ClairePor um longo momento, ficamos ali, nossos corpos ainda entrelaçados, nossas respirações entrecortadas preenchendo o silêncio do quarto. Jean-Luc se inclinou para trás, apoiando-se em um braço para me observar. Sua outra mão subiu até meu rosto, onde ele traçou minha mandíbula com os dedos, seu toque não mais tão terno quanto antes.— Você está bem? — ele perguntou, sua voz baixa e cheia de preocupação genuína.Eu apenas assenti, incapaz de encontrar as palavras para responder. Tudo o que consegui fazer era encarar aqueles olhos azuis profundos, tentando entender como alguém poderia me fazer sentir tanto em tão pouco tempo.Ele deu-me um sorriso que parecia revelar uma versão diferente dele, menos vulnerável e mais intimidante.— Não consigo parar de olhar para você — ele confessou, sua voz um sussurro. — Não acredito que finalmente a tenho só para mim.Eu corei, mas, antes que pudesse responder, ele se deitou ao meu lado e me puxou para perto. A sensação de seus braços ao meu r
ClaireMais tarde, ao sair do banheiro depois de finalizar a maquiagem e o cabelo, parei diante de Jean-Luc que se encontrava escorado no parapeito na varanda, observando em silêncio a vista.— Como estou?Ele se virou e sorriu ao me ver.— Maravilhosa! Está deslumbrante, Claire. Perfeita. A mulher mais linda que meus olhos tiveram a honra de enxergar. — A seleção de elogios me fizeram sorrir. Ele apanhou minha mão e beijou o dorso. — Está pronta?Assenti.Pegamos nossos casacos e deixamos o hotel. Jean-Luc dirigiu por uns quarenta minutos até uma mansão feita de pedras, protegidas por muros altos e um portão de ferro vermelho.Um homem abriu a porta para mim, que desci com sua ajuda. Jean-Luc se aproximou rapidamente, apanhando a minha mão. Ali fora havia apenas dois casais. Ambos nos olharam com discrepância. Um deles comentou algo aos sussurros.Jean-Luc puxou-me para dentro. Ao passarmos pela porta, logo uma mulher apareceu, apanhando minha bolsa e nossos casacos.— Meu celular —
ClaireIncomodada com tudo o que acabara de ver, peguei o garfo e espetei um pedacinho de batata no prato à minha frente. Levei-o à boca, mastigando lentamente, como se o ato de comer pudesse abafar o nó de ansiedade que crescia no meu peito. Jean-Luc estava sentado ao meu lado, sua postura impecável, mas seu olhar não era de conforto. Ele me encarava com aquela leveza controlada que eu começava a identificar como uma máscara, e, apesar de tudo, ele não sorria.À cabeceira da mesa, Franz começou a puxar o assunto, sua voz soando firme e despreocupada enquanto falava em alemão com os demais. Minha atenção voltou-se ao prato, enquanto meus ouvidos tentavam pegar alguma palavra familiar naquela conversa fluida e quase ensurdecedora. Claro que eu não entendi nada; meu alemão era inexistente, e, diante daquele ambiente, essa barreira linguística parecia uma afronte pessoal.Não resisti e os encarei de soslaio. A mesa estava cheia de figuras que parecem ter saído de um filme noir: elegantes
ClaireO jantar contínuo. A comida era deliciosa, mas a cada garfada eu sentia o estômago mais apertado, como se estivesse engolindo chumbo. Eu não participei de nenhuma conversa, e Jean-Luc também não fez questão de iniciar uma em francês para me incluir. Todos falavam em alemão, italiano e outra língua que eu não sabia se era espanhol ou português, ignorando minha presença com uma naturalidade quase ensaiada. Era como se eu fosse um fantasma na mesa.A única pessoa que parecia demonstrar algum interesse em mim era René. Ele me olhou atentamente, como se quisesse verificar se eu estava bem, mas não disse nada. Jean-Luc, por outro lado, parecia imerso em seu próprio mundo, como se minha exclusão não fosse algo que o incomodasse.Olhei para o relógio na parede atrás de Tatiana. Os ponteiros pareciam congelados. O tempo se arrastava, e minha ansiedade só aumentava. Eu me senti como uma intrusa em um ninho de cobras, incapaz de entender suas línguas ou sobre o que gesticulavam vez ou out
Jean-LucO mundo pareceu desmoronar no instante em que Franz levou Claire pelo braço. Não era só ciúme – embora a ideia de Claire sozinha com ele fosse como um espinho no meu peito –, mas a preocupação legítima. Franz tem o hábito irritante de falar demais, de abrir portas que deveriam permanecer trancadas. E Claire… Claire ainda não está pronta para ouvir de forma crua sobre esse lado da minha vida, embora eu já estivesse a colocando para dentro.Eu a amo. Esse sentimento, essa certeza, não deveria ser tão avassaladora, mas é. E é justamente por isso que estou tentando introduzi-la devagar, passo a passo, nesse mundo de sombras. Porque, se eu for imprudente, ela pode me rejeitar. E, se isso acontecer, não sei o que restará de mim.Fiquei observando a porta por onde os dois saíram, o maxilar travado e os punhos cerrados. Queria segui-los, mas sei que não devia. Franz é um animal social. Ele age como se tudo fosse um jogo ensaiado, mas é imprevisível. Eu só poderia esperar que ele não
ClaireEncarei a pintura outra vez, sentindo um frio na espinha. Aquela obra, junto com outras que eu já havia reconhecido, não era apenas replicadas. E muitas delas haviam sido roubadas de museus ou coleções particulares há muito tempo. Agora, eu as via ali, na casa de Franz, como se fossem meros itens decorativos.Olhei para ele, chocada.— Isso... isso é um crime — murmurei. Ele era um receptor.Franz virou-se para mim, sorrindo como se estivesse se divertindo com minha ingenuidade.— Chame como quiser, mas prefiro pensar que estou preservando a história. E, claro, você vai guardar esse segredinho, não é?Ele ergueu o dedo indicador, colocando-o sobre os próprios lábios em um gesto teatral de silêncio. Engoli em seco outra vez, incapaz de responder.Franz se aproximou mais, reduzindo a distância entre nós. Seu olhar agora tinha algo que eu não sabia decifrar.— Você é uma de nós agora, ainda que eu ache que não deveria ser. No entanto, aprovo, porque gostei de você. Gostei da cor d
ClaireJean-Luc tentou se aproximar mais uma vez, mas eu levantei a mão, impedindo-o.— Você foi injusto, Jean-Luc — sussurrei, sentindo a dor atravessar minha voz. As portas do elevador se abriram e eu saí às pressas, entrando no quarto.— Claire... eu...— Você me envolveu nisso sem me dizer nada — berrei, interrompendo-o. — Você me jogou no meio disso tudo e esperava que eu simplesmente aceitasse sem perguntar? Qual era a porra do seu plano? Minha vida foi colocada em risco!Jean-Luc tentou falar, mas eu já havia me virado. Caminhei até minha mala e comecei a abrir o zíper, pegando minhas roupas e jogando-as de volta dentro dela.— Claire, não faz isso. Me escuta. Eu tive motivos...— Me leva para casa. — Minha voz soou firme, mas eu sabia que ele podia ouvir o peso da decepção nela. — Agora!***A viagem de volta para França foi feita em um silêncio ensurdecedor. Jean-Luc não ousou emitir um ruído. Mas seus olhos sobre mim diziam muito. Estava aflito, magoado, triste e decepcionad
ClaireParis, 2018. A noite caía suavemente sobre a Cidade das Luzes, derramando sombras longas pelas ruas estreitas e antigas. Eu sentia o frio úmido penetrando minha pele, mas meu coração ardia com uma inquietude que nenhuma estação poderia acalmar. Caminhava apressada pelo Boulevard Saint-Germain, com meus pensamentos dispersos como as folhas de outono aos meus pés. A galeria onde eu costumava buscar inspiração estava a poucos metros de distância, e eu ansiava pelo refúgio silencioso que as pinturas ofereciam. Eu precisava escapar das memórias que me assombravam, das incertezas que pendiam sobre meu futuro como uma espada invisível. As ruas de Paris, embora familiares, pareciam mais solitárias naquela noite. Entrei na galeria, e o cheiro familiar de tinta e madeira velha me acolheu imediatamente. Passei pelas obras conhecidas, cada pincelada contando uma história, mas naquela noite, uma sensação de antecipação rastejava pela minha mente. Meus olhos começaram a percorrer ao redor.