Irina
Pensei que esse lugar recebia pessoas de todos os lugares de braços abertos, mas me enganei. Eu fiz uma amizade no último lugar em que trabalhei, uma senhora muito gentil, ela pegou o número para contato lá de casa e disse que vai me avisar quando aparecer algum trabalho fixo para mim.
O Boris está trabalhando com um amigo dele em construções civis. Fiquei impressionada como ele conseguiu um trabalho mais rápido do que eu e não está sofrendo o que estou sofrendo.
Hoje vou até uma floricultura onde me disseram que estão precisando de atendente e a pessoa que arrumou para mim foi uma vizinha daqui, ela disse que com a minha beleza vou chamar bastante atenção no balcão.
Espero que eles não me contratem apenas pela minha beleza. Eu quero ser tratada pela forma que trabalho e não por ter um rosto bonito. Quero ser valorizada pelo meu trabalho e não pela minha aparência.
Finalmente consegui um emprego, não me paga muito bem, mas o suficiente para conseguir levar a minha vó ao hospital. E eu já fico feliz por isso. Com dois meses de salário finalmente tenho o suficiente para levar a minha vó ao médico e comprar remédios se assim ela precisar.
Consigo marcar a consulta e assim que chegamos na clínica, a médica já passa uma bateria de exames para minha vó, e só os valores dos exames foi uma parte boa do dinheiro.
Mas pelo menos teremos o resultado em breve. Ela passou alguns remédios e vitaminas para minha vó e claro que eu comprei, não poderia deixá-la sem os remédios.
Alguns dias depois voltamos para a segunda consulta só que as notícias não são boas e me deixa desesperada.
— Doutora, a senhora tem certeza? — E a Doutora responde para mim:
— Senhorita Dobrow, foi por esse motivo que eu preferi marcar com a senhorita aqui sem a presença de sua avó! Eu tenho certeza... É câncer de mama. Ela precisa fazer o exame para descobrirmos se é benigno ou maligno, mas ao julgar pelo meu tempo trabalhando com isso acho que não vai ser muito bom o resultado dessa biópsia. Acho melhor a senhorita se preparar para algo pior. Eu sinto muito, mas como já expliquei podemos prolongar a vida dela com o tratamento, só que é bem caro. A sua família teria que se reunir e conversar para arrumar o dinheiro para pagar.
— Não, por favor. Eu não saberia... Doutora, vou falar com meu primo. Volto aqui amanhã.
Saio da clínica muito abalada, pois sei que se for o que estou pensando as coisas ficarão complicadas. Eu sei que a minha vó já tem oitenta anos, mas não vou aceitar que ela se vá por causa de uma doença tão ingrata.
Ao chegar no trabalho do meu primo quase todos os homens olham para mim e começam a mexer comigo, mas apenas com um grito de Boris todos voltam ao trabalho e ele irritado pergunta para mim:
— O que está fazendo aqui? É o meu trabalho, eu disse que poderia vir aqui só se algo urgente acontecesse.
— É urgente, Boris! — Eu conto para ele o que aconteceu e digo que a nossa avó vai precisar de um tratamento muito caro e que precisamos nos juntar para pagar, e ele logo diz para mim:
— Irina, mal sobra dinheiro para nos sustentar. Você sabe que estou enviando dinheiro para os meus filhos na Rússia. Como vou pagar por algo tão caro? Mesmo sendo para minha avó.
— Você está se ouvindo? Você sai para beber quase todos os dias, porque não usa o dinheiro que usa pra isso para me ajudar? Ela te criou também e te deu todo o amor que tinha. — E ele irritado responde:
— Irina, acho melhor não falar assim comigo novamente. Acho que lembra bem do que sou capaz.
— Eu odeio você. — Depois de dizer isso para ele volto para casa, me sento no sofá, pois sei que a minha vó está lá no quarto tirando seu sono da tarde. Eu deixei de ir trabalhar para poder ir até a médica e ela me dá uma notícia dessas.
O que eu ganho lá não é o suficiente para bancar o tratamento da minha avó e o meu primo pelo visto não vai colaborar.
— O que eu vou fazer para resolver essa situação? — Pergunto em voz alta esperando ter a resposta.
Eu não tenho com quem pegar o dinheiro e não estou conseguindo arrumar um trabalho a mais para ajudar na renda. E no final de tudo para mim não foi bom mudar para cá.
Continuo passando a mesma coisa que passava na Rússia. A diferença é que lá eu conhecia tudo e todos me conheciam. Eu sei que a vida era difícil, mas pelo menos eu estava na minha cidade, no lugar onde nasci e fui criada.
E agora estou aqui com essa bomba em meus braços, estou aqui chorando, distraída e sinto a mão da minha avó em meu rosto e a sua voz suave me confortando dizendo:
— Minha neta, não chore. Você é a minha bonequinha linda, e as bonequinhas não choram. Diga para a sua vó, o que está a deixando triste?
— Eu quero voltar à minha infância e ter mais tempo com a senhora. Quero que a sua idade diminua uns anos. Quero que a nossa família possa voltar para a Rússia e viver prosperamente lá. — Minha avó fala calma e gentil:
— Não pode mais agir como a criança que era, meu amor. Estamos aqui agora e precisamos nos acostumar com a nossa nova vida, eu sei que é difícil e um pouco assustador. Eu só consigo andar até a esquina quando vocês não estão em casa, mas estou progredindo cada dia mais e assim vai ser com vocês, meu amor.
— Eu amo a senhora, vovó. — Eu dou um abraço forte nela e ficamos ali um tempo.
Eu comecei a procurar outro trabalho. Trabalho na floricultura apenas quatro horas por dia. Quero arrumar um trabalho que preencha o restante do dia e que pague um valor considerável para que eu possa juntar os dois salários e começar a pagar o tratamento da minha vó.
Mas a única coisa que arrumo são freelancer, nada que pague o suficiente ou que me ajude. E estou ficando cada vez mais preocupada, porque sei que quanto mais demorar mais o câncer avança.
Já se passaram vinte dias e a única coisa que eu consegui até agora foi o dinheiro para a minha avó fazer esse novo exame. Eu ainda não contei para ela a razão para o novo exame e a médica também não contou a pedido meu.
Eu pedi para ela não contar. E agora tenho que esperar esse resultado sair. Vou passar todos os meus dias trabalhando e procurando mais trabalho. Eu não sabia que a vida aqui seria desse jeito, o meu primo pintava esse lugar como o país dos empregos.
Então, por que os lugares onde vou me julgam por ser russa e não confiam em mim? É claro que para o meu primo, aqui a vida está sendo muito mais fácil. Boris não tem com o que se preocupar. E isso me deixa bem chateada.
Por que a vida para os homens costuma ser mais fácil do que para as mulheres? Por que somos tão subestimadas? Deixa para lá.
Chegou o dia de pegar o exame da minha vó e eu levo o exame até a doutora e ela constatou o que eu não queria. Minha vó está com câncer maligno. E isso me destrói. Dessa vez eu não fui até o trabalho do meu primo.
Porque sei que é em vão, mas a minha vó foi convidada para um chá da tarde pelas vizinhas senhoras de onde moramos, sei que essa hora não tem ninguém em casa. Então é para lá que eu vou parar de chorar.
Eu fui tomar um banho e acabei esquecendo de pegar a minha roupa, a minha mente está uma bagunça. Quando entro no quarto enrolada na toalha sou jogada em cima da cama pelo meu primo que está bêbado.
Como sempre ele começa a me alisar e a única reação que eu tenho agora é de dar uma joelhada nele e o mesmo cai no chão. E assim que se levanta para me agredir eu jogo a bomba e digo para ele que se não cuidarmos da nossa vó ela vai morrer.
Ele para bem antes de dar o tapa na minha cara, em seguida sai do quarto me deixando sozinha. Eu nem acredito que foi a primeira vez que o enfrentei. Consegui sair vitoriosa disso, mesmo que seja com algo que me machuca tanto quanto está machucando ele agora.
Na verdade eu nem sabia que ele tinha sentimentos pela nossa vó, já que ele não se mostrou muito preocupado quando dei a notícia que ela estava com câncer. E agora estou aqui sofrendo sem que a minha vó saiba que está com uma doença grave. Como eu vou contar para ela?
IrinaEstou sofrendo demais com a nova situação que surgiu em minha vida. Descobrir que alguém que eu amo está com uma doença grave, que mesmo sendo maligno, se for tratado consegue prolongar a vida da pessoa que você ama, o que você faria para tentar salvar a vida dessa pessoa?Eu já tentei por quase todo o lugar aqui encontrar um trabalho decente, mas eu já percebi que para ganhar o que preciso para começar o tratamento da minha avó precisaria de pelo menos umas três de mim para conseguirmos juntar todo o dinheiro necessário.O meu primo é tão idiota, não consigo chegar a uma conversa decente com ele. Já que ele disse que não pode me ajudar financeiramente porque está sustentando os três filhos que o mesmo deixou na Rússia. E fora algumas contas da casa que é ele quem paga.Eu não sei o quanto ele ganha nesse novo emprego dele, mas gostaria que ele pudesse pelo menos me ajudar com o tratamento da nossa avó. A doutora me disse que para o início do tratamento eu preciso de pelo menos
IrinaEu não sei o que faço. É muito difícil escolher entre sua dignidade e a pessoa que mais ama, sendo que vou sempre escolher a minha avó.Boris realmente esperou os dois dias e quando eu estava lavando a louça do jantar chegou perto de mim como quem iria colocar um copo para lavar e sussurrou para mim:— Irina, se você já tem a resposta para me dar hoje é o dia perfeito para te levar até o lugar para falar com a dona. Estarei aqui na sala te esperando para levá-la lá. Esperarei apenas cinco minutos assim que a nossa avó estiver dormindo. Não se atrase.Ele sai com a maior tranquilidade, claro que não é ele que terá que se vender como se fosse um objeto. Eu tento ver televisão, mas nada prende a minha atenção, a minha cabeça está dando voltas.Eu sei que já tomei minha decisão, mas mesmo assim ainda dói o que vou fazer. Vou jogar a minha dignidade na lama, eu não terei mais o brilho de antes, não terei mais o meu orgulho. Serei apenas uma mulher suja que se vendeu.Eu fico ali tão
IrinaEla me puxa para um lado do lugar que me deixa curiosa, pois depois que seguimos por um corredor o lugar que parecia uma boate começa a parecer uma casa, depois que passamos por uma sala com alguns sofás entrarmos em um pequeno escritório e eu acabo não resistindo e perguntando a idade da mulher que parece ser jovem e Rosalinda responde:— Meu anjo, não é educado perguntar a idade de uma dama, mas vou dizer pois parece muito curiosa... Tenho cinquenta e seis anos. — Mentira! Eu pensei que tinha quarenta. — Falo ainda em choque ao ver que a mulher é muito linda e jovial. Até que ela começa a me contar um pouco sobre o nome do lugar e sua história:— Sabia que Flor-da-Noite é o apelido de uma flor que floresce somente durante a noite? Apesar de várias espécies receberem o nome de Dama-da-Noite que é seu nome original, algumas como cacto-orquídea recebe o nome científico de Epiphyllum oxypetalum. É uma planta da família dos cactos originária do México que floresce na primavera, qu
IrinaDepois de descobrir que o presente que eu ganhei é nada menos que um diário, eu me sentei na cama e fiquei ali olhando para minha avó que foi a minha confidente a vida inteira.Mas agora tem coisas que infelizmente vou ter que esconder dela e nada melhor que um belo diário para isso e esse que eu ganhei parece um livro grande. A capa tem um veludo vermelho macio lindo, as folhas do diário parecem folhas envelhecidas um pouco amareladas, mas é apenas o charme do diário.Eu coloco o diário embaixo das minhas roupas no armário, depois me deito ao lado da minha amada avó e tento dormir. Acabo dormindo olhando para o rosto dela. Assim que acordo pela manhã vejo que minha avó já se levantou.Eu já falei para ela não se levantar e preparar o café da manhã, já disse que eu mesma posso fazer isso, mas ela é um pouco teimosa. Tomo um banho rápido e troco de roupa, pois ainda tenho que ir para floricultura, mas assim que abro a porta do quarto para descer sou empurrada de volta para o mesm
IrinaEla olha para mim e pergunta quem eu sou e digo que sou apenas uma funcionária da floricultura, e ela não espera que eu pegue pelo menos o avental para cuidar das plantas e diz que eu estou demitida. E eu pergunto para ela:— Onde está a dona Oliver, dona da floricultura? — E ela responde que a pobre senhora está em um caixão sendo levada para sua terra natal para poder ser enterrada lá perto dos seus parentes.Pelo que eu entendi a filha dela que irá vender a floricultura pois também não é daqui. Ela paga apenas meus dias trabalhados e me dispensa.Eu volto para casa com um aperto no peito. O que eu vou dizer para minha avó? Eu vou dizer que hoje é só um dia de folga, amanhã eu saio para procurar trabalho novamente. Eu ainda tenho que esperar uma ligação ou uma mensagem da Rosalinda.Quando chego em casa vejo que minha vó está novamente na vizinha conversando, consigo ouvir sua gargalhada daqui da sala. Amo sua gargalhada alta, ela fez amizade com essa vizinha e essa vizinha a
IrinaAo ler essa mensagem sinto meu coração apertar e doer ao mesmo tempo, sinto um frio percorrer todo o meu corpo e uma vontade de chorar nesse momento me aperta a garganta. E por um segundo se passa em minha mente o desejo de querer partir junto com a minha vó.Só para não ficar nesse mundo sem ela, mas ao mesmo tempo eu quero que ela continue vivendo por pelo menos até os cem, cento e dez anos. Quanto mais ela viver mais feliz ficarei. Eu mando de volta para a Rosalinda em resposta:— "Assim que a minha avó dormir estarei aí." — Eu poderia ir agora, mas não quero que me vejam entrar nesse lugar.Para a minha angústia e desespero a noite cai, para o meu tormento minha avó decide dormir cedo, meia hora depois que ela cai em um sono profundo eu coloquei uma calça jeans preta, um tênis preto e um casaco de capuz também preto. O capuz é tão grande que quase cobre meu rosto todo. E quando eu saio do quarto encontro meu primo que fala:— Sei onde vai e irei com você. Eu consegui um carr
IrinaGostaria muito de entender o que está acontecendo em minha vida, mas no momento a única coisa que eu posso fazer por mim e por quem eu amo é estar aqui em um lugar que eu nunca imaginei pisar. Olho para Rosalinda quando entro e a cumprimento:— Boa noite, Rosalinda.— Boa noite, cariño. Vamos conversar lá dentro?Ela vai para o mesmo lugar onde conversamos a última vez, dessa vez quando passamos pela sala vejo algumas meninas e duas bem animadas já chegam próximas a mim se apresentando e falando algumas coisas elas se chamam Daphne e Sierra. Aparentemente gentis. Daphne é a primeira a se apresentar seguida de Sierra.— Olá, sou Daphne, e soube que você é russa e tem dezoito anos. Você é extremamente linda. Alguém já te disse isso?— Daphne, é claro que ela sabe que é linda! Olhe para ela, parece uma linda boneca russa. Oi, sou Sierra, muito prazer.— Eu fiz dezenove anos a pouco tempo... Não falem assim, não sou tão bonita quanto vocês. — As duas mulheres são lindas também, Daph
IrinaQuando termino de conversar com a Rosalinda decido voltar para casa sozinha, mas Boris está do lado de fora à minha espera e eu falo:— Pensei que iria ficar até o amanhecer como sempre. — E Boris responde sem olhar para mim:— A minha preferida não pode me atender hoje por causa desse lance aí que acontece com vocês mulheres uma vez no mês e acabou com a minha noite. Vamos logo porque tenho que trabalhar pela manhã.Eu caminho até o carro e entro. Ao chegarmos em casa caminho na direção da escada e Boris me segura pelo braço ao falar:— Você vai virar uma das flores da Rosalinda? Sabe que cada mulher que está lá tem nome de flor, né?— O que? Mas é claro que não! Vai ser apenas essa vez e não vou voltar lá. Você sabe que estou seguindo esse caminho apenas para salvar a vovó.— Só um aviso, Irina, se você por um acaso virar uma das flores do Flor-da-Noite vou ter o prazer de virar um de seus clientes. Pode ter certeza disso.Ele me solta e passa por mim subindo a escada indo em