Floresta

Violet Hathaway

Residência Hathaway

Horas antes

Hoje é o aniversário da Annabel, minha irmãzinha de 2 anos. Ela se parece muito comigo, todos dizem isso. Annabel é branquinha, com cabelos negros e olhos azuis. Ela é como eu era quando era pequena, exceto pela cor dos olhos, já que os meus são negros. Me chamo Violet e sou a mais velha das gêmeas. Minha gêmea idêntica se chama Sarah, mas ela mora em outra cidade desde que a mamãe descobriu que estava grávida de Anna.

Acho que Sarah só queria ter a própria vida, então, com dezesseis anos, o papai permitiu que ela morasse com a vovó no sítio.

Felizmente, hoje ela está aqui. Vamos comemorar o aniversário de nossa irmã em família.

Ajudo Sarah a levar as decorações da festa para o quintal dos fundos. Diversos balões rosa e branco estão pendurados formando um arco. Atrás do arco, há um painel rosa com alguns de seus personagens favoritos dos desenhos animados. Luzes coloridas enfeitam o quintal, que está cheio de mesas e cadeiras de madeira clara. No centro de cada mesa, há um vaso com rosas brancas, as favoritas de Anna.

Toda a família está em clima de festa, felizes pelo grande dia do aniversário de Annabel. Ela é uma criança adorável e faz amizade facilmente com todos que a conhecem. Seus amigos da escolinha também estão vindo para a festa. Papai contratou um mágico para entreter as crianças e alugou um castelo pula-pula. Será um dia memorável.

— Violet! – Sarah grita, chamando minha atenção. Seu rosto tem uma expressão divertida. – Pensa rápido!

Com um reflexo péssimo, não consigo segurar a bola e ela voa por cima da cerca, indo em direção às árvores que começam a floresta.

— Ótimo– minha voz sai irritada. – Você sabe que meus reflexos são uma porcaria. Agora perdemos uma bola!

O cabelo roxo de Sarah voa com o vento, e seus olhos azuis me encaram, sem esconder o tédio. Sua expressão sarcástica logo se transforma em pavor, e vejo a cor sumir de seu rosto.

— Essa era a bola que o vovô deu para Annabel– sua voz sai nervosa, apesar de seu esforço para disfarçar. – Violet, se você perder o último presente que ele deu em vida para Anna, a mamãe vai nos matar!"

Sei que ela está certa. Não posso deixar meus pais saberem que perdi a bola da Anna, ainda mais sendo o brinquedo favorito dela.

Coloco meu casaco, está muito frio, e sinto que estou mais segura com ele.

Com a ajuda de uma cadeira, pulo a cerca e caio na grama alta. Olho ao redor e um arrepio percorre meu corpo, como se houvesse uma energia ruim no lugar

— Violet? – Sarah fala com uma voz estranha. – Você está bem?

— Estaria melhor se você não tivesse me obrigado a vir aqui.

— Pegue logo essa bola e volte de uma vez! – Sua voz volta a ficar arrogante. – Você já está me irritando!

Quando vou responder à sua afronta, tenho minha atenção roubada por uma árvore. A árvore estava repleta de marcas, mas as que me deram arrepios foram as mais recentes. Eram grossas, como arranhões. Passo minha mão por elas e vejo que cada marca é mais grossa que meus dedos. Nem mesmo uma faca de caça conseguiria fazer uma marca desse tipo com tamanha precisão. Minha visão foca nas outras árvores e vejo que nelas havia mais das mesmas marcas, mas dessa vez mais grossas, maiores e em uma altura mais baixa.

Algo vermelho estava entre as marcas de uma árvore, passo o dedo e vejo que está fresco. Seria sangue? Arregalo os olhos ao cheirar e constatar que estou certa.

Um arrepio invade meu corpo e ele fica em estado de alerta. Uma estranha sensação de estar sendo observada me faz olhar em direção a uma árvore. Me arrepio ao ver, por um breve instante, um homem pulando entre as árvores.

— Violet?

Volto à realidade com o som da voz de Sarah. Limpo minha mão na minha calça e olho ao redor em busca da bendita bola. Certo, isso deve ser apenas mais uma das minhas alucinações. Na certa, meus medicamentos não estão mais fazendo efeito.

Meu olhar vagueia pela extensão da floresta, sinto o ar faltar ao ver um jovem ruivo correndo ferido. Parece estar fingindo algo. Seus pés mal tocam o chão e seu corpo está repleto de cortes que escorrem sangue. Vejo um homem alto usando capuz se aproximar lentamente do fugitivo e, em breves segundos, essa visão se transforma em névoa.

Meu coração acelera. Droga, o que foi isso? Sempre tive essas visões, mas normalmente meus remédios faziam efeito e me impediam de ver essas coisas. Mesmo com meus remédios, às vezes ainda tenho essas visões. Não gosto de falar sobre isso com os meus pais, pois sei que está fora do meu controle. Elas não são tão vívidas e nem tão frequentes.

Mas agora? Agora estão ficando cada vez mais frequentes e realistas. Posso sentir as emoções das pessoas nessas visões, sentir os cheiros, ouvir suas vozes e até mesmo ver o clima mudar. É como assistir a um filme, vejo o lugar de forma diferente, em um tempo que não consigo decifrar. É como se pudesse ver o passado e o futuro de um lugar. Sei que isso é apenas uma desculpa para essas visões devido aos meus distúrbios psiquiátricos, uma forma de me sentir normal em meio a esse mundo de remédios e terapias.

— Não achei. – Falo com a

voz trêmula. – Acho que deve ter caído no meio das árvores.

Não vou entrar nessa floresta, não após ver essas marcas e ter essa visão macabra. Essas marcas me fazem quase acreditar nas lendas que cercam essa floresta, como se as crendices populares fossem verdadeiras. E essa visão só me faz ter mais certeza de que nunca devo pisar nesse lugar.

— Vai lá buscar! – Sarah grita irritada. – Se a mãe souber que você perdeu, ela vai nos matar!

Ando em direção à floresta e me assusto quando os pássaros começam a voar. O som dos animais é relaxante, o canto dos pássaros, o som do vento, o ar fresco.

Ando alguns minutos até ouvir passos. Paro de andar no mesmo instante. Seria Sarah vindo ver o motivo da minha demora?

Olho em direção ao som e vejo que não há ninguém. Reviro os olhos, provavelmente é alguma pegadinha da minha irmã gêmea.

— Muito engraçado, já pode parar!

Vejo um vulto se movimentar rapidamente entre as árvores, um movimento impossível de ser reproduzido por qualquer criatura viva. A floresta fica em silêncio e tenho a sensação de estar sendo observada. Olho para o alto e não vejo ninguém nas árvores. Dou um pulo de susto ao sentir uma mão em meu pescoço, olho ao redor e não vejo ninguém. Coloco meu capuz e começo a correr, escuto os passos me seguindo rapidamente. Olho entre as árvores e observo o vulto cada vez mais próximo.

Tropeço nos meus próprios pés, rolando barranco abaixo. Bato com a cabeça em uma pedra e sinto minha visão ficar embaçada.

Tonta, levanto-me com dificuldade. Limpo meu corpo, tirando a areia e as folhas secas.

Olho para o barranco e me pergunto como conseguirei sair desta floresta.

Minha única alternativa é continuar andando. Sei que Sarah não irá me procurar e, mesmo se ela vier, não irá imaginar que estou aqui.

A sensação de estar sendo observada piora à medida que me afasto de casa. É como se cada passo que dou para adentrar as profundezas da floresta me colocasse no território de seja lá o que está me seguindo.

Uma pegada na lama me assusta. Parece uma pegada de um cão, só que extremamente maior. Comparo com o tamanho do meu pé e me assusto ao ver que é muito maior.

Tiro uma foto e guardo o celular no bolso. Escuto o som de um rosnado muito próximo. Olho na direção do som e vejo um enorme lobo marrom a alguns metros de distância. Seu tamanho é assustador, como se fosse maior que eu, algo totalmente ilógico. Nunca vi um animal desse tamanho.

O lobo encara algo atrás de mim, mostrando os dentes como se estivesse prestes a atacar. Olho na direção em que ele olha e avisto o tal vulto no meio das árvores. Parece que seja lá o que isso for, é algo que os lobos não gostam. Meu coração acelera ao me lembrar da visão. Esse vulto poderia ser o homem de capuz.

"Deixe de bobagem, Violet. Isso é apenas uma visão devido à dosagem errada da sua medicação. Não existe homem de capuz!" Digo para mim mesma, mas parece não funcionar, pois vejo, a alguns metros de distância, uma pessoa extremamente alta usando uma capa preta que cobre todo o seu corpo.

— Violet! – Escuto a voz de Sarah, parecendo estar muito próxima. – Onde você está?

Quando olho na direção do lobo, ele já não está mais lá. Vejo a tal figura caminhar lentamente para dentro da floresta e, num piscar de olhos, desaparecer.

Céus, devo estar louca.

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