e me deixa desesperada.

— Doutora, a senhora tem certeza? — E a Doutora responde para mim:

— Senhorita Dobrow, foi por esse motivo que eu preferi marcar com a senhorita aqui sem a presença de sua avó! Eu tenho certeza... É câncer de mama. Ela precisa fazer o exame para descobrirmos se é benigno ou maligno, mas ao julgar pelo meu tempo trabalhando com isso acho que não vai ser muito bom o resultado dessa biópsia. Acho melhor a senhorita se preparar para algo pior. Eu sinto muito, mas como já expliquei podemos prolongar a vida dela com o tratamento, só que é bem caro. A sua família teria que se reunir e conversar para arrumar o dinheiro para pagar.

— Não, por favor. Eu não saberia... Doutora, vou falar com meu primo. Volto aqui amanhã.

Saio da clínica muito abalada, pois sei que se for o que estou pensando as coisas ficarão complicadas. Eu sei que a minha vó já tem oitenta anos, mas não vou aceitar que ela se vá por causa de uma doença tão ingrata.

Ao chegar no trabalho do meu primo quase todos os homens olham para mim e começam a mexer comigo, mas apenas com um grito de Boris todos voltam ao trabalho e ele irritado pergunta para mim:

— O que está fazendo aqui? É o meu trabalho, eu disse que poderia vir aqui só se algo urgente acontecesse.

— É urgente, Boris! — Eu conto para ele o que aconteceu e digo que a nossa avó vai precisar de um tratamento muito caro e que precisamos nos juntar para pagar, e ele logo diz para mim:

— Irina, mal sobra dinheiro para nos sustentar. Você sabe que estou enviando dinheiro para os meus filhos na Rússia. Como vou pagar por algo tão caro? Mesmo sendo para minha avó.

— Você está se ouvindo? Você sai para beber quase todos os dias, porque não usa o dinheiro que usa pra isso para me ajudar? Ela te criou também e te deu todo o amor que tinha. — E ele irritado responde:

— Irina, acho melhor não falar assim comigo novamente. Acho que lembra bem do que sou capaz.

— Eu odeio você. — Depois de dizer isso para ele volto para casa, me sento no sofá, pois sei que a minha vó está lá no quarto tirando seu sono da tarde. Eu deixei de ir trabalhar para poder ir até a médica e ela me dá uma notícia dessas.

O que eu ganho lá não é o suficiente para bancar o tratamento da minha avó e o meu primo pelo visto não vai colaborar.

— O que eu vou fazer para resolver essa situação? — Pergunto em voz alta esperando ter a resposta.

Eu não tenho com quem pegar o dinheiro e não estou conseguindo arrumar um trabalho a mais para ajudar na renda. E no final de tudo para mim não foi bom mudar para cá.

Continuo passando a mesma coisa que passava na Rússia. A diferença é que lá eu conhecia tudo e todos me conheciam. Eu sei que a vida era difícil, mas pelo menos eu estava na minha cidade, no lugar onde nasci e fui criada.

E agora estou aqui com essa bomba em meus braços, estou aqui chorando, distraída e sinto a mão da minha avó em meu rosto e a sua voz suave me confortando dizendo:

— Minha neta, não chore. Você é a minha bonequinha linda, e as bonequinhas não choram. Diga para a sua vó, o que está a deixando triste?

— Eu quero voltar à minha infância e ter mais tempo com a senhora. Quero que a sua idade diminua uns anos. Quero que a nossa família possa voltar para a Rússia e viver prosperamente lá. — Minha avó fala calma e gentil:

— Não pode mais agir como a criança que era, meu amor. Estamos aqui agora e precisamos nos acostumar com a nossa nova vida, eu sei que é difícil e um pouco assustador. Eu só consigo andar até a esquina quando vocês não estão em casa, mas estou progredindo cada dia mais e assim vai ser com vocês, meu amor.

— Eu amo a senhora, vovó. — Eu dou um abraço forte nela e ficamos ali um tempo. 

Eu comecei a procurar outro trabalho. Trabalho na floricultura apenas quatro horas por dia. Quero arrumar um trabalho que preencha o restante do dia e que pague um valor considerável para que eu possa juntar os dois salários e começar a pagar o tratamento da minha vó.

Mas a única coisa que arrumo são freelancer, nada que pague o suficiente ou que me ajude. E estou ficando cada vez mais preocupada, porque sei que quanto mais demorar mais o câncer avança.

Já se passaram vinte dias e a única coisa que eu consegui até agora foi o dinheiro para a minha avó fazer esse novo exame. Eu ainda não contei para ela a razão para o novo exame e a médica também não contou a pedido meu.

Eu pedi para ela não contar. E agora tenho que esperar esse resultado sair. Vou passar todos os meus dias trabalhando e procurando mais trabalho. Eu não sabia que a vida aqui seria desse jeito, o meu primo pintava esse lugar como o país dos empregos.

Então, por que os lugares onde vou me julgam por ser russa e não confiam em mim? É claro que para o meu primo, aqui a vida está sendo muito mais fácil. Boris não tem com o que se preocupar. E isso me deixa bem chateada.

Por que a vida para os homens costuma ser mais fácil do que para as mulheres? Por que somos tão subestimadas? Deixa para lá.

Chegou o dia de pegar o exame da minha vó e eu levo o exame até a doutora e ela constatou o que eu não queria. Minha vó está com câncer maligno. E isso me destrói. Dessa vez eu não fui até o trabalho do meu primo.

Porque sei que é em vão, mas a minha vó foi convidada para um chá da tarde pelas vizinhas senhoras de onde moramos, sei que essa hora não tem ninguém em casa. Então é para lá que eu vou parar de chorar.

Eu fui tomar um banho e acabei esquecendo de pegar a minha roupa, a minha mente está uma bagunça. Quando entro no quarto enrolada na toalha sou jogada em cima da cama pelo meu primo que está bêbado.

Como sempre ele começa a me alisar e a única reação que eu tenho agora é de dar uma joelhada nele e o mesmo cai no chão. E assim que se levanta para me agredir eu jogo a bomba e digo para ele que se não cuidarmos da nossa vó ela vai morrer.

Ele para bem antes de dar o tapa na minha cara, em seguida sai do quarto me deixando sozinha. Eu nem acredito que foi a primeira vez que o enfrentei. Consegui sair vitoriosa disso, mesmo que seja com algo que me machuca tanto quanto está machucando ele agora.

Na verdade eu nem sabia que ele tinha sentimentos pela nossa vó, já que ele não se mostrou muito preocupado quando dei a notícia que ela estava com câncer. E agora estou aqui sofrendo sem que a minha vó saiba que está com uma doença grave. Como eu vou contar para ela?

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