Ficar perdida entre os papéis espalhados pela mesa não era melhor do que ficar na cama olhando para as paredes pintadas em tons pastéis do quarto de hóspedes. Entre todos os males o pior eu acho, larguei as folhas sobre a mesa e me apoiei na cadeira respirando com um pouco de dificuldade por causa da dor que insistia em me incomodar a cada movimento, por maus simples que fosse.
- Nádia, pode ir até o quarto e pegar o analgésico pra mim por favor, já está na hora.
- Sim senhora.
Contratar Nádia se mostrou uma escolha muito acertada, ela estava cuidando muito bem da administração de tudo relacionado aos assuntos legais, e até com os assuntos não tão lícitos assim, além do mais era esperta e aprendia rápido, o fato de ser bonita também ajudava a abrir as portas mais facilmente.
- Aqui senhora.
Me ofereceu o frasco e colocou um copo de água na mesa a minha frente.
- Obrigado Nádia.
- Disponha senhora.
Engoli o comprimido me
O céu estava escuro quando o avião pousou no aeroporto de Nápoles, o frio seguia implacável como era esperado daquela época do ano, abotoei meu casaco como uma maneira de impedir o vento de entrar, tomei um último olhar pra trás antes de seguir rumo a minha escolha, talvez eu nem tivesse escolha afinal, nao quando o sangue fala tão alto. Meus passos logo se tornam inaudíveis entre as conversas da multidão, alguns passos e encaro Mateo distante, ele esta diferente de como eu me lembrava, os olhos azuis parecem profundos e as olheiras entregam as noites mal dormidas, mas sua presença imponente continua a mesma, como um animal prestes a atacar, as pessoas se desviam dele involuntariamente, mas os olhos mais corajosos e curiosos acompanham seus movimentos, por um minuto sinto um sentimento familiar, mas o empurro para o mais profundo da minha mente e termino meu trajeto at&eacut
Estar em casa me deixou nostálgica, poder olhar para os retratos de família que um dia esconderam tão bem a verdade dos olhos infantis e me lembrar de todas as festas de aniversários de todos os natais, e perceber onde isso nos levou. Quando eu fui embora tinha apenas quinze anos, era uma adolescente que acreditava que a solução era fugir e esquecer tudo, os anos no internato e na faculdade me deixaram mais dispersa de tudo isso, mas lá no fundo ainda havia a lembrança, dos gritos, do sangue, do cheiro da fumaça. Tantos anos e ainda consigo sentir o cheiro.-Eu mesma cuidei de todos os detalhes para o funeral do seu pai, mas se houver alguma mudança que queira fazer eu cuidarei disso imediatamente. Izabel a governanta da mansão trazia consigo um ar de preocupação e vez ou outra podia notar suas mãos agitadas descendo até a saia na te
O enterro havia movimentado toda a alta sociedade Siciliana, parada ao lado do caixão fechado recebendo cumprimentos de tantos desconhecidos pude perceber quão longe meu pai tinha levado a família, senadores, atores, empresários influentes, todos se dizendo muito consternados com o acontecimento, a maioria estava mentindo como era de se esperar, mas em alguns aqui ou ali havia um pouco de sinceridade, uma parte de mim ainda estava digerindo a situação querendo um pouco de silêncio e solidão, a outra parte e provavelmente a mais dificil de ser controlada estava com raiva, raiva por ter fugido anos atrás como uma covarde, raiva por não estar presente quando ele precisava de mim, raiva de todas as mentiras, até raiva dele mesmo por ter morrido assim, quando eu pensava em como seria a morte do meu pai, imaginava ele morrendo no jardim se lembrando da minha mãe sentado no mesmo banco que ela morreu, parece
O dia amanheceu estranhamente silencioso, tentei controlar a ansiedade, e me manter calma, mas ao me sentar a mesa para o café da manhã, senti um arrepio na pele, agora faltava tão pouco tempo, tantos pensamentos passavam pela minha cabeça e me deixavam agitada, será que ele se lembraria de mim, será que pensou em mim em tantos anos longe de tudo, soube que ele partiu logo depois de mim, simplesmente se foi sem nenhuma explicação do porquê, mas ele nunca dava explicações sobre nada de qualquer forma, manter um diálogo nunca foi uma de suas habilidades.- Bom dia, estamos prontos para a senhora quando quiser. Um breve aceno foi tudo o que Mateo conseguiu, duvido que conseguisse pronunciar qualquer palavra agora. Seriam algumas horas de carro, certamente fazia sentido ele ir viver completamente afastado do resto da sociedade moderna, duvido que tivesse sequ
Olhar ao redor e começar a ver as coisas mudarem me deu animo mas me deixou um pouco agitada, ter Mateo ao meu lado me olhando a cada passo também não ajudava em nada.- O que foi Mateo?- Mesmo com o voto de Lúcio, ainda precisamos de mais dois votos, presumo que a senhora saiba como conseguir os votos. A dúvida no som das palavras me deixou um pouco chateada, no fundo Mateo ainda me via como uma garotinha frágil que precisava ser protegida e cuidada, talvez fosse a hora dele entender quem dá as cartas agora.- É claro, preciso que vá buscar uma pasta pra mim no banco.- Posso pedir pra alguém ir buscar.- Não, têm que ser você, e traga diretamente pra mim. Entreguei a chave e ele saiu em silêncio, Mateo era leal, mas tinha seus próprios conceitos de lealdade e isso teria que mudar, mas era um problema pra l
Às vezes me olho no espelho e não me reconheço, olho nos fundos dos meus olhos procurando qualquer resquício da garota que eu fui um dia, e nada, nada é a única coisa que eu encontro, não importa o quanto eu procure, não importa o quanto eu queira encontrar qualquer coisa, tudo é apenas um grande nada. Ouço as batidas na porta, e retorno ao meu quarto, já aguardando a entrada, Mateo atravessa rapidamente o comodo fechando a porta atrás de si, hoje em especial ele parece ainda mais quente, com a barba crescendo e a tensão nos ombros largos, com um terno negro impecável e uma camisa que poderia ser a sua segunda pele, tão branca e macia que minhas mãos se agitam querendo arranca-la para ter um melhor acesso a carne firme e marcada que está escondida, Mateo se mantém calado, observando meus movimentos calmamente, os olhos vagueiam entre meu rosto e os seios expo
A porta fechada indicava que todos já aguardavam na sala de reuniões, Mateo se apressou a minha frente para abrir, Lúcio ao meu lado checava sua arma no coldre, eu sabia que esse momento chegaria e que isso iria mudar tudo, mas nem mesmo esse pensamento me preparou para o que estava para acontecer. Caminhei silenciosamente sentindo os olhares acompanhando meus movimentos, me acomodei na cadeira que pertenceu ao meu pai por tantos anos. Os olhos surpresos também acompanharam Lúcio, imagino que vê-lo após tantos anos foi uma surpresa e tanto para os homens da sala, para alguns mais do que outros.- Bom dia senhores, como sempre é um prazer tê-los aqui.- Está belíssima Martina, uma verdadeira princesa. Como sempre Tommaso escondia seu veneno em palavras gentis e cuidadosamente escolhidas.- Bom, como todos sabem só existe um motivo para termos
Já haviam se passado alguns dias depois da votação, como sempre eu estava atolada em trabalho, cuidar da família é uma tarefa interminável, manter os negócios, e deixar todos felizes era uma tarefa árdua, e com tudo isso havia se instaurado entre mim e Mateo um clima de tensão, mesmo que não houvesse causa aparente, o silêncio antes tão confortável agora era incómodo, ter que lidar com toda essa testosterona me deixava um pouco ansiosa. Lúcio permanecia como sempre, solitário, focado e absurdamente quente, meus pensamentos acabavam me levando a ele seja qual fosse o caminho que eu escolhesse, e ele não estava me dando muita escolha, com suas frases de duplo sentido, seus olhares sobre mim e seu sorriso fatal, ele havia se encontrado com um negociador de armas, mas a munição usada era muito específica e ele acabou em um beco se