Yara Blake.
12:20 — Casa da Yara. — Eldoria.
Sexta-Feira.
Estou de pé em frente ao espelho, observando meu reflexo. A imagem do meu vestido de casamento continua fresca em minha mente, um lembrete cruel do dia em que minha vida mudou para sempre. Por um momento, me perco nas lembranças daquele infeliz casamento, acreditando que tudo iria melhorar com o tempo. Pensei que, eventualmente, me apaixonaria por Ronan e ele por mim. Mas não foi isso que aconteceu.
Desde o dia em que nos casamos, ele nunca me tocou. Não consumamos nosso casamento na lua de mel. As palavras dele ainda ecoam em minha mente: "Você não serve para mim." Desde então, minha vida se resume a cumprir as obrigações de casa e ser uma boa esposa, do jeito que ele acha que deve ser.
Ele constantemente j**a na minha cara que só tenho ele na vida, que devo obedecê-lo sem questionar. Quando tentei conversar com minha mãe, na esperança de encontrar algum consolo, ela ficou do lado dele. Disse que devo sempre abaixar a cabeça para meu marido, que é o que se espera de uma esposa.
Estou cansada. Me casei quando tinha dezoito anos e agora, aos vinte e dois, esses quatro anos têm sido um verdadeiro inferno. Tenho medo de pedir o divórcio e ele me machucar. Conheço bem sua verdadeira personalidade, escondida atrás de uma fachada de respeito e educação.
Hoje acordei cedo para preparar o café da manhã para Ronan, como faço todos os dias. Mas, agora, estou no banheiro, terminando de me arrumar para a entrevista. Minha mente está focada no que essa nova oportunidade pode significar para mim. A entrevista surpreendentemente será na empresa do senhor Magnus, algo que descobri através do jornal que consegui ler.
Foi difícil, mas liguei pelo telefone fixo da nossa casa para o número que estava no anúncio. Surpreendentemente, a mulher que me atendeu foi muito gentil e me passou todas as informações necessárias: o endereço, o horário da entrevista, e até disse que não preciso de currículo, apenas da minha identidade, porque serei entrevistada pelo próprio senhor Magnus.
Ouvi falar que a senhora Darkmore tem três filhos: Magnus, Kael e Damien. Apenas sei seus nomes porque pesquisei discretamente, mas não consegui encontrar nenhuma imagem ou informações nos jornais. Meu marido não me permite ter um celular, e qualquer contato com o mundo exterior é controlado por ele.
Surpreendentemente, ele me deu permissão para tentar essa entrevista. Acho que o status da família Darkmore influenciou sua decisão. Se fosse em algum lugar mais humilde, ele jamais teria permitido. Ele acredita que, ao trabalhar para uma família rica e poderosa, minha lealdade a ele só aumentará.
Estou aqui, diante do espelho, ajustando os últimos detalhes da minha aparência. Dou uma última olhada no meu reflexo, certificando-me de que não tenho olheiras visíveis e que minha roupa está adequada. Hoje, estou vestida com um conjunto simples, mas decente: uma blusa branca de algodão e uma saia preta até os joelhos. A blusa é básica, com um decote em V discreto e mangas curtas, enquanto a saia tem um tecido leve e fluído que cai suavemente. Apesar de sua simplicidade, a roupa está bem passada e faz com que eu me sinta um pouco mais confiante.
Apliquei um pouco de maquiagem para disfarçar a palidez e garantir que meu visual esteja apresentável. O esforço é mínimo, mas é o melhor que posso fazer com o que tenho. Olho novamente para o espelho e sinto uma mistura de nervosismo e esperança.
Saio do banheiro, pego minha bolsa com os documentos e começo a descer os degraus. Por sorte, Ronan deixou dinheiro para o táxi, cobrirá apenas a ida e a volta. Se eu sentir fome durante o dia, não poderei comer nada, pois o dinheiro disponível é exatamente o necessário para o transporte.
Chego ao no último degrau, respiro fundo antes de sair de casa. Hoje, tenho uma chance de mudar minha vida, e não posso deixar essa oportunidade escapar. Coloco o dinheiro no bolso e saio, determinada a fazer o melhor na entrevista.
Por sorte, vejo um táxi se aproximando. Faço sinal e ele para rapidamente. Entro no veículo e dou ao motorista o endereço da empresa dos Darkmore. Enquanto o táxi avança pelas ruas, meu coração b**e acelerado.
Tenho muita vontade de conhecer novas pessoas, de interagir com alguém fora do meu círculo restrito. As únicas pessoas com quem falo são meus pais e o meu marido. Ronan restringe muito os meus passos; até para fazer compras, ele me acompanha. Por que ele tem essa obsessão de me prender? Não posso ter amigos, não posso conversar com ninguém além dele e da minha família.
Tenho certeza de que Ronan me trai. Está cada vez mais óbvio. Ele chega do trabalho com um cheiro diferente, e já encontrei marcas de batom em suas roupas. Uma vez, confrontá-lo sobre isso me trouxe apenas mais dor. Perguntei sobre as evidências que encontrei, mas, em vez de uma resposta, ganhei um tapa no rosto que ficou roxo por quase uma semana. Como minha pele é clara, qualquer marca se torna visível e dura por um tempo.
Esses sinais de traição, junto com a violência e o controle, fazem com que minha vida se sinta ainda mais opressiva. Sinto-me presa e sem opções. No entanto, essa entrevista pode ser minha chance de mudar tudo isso. Posso sair mais, interagir com novas pessoas, e quem sabe, essas pessoas possam me ajudar a escapar desse casamento. Se conseguir o emprego, minha vida pode começar a se transformar, e a oportunidade de encontrar uma saída pode finalmente se concretizar.
— Chegamos. — O motorista me avisa.
Saio do transe em que me encontrava e olho pela janela. A cidade parece tão distante e o prédio imenso à minha frente se destaca entre os outros.
— Obrigada. — Agradeço, puxo a bolsa para pegar o dinheiro e pago a corrida.
Ele me entrega o troco e eu saio do carro, sentindo o frio do ar fresco em meu rosto. Pego a minha bolsa e olho para o enorme prédio à minha frente. O edifício é imponente, com vidros escuros que refletem a luz do sol e uma entrada elegante que parece quase inacessível.
Fecho os olhos por um momento e conto até dez mentalmente, tentando acalmar o turbilhão de emoções dentro de mim. Quando abro os olhos novamente, respiro fundo e sussurro para mim mesma:
— Estou pronta.
Com determinação renovada, dou o primeiro passo em direção à entrada do prédio.
Yara Blake.13:00 — Empresa. — Eldoria.Sexta-Feira.Entro no prédio e, imediatamente, sou envolvida pela grandiosidade do lugar. O hall é vasto, com pisos de mármore brilhante que parecem nunca ter sido pisados. Lustres enormes pendem do teto, espalhando uma luz suave que reflete em todas as superfícies, dando ao ambiente uma sensação de requinte absoluto. As paredes são decoradas com obras de arte modernas, e tudo ao meu redor exala luxo e sofisticação, algo que nunca tinha visto antes.Sinto-me desconfortável. Olho para a minha roupa simples, que, embora esteja limpa e bem arrumada, parece deslocada em meio a tanto luxo. Respiro fundo, tentando afastar o nervosismo que começa a me consumir. Não posso deixar que isso me afete agora. Preciso manter o foco.Caminho até a recepção, onde uma mulher elegante está sentada atrás de um balcão de vidro. Ela sorri de forma profissional ao me ver se aproximar.— Bom dia. Em que posso ajudá-la? — pergunta, com a voz suave e educada.— Bom dia.
Yara Blake.14:00 — Empresa. — Eldoria.Sexta-Feira.Assim que saio da sala, sigo Amélia pelo longo corredor, tentando processar tudo o que acabou de acontecer. Meus passos continuam hesitantes, como se a qualquer momento alguém fosse me chamar de volta e dizer que tudo isso foi um engano. Mas Amélia mantém um ritmo firme, me guiando até uma sala menor, onde ela finalmente se vira para mim.— Vou te explicar como funcionam as coisas na mansão dos senhores Darkmore. — começa ela, com uma voz clara e profissional. — Assim que você chegar no domingo à noite, a governanta chefe, senhora Thompson, a designará para o trabalho que combinar melhor com suas habilidades. Se você for melhor na cozinha, provavelmente ficará responsável por preparar as refeições. Se tiver mais jeito para a limpeza, será designada para isso.Faço que sim com a cabeça, tentando absorver todas as informações. Amélia continua:— O salário será de quinze mil dólares por mês, com todas as despesas de moradia e alimentaç
Yara Blake.18:10 — Casa da Yara. — Eldoria.Após o banho, me visto rapidamente, colocando uma roupa simples, mas confortável. Desço as escadas com cuidado, sentindo a frieza do chão nos pés descalços. Assim que alcanço o último degrau, a porta da frente se abre com um estalo, revelando Ronan. Ele me lança um olhar frio, e suas primeiras palavras, como de costume, são cheias de impaciência.— O jantar está pronto? — pergunta ele, sem qualquer vestígio de carinho na voz. — Estou faminto.Concordo rapidamente com a cabeça, tentando evitar qualquer tipo de confronto.— S-Sim, está pronto. Fiz mais cedo, mas deve estar frio agora... Por que não toma um banho enquanto eu esquento? — minha voz sai trêmula, e antes que eu perceba, estou desviando o olhar.O olhar dele é cortante, o tipo de olhar que me faz sentir pequena, insignificante. Me encara com desprezo antes de explodir em raiva.— Você sabe que chego a essa hora, e ainda não esquentou a comida? — a voz dele sobe de tom, carregada de
Magnus Darkmore.Estávamos precisando de mais uma empregada na mansão, então ordenei à minha secretária, Amélia, que publicasse um anúncio nos jornais. Como não queria lidar com as entrevistas sozinho, convidei meus irmãos para me acompanharem: Kael, o segundo irmão, um juiz renomado, e Damien, o terceiro irmão, que é médico. Kael tem trinta e seis anos, Damien tem trinta e cinco, e eu sou o mais velho, com trinta e oito.As primeiras candidatas foram um desastre. Pareciam mais interessadas em se jogar em cima de nós do que em mostrar suas qualidades. Kael, com seu jeito bruto e sarcástico, não deixava barato. Sempre fazia questão de humilhar as garotas, algo que divertia profundamente Damien. Concordo que eu também achava a situação divertida. Ver a reação delas às suas provocações e o desconforto que isso causava era um espetáculo à parte.No entanto, o que não esperávamos era que a próxima candidata fosse chamar a nossa atenção. Quando ela entrou no escritório, soubemos imediatamen
Yara Blake.Sábado.Enquanto corto os legumes para o almoço, uma mistura de irritação e ansiedade começa a crescer dentro de mim. Tudo o que eu queria era passar o sábado sozinha, organizar minhas coisas e me preparar mentalmente para começar o novo emprego na mansão dos Darkmore. Mas, claro, Ronan não podia deixar isso acontecer. Ele fez questão de contar à minha família sobre o meu novo trabalho, e agora, eles decidiram vir almoçar aqui, sem nem ao menos me perguntar, como sempre fazem. Não bastasse o estresse de lidar com a casa, agora preciso enfrentar a presença crítica dos meus pais.Por que ele teve que contar? Ele sempre faz isso, parece que se diverte vendo como eu fico nervosa. A voz dele ainda ecoa na minha cabeça, aquela frieza e indiferença com que me trata sempre. Porque eu quis, Yara. Não é óbvio? Como se isso fosse motivo suficiente para me jogar em situações como essa.Eu me movo rápido pela cozinha, tentando fazer tudo ao mesmo tempo. O cheiro de alho refogando começ
Kael Darkmore.Depois que saí da empresa do meu irmão, segui direto para o meu trabalho. Como juiz, sempre tenho pilhas de casos a revisar, decisões a tomar e audiências a preparar. Hoje, porém, minha mente está longe desses deveres. Apesar de estar cercado por processos e documentos importantes, não consigo me concentrar em nada além dela. Yara Blake.Desde o momento em que a conhecemos, algo mudou. Sempre tivemos mulheres em nossas camas, uma após a outra, mas nenhuma delas despertou em nós o que Yara conseguiu. Seu jeito submisso nos cativou de uma maneira que eu não esperava. Há algo na sua timidez, na forma como ela abaixa a cabeça, que me deixa intrigado. Me pego me perguntando se ela é virgem. Só porque é casada não significa que não seja. Já peguei casos em que mulheres buscaram o divórcio porque seus maridos não cumpriram suas obrigações conjugais. Se Yara for virgem, isso tornaria tudo ainda mais interessante.Assim que cheguei ao trabalho ontem, a primeira coisa que fiz foi
Damien Darkmore.17:00 — Consultório. — Eldoria.Estou no meu consultório, terminando de preencher alguns relatórios antes de finalmente ir para casa. O dia foi longo, e minha mente está cansada, mas a rotina de um médico nunca realmente termina. Enquanto reviso alguns prontuários, meu celular vibra na mesa ao lado. Pego o aparelho e vejo que é o Magnus ligando. Atendo imediatamente.— Magnus, o que houve? — Pergunto, mantendo a voz baixa.— Kael descobriu algo interessante sobre a nossa doce Yara. — Ele começa, e eu automaticamente deixo a caneta de lado, concentrando-me na conversa.— Estou ouvindo. — Digo, apoiando as costas na cadeira e fechando os olhos por um momento, tentando focar na informação.— Ela é casada com Ronan Blake, um empresário do setor de construção. O casamento deles foi arranjado pelos pais, um acordo entre famílias para fortalecer as empresas. — Magnus relata, a voz carregada de um tom de desdém.— Casada com Ronan Blake... — Repito, deixando a informação se s
Yara Blake.Domingo.18:20 — Casa da Yara. — Quarto. — Eldoria.Estou terminando de arrumar minha mala, me sentindo um pouco ansiosa. Hoje é domingo, e já está escurecendo, preciso sair antes que fique tarde demais. Acordei muito mais cedo do que de costume, por volta das cinco da manhã, para conseguir arrumar toda a casa, preparar o café do Ronan e também fazer os almoços para a semana. E desde ontem, ele tem lançado ameaças sutis ontem, dizendo que, se descobrir algo, coisas ruins acontecerão. Sei que ele se refere a mim.Ainda continuo em choque ao descobrir que ele pretende usar o meu dinheiro para a empresa dele. Esse dinheiro era minha esperança, meu caminho para fugir ou, quem sabe, contratar um advogado para conseguir o divórcio. Solto um suspiro pesado enquanto fecho a mala. Não tenho muitas roupas, já que o Ronan nunca se preocupou em me dar mais do que o básico. Tudo o que é meu está guardado ali, todas as minhas poucas posses.Ele saiu há pouco, dizendo que algo havia acon